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A GUERRA MEDIEVAL: ESTAGNAÇÃO OU DESENVOLVIMENTO MILITAR?

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Academic year: 2021

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A GUERRA MEDIEVAL: ESTAGNAÇÃO OU

DESENVOLVIMENTO MILITAR?

MORETTI JUNIOR, Augusto João (PIBIC/FA/UEM) REIS, Jaime Estevão dos (DHI/PPH/UEM)

Introdução

No século XIX estrategistas militares1 que estudaram a guerra medieval, afirmaram que as atividades bélicas da Idade Média não apresentaram um desenvolvimento técnico, se compradas as da Antiguidade e do período Moderno. Entretanto, autores mais contemporâneos têm publicado uma série de trabalhos que contestam as afirmações daqueles historiadores, mostrando um desenvolvimento da arte militar no período medieval. Autores como J. F. Verbruggen, García Fitz, Matthew Bennett e Martin Dougherty, explicam que os “senhores da guerra” no medievo se esforçaram - assim como os de outros períodos históricos - para se adaptar às condições de guerra que lhes eram apresentadas e criar táticas militares necessárias a cada conflito armado.

Neste sentido, buscamos nesse texto fazer uma discussão historiográfica acerca da atuação dos homens da Idade Média e seu racionalismo diante dos conflitos bélicos, mostrando, por meio do diálogo com os autores que representam uma nova interpretação analítica da guerra na Idade Média, os avanços, as técnicas e as estratégias militares empregados durante a Idade Média, conforme o nível de desenvolvimento da sociedade deste período histórico. Além do apoio historiográfico, utilizaremos como fonte para nossa discussão, a Regra da Ordem Militar dos Cavaleiros Templários, uma vez que esta fornece informações importantes sobre as condições da guerra no período medieval.

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No ano de 1954, J. F. Verbruggen lançou um livro que apresenta um levantamento bibliográfico explicando a ideia desses autores do século XIX, como Sir Charles Oman, Hans Delbrück, Wilhelm Erben, Eugen von Frauenholz and Ferdinand Lot. VERBRUGGEN, J. F. The Art of Warfare in Western

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A Guerra Medieval

Para Francisco García Fitz, os homens medievais também apreciavam os valores militares da obediência, disciplina, respeito à hierarquia de comando, bem como tinham uma clara noção de aspectos como organização logística, garantia de abastecimento, avaliação das forças e posições, defesa de pontos fortes, recrutamento, sistema de financiamento bélico, e, por fim, detinham informações sobre a situação do adversário.

Deste modo, consciente desses valores e conhecedores das características militares, os homens da Idade Média - dentro das limitações de seus recursos econômicos, institucionais e tecnológicos – definiram as características básicas da guerra medieval: a supremacia do defensivo frente ao ofensivo e o predomínio da guerra do desgaste (GARCÍA FITZ, 1998, p. 44-45).

J. F. Verbruggen complementa, explicando que a guerra medieval podia ocorrer de duas formas: a primeira seria destruir o inimigo deixando-o politicamente desamparado e militarmente impotente. A segunda forma seria a ocupação de castelos, cidades ou regiões que o conquistador poderia anexar as suas terras, ou utilizá-la como barganha nas negociações de paz (VERBRUGGEN, 1998, p. 276).

Como os recursos econômicos eram escassos, tornava-se inviável uma campanha de longa duração e de grande alcance. Táticas de guerra na Idade Média, como a destruição dos campos, pilhagem, roubo, incêndio e o cativeiro, foram praticadas em curtas distâncias de acordo com as condições e a logística da época. O que se pensou ser essa uma simples devastação, era, na verdade, uma estratégia da guerra medieval. Para García Fitz, as incursões devastadoras tinham como principio estratégico algo bem definido: destruir para debilitar, acabar com as bases materiais, visando o empobrecimento e o enfraquecimento das políticas econômicas e morais de seus inimigos antes de enfrentá-los diretamente (GARCÍA FITZ, 1998, p. 46).

Para Martin Dougherty, a guerra no período medieval só obteria esse efeito político e econômico, se possibilitasse a conquista de castelos e cidades. Primeiramente, porque um castelo bem protegido era símbolo de poder para aquele que o possuísse, e, além disso, poderia servir como centro de operações de um exército. Se em meio a uma campanha, um exército evitasse tomar algum castelo, a guarda dessa fortaleza poderia

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nas tropas adversárias. Por isso, muitas operações tinham como objetivo tomar um ponto forte defendido por castelos ou qualquer outra fortaleza mesmo que isso estivesse fora dos planos iniciais. Isto se devia à necessidade de liberar o caminho para futuras campanhas militares. Já no aspecto político, um rei ou senhor que não fosse capaz de proteger sua fortaleza era mal visto entre os seus pares, o que dificultava a formação de alianças (DOUGHERTY, 2010, p. 6).

Todos os que quisessem aumentar seus territórios ou se defender deveriam manter os chamados pontos fortes, o invasor que tomasse uma fortaleza só poderia ser derrotado quando retomado o controle do local. Essas fortificações foram o núcleo catalisador das atividades militares, por isso desempenhavam um papel fundamental nas estratégias medievais. Serviam como lugares de defesa e proteção. Devido à eficiência das fortalezas, qualquer operação de ataque frontal exigia grandes sacrifícios, e os meios técnicos utilizados para esses ataques eram facilmente destruídos. Sendo assim, a melhor maneira de tomar uma fortaleza seria pelo desgaste, bloqueando as guarnições e impedindo o abastecimento da fortaleza com os suprimentos e armamentos necessários. Estas medidas geravam um clima de desespero entre os sitiados, o que facilitava o ataque e a tomada da fortaleza. (GARCÍA FITZ, 1998, p. 52-53).

Acerca das fortalezas e pontos fortes J. F. Verbruggen escreveu: “A good fortress was the medieval ruler’s best friend” (VERBRUGGEN, 1998, p. 321). Para o autor, os chamados pontos-fortes, sejam eles, castelos, torres, cidades fortificadas, obtinham um papel fundamental na guerra medieval. Já que o local poderia proteger as pessoas de um eventual ataque, assim como, evitava que seus exércitos realizassem um confronto em campo aberto caso não fosse seu desejo.

As fortificações poderiam proteger os exércitos com um número limitado de homens, até que o período de guerra passasse. Geralmente se iniciava no auge da primavera e terminava com a chegada do inverno. Além do mais, as pessoas que estavam dentro dos pontos fortes, poderiam armazenar alimentos e outros mantimentos e esperar que seus inimigos do lado de fora morressem de fome, sede, já que, tinham que trazer seus mantimentos de longas distâncias. Além do mais, as doenças assolavam os grandes exércitos. Esses e outros fatores os faziam abandonar o cerco (VERBRUGGEN, 1998, p. 327).

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Essas pequenas incursões devastadoras possuíam como princípio estratégico destruir para debilitar, destruir as bases econômicas do inimigo para deixá-lo em uma situação de desequilíbrio, para derrotá-lo sem a necessidade de uma grande campanha ou um enfrentamento militar massivo. Lembrando que essas pequenas incursões possuíam um objetivo a longo prazo: desestruturar o inimigo pouco a pouco, utilizando um pequeno número de soldados, de tempo e nenhuma complicação tecnológica (GARCÍA FITZ, 1998, p. 45-47).

Segundo García Fitz, ao contrário dos cercos as fortalezas, as batalhas campais eram algo excepcional. Verifica-se que entre os anos de 1066 e 1154, ocorreram tão somente sete batalhas campais dignas de nota. A confrontação campal só se dava quando outras formas de ataque haviam se esgotado (GARCÍA FITZ, 1998, p. 63-65).

A afirmação de Fitz pode ser complementada com as ideias de Verbruggen: “Medieval commanders were so cautious in defense that they offered very few pitched battles” (VERBRUGGEN, 1998, p. 328). E explica quando ocorriam: “Apart from the few cases in which a battle was forced during the siege of an important fortress, battles were fought only when both sides wanted to, and thought they had a chance of winning.” (VERBRUGGEN, 1998, p.328-330). Como podiam se defender muitas vezes, em suas fortalezas, como aponta o autor, as batalhas campais se realizavam em casos da necessidade de proteger uma fortaleza, em meio a um cerco, ou em caso de ambos os lados acreditarem na vitória.

Segundo Verbruggen, ainda que fossem poucas as batalhas campais e o confronto direto, a guerra no período medieval foi marcada pelo desenvolvimento da cavalaria pesada. O seu desenvolvimento ganhou força com as invasões bárbaras – as legiões romanas usavam os cavaleiros de forma muito limitada – pois com a chegada dos povos germânicos no século IV aumentou a excelência dos equipamentos e técnicas utilizadas por cavaleiros. A evolução dos armamentos fez com que os cavaleiros dispusessem de mais firmeza na cavalgada e possibilitasse uma carga mais rápida e eficiente. Para o historiador militar, o desenvolvimento de uma cavalaria “blindada” revolucionou a arte da guerra entre os séculos VIII até a metade do IX (VERBRUGGEN, 1998, p.19-20).

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A Regra do Templo e a Guerra Medieval

Quanto à análise da Regra do Templo, o documento apresenta elementos importantes sobre a guerra, lembrando que ela não ocupa uma função de tratado militar completo sobre a arte da guerra, porém, fornece informações únicas sobre o seu período. Segundo Regine Pernoud os retrais, foram escritos entre 1156 a 1169, quando Beltrán de Blanquefort era o mestre da Ordem do Templo, um período em que as atividades dos templários se concentravam em maior parte em campo aberto e que ao mesmo tempo ocorria um maior desenvolvimento dos aparatos militares. Por conseguinte, os artigos pertencentes aos retrais são marcados por característica militares (PERNOUD, s.d., p.130).

O primeiro aspecto que gostaríamos de analisar é a disciplina dos irmãos do Templo, pois acreditamos que a disciplina era um dos “pilares” seja na vida conventual ou em campo de batalha. Autores como Matthew Bennet, Demurger e Verbruggen, abordam a questão da disciplina como fator de sucesso dos cavaleiros templários. Porém não apresentam como a Regra constantemente trás essa “virtude” como obrigação para seus membros.

Ao ler os textos dos estudiosos da Ordem do Templo, podemos ver a importância da obediência dos templários e o respeito à hierarquia de comando. Alain Demurger explica que os templários e os irmãos das ordens religiosas são constantemente descritos pelos cronistas da época, com disponibilidade, disciplina, coesão. Para o autor, as ordens militares, foram fundadas em “valores tradicionais”, do mundo cavalheiresco, e também nos valores coletivos do mundo monástico sendo eles: “a honra, coragem, espírito de sacrifício e senso de dever, mas também a obediência, disciplina e humildade.” (DEMURGER, 2002, p.128).

No artigo de número 39, é descrito como os irmãos deveriam se comportar, e em primeiro plano não aparece nem a castidade nem a pobreza, mas sim o voto de obediência aparece por primeiro:

Para cumprir com seus sagrados deveres e ganhar a glória e a alegria do Senhor e livrar-se do medo do fogo do inferno, é conveniente que todos os irmãos professos obedeçam estritamente a seu mestre. Pois nada é mais querido a Jesus Cristo que a obediência. (REGRA, Art. 39).

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Outro aspecto era o de instruir os combatentes. Como aponta Verbruggen, a arte da guerra medieval deve ser baseada nos cavaleiros, e é exatamente o que o código templário faz. Contudo, devemos lembrar que a Ordem também era formada pelos irmãos sargentos, que ao contrário dos irmãos cavaleiros não descendiam de uma linhagem de cavaleiros nobres. Porém eram homens, que se colocavam a disposição da Ordem, realizando muitas vezes as mesmas funções de um cavaleiro em campo de batalha. Por fim, sem comentar todos os cargos e hierarquias que os irmãos cavaleiros poderiam ocupar, além dos sargentos, se encontrava os Turcoples. A chegada dos ocidentais ao oriente lhes apresentou uma nova forma de guerrear, confrontando uma cavalaria ligeira, que desorganizava e derrubava a cavalaria pesada enquanto se preparava. Desta forma, a Ordem do Templo, começou a recrutar soldados locais, convertidos ao cristianismo, para lutar a “moda oriental”. Eram tropas equipadas com arcos, com uma armadura leve, tornando-a uma cavalaria ligeira, que possuía como objetivo, proteger a cavalaria pesada do ataque dos arqueiros montados turcos, assim como, realizavam a tarefa de exploradores, já que eram homens locais que conheciam muito bem a região. Lembrando que os turcoples ocupavam uma posição intermediária entre os cavaleiros e os sargentos (BENNET, 2001, p. 227-228).

O Código do Templo também apresenta o comportamento militar dos cavaleiros em campanha de guerra que se dividia em três: o acampamento, a marcha e a formação dos esquadrões para a batalha. Para J. F. Verbruggen, a preocupação da Regra em manter a organização e disciplina nesses momentos críticos, ocorria, pois eram esses momentos que poderiam levar um exército a derrota. Assim, o comportamento indicado pela Regra, só pode ter sido resultado de muitos anos de experiência (VERBRUGGEN, 1998, p. 80).

Conclusão

Como afirmar que as estratégias de debilitação não eram uma forma de arte militar? Devido aos escassos recursos econômicos, a utilização dos saques, cercos e tomadas de fortalezas eram fundamentais para atingir os objetivos que os homens do medievo almejavam. A falta de compatibilidade entre o modo como se organizaram as

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Moderno, não faz das estratégias e técnicas medievais algo inferior as daqueles períodos históricos. Expressam as atitudes conforme os recursos bélicos e níveis de conhecimento permitiam. A Regra do Templo é um exemplo claro da preocupação desses homens para com os aspectos bélicos, pois sabiam da importância da arte militar para a manutenção e desenvolvimento da Ordem.

REFERÊNCIAS

Fontes impressas:

UPTON – WARD, J. M. (Ed.). El Código Templário. Barcelona: Martínez Roca, 2001.

Bibliografía:

BENNETT, Matthew. La Régle du Temple en tanto que manual militar o Cómo ejecutar una carga de caballería. In: UPTON-WARD, J. M. (Ed.). El Código Templário. Barcelona: Martínez Roca, 2001.

BENNETT, Matthew et. Al. Técnicas bélicas del mundo medieval (500 a.C – 1500 d.C.): equipamento, técnicas y tácticas de combate. Madrid: Libsa, 2007.

DEMURGER, Alain. Os templários: uma cavalaria cristã na Idade Média. Rio de Janeiro: Difel, 2007.

DOUGHERTY, Martin J. Armas y técnicas bélicas de los Caballeros medievales 1000 – 1500. Madrid: Libsa, 2010.

GARCÍA FITZ, Francisco. La Edad Media: guerra e ideología (justificaciones religiosas y jurídicas). Madrid: Silex, 2003.

GARCÍA FITZ, F. Ejércitos y actividaders guerreras en la Edad Media europea. Madrid: Arco Libros, 1998.

HOOPER N.; BENNETT M. The Cambridge illustrated atlas of warfare : the Middle Ages 768-1487. Cambridge University Press, 1996.

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PERNOUD, Régine. Os templários. Lisboa: Europa-América, s.d.

VERBRUGGEN, J. F. The Art of Warfare in Western Europe During The Middle Ages. Woodbridge, Suffolk: The Boydell Press, 1998.

Referências

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