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Academic year: 2018

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PROGRAMA DE PÓS-GRADUAÇÃO EM CIÊNCIA DA INFORMAÇÃO MESTRADO EM CIÊNCIA DA INFORMAÇÃO

LUIZ EDUARDO FERREIRA DA SILVA

CIÊNCIA COMO TÉCNICA OU TÉCNICA COMO CIÊNCIA:

nas trilhas

da Arquivologia e seu status de cientificidade

(2)

LUIZ EDUARDO FERREIRA DA SILVA

CIÊNCIA COMO TÉCNICA OU TÉCNICA COMO CIÊNCIA: nas trilhas da Arquivologia e seu status de cientificidade

Dissertação apresentada ao curso de Mestrado do Programa de Pós-Graduação em Ciência da Informação da Universidade Federal da Paraíba, na Linha de pesquisa “Memória, Organização, Acesso e Uso da Informação” como requisito para o grau de Mestre em Ciência da Informação.

Orientadora: Profª. Dr.ª Dulce Amélia de Brito

Neves

(3)

S586c Silva, Luiz Eduardo Ferreira da.

Ciência como técnica ou técnica como ciência: nas trilhas da Arquivologia e seu status de cientificidade / Luiz Eduardo Ferreira da Silva.- João Pessoa, 2013.

138f. : il.

Orientadora: Dulce Amélia de Brito Neves

Dissertação (Mestrado) – UFPB/CCSA

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LUIZ EDUARDO FERREIRA DA SILVA

CIÊNCIA COMO TÉCNICA OU TÉCNICA COMO CIÊNCIA: nas trilhas da Arquivologia e se status de cientificidade

Dissertação apresentada ao curso de Mestrado do Programa de Pós-Graduação em Ciência da Informação da Universidade Federal da Paraíba, na Linha de pesquisa “Memória, Organização, Acesso e Uso da Informação” como requisito para o grau de Mestre em Ciência da Informação.

Aprovada em _____/______/______

BANCA EXAMINADORA

________________________________________________ Prof.ª Dr.ª Dulce Amélia de Brito Neves (Orientadora)

Doutora em Ciência da Informação Universidade Federal da Paraíba (UFPB)

_________________________________________________ Prof.ª Dr.ª Bernardina Maria Juvenal Freire de Oliveira

Doutora em Letras

Universidade Federal da Paraíba (UFPB)

_________________________________________________ Prof. Dr. José Washington de Morais Medeiros

Doutor em Educação

Universidade Estadual da Paraíba (UEPB)

____________________________________________ Prof. Drº. Carlos Xavier de Azevedo Netto

Universidade Federal da Paraíba (UFPB)

(Suplente Interno)

____________________________________________

Profa. Drª Jacqueline Echeverría Barrancos Universidade Estadual da Paraíba (UEPB)

(5)

AGRADECIMENTOS

Ao senhor Deus de todas as coisas, o Pai maior que nos guia e nos protege de todos os perigos da vida, obrigado Deus de bondade, de misericórdia e amor.

À Profª. Drª. Dulce Amélia de Brito Neves – minha orientadora – por ter acreditado na minha caminhada dissertativa, pelas conversas e acima de tudo por ter tido a coragem de abrir uma disciplina especial no Programa de Pós-Graduação em Ciência da Informação da Universidade Federal da Paraíba para discutir epistemologia, obrigado pela humildade.

Aos meus mestres Prof. Dr. Waldeci Ferreira Chagas e o Prof. Dr. José Washington de Morais Medeiros, dois seres humanos excepcionais, obrigado por ter acreditado nas minhas potencialidades de aluno, de ser humano, tudo que sou hoje enquanto pesquisador agradeço a vocês, onde me espelho, não apenas pelo víeis acadêmico, mas, sobretudo na conduta ética que encaram a construção do saber. Obrigados meus nobres e eternos orientadores.

A banca examinadora pelas valiosas contribuições que foram auferidas e logo acatadas no exame de qualificação.

A todos os professores do Programa de Pós-Graduação em Ciência da Informação da UFPB, em especial a Profª. Drª Mirian de Albuquerque Aquino, pelo incentivo, pelas conversas, pelo exemplo de professora, obrigado pelo carinho, aprendi muita coisa com sua ação peculiar de educadora.

A Profª. Drª Bernadina Maria Juvenal Freire de Oliveira, obrigado pelo carinho, por suas palavras, obrigado pelas discussões de memória, pela conduta e seriedade que leva suas ações, muito obrigado pela confiança, e por ter acreditado em meu potencial.

A minha base, o meu tudo, minha família, os que não estão mais presentes fisicamente nesse mundo, mas que foram e serão sempre lembrados em meu

coração e em minhas orações, (in memoriam) Irene Maria Ferreira minha avó

amada, ao querido e brilhante avô José Ferreira, aos meus tios Feliciana Ferreira (Chandu), Antônio José Ferreira e Maria Luzinete Ferreira, pessoas que eu não tenho como esquecer, pois me ajudaram a ser homem e cidadão, ensinado a respeitar o semelhante e lutar pelos nossos sonhos, obrigado meus eternos e memoráveis amores.

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Ao meu pai, exemplo de conduta humana, de ética e honestidade, características que nesse mundo é difícil de encontrarmos hoje, obrigado por ter acreditado em mim, por ter estendido a mão e por nunca me tratar com indiferença, o obrigado meu Pai, tudo que faço é também pensando em vosso futuro.

Aos meus irmãos Lucas Ferreira Santana e Karla Patrícia, que fazem parte da minha história, do meu crescimento e também das minhas conquistas. Obrigado por existirem em mim.

A minha amada companheira Suênia Vasconcelos de Souza, minha futura esposa, a pessoa que Deus escolheu para eu cuidar, para eu amar, joia perfeita tenha certeza que farei isso com todas as minhas forças, passamos por muitas coisas juntos, medos, incertezas, provações, mas que Deus sempre mostrou a nossa aliança. Amo-te.

Aos meus amigos (irmãos) que sei que posso contar, o laço de irmandade não é apenas sanguíneo, mas sobretudo quando sabemos que encontramos verdadeiros amigos, Fernando José, Antônio Augusto e Joelson Nascimento.

Aos funcionários da secretária do PPGCI, Franklin Duarte Kobayash e Helton Bruno Pinheiro Barbosa pela presteza e dedicação que encaram o trabalho, por sempre ter me tratado com respeito e paciência, meu muito obrigado.

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Pense no cientista como explorador de labirintos. Ele se meteu pela ala esquerda, terminou num beco sem saída, voltou e colocou na entrada um sinal vermelho. Esse sinal é digno de confiança, final, decisivo. Ele prossegue, encontra a caminhos abertos, volta, coloca um sinal verde. Esse sinal não é digno de confiança. Nada garante que, mas adiante, a ala por ele explorada não termine também num beco sem saída. O sinal vermelho diz: é inútil entrar por este caminho. Tal sinal tem um enorme valor: poupar esforços. A informação de que certos caminhos não levam a lugar algum é informação tão importante como quaisquer outras. Se você encontra, no inicio da rua, uma tabuleta com a informação “beco sem saída”, você não entra por ela. Economizará. Isso também é conhecimento.

(8)

RESUMO

Pesquisa que tem por objeto compreender o caráter de cientificidade da Arquivologia sob a luz da Ciência da Informação, de modo que essa problematização tenha um papel fundamental no contexto arquivístico. Desse modo, partimos da seguinte

hipótese:Em Arquivologia, a lógica do agir instrumental obstrui o caráter do campo

como ciência quando, na verdade, desdobra-se mais como técnica. Nesse sentido, por intermédio do método indiciário e da hermenêutica crítica, buscamos através dos indícios interpretativos, encontrar as pistas para as incertezas epistemológicas em que a Arquivologia está circunscrita, sobretudo, no contexto teórico-metodológico. Logo, através dessa ação indiciária medimos as possibilidades de uma Arquivologia – técnica ou de uma Arquivologia – Ciência. Com efeito, observamos que a Arquivologia não pode fugir da técnica como procedimento, mas, o que nos deixa

preocupados é que a “cientificação da técnica” se tornou a própria ideologia da

Arquivologia, o sentido primeiro e último sobre o qual a razão de ser constitui-se como base. De todo modo, os resultados indiciários e interpretativos demonstram que se a Arquivologia reduz-se a um conjunto de técnicas, trata-se de um “produto” e não de uma ciência que via de regra, produz verdades e implementa verdades criando produtos. Por conseguinte, concluímos que esse estudo permitiu perceber que uma ação reflexiva no contexto da pesquisa em Arquivologia, poderá fazer com que a Arquivologia se distancie do modelo funcional/pragmático que a marcou no processo de historicização.

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ABSTRACT

The research aims at understanding the scientificity character of Archival

Science in light of Information Science so as this problematization may have an

outstanding role in the archival context. In this way, the following hypothesis

was taken into account: In the Archival Science, the logic of instrumental action

hinders the field character as science when, in fact, it is unfolded as a

technique. In this perspective, by means of the evidential method and the

critical hermeneutics, we searched through interpretative evidence to find

clues for the epistemological uncertainness in which the Archival Science is

circumscribed, especially, in the theoretical and methodological context.

Therefore, through this evidential action, the possibilities of an Archival Science

– technique or of an Archival Science - Science were measured. In effect, it was

observed that the Archival Science can not ignore the technique as procedure,

but one major concern is related to the “scientification of the technique” which

became the Archival Science ideology; the first sense and the last one about

which the reason of being is constituted as basis. Thereby, the evidential and

interpretative results demonstrate that if the Archival Science is reduced to a

set of techniques, it refers to a “product” and not to a science that, usually,

produces truths and implements them by creating products. Consequently, it

can be concluded that this study enabled to perceive that a reflective action in

the context of Archival Science research can make the Archival Science to

distance from the functional/pragmatic model that registered it in the

historicization process.

(10)

LISTA DE ILUSTRAÇÕES

Figura 1 A dual visão do sentido “paradigma” na ciência 60

Figura 2 O esboço científico da divisão da ciência 78

Figura 3 Rationalizierung (racionalização) do agir funcional instrumental na

Arquivologia 97

Figura 4 A concepção do ciclo prático-vital na Arquivologia 100

Figura 5 A produção do conhecimento e interesse em Jürgen Habermas 103

Figura 6 A evolução informacional ao longo da história 113

Figura 7 A dinamicidade quadripolar na Arquivologia 117

Figura 8 A relação hermenêutica da pesquisa 123

(11)

SUMÁRIO

1 INTRODUÇÃO 11

2 “SPIE” METODOLÓGICO 22

3 A INTELECÇÃO PARADIGMÁTICA NA ARQUIVOLOGIA: um diálogo entre o clássico e o contemporâneo

33

3.1 O Principio da proveniência 40

3.2 O Princípio da ordem interna ou original e o respeito pelos fundos 45 3.3 A Teoria sistêmica e o rompimento da ordem: a crise paradigmática

na Arquivologia 50

4 A CIÊNCIA COMO RAZÃO LEGITIMADORA: da revolução das

luzes à crise de paradigmas na modernidade 55

4.1 Racionalidade e século das luzes: liberdade, igualdade e

fraternidade 61

4.2 O poder da razão na modernidade: a redenção de ciência 70 5 CONHECIMENTO E INTERESSE: o lugar das Ciências Sociais

Aplicadas 76

5.1 A constituição de um campo científico 79

5.2 Manifestações das ciências sociais aplicadas: O que são? De onde

vêm? 83

5.3 A técnica como ideologia do pensar-agir: do pragmatismo ao

funcionalismo 87

5.4 Ciências empíricas e ciências histórico-hermenêuticas: critica de

Jürgen Habermas 101

6 TÉCNICA OU CIÊNCIA? EM BUSCA DE UMA POSSÍVEL

“IDENTIDADE PERDIDA” NA ARQUIVOLOGIA 110

6.1 O esforço da abordagem europeia: a perspectiva sistêmica dos

arquivos 113

6.2 Os laços do pensamento funcional sob a formação pragmática 119 6.3 A negação da auto-imagem: os estilhaços da ciência arquivística 121

7 CONSIDERAÇÕES FINAIS 125

(12)

1 INTRODUÇÃO

Em um contexto sociopolítico, econômico e de profunda transformação, a ciência contemporânea traz consigo diversas formas de pensarmos a estrutura e a

formação de um corpus científico. Todavia, o campo científico de qualquer disciplina

ou área do conhecimento que busca estabelecer-se como ciência tem que possuir

uma metodologia e uma base teórico-metodológica consolidada1.

Nesse sentido, percorrendo o universo empírico e pragmático, ao qual a

Arquivologia2 foi associada no processo de historicização, procuramos compreender

seu lugar como um campo do conhecimento que está ancorado supostamente em

uma cientificidade. Dessa maneira, é interessante visualizar o status científico que a

Arquivologia almeja, através dos seus princípios e fundamentos mais específicos. Segundo Rousseau e Couture (1998, p.53) “um corpus científico constitui-se de

diversas maneiras, mas, sobretudo através de manuais3 da especialidade e a

criação de atividades de formação. A publicação de manuais representa uma etapa na constituição de uma disciplina científica”. Rousseau e Couture (1998) indagam a respeito desses manuais que seriam o caminho de tornar a Arquivologia um campo do conhecimento autônomo.

De igual modo, esses manuais existiam desde o século XV e XVI com o

avanço da ciência, no entanto, na Arquivologia esses manuais tiveram sua grande

ênfase no final do século XIX com o manual dos arquivistas holandeses4.

1 Tanodi (1960, p.13-14) afirma que “a configuração de uma ciência depende do

cumprimento de alguns requisitos, quais sejam: a) Ter um campo específico de observação, um objeto; b) Tal objeto deve ser investigado com um fim determinado: procurar o conhecimento pelas causas ou estabelecer leis universais, ou investigar uma verdade; c) Para atingir seu objetivo, toda ciência deve ter um método próprio”.

2 Na pesquisa apresentamos como sinônimos os termos Arquivologia e Arquivística, uma

vez que na literatura para a conceituação “científica” da área os dois termos aparecem de modo semelhante.

3 Para Rousseau e Couture (1998, p. 53) “desde o início do século XIX, surgiram em

diferentes países vários manuais de arquivística. Concebidos por arquivistas, cuja competência é reconhecida ou por associações profissionais, descrevem as práticas nacionais em matéria de concepção e de tratamento dos arquivos”.

4

Muller, Feith, e Fruin produziram seu manual para a associação de Arquivistas

(13)

Na segunda metade do século XIX, o percurso histórico da Arquivística foi marcado por duas variáveis: as preocupações com o equacionamento dos problemas dos arquivos modernos, com o desenvolvimento de práticas arquivísticas, e, por outro, com as preocupações em torno da necessidade de se construir consenso acerca dos conceitos e métodos utilizados pela Arquivística no mundo. (SILVA, 2012, p. 34).

Dessa maneira, a escolha pela temática se deu em virtude de conhecer as lacunas teórico-metodológicas da Arquivologia, principalmente quando relacionado à dicotomia entre ciência e técnica, pois o objetivo desses esclarecimentos é situar a Arquivologia dentro do pensamento contemporâneo, partindo dos questionamentos e das ações interpretativas à compreensão das variáveis do saber arquivístico. Assim, ao interpretarmos um fenômeno é necessário corroborar para um processo de autofundamentação em um sentido explanatório, interpretativo e autorreflexivo. De todo modo, partimos para a compreensão da relação da ciência com a técnica no

universo da Arquivologia, principalmente fundamentados em Jürgen Habermas5

através da lógica da argumentação exegética.

Logo, analisamos esse antagonismo de um agir funcional instrumental

(técnica)6 a uma possível teoria epistêmica na literatura da Arquivologia. Segundo

1890. Típico dos trabalhos feitos por comitês, é escrito com muito cuidado e com uma série de exemplos. Mesmo em relação a regras, é perceptível esse aprofundamento. O manual também reflete as ideias de Muller tomadas da teoria Francesa, devido a seus estudos na École des Chartes e do conceito alemão de proveniência, utilizado em uma série de arquivos da Holanda. (COOK, 1997, p. 21).

5 O filósofo da ciência Jürgen Habermas considera que se pode classificar a maneira de

ver as interações entre a ciência e a sociedade em três grupos distintos: 1º as interações tecnocratas, 2º interações decisionistas e pragmático-políticas. Essas três maneiras de ver jamais existem em estado puro: trata-se de modelos conceituais que permitem uma representação do que ocorre. Para o modelo tecnocrático, as decisões cabem aos especialistas. Já o modelo decisionista faz uma distinção entre tomadores de decisão e técnicos. Para o modelo tecnocrático, seriam os conhecimentos científicos (e, portanto, os “especialistas”) que determinariam as políticas a serem seguidas (objetivos e meios). Já o terceiro modelo, o que é privilegiado é a perpetua discussão e negociação entre o técnico e os clientes. (FOUREZ, 1995, p. 208- 209-210).

6 A crítica da racionalidade instrumental ou técnica. Uma tentativa crítica reconceituada

(14)

Ribeiro (2002, p. 105), a Arquivologia necessita ser “repensada e (re) construída sob pena de não vencer o empirismo e o estatuto de disciplina técnica que a tem caracterizado”. Desse modo, a autora propõe um caráter informacional coadunado com a vertente paradigmática da informação social que estaria no entremeio do objeto de estudo da Ciência da Informação.

Nesse sentido, a investigação interpretativa visou debater os conceitos, finalidades e intelecção dos indícios hermenêuticos em um processo argumentativo

para abrangermos essa dicotomia ciência/técnica na Arquivologia,na medida em

que a técnica e a ciência pervadem as esferas institucionais da sociedade e transformam assim as próprias instituições, desmoronam-se as antigas legitimações”. (HABERMAS, 2009, p. 45). Essas legitimações impregnadas no anseio da modernidade, marcadas por essa assimetria dicotômica da ciência e técnica foi contextualizada pela ruptura com a antiga herança da ciência moderna. Segundo Habermas (1987), a conjectura da racionalidade é fundamental para o

sujeito abandonar o paradigma que existia na ciência moderna na relação

sujeito-objeto, no entanto, surgirá o paradigma do agir comunicativo em um processo linguisticamente interpretativo.

Com efeito, Habermas (1987) chama atenção para algo importante que levou o

homem a entender sua práxis enquanto ser categorizado por subjetividade, ou seja,

a emancipação dos interesses do “saber prático”; o autor esclarece a preponderância de se trabalhar em um substrato teórico e epistemológico, o qual ele

chamou de teoria social crítica. Logo, esse teor reflexivo traz para o campo do

conhecimento outro olhar, outra maneira de se fazer, pensar e contextualizar o exercício epistêmico em detrimento aos padrões tecnocratas que foram impregnados na Arquivologia no processo de historicização.

(15)

Diante dessas argumentações, o século XIX marcou de forma concisa todo entremeio do conhecimento da Arquivologia que foi alinhavado e sobreposto a um modelo de saber que reportava sempre à uma praticidade, uma finalidade

convencional, porque era incrementada pela ação intervencionista do Estado7

institucionalizado, uma vez que a Arquivologia nesse período estava demarcada com o adjetivo de “auxiliar da História” e que foi impulsionado pela ação positivista:

O positivismo posto em cena por Comte, serve-se dos elementos da tradição tanto empirista quanto racionalista para solidificar, a posteriori, em vez de refletir, a fé da ciência em sua validade exclusiva, clarificando a estrutura das ciências com base nesta fé. (HABERMAS, 1987, p. 27).

Essa postura positivista condicionou em larga escala o avanço científico da Arquivologia servindo-se dos elementos da ação tradicional (empirismo) e da

validade exclusiva determinada pela neutralidade da lei dos três estágios8.

Habermas (1987) reporta ao positivismo um processo objetivo de formação da espécie humana, que dogmatizou e mascarou a fé da ciência nela mesma. Desse modo, a Arquivologia não muito diferente de outros campos do conhecimento sofreu a influência do positivismo, através de correntes que se afirmaram e se constituíram

como o empirismo9, pragmatismo10 e o funcionalismo11, que “enclausuraram” o

7 Segundo Habermas (2009, p. 68), “desde o último quartel ao século XIX, fazem-se notar

nos países capitalistas avançados duas tendências evolutivas: 1) um incremento da actividade intervencionista do Estado, que deve assegurar a estabilidade do sistema e, 2)

uma crescente interdependência de investigação técnica, que transformou as

ciências na primeira força produtiva”.

8 A lei dos três estágios de Comte enuncia uma regra segundo a qual o desenvolvimento

intelectual dos indivíduos, bem como o da espécie, deve consumar-se em seu total. Esta lei do desenvolvimento possui manifestamente uma forma lógica não correspondente ao status das hipóteses nomológicas das ciências experimentais: o saber que Comte reivindica para interpretar o significado do saber positivo não está, ele mesmo, subsumido sob as condições do espírito positivo. (HABERMAS, 1987, p. 92).

9 Medeiros (2008, p. 84) afirma que “o empirismo, por sua vez, foi a orientação filosófica

que reiterou a supremacia da experiência” sensível das coisas e procurou ligar, persistentemente, o saber à experiência vivida”.

10 “O pragmatismo de Peirce de 1871-1878 significa uma concepção de realidade que

(16)

saber arquivístico a um modelo da funcional de um agir instrumental e que

perpassou todo o século XIX até chegar a nossa contemporaneidade.

A rigor, Habermas (1987) propôs pensar a primazia de uma cientificidade

social crítica (interpretativa) contra a hegemonia positivista que adentrou no universo

de diferentes áreas do saber em variados contextos geográficos. Esse positivismo impregnou-se de uma forma específica e intencional na produção do saber da arquivística durante duradouros tempos. Nesse sentido, essas correntes deixaram escombros no campo do saber arquivístico, ou seja, a não reflexão epistemológica e

a não teorização interpretativa, levando a procedimentos operatórios do saber-fazer

pragmático em seus fundamentos e princípios, ocorrendo uma ação da

racionalidade instrumental que não visa a uma experiência de atividade reflexiva ou emancipatória, “nesse sentido a experiência da reflexão recorda os momentos emancipatórios da história da espécie”. (HABERMAS, 1987, p. 40).

De modo semelhante, Habermas (1987) traz a experiência da reflexão, do conhecimento teórico enquanto tal, em que uma fundamentação se consolida em termos transcendentais de subjetividades, característica peculiar do sujeito

categorizado (intersubjetivo) e que se baseia em um círculo de experiência

intrínseca ao indivíduo (realidade cotidiana). Destarte, o autor tece sobre o processo

hermenêutico, na medida em que ele propõe olhar para o interesse emancipatório (autorreflexivo), e que com a modernidade tornou-se um meio de sobreviver sobre as intempéries das forças produtivas, “o interesse emancipatório visa à consumação da reflexão enquanto tal”. (HABERMAS, 2009, p. 144).

11 Para voltar da vida orgânica para a vida social, se examinarmos tal comunidade como

(17)

Por conseguinte, a teoria crítica social emancipatória possibilita um diálogo mais forte sobre si, tornando-se um processo autocompreensivo e reflexivo que são constituídos nas expressões, nas experiências e nos círculos exaustivos dos questionamentos. De todo modo, a Arquivologia deve fundamentar o sentido inverso da “tecnificação” do agir funcional instrumental12 e, através da reflexão, começar a

desenvolver outros significados sobre si.

Por meio desse estudo buscamos olhar dentro de nós mesmos e enxergar as lacunas de nossa formação, no entanto, nosso propósito não é “julgar” o saber arquivístico, pelo contrário, nosso interesse (emancipatório) é compreender e contribuir de fato para o avanço da Arquivologia, o que será estabelecido através dos atos exegéticos que estão circunscritos em rupturas epistemológicas, “o ato de

compreender não se planifica na empatia no outro, mas na reconstrução de uma

objetivação intelectual.” (HABERMAS, 1987, p. 161, grifo nosso). Assim, é preponderante auferir a autofundamentação emancipatória e precisamente mostrar que a Arquivologia pode ultrapassar a vivência empírica da instrumentalização técnica em seus fundamentos e princípios, planificando-se no processo de compreensão autorreflexiva, porque a Arquivologia pode clarificar uma ação epistemológica a partir da percepção conceitual de suas próprias bases metodológicas.

Vale ressaltar que, não almejamos refletir nossa própria condição, ou seja, colocarmo-nos na condição de interlocutor do debate, pois seria muito fácil criticar, “gritar”, o difícil é consolidar no grito a força de um argumento plausível e, assim, colocar-se na condição de interlocutor do debate, sobretudo numa área profissional como a Arquivologia, que permanece em um “ciclo vicioso” de reproduções dos seus próprios conhecimentos, ou seja, das técnicas.

Sendo assim, é pertinente indagarmos: Como entender o caráter epistemológico

da Arquivologia como ciência sob a luz da Ciência da Informação? Podemos então considerar que o sentido da pergunta implica no próprio campo de estudo da

12 Para Habermas (1987, p. 213): A função transcendental da atividade instrumental é

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Arquivologia, através da provocação e da vigilância epistemológica que poderá

fortalecer suas entrelinhas conceituais, pois tomamos comohipótese que: Em

Arquivologia, a lógica do agir instrumental obstrui o caráter do campo como ciência quando, na verdade, desdobra-se mais como técnica na dimensão de seus princípios e fundamentos mais característicos, ou seja, “a teoria que se refere à essência imutável das coisas para lá do âmbito mutável dos negócios humanos, só adquire validade na práxis por marcar a atitude vital dos homens que dela se ocupam”. (HABERMAS, 2009, p. 98).

Sendo assim, esses sinais e emblemas aguçaram nosso olhar no sentido de compreendermos o caráter epistemológico da Arquivologia no universo de sua pretensa cientificidade com a contribuição da Ciência da Informação. Especificamente objetiva-se:

a) Discutir os “chamados paradigmas” da Arquivologia enquanto ciência; b) Verificar o processo evolutivo da disciplina com suas características gerais;

c) Averiguar as mediações relativas aos aspectos contingentes do processo pelo qual se empreende a atividade científica enquanto tal.

Desse modo, na contemporaneidade, não é difícil arriscarmos perceber que determinadas ciências se constituíram através de técnicas que servem justamente para “dominação”, nesse sentido, compreendemos que nem toda ciência liberta, nem toda ciência consegue emancipar o sujeito a qual ela forma. Logo, corremos o risco em nome da ciência possibilitar muito mais “coerção” do que “liberdade”, “retrocesso” do que “progresso”, corremos o risco de reiterarmos a “violência” e a “morte” do que a vida.

Inconscientes do que é e faz a ciência na sociedade, os cientistas são incapazes de controlar os poderes escravizadores ou destrutores gerados pelo saber [...] o conhecimento escapa-lhes e constitui uma potência que se torna estranha e ameaçadora. (MORIN, 1999, p. 23).

Por isso, o papel da interpretação e compreensão do fenômeno é justamente possibilitar uma dialética crítica auxiliada aprioristicamente em um olhar denso do que se pretende estudar, ou seja, suas diretrizes e direcionamentos.

(19)

informativo e os não informativos; trata-se, antes bem, de compreender a inextrincável relação da informação e da desinformação como dimensões do mundo de partilhar com outros a abertura de um mundo. Dês-informação e informação seriam, assim, abreviações das experiências de mentir, iludir, distorcer, errar, ocultar, fazer propaganda, ou – de outro modo – de buscar a comunicação pública, a orientação à verdade, qual a abordagem adequada para tratar problema ou assunto; de escutar o ponto de vista dos outros, de argumentar, de cultivar o pensamento crítico. (GONZALEZ DE GOMEZ, 2011, p. 36-37, grifo nosso)

Dessa forma, a pesquisa buscou cultivar o pensamento crítico, fazendo uma tessitura construtiva e contributiva que poderá provavelmente remodelar e arranjar a maneira de se pensar a Arquivologia. Nesse sentido, entendemos que o campo arquivístico ainda esbarra em configurações conflituosas, principalmente relacionadas às terminologias, revelando na maioria das vezes em inconsistências conceituais. Esse antagonismo pode ser identificado na nomenclatura do campo

como Arquivologia13, Arquivística e Arquivonomia. Salientamos ser de fundamental

importância para Arquivologia discutir suas peculiaridades em função do avanço da área, que nos últimos tempos cresce consideravelmente em todo o país.

Similarmente, não menos complexo, uma ala muito consistente da Arquivologia ainda tenta associá-la à pós-modernidade, no entanto, a pós-modernidade se constituiu muito mais naquilo que ela não é, ou naquilo que a modernidade não conseguiu ser.

O outro momento se caracteriza por uma mudança de paradigma e vai, desde a década de 1980 até os dias atuais, sendo identificado, pelos teóricos da área, de maneiras diferentes. Nesse período, novas mudanças acontecem devido aos intensos debates teórico-práticos

promovidos no seio da Arquivística, provocados pelo surgimento das tecnologias de informação e comunicação e da influência das ideias pós-modernas no desenvolvimento das ciências. (SANTANA; MENA MUGICA, 2009 apud CALDERON, 2011, p. 54, grifo nosso).

13 No Brasil, autores como Castro, Castro e Gasparian (1988), Rondinelli (2002), Smit

(20)

Essa nuance paradigmática da Arquivologia surge a reboque da transformação tecnológica que assolou a humanidade no final do século XX e início do século XXI,

porém, é necessário compreender que interligar a Arquivologia ao rol da

pós-modernidade pode ser algo emblemático e perigoso, além de não garantir o status

científico.

Desse modo, não podemos negar que a inserção da Arquivologia nos

programas de pós-graduações em Ciência da Informação14 trouxe para área uma

enorme contribuição, “a associação com a Ciência da Informação parece ser uma característica da evolução da área arquivística”. (FONSECA, 2005, p.101).

Sendo assim, a Ciência da Informação e a Arquivologia irão estabelecer relações de natureza aproximativas, não no sentido de “dependência” uma com a outra, mas, no aspecto informativo e social, “é a informação registrada e, diferentemente de outro tipo de informação, é mantida como estoques informacionais em razão de sua utilidade ou missão e que passa a ter uma existência institucional e, portanto, social”. (SMIT; BARRETO, 2002, p. 21). Logo, a Ciência da Informação tem essa potencialidade aproximativa, de dialogar com outros campos do conhecimento, de fomentar dentro desses campos meios que possibilitem uma reestruturação conceitual e metodológica em seu interior:

A Ciência da Informação é um campo dedicado às questões científicas e à prática profissional voltadas para os problemas da efetiva comunicação do conhecimento e de seus registros entre seres humanos, no contexto social, institucional ou individual do uso e das necessidades de informação. No tratamento destas questões são consideradas de particular interesse as vantagens de modernas tecnologias informacionais. (SARACEVIC, 1996, p. 47).

14 Para González de Gomes (2000): A ciência da Informação surge, no horizonte de

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A Ciência da Informação desempenha uma característica extraordinária nas questões que envolvem os fluxos e os processos informacionais. Na concepção teórico-metodológica, a Ciência da Informação oferece e orienta uma análise e um compromisso que permeia diversas áreas da produção do saber e uma delas é a da

Arquivologia com a vertente informação15. Logo, entre ambas existe um nicho

relacional que é auferido por esse canal informacional.

A Arquivologia trouxe para a Ciência da Informação não apenas um rico acúmulo de técnicas, conceitos e visões sobre os documentos arquivísticos, mas também ideias sobre a organicidade e o ciclo de vida dos documentos, sobre patrimônio e memória, sobre a historicidade dos registros do conhecimento humano para todas as disciplinas científicas pertencentes ao campo das ciências humanas e sociais afinal, a historicidade é uma marca distintiva de todos os fenômenos humanos, portanto, dimensão incontornável de todas as ciências sociais e não apenas da História. (ARAÚJO, 2011, p. 10).

Com efeito, notamos a congruência entre a Ciência da Informação e a Arquivologia através do viés informacional, assim, a Ciência da Informação atua de forma umbilical na produção do saber de áreas que trabalham com a organização, o acesso e o uso da informação. Logo, para uma melhor compreensão das discussões configuradas nesta pesquisa, a organização estrutural do texto se apresenta da seguinte forma:

A parte introdutória contextualiza aspectos conceituais, as trilhas teóricas necessárias para o desenvolvimento do texto e faz uma delimitação dos aspectos de pesquisa, como problemáticas, objetivo geral e objetivos específicos, justificativa. E delineia o nicho relacional da Ciência da Informação com a Arquivologia.

15 Acredita-se que o conceito de informação de Buckland (1991), que vem sendo

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No “spie16” metodológico, discorremos sobre os sinais que fundamentam esse

estudo e nele abordamos a investigação teórica, qualitativa e bibliográfica, por meio de uma relação entre o método indiciário e a hermenêutica. No nosso entendimento essa escolha configura como a base adequada para uma investigação minuciosa da pesquisa, pois analisamos a dicotomia entre ciência e técnica na Arquivologia sob o prisma epistemológico.

Em “A intelecção paradigmática na Arquivologia: um diálogo entre o clássico e o contemporâneo”, abordamos epistemologicamente os princípios arquivísticos dentro de um contexto de relevância, apontando a evolução histórica dos arquivos e da Arquivologia, de modo a fundamentar o pertencimento dessa pesquisa no campo da Ciência da Informação e na Linha de Pesquisa “Memória, Organização, Acesso e Uso da Informação.

“Ciência como razão legitimadora: da revolução das luzes à crise de paradigmas na modernidade”, discute a contextualização histórica que caracterizou a evolução do significado do termo “ciência” para diversas áreas do conhecimento, e principalmente no cenário da Arquivologia.

“Conhecimento e interesse: o lugar das Ciências Sociais Aplicadas, discorre sobre as consequências da razão instrumental na Arquivologia, sobretudo os efeitos da técnica como ideologia que influenciaram profundamente a Arquivologia no seu processo de historicização.

O capitulo 6 trata de compreender os estilhaços da “ciência arquivística” aonde tecemos algumas considerações sobre a dicotomia ciência e técnica na Arquivologia.

16 Para Espada (2006, p. 333) “Spie é antes de mais nada a tentativa de propor uma

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2 “SPIE” METODOLÓGICO

Pesquiso para constatar, constatando, intervenho, intervindo educo e me educo. Pesquiso para conhecer o que ainda não conheço e comunicar ou anunciar a novidade. (FREIRE, 2008, p. 29).

A epígrafe introdutória deste capitulo anuncia a excepcionalidade da pesquisa e suas constatações mais significativas na produção do conhecimento. Sendo assim, adentrar no universo metodológico é compreender os caminhos da construção do saber científico, é pensar em suas múltiplas variáveis, questionando, problematizando e apontando soluções a determinados “projetos” (pesquisas). Desta feita, “cada abordagem tem seus pontos fortes e fracos, e cada uma é particularmente adequada para um determinado contexto”. (BELL, 2008, p. 15).

Nesse sentido, a pesquisa indiciária social/qualitativa tem essa funcionalidade

inclusiva, de esmiuçar as pistas, de imaginar os variados substratos sociais e culturais, dos quais a estrutura da pesquisa parte das concepções e abordagens teórico-metodológicas de entender as conjecturas dos fenômenos a serem estudados. Nesse sentido, “o movimento de investigação qualitativa baseia-se em uma profunda preocupação com a compreensão do que os outros seres humanos estão fazendo ou dizendo” (DENZIN; LINCOLN, 2006, p. 205). Para Habermas (1987), a pesquisa social qualitativa é emancipatória e autorreflexiva em um estofo transcendental de compreensão:

As discussões metodológicas em sentido mais restrito sobre a construção lógica de teorias e sobre a relação de teorias com a experiência foram ultrapassadas por investigações (epistemológicas) acerca da construção lógico-transcendental do mundo de sujeitos possíveis e acerca das condições da intersubjetividade da compreensão. (HABERMAS, 2009, p. 144).

A rigor, esse fenômeno requer do pesquisador um “sacerdócio” imprescritível,

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essencial para entendermos o universo da pesquisa, por meio dele nos aproximamos da problemática desenvolvida, essa que é proposta na dicotomia

sujeito/objeto, assim, a partir do método adequaremos à realidade a ser investigada e não aos interesses individuais de quem investiga.

Dentre os perfis teóricos de investigação da pesquisa qualitativa utilizamos o método indiciário e a abordagem (hermenêutica) como base interpretativa dessa pesquisa, onde essa ação reflexiva se tornou fundamental para contextualizarmos os sinais do fenômeno com um olhar compreensivo e crítico. A hermenêutica busca equacionar o sentido condescendente e elucidativo dos fenômenos através das interpretações e provocações existentes em determinados contextos, “o que chamamos de hermenêutica é assim uma forma de experiência e, ao mesmo tempo,

uma forma de análise gramatical”. (HABERMAS, 1987, p.173). Assim, Habermas

(1987) se volta não para as práxis metodológicas do estado positivo, mas para o método hermenêutico e interpretativo das ciências do espírito, ou seja, das ciências

humanas (Geisteswissenschaften).

A compreensão hermenêutica não pode penetrar sem preconceitos na coisa, mas é incontornavelmente marcada de antemão pelo contexto, no qual o sujeito compreensivo adquiriu de início os seus esquemas interpretativos. (HABERMAS, 2009, p. 299).

De fato, o “ilustrar hermenêutico” vem contribuir para a observação do fenômeno a ser estudado, uma vez que abarcamos compreender o possível universo científico da Arquivologia, as genealogias especulativas que sustentam e afirmam uma “autonomia” científica na literatura arquivística, tornando fundamental uma averiguação densa dessa realidade, “a autonomia é a única ideia de que somos senhores, no sentido da tradição filosófica” (HABERMAS, 2009, p.144).

Segundo Habermas (2009), a reflexão sobre aquilo que faz a hermenêutica precisa clarificar previamente o que precisa ser pensado efetivamente sobre o processo de constituição, no qual algo espiritual se objetiva, e o quão complementar é o ato da autofundamentação.

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ser explicitado, tem o status de um fato, de algo empiricamente encontrado de antemão. (HABERMAS, 2009, p. 142).

Com isso, o estudo do método científico traz essa característica intrínseca da compreensão, do que pode e o que não deve ser investigado. A metodologia tem esse escopo produtivo e elucidativo de buscar entender as vertentes mensuráveis que são construídas no campo científico, “o método da pesquisa tem-se revelado, de fato, como sendo o de maior sucesso” (HABERMAS, 1987, p.135).

Genericamente, a pesquisa qualitativa começa a ser construída a partir da necessidade de entender a conjuntura da prática do cotidiano, que em inúmeras vezes é produzida para compreender a significação do “outro”, e isso, se dará através da crítica interpretativa em um contíguo de práxis, “a hermenêutica equivale

à maneira científica do agir interpretativo do cotidiano” (HABERMAS, 1987, p. 185).

Nesse viés, o questionamento hermenêutico reivindica uma habilidade no sentido exegético e intencional oriundo das práticas do cotidiano, das relações, interpretações e vivências da experiência pessoal.

O andamento simultaneamente tortuoso, caprichoso e severo do ensaio pode parecer incompatível com o rigor de um test, mas talvez essa mesma flexibilidade tenha êxito em captar configurações que tendem a escapar às malhas das disciplinas institucionais. (GINZBURG, 2004, p.13).

De modo semelhante, o pesquisador indiciário reconstitui e costura os estilhaços que são deixados dentro das incertezas investigativas dos fenômenos. Assim, o indiciário faz uma imersão na elaboração de sinais multifacetados e pseudoparadigmáticos, tudo isso para entender o fenômeno em questão que é alinhavado e sobreposto em diferentes narrativas que são concebidas através do olhar divinatório a partir de uma relação de força daquilo que se pretende analisar. Desse modo, “autorreflexivo” com relação a seu próprio papel e aos dos outros pesquisadores em geral no processo de criação do conhecimento e da realidade (KINCHELOE; BERRY, 2007, p.22).

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O progresso do conhecimento na dimensão das ciências, bem como o da crítica, funda a esperança de que seja possível adquirir, pelo trabalho científico, um saber sobre a realidade do mundo através do qual possamos aumentar nosso poder e em vista do qual possamos organizar nossa vida. (HABERMAS, 1987, p. 297).

Em meio a isso, os emblemas e sinais proporcionaram uma análise crítica das especificidades que são elaboradas na relação humana do “eu” com os fenômenos (projetos). O pesquisador com seus indícios incorpora uma multiplicidade consciente de enxergar as diversas possibilidades das variáveis pesquisadas, ou seja, na

pesquisa buscamos entrelaçar o sentido “caçador17” do pesquisador indiciário, com o

poder de interpretação da hermenêutica crítica:

Os acontecimentos anômalos e imprevistos, as variáveis ou fatores estranhos são sempre bem vindos, já que o objetivo prioritário dessa estratégia não é construir teorias consistentes e organizar sua comparação, mas mergulhar na complexidade do mundo real do caso concreto que queremos estudar, bem como refletir sobre as observações, os registros, as informações e as perspectivas dos envolvidos [...] Tais fatos emergentes são ocasiões "de ouro" para compreender o funcionamento da realidade, já que alteram a rotina e põem a descoberto conflitos, interesses, necessidades e comportamentos, habitualmente ocultos e

soterrados. (PÉREZ GÓMEZ, 1998, p. 160, grifo nosso).

Essa “evidência” (crítica e interpretativa) é um efeito que sobrevém somente

após o estabelecimento daquilo que apontamos como uma sintonia indiciária

metodológica, em que o pesquisador indiciário se torna um “detetive metodológico”, que através das várias maneiras de investigar acaba adotando o aspecto “intrínseco da subjetividade” e da alteridade ontológica e dialógica, pois a consistência do método indiciário incide em ecoar uma ação de investigação pautada nas pistas, nas sintonias e indícios entre o observador e o objeto a ser analisado, nesse caso, captamos os aspectos e as pistas que apontam a existência de uma “ciência arquivística”.

17 “O caçador teria sido o primeiro a ‘narrar uma história’ porque era o único capaz de ler,

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Quando examinamos minuciosamente o método indiciário, percebemos que configura uma metodologia significativa e contributiva, porque o indiciário detém uma flexibilidade extraordinária na construção do seu modo de traçar as pistas no processo da pesquisa. Nesse sentido, consideramos esse pesquisador, resguardadas as devidas proporções, como uma “ave de rapina” que voa em diferentes ambientes e múltiplos contextos, porém, na maioria das vezes, ele sempre buscará o caminho mais adequado para responder às suas necessidades mais emblemáticas, ou seja, o pesquisador indiciário é um “revelador metodológico” que faz um emaranhamento conceitual para contrapor suas inquietações; quer dizer, ele adentra de fato nas suas convicções, em sua subjetividade, modelando e explicitando profundamente uma invocação investigativa a partir de dados que foram negligenciáveis no processo da pesquisa:

Mas, o mesmo paradigma indiciário pode ser usado para elaborar formas de controle num instrumento para dissolver as névoas da ideologia que, cada vez mais, obescurecem uma estrutura social como a do capitalismo maduro. Se as pretensões de conhecimento sistemático mostram-se cada vez mais como veleidades, nem por isso a ideia de totalidade deve ser abandonada. Pelo contrário: a existência de uma profunda conexão que explica os fenômenos superficiais é reforçada no próprio momento em que se afirma que um conhecimento direto de tal conexão não é possível. Se a realidade é opaca existem zonas privilegiadas – sinais, indícios

que permitem decifrá-la. (GINZBURG, 1989, p.177, grifo nosso).

Ginzburg (1989) enfatiza a circunstacialidade e imprevisibilidade dessa metodologia, tornando-se indispensável uma improvisação no ato de pesquisar o fenômeno, na medida em que os rastros poderão ser encontrados a partir de uma ação subjetiva, pois o pesquisador indiciário interroga o sentido das coisas, dos problemas e das evidências mais abstratas. Para Ginzburg (1989), a percepção dos indícios podem se tornar mais reveladores para se chegar a resultados satisfatórios em um processo de intuição ou faro:

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Habermas (2009) entende que o quadro metodológico da pesquisa e do fenômeno com a função aplicativa dos resultados da pesquisa só poderá ser explicado, se conseguir tornar conscientes os interesses investidos, que são diretrizes para o próprio saber e que estão presentes nas abordagens metodológicas.

De todo modo, o método indiciário se comporta também como complexo, pois exigirá do pesquisador um olhar condescendente do objeto, logo, desconstruindo as cosmovisões reducionista e objetivista do universo científico que criticam a utilização dessa metodologia. Notamos, então, que, “os dados, vistos de outra perspectiva ou questionados a partir de alguém com formação distinta podem evocar interpretações diferentes”. (KINCHELOE; BERRY, 2007, p. 21).

Kicheloe e Berry (2007) apontam o desafio da metodologia, visto que o pesquisador indiciário procurará responder as suas perguntas e até mesmo suas incertezas, sobretudo para uma melhor compreensão interpretativa do fenômeno. Sendo assim, esse pesquisador por ter essa característica peculiar e que está relacionada a uma ação “volátil” traz, para o universo de sua pesquisa, mecanismos que possibilitarão sua efetivação enquanto projeto.

Às vezes, um dado singular não tem aparentemente uma explicação para sua ocorrência; é idiossincrático, diferente e, muitas vezes, estranho. O trabalho do analista será o de justificar sua ocorrência, buscando compreender os fenômenos que estão por

trás dele. Para isso, é importante que [...] a maneira como

determinado dado possa ter aparecido seja objeto de reflexão para o analista. (DUARTE, 1998, p. 62, grifo nosso).

Ainda nesse estudo, lançamos mão além dos indícios, mitos e emblemas, da abordagem compreensiva, como a hermenêutica crítica para compreendermos os indícios da possível cientificidade na Arquivologia, sendo preponderante a

compreensão da influência das ciências empírico-analíticas18, ou seja, aquela do

18 As ciências empírico-analíticas exploram a realidade na medida em que esta se

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agir funcional instrumental (técnica), e as histórico-hermenêuticas para averiguar a complexidade histórica do ato interpretativo, porque a partir dessa análise construímos um arcabouço mais sólido de concordância ou não com essa afirmação de uma cientificidade na Arquivologia:

Devemos usar os métodos que melhor possibilitam responder a nossas perguntas sobre um determinado fenômeno [...] Essa subversão aceita o fato de que a experiência humana é marcada por incertezas e que nem sempre a ordem é estabelecida com facilidade. (KINCHELOE; BERRY, 2007, p. 18).

De acordo com essa representação, o método indiciário tem a possibilidade de fazer uma interpretação daquilo que buscamos, pois ao analisarmos os dados pretendemos mostrar as perspectivas distintas que são inerentes ao estudo, sobretudo com as variações da abordagem compreensiva (hermenêutica), “a busca pela compreensão é um aspecto fundamental da existência humana, pois o encontro com o não familiar sempre exige a tentativa de fazer sentido, de compreender” (DENZIN; LINCOLN, 2006, p. 287).

Nessas conjunturas interpretativas os fenômenos são analisados de maneira que direcionem uma maior compreensão dos processos, das características e peculiaridades marcantes da realidade a ser analisada. Com isso, o pesquisador qualitativo que adentra no universo da hermenêutica e em sua multiplicidade, constrói uma ponte com o contexto histórico daquilo que é investigado, ou seja, uma tarefa interpretativa do circulo investigativo. Esse círculo hermenêutico cumpre-se por objetos teóricos mediante um apelo analítico e exaustivo do problema a ser analisado, “a hermenêutica concebe a mediação daquilo que o intérprete traz consigo com aquilo de que ele se apropria como um desenvolvimento contínuo daquela tradição cuja apropriação está em questão para o intérprete.” (HABERMAS, 2009, p. 237).

(30)

hermenêutico, a qual utilizamos para identificar os traços e sinais da possível autonomia científica da Arquivologia.

Dentro dessa perspectiva, Habermas (1987) aponta que o interesse interpretativo está ligado aos seres humanos em todo seu processo cíclico que ganha forma na subjetividade ancorada na racionalidade, ou seja, a hermenêutica se

refere a uma competência (“Vermögen”) através das experiências em um canal

linguístico comunicável na prática relacional do cotidiano.

Notamos, então, que para esse autor a pesquisa é a forma de reflexão em um processo de aprendizagem mensurável, “nos processos de aprendizagem, se adapta às suas condições externas de vida; que se exercita, mediante processos formativos, no nexo de comunicação de um modo social da vida” (HABERMAS, 2009, p. 143). Desse modo, os sinais do processo investigativo são compreendidos na ação indiciária que visa a pressupostos em uma realidade teórica que se constitui na autoconservação:

• Ele isola o processo de aprendizagem do processo vital, é por isso que o exercício operatório fica reduzido aos controles seletivos, próprios àquela atividade que se orienta no sucesso.

• Ele garante a precisão e a confiança intersubjetiva, é por isso que a atividade assume a forma abstrata do experimento, mediatizada que está por operações mensuráveis.

• Ele sistematiza a progressão do conhecimento; é por isso que se torna possível integrar não poucas hipóteses universais em conjuntos teóricos relativamente simples. Estes possuem a forma de sistemas enunciativos com caráter hipotético-dedutivo. (HABERMAS, 1987, p.140).

Segundo Habermas (1987) o sujeito em pesquisa se constitui na base de uma intersubjetividade que extrapola o conjunto transcendental da atividade instrumental, quer dizer, o sujeito da pesquisa deve mostrar um assaz autocompreensivo, contextualizado, articulado e transposto em uma teoria exegética, porque a partir dessa ação indiciária, buscamos uma relação de força, entre o sujeito e o objeto a ser investigado.

(31)

Desse modo, os indícios são atos reflexivos onde o sujeito falante perceberá suas “liberdades ou dependências” e suas conexões com o contexto da relação autocompreensiva, visto que aprenderemos a “dominar” nossas próprias pressuposições inconscientes ou elaboradas de investigador, ou seja, uma reflexão sobre o contexto historicizado e que será assegurada ou interpretada pela hermenêutica, “mas somente através de uma reflexão sobre o contexto histórico que desde sempre vincula o sujeito que conhece seu objeto” (HABERMAS, 1987, p. 35).

De igual modo o desenhar hermenêutico vem assumir uma reflexão interpretativa que será desenvolvida pela ação do cientista, este filtrará o contexto histórico, que por sua vez, consistirá no ponto de partida do que venha a ser investigado. Dessa maneira, a hermenêutica proposta por Habermas (1987) se constitui em um eixo fundamental na universalidade pretensiosa entre o método e coisa a ser investigada, ou seja, seus sinais mais complexos.

Com outras palavras, Denzin (2006) aborda que a hermenêutica central de muitos trabalhos qualitativo-críticos envolve as interações entre pesquisa, sujeito(s) e essas estruturas sócio-históricas que têm a função de situar. Nessa conjuntura histórica, Habermas (1987) tenta construir uma verdade crítica e que revela os limiares autocompreensivos que são revelados para a linguagem do mundo vivido e da vida social. Sendo assim, ele elenca algumas posições criteriosas do fazer hermenêutico, a saber:

1º A hermenêutica é capaz de descrever as estruturas da reconstituição da comunicação perturbada.

2º A hermenêutica, e nisso seu juízo coincide com o de Gadamer, está necessariamente referida à práxis.

3º A hermenêutica destrói a autossuficiência objetivista das ciências do espírito assim como vêm tradicionalmente apresentadas. 4º A hermenêutica tem importância para as ciências sociais, na

medida em que mostra que seu domínio objetivo está preestruturado pela tradição e que elas mesmas, bem como o sujeito que compreende, têm seu lugar histórico determinado. (HABERMAS, 1987, 107-108).

(32)

Arquivologia”. De todo o modo, os indiciários percebem a centralidade sócio-histórica que envolve o fenômeno, na tentativa de elucidar os significados identificados na realidade problemática do campo de estudo.

Habermas (2009) compreende que a hermenêutica é feita para clarificar uma possível autorreflexão da ação dos grupos sociais que partem das tradições, assim, ela não pode mais estar posicionada absolutamente nas tradições culturais enquanto tal.

Logo, esse “Spie” metodológico teve como provocação: examinar os indícios,

as pistas e as sintonias dessas características que são atribuídas ao universo da Arquivologia, porque suspeitamos ser problemática a existência de fato de uma “ciência arquivística”. Apreciando esses efeitos, a hermenêutica (interpretação) e o método indiciário nos ofereceram uma vertente investigativa ao pensarmos no fenômeno e, assim, assumirmos uma postura em relação ao que se propõe investigar, “a hermenêutica crítica cita o mundo como parte de um esforço mais amplo de avaliá-lo e de melhorá-lo” (DENZIN; LINCOLN, 2006, p. 292).

Destarte, essa flexibilidade da hermenêutica permitiu um diálogo com o método indiciário que emprega múltiplas estratégias de concepção e investigação dos dados a serem analisados. Sendo assim, a metodologia indiciária exige do pesquisador uma sensibilidade, mas, ao mesmo tempo, pondera uma postura crítica e exegética ao esmiuçar o objeto.

A par disso, ao utilizarmos o método indiciário procuramos ter uma estratégia múltipla de compreensão do fenômeno, ou seja, como exposto anteriormente, esmiuçar e não negligenciar nenhuma pista. Nesse sentido, a pesquisa indiciária tem essa peculiaridade interpretativa que permitiu interrogar a transparência da relação entre ciência e técnica na Arquivologia:

Todas as situações em que a unicidade e o caráter insubstituível dos dados são, aos olhos das pessoas envolvidas, decisivos. Em situações como essas, o rigor flexível do paradigma indiciário mostra-se ineliminável. Nesmostra-se tipo de conhecimento entram em jogo elementos imponderáveis: faro, golpe de vista, intuição. (GINZBURG, 1989, p. 177).

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(34)

3 A INTELECÇÃO PARADIGMÁTICA NA ARQUIVOLOGIA: um diálogo entre o clássico e o contemporâneo

Desde a mais alta antiguidade, o homem demonstrou a necessidade de conservar sua ‘própria memória’, inicialmente sob a forma oral, depois sob a forma de grafitti (sic) e desenho e, enfim, graças a um sistema codificado. A memória assim registrada e conservada constitui ainda a base de toda atividade humana: a existência de um grupo social seria impossível sem o registro da memória, ou seja, sem os arquivos. A vida mesma não existiria – ao menos sob a forma que a nós conhecemos – sem ADN, ou seja, a memória genética registrada em todos os primeiros arquivos. (LODOLINI, 1993, p. 233).

A Arquivologia em seu advento estava atrelada ao surgimento de algo que se tornou inovador e essencial para humanidade, a memória registrada, sendo representada pela própria manifestação do homem através da escrita. A rigor, essa forma de registrar e de se comunicar ao longo dos tempos proporcionou mudanças na Arquivologia e nos arquivos, “a origem dos arquivos dá-se, pois, naturalmente, desde que a escrita começou a estar a serviço da sociedade humana” (SILVA et al., 2009, p. 45).

Silva et al. (2009), entendem que os povos sempre manifestaram interesse

pela comunicação, através da fala e dos signos ancorados em suportes, reunindo e organizando as informações. Toda essa necessidade traz consigo um meio prático

de intervenção. Assim, para Silva et al. (2009, p. 45), “a origem de acervos

documentais radica uma motivação de índole pragmática. Daí que a constituição dos primeiros arquivos tenha obedecido a uma fórmula intuitiva, alheia a qualquer vertente técnica ou conceptual”. Portanto, entendemos que os arquivos estavam totalmente voltados para as instituições que produziam os documentos.

Nesse sentido, entender o clássico na Arquivologia é tramitar nas temporalidades e cronologias da História, procurando e evidenciando as diferentes maneiras de registrar, organizar e inventariar o arquivo.

O rei Hammourabi mandou inventariar o arquivo do palácio e terá levado consigo a correspondência internacional, para depois a usar como instrumento do seu próprio jogo diplomático. Os arquivos não eram concebidos como meros depósitos ou reservas inertes as placas de argila. Eles constituíam já um complexo sistema de

informação. Para além, dos documentos em si, havia uma estrutura

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disponibilização de um serviço, determinado tanto pelo valor informativo das placas, como pela pertinência e rigor da sua integração sistêmica. O papel instrumental dos arquivos e a necessidade do conhecimento da sua estrutura estão bem patentes na atitude de Hammourabi (SILVA, et al., 2009, p.48, grifo nosso).

De igual modo, para Silva et al. (2009), nessa cronologia já existiam modelos

de organização dos documentos e a própria variação documental. Os arquivos na Antiguidade exerciam funções bem determinadas e pragmáticas.

Em suma estamos perante uma estrutura sistêmica, cujo objeto e cuja práxis assentam já em princípios intuitivamente assumidos. Embora de origem pragmática e precisamente por esse motivo, eles virão a tornar-se de aplicação universal, chegando aos nossos dias configurados em normas de organização e arquivos. (SILVA, et al., 2009, p. 52).

Diante disso, a tradição clássica está embrionariamente ligada às unidades administrativas, essas estruturas que atualmente parecem fazer parte do cotidiano da Arquivologia. .Nesse sentido, é essencial visualizar que os documentos na grande maioria tinham seu advento de produção e conservação para atender às necessidades da própria administração. As práticas de organização estavam presentes desde o surgimento das civilizações antigas.

Nos séculos XVII e XVIII, intensificou-se a procura dos arquivos, em função do chamado valor secundário da documentação. O impacto desse movimento vai fazer-se sentir em duas direções, de sentido contrário, no que respeita ao desenvolvimento da realidade arquivística. Por um lado, ele encontra-se em oposição à tendência redutora do conceito estreitamente jurídico e administrativo dos arquivos, pressionando assim a abertura destes a outro tipo de funções. A descoberta da sua múltipla riqueza informativa levará também, nesta época, a um amplo movimento de elaboração de instrumentos de pesquisa. (SILVA, et al., 2009, p. 95).

De modo semelhante, isso nos mostra que a Arquivologia clássica influenciou os princípios e fundamentos, haja vista que a Arquivologia custodial tem grande aproximação com a administração, ou seja, com as instituições.

(36)

proliferação das instituições, a massa de informação e de documentos produzidos sob forma de documentos administrativos e o interesse por outros tipos de arquivo para além dos arquivos governamentais (os arquivos privados, os arquivos econômicos, os arquivos de igrejas, os arquivos sociais) trouxeram uma produção acrescida de informações e uma maior utilização da informação. (ROSSEAU; COUTURE, 1998, p. 42).

Nessas conjunturas, o método custodial de organização de documentos centraliza-se na administração, no documento em si, então, não percebia o teor informacional que aquele documento poderia oferecer, servindo em grande parte para a pesquisa através da ligação com a História. No entanto, é de se pensar o corte epistemológico que a Arquivologia custodial provocou com aquela rotulação de disciplina auxiliar da História.

Desse modo, Silva (2011)19, chama-nos atenção para compreendermos esse

fluido da Arquivologia clássica custodial, e percebemos que ao longo do tempo a custodialidade teve seu grau de importância para a Arquivologia, procurando romper com outras disciplinas. Fonseca (2005, p. 55) também argumenta sobre o objeto da Arquivologia clássica, o qual “era identificado pelo conjunto de documentos produzidos ou recebidos por uma dada administração; era o arquivo custodiado por uma instituição arquivística”. Assim a autora vem reforçar os argumentos que aqui foram discutidos acerca dessa custodialidade.

Já no final do século XX, por meio do avanço tecnológico começou a ser

pensado o que se vinculou nomear de Arquivologia pós-custodial, que propõe uma

nova roupagem nas práticas do saber-fazer da Arquivologia. Segundo Silva (2011),

“o deslocamento de objeto e alteração metodológica configurariam a Arquivologia pós-custodial e pós-moderna nascida no Canadá na década de noventa, final do século XX”. Nessa mesma linha de pensamento, essas mudanças emergentes trouxeram diferentes perspectivas na maneira de pensar sobre Arquivologia a partir da abordagem “pós-moderna” ou “pós-custodial”.

Conforme afirma Cook (1997, p. 15-16):

O pós-moderno desconfia da idéia de verdade absoluta baseada no racionalismo e no método científico. O contexto por trás do texto, as

19 Palestra proferida pelo professor Armando Malheiro no XV Encontro Nacional de

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relações de poder que conformam a herança documental lhe dizem tanto ou mais que o próprio assunto que é o conteúdo do texto. Nada é neutro. Nada é imparcial. Tudo é conformado, apresentado, representado, simbolizado, significado, assinado por aquele que fala, fotografa, escreve ou pelo burocrata governamental, com um propósito definido, dirigido a uma determinada audiência. Os pós-modernistas procuram desnaturalizar o que presumimos natural. Os pós-modernistas toma tais fenômenos naturais, seja o patriarcalismo, o capitalismo, a religião ou, poderia eu acrescentar, a ciência arquivística tradicional, e afirma que são “antinaturais” ou “culturais” ou, no mínimo, “construções sociais” de um tempo, lugar, classe, gênero, raça e etc..

Então, essa mudança de paradigma também mudaria o rumo e intencionalidade da Arquivologia, que na fase custodial seria o documento em si, no

entanto, agora é a informação arquivística. Para Silva et al. (2009, p. 203, grifo

nosso), “os grandes tratados de arquivística incidem, regra geral, em questões de

natureza prática e raramente descem à pesquisa sobre a essência da disciplina e as causas da sua presença no campo das Ciências da Informação”. Assim, a Ciência da Informação tem como característica:

A ciência da Informação vem com o propósito de condensar os

estudos científicos sobre a informação, assim como contribuir

para aprimorar disciplinas como a documentação, a Biblioteconomia, a Arquivologia, a Museologia e a Gestão da Informação em tratos específicos com a informação e os documentos, de acordo com as necessidades científicas, disciplinares, profissionais e cotidianas de cada região, país ou continente. (CARVALHO, 2011, p. 62, grifo nosso).

Silva et al. (2009) são enfáticos ao afirmarem que há uma carência nos moldes

de se pensar o lugar da Arquivologia, e isso decorre, pela natureza

operacionalizadora e prática dos arquivos e pela falta de pesquisa. Segundo Silva et

al. (2009, p. 203, grifo nosso): “isto tem levado alguns autores a duvidar da

possibilidade de se encontrar bases científicas para o saber arquivístico”. É

necessário que apareçam a pesquisa e as próprias problematizações acerca do universo metodológico da Arquivologia.

Imagem

Figura 1: A dual visão do sentido “paradigma” na ciência
Figura 2: O esboço científico da divisão da ciência
Figura 3: Rationalizierung (racionalização) do agir funcional instrumental na Arquivologia
Figura 4: A concepção do ciclo prático-vital na Arquivologia
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Referências

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