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Palavras chave: pesquisa ação; alfabetização; aprendizagem; psicopedagogia

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Academic year: 2021

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AS CONTRIBUIÇÕES DA PESQUISA DE INTERVENÇÃO PARA O PROCESSO DE ENSINO E APRENDIZAGEM NA ALFABETIZAÇÃO

Maria Irene Miranda – UFU Este trabalho relata uma pesquisa-ação em desenvolvimento em uma escola pública da rede municipal de ensino da cidade de Uberlândia (MG). A pesquisa envolve professores e alunos bolsistas do curso de pedagogia da Universidade Federal de Uberlândia, profissionais da secretaria municipal de educação (professores, pedagogos, psicopedagogos e psicólogos). As atividades de pesquisa e intervenção são realizadas junto a alunos do ensino fundamental encaminhados com queixa de problemas de aprendizagem na alfabetização. São realizados cursos de formação continuada fundamentados na perspectiva psicopedagógica com objetivo de capacitar os professores dos alunos atendidos. A pesquisa conta com financiamento da FAPEMIG (Fundação de Amparo a Pesquisa de Minas Gerais) e faz parte das ações do GEPPE (Grupo de Estudos e Pesquisa sobre a Psicopedagogia Escolar da Universidade Federal de Uberlândia). Buscando favorecer a qualidade do ensino oferecido nas escolas, por meio de projetos de intervenção psicopedagógica que promovam a aprendizagem, a pesquisa provoca a interlocução entre universidade e escola, assim como o diálogo entre os profissionais de diferentes segmentos. Os resultados parciais da pesquisa revelam que a despeito da cultura do fracasso e da exclusão presente no contexto escolar, a psicopedagogia possibilita um novo olhar para os sujeitos com problemas de aprendizagem na alfabetização, considerando-os em suas potencialidades e não em suas supostas limitações. Os professores alfabetizadores desprovidos dos equivocados parâmetros de normalidade partem da premissa de que todos podem aprender a ler e a escrever. No entanto mudar o foco do processo de quem ensina (professor) para quem aprende (aluno) não é tarefa simples, implica em mudança de paradigma. Esse tem se constituído desafio à pesquisa, pois mudar a perspectiva e a postura docente é um processo gradativo, de avanços e recuos. Ao intervir na realidade a pesquisa- ação contribui para efetivação da escola como espaço social de produção e socialização do conhecimento.

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Este trabalho consiste de uma atividade de pesquisa e extensão em andamento em uma escola pública da rede municipal de ensino da cidade de Uberlândia (MG). A proposta originou-se das discussões e dos trabalhos realizados pelo Grupo de Estudos e Pesquisa sobre a Psicopedagogia Escolar da Universidade Federal de Uberlândia (GEPPE/UFU), cujo desenvolvimento foi viabilizado pela contemplação do projeto junto a FAPEMIG (Fundação de Amparo a Pesquisa de Minas Gerais).

No que se refere à extensão o grupo observou uma demanda social por atendimento psicopedagógico a crianças e adolescentes encaminhados como problemas de aprendizagem, principalmente na alfabetização. Para suprir essa necessidade, discentes bolsistas do Curso de Pedagogia, sob orientação de professores da universidade e profissionais da rede municipal de ensino (pedagogos, psicopedagogos e psicólogos) realizam atendimentos, articulando essa atividade extensionista a projetos de pesquisa. Este trabalho necessariamente provoca a interlocução entre a universidade e as escolas de ensino fundamental, assim como exige uma abordagem interdisciplinar, dada a complexidade do objeto de investigação, qual seja, as dificuldades de aprendizagem na alfabetização.

O projeto de pesquisa e extensão tem como objetivos:

• Favorecer a melhoria da qualidade do ensino oferecido nas escolas, por meio de projetos de intervenção psicopedagógica que visam promover a aprendizagem e o sucesso escolar dos alunos com problemas de aprendizagem na alfabetização; • Possibilitar a realização e socialização de estudos, pesquisas e ações referentes

aos subsídios da Psicopedagogia Escolar para professores e pedagogos, diante dos problemas de aprendizagem no processo de alfabetização;

• Desenvolver Estudos de Caso Psicopedagógico no âmbito da Faculdade de Educação da Universidade Federal de Uberlândia;

• Possibilitar a interlocução entre a universidade e demais instituições de ensino, por meio da pesquisa de intervenção;

• Oferecer curso de formação continuada para professores e pedagogos da escola campo da pesquisa que atuam junto aos alunos com problemas de aprendizagem.

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Nos encontros do GEPPE são discutidas as contribuições que a psicopedagogia pode oferecer a professores e pedagogos no contexto escolar, uma vez que se trata de uma área interdisciplinar que muito favorece os processos de ensino e aprendizagem, pois estuda os aspectos intervenientes e os possíveis desvios decorrentes desses processos. Ao buscar referência em diversas áreas para abordar os fatores determinantes do conhecimento a psicopedagogia possibilita a articulação e o diálogo entre os profissionais de diferentes segmentos.

Os estudos e pesquisas psicopedagógicas buscam elucidar os mecanismos pelos quais o sujeito organiza o pensamento para aprender, partindo do princípio de que aprender é uma capacidade inerente a qualquer pessoa que interage no mundo. Dessa forma, pode-se afirmar que a Psicopedagogia além de interdisciplinar é também interacionista, à medida que considera que o sujeito se constitui a partir da combinatória de fatores internos e externos. Em outras palavras, a Psicopedagogia tem uma visão biopsicossocial do sujeito, cuja aprendizagem resulta de fatores biológicos, psicológicos (cognitivos e emocionais) e sociais (interações estabelecidas em diferentes contextos em dado momento histórico e cultural).

A Psicopedagogia pode oferecer contribuições ao trabalho pedagógico desenvolvido nas instituições escolares, motivo pelo qual existe uma grande demanda na área, tanto pelos alunos do curso de pedagogia quanto de outras áreas que buscam no referencial psicopedagógico respostas para os desafios enfrentados no cotidiano escolar.

No âmbito da sala de aula o professor precisa lidar com a diversidade e a heterogeneidade, características inerentes a qualquer grupo social. A experiência e a literatura revelam que existe uma tendência de padronização do trabalho docente, ou seja, os professores ensinam como se todos os alunos tivessem no mesmo nível de desenvolvimento e, portanto, com as mesmas disposições intelectuais para aprender. Na perspectiva interacionista, níveis distintos de pensamento implicam em necessidades distintas de mediação. Isso significa que quando o professor trabalha da mesma forma com toda a turma propicia a aprendizagem de alguns, enquanto outros ficam as margens do processo, constituindo uma modalidade discente cada vez mais comum nas escolas: alunos com dificuldades ou distúrbios de aprendizagem. Receber esse rótulo pode levar ao fracasso escolar, visto que normalmente as escolas não oferecem uma intervenção no sentido de retirar o aluno dessa situação. Consequentemente as experiências de insucesso vão se acumulando e o aluno é excluído da instituição escolar, o que remete ao processo de exclusão social.

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Mediante essa realidade a Psicopedagogia pode instrumentalizar os educadores – professores, pedagogos – para lidar com essa demanda, oferecendo-lhes alternativas de ação para o processo diagnóstico, cuja análise subsidia a intervenção que tem como objetivo principal promover o desenvolvimento e aprendizagem dos alunos.

Tendo em vista que o GEPPE é composto por psicopedagogos, pedagogos, psicólogos, professores, pesquisadores, estudantes e outros profissionais da área interessados, ou seja, possui uma configuração multidisciplinar, existe a intenção de realizar trabalhos que contribuam, efetivamente, com a pesquisa, com os alunos, com as escolas pesquisadas e com a formação dos envolvidos direta e indiretamente com a proposta.

Isto posto, pode-se considerar que a relevância social, acadêmica e científica desse estudo consiste em: amenizar a evasão e repetência, possibilitando o desenvolvimento de alunos com problema de aprendizagem; desencadear a construção de um projeto de ação coletiva, voltado para as necessidades de alunos e professores, incentivando e orientando a pesquisa no âmbito da instituição. Espera-se, dessa forma, que a pesquisa tenha um impacto transformador da demanda social apresentada ao GEPPE pela comunidade.

Para investigar os problemas de aprendizagem de crianças na fase da alfabetização bem como desenvolver ações de extensão por meio de um projeto de intervenção, sob o viés psicopedagógico, que contribua para o sucesso de educandos e educadores, é preciso ultrapassar os entendimentos imediatos acerca deste fenômeno e buscar explicações a partir da realidade observada. No entanto, parte-se do princípio de que não existem verdades absolutas e nem conhecimentos definitivos: o referencial teórico, a opção metodológica e as condições sociais do fenômeno investigado influenciam e relativizam os resultados obtidos. Dadas as possibilidades de trajetória de pesquisa, optou-se pela pesquisa-ação, com a consciência de que, independente do procedimento metodológico, o conhecimento produzido significa tão somente uma vertente de análise.

A opção pela pesquisa-ação justifica-se por oferecer a possibilidade de contar com meios capazes de responder, com maior eficiência, aos problemas da situação em que vivenciam, estabelecendo diretrizes de ação transformadora. Esse tipo de pesquisa tem caráter qualitativo e visa a produzir uma ação de efeito positivo, a partir de diversas

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formas de ação coletiva, orientadas a favor da resolução de problemas ou de objetivos de transformação, os quais devem ser explicitados pelo investigador.

Segundo André,

Há, assim, um sentido político muito claro nessa concepção de pesquisa: partir de um problema definido pelo grupo, usar instrumentos e técnicas de pesquisa para conhecer esse problema e delinear um plano de ação que traga algum benefício para o grupo. Além disso, há uma preocupação em proporcionar um aprendizado de pesquisa da própria realidade para conhecê-la melhor e pode vir a atuar mais eficazmente sobre ela, transformando-a. (1995, p.33) O planejamento da investigação ocorre de forma flexível, considerando aspectos relacionados aos problemas da pesquisa, que neste estudo são:

• De que forma os professores e pedagogos podem contribuir para diminuir a evasão e repetência do aluno considerado problema de aprendizagem?

• De que maneira o viés psicopedagógico pode contribuir com a ação docente frente aos problemas de aprendizagem?

• Como articular projetos de ação pautados na pesquisa e voltados para as necessidades dos alunos e professores mediante o processo de alfabetização? • Como realizar investigações, levantar hipóteses e questões sobre as supostas

dificuldades do aluno e sobre o processo pedagógico, propondo uma avaliação crítica e o surgimento de novos procedimentos?

Tais questionamentos e outros que poderão surgir no decorrer da pesquisa compõem a problematização dessa proposta.

Os sujeitos da pesquisa são alunos de uma escola pública municipal de ensino fundamental indicados pelos professores como problema de aprendizagem na leitura e na escrita. A pesquisa é realizada com alunos e professores, para tanto a participação direta na escola significa a vivência com o fenômeno em todos os seus aspectos. Se é na escola que acontecem as relações de ensino e aprendizagem, as contradições, e onde se manifestam os problemas de aprendizagem da leitura e da escrita, estar na escola significa entrar em contato com o fenômeno, vivenciá-lo em seus diferentes significados e implicações. Essa possibilidade enriquece e amplia os horizontes da investigação, assim como sinaliza alternativas de intervenção.

Após definição do objeto de investigação, os pesquisadores iniciaram um levantamento das necessidades, expectativas e atribuições acerca do fenômeno em estudo. Alguns teóricos denominam essa etapa de exploratória, quando são iniciados os

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contatos in locum, fundamentais para a (re) formulação do problema. A investigação de seus aspectos constitutivos - as dificuldades de aprendizagem - busca não apenas compreender o fenômeno mas, também, identificar alternativas intervencionistas para sua superação. Isso não significa atribuir aos problemas um sentido pragmático e restrito e nem reduzir a pesquisa à busca de solução de pequenos impasses do cotidiano. Sendo assim, foram selecionadas, em campo, as questões consideradas fundamentais e de sentido mais amplo, cujas respostas não são evidentes e que justificam, portanto, uma investigação rigorosa. Durante esse processo, a mediação teórico-conceitual é muito importante, pois subsidia as questões práticas, orientando-as.

A pesquisa parte da crença de que todos os alunos podem aprender, desde que os professores saibam como os ensinar. Para isso devem contar com apoio teórico e metodológico, por meio do qual são desfeitas noções equivocadas acerca das possibilidades de aprendizagem e, ainda, apresentadas atividades para favorecer o seu desenvolvimento. Para verificar a sustentação empírica dessa hipótese de natureza qualitativa é necessário recorrer à ação, uma vez que nessa modalidade de pesquisa a hipótese consiste na tentativa de responder, de forma operativa, às questões colocadas na investigação. “Trata-se de hipóteses sobre o modo de alcançar determinados objetivos, sobre os meios de tornar a ação mais eficiente e sobre a avaliação dos possíveis efeitos, desejados ou não” (THIOLLENT, 1994, p.57).

Foram definidos para coleta de dados junto aos professores, alunos, e pedagogos os seguintes instrumentos: diagnóstico psicopedagógico, questionário e observação. Junto ao aluno é realizado o diagnóstico psicopedagógico, desenvolvido por meio de atividades variadas, definidas a partir de suas possibilidades de revelar os conhecimentos sobre a leitura e a escrita. Os dados são organizados de modo a propiciar o entendimento do fenômeno investigado e respaldar o conjunto de ações a serem desenvolvidas. A observação em diferentes situações do contexto escolar busca compreender a dinâmica do cotidiano e desvelar os “não-ditos”, aquilo que os participantes não revelam pelo discurso, mas por ações e atitudes. Os questionários possibilitam esclarecer questões relacionadas ao objeto a partir do ponto de vista dos diferentes participantes da pesquisa. Nesse processo de situar os fatos na cotidianidade são considerados aqueles mais relacionados às questões-problemas e aos objetivos propostos na investigação.

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Os dados obtidos possibilitam discussões e estudos, levando os participantes a se envolverem com o projeto e a atuarem de modo cooperativo, buscando efetivar ações transformadoras, as quais caracterizam atividades extensionistas. No presente estudo as ações de extensão consistem em atendimentos psicopedagógicos oferecidos a alunos do Ensino Fundamental de uma escola pública municipal e cursos de formação continuada para os professores e pedagogos que atuam junto aos alunos em atendimento. Propõem-se três atendimentos Propõem-semanais para cada sujeito, os quais são realizados pelas bolsistas do projeto (discentes do Curso de Pedagogia) sob orientação da professora da universidade e profissionais da área da psicopedagogia da Secretaria Municipal de Educação. Após maior conhecimento da realidade escolar e das necessidades dos alunos são planejados e desenvolvidos os cursos de formação continuada, os quais são certificados pela Pró-Reitoria de Extensão da Universidade Federal de Uberlândia.

A intervenção junto aos alunos com problemas de aprendizagem e os educadores (professores e pedagogos) se justifica no entendimento de que não é suficiente uma ação voltada somente para o educando, o que deixaria implícita a ideia de que o problema é exclusivamente dele. Se a aprendizagem resulta da combinatória de fatores internos e externos ao sujeito, as relações que ele estabelece com os educadores também precisam ser investigadas e repensadas. De acordo com o pressuposto psicopedagógico a qualidade da intervenção é um fator primordial para o sucesso da aprendizagem.

Nos cursos de formação continuada são contemplados os fundamentos teórico-metodológicos do processo de ensino e aprendizagem da leitura e da escrita a partir das supostas dificuldades apresentadas pelos alunos em situação de alfabetização.

Com base nas análises realizadas até o momento e na revisão da literatura pode-se inferir que a cultura do fracasso e da exclusão é muito prepode-sente no contexto escolar, mesmo quando no discurso se tenta superar a estrutura educacional seletiva e excludente e estabelecer um paradigma de formação humana integral.

Devido a grande incidência de alunos considerados “problema de aprendizagem”, os quais tendem a fracassar pela repetência e/ou pela evasão, pode-se sugerir que a educação continua sendo privilégio de alguns, uma vez que, apesar dos avanços quantitativos, ainda não é possível assegurar a permanência do aluno na escola, o qual fica privado de efetivar um dos direitos fundamentais de cidadania, que se refere ao acesso aos conhecimentos sistematizados. Em sendo assim, a escola cumpre, com muitas lacunas e problemas, a sua função social, que consiste no processo de formação

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que instrumentaliza o sujeito para alcançar sua condição de cidadão, desenvolvendo suas capacidades e habilidades.

A literatura sobre o assunto e a experiência em instituições educacionais revelam que são considerados alunos com problema de aprendizagem aqueles que:

...não conseguem acompanhar o ritmo da turma e apresentam dificuldades na leitura e escrita, na memorização, na cópia, em conceitos básicos de matemática, entre outros. Manifestam por vezes atitudes agressivas, falta de iniciativa e de interesse pelas atividades propostas pelo professor. A maioria dos alunos é repetente por vários anos e não demonstra um desenvolvimento satisfatório (MIRANDA, 2000, p.19).

Existe um parâmetro de normalidade almejado entre os professores e aqueles que não correspondem são desconsiderados em relação ao seu potencial e possibilidades de aprender. Isto significa não atuar de forma a viabilizar o desenvolvimento do aluno.

Estudos (Patto, 1984, 1990; Rosenthal e Jacobson, 1989) apontam que a forma como o professor interage com o aluno, assim como suas expectativas em relação ao seu desenvolvimento, interferem no resultado do processo ensino-aprendizagem. O educador tende a ser um mediador mais eficaz quando acredita no aluno, criando situações propícias para sua aprendizagem e desenvolvimento. Porém, quando existe uma expectativa negativa em relação às possibilidades do aprendiz, o professor tende a não se esforçar muito, pois não acredita que este possa corresponder ao que dele se espera.

Uma revisão dos significados de “problemas de aprendizagem” revela que somente no final da década de 80 e início de 90, os estudos realizados passaram a apresentar uma visão mais holística e complexa dos fatores que envolvem o processo de aprendizagem (Sara Pain, 1992; Alicia Fernández, 1991: Dolle e Bellano, 1996; Castorina, 1985, 1988; Montoya, 1996). Ainda neste período, contribuindo para uma concepção pluralista do processo de aprender, a psicopedagogia, tributária principalmente da psicologia e da pedagogia, respaldou diversos trabalhos multidisciplinares sobre a aprendizagem e seus desvios, assim como ações intervencionistas embasadas, principalmente, na teoria psicogenética de Jean Piaget. Segundo Miranda,

Tal intervenção psicopedagógica se dá no sentido de viabilizar, pelo indivíduo, a utilização de suas competências, favorecendo a reconstrução das ações no plano da representação. Para tanto, faz-se necessário abandonar o uso abusivo de atividades figurativas estáticas, como exercícios repetitivos e generalizações perceptivas, bem como a

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reprodução de objetos estereotipados e descontextualizados. (2000, p.56)

Na perspectiva psicopedagógica, quando a escola realiza um projeto de intervenção para atender os alunos que apresentam dificuldades no processo de aprendizagem, os resultados são de (re) integração desses sujeitos no ensino regular. Para tanto, faz-se necessário a ação de profissionais que organizem e desenvolvam práticas voltadas para as demandas da instituição.

Projetos dessa natureza normalmente são pautados na concepção interacionista, que considera o conhecimento enquanto processo construído pela atuação simultânea de fatores internos e externos ao sujeito.

Nessa vertente, é importante compreender a própria noção de interação:

A palavra interação é composta por dois afixos, “inter” e “ação”, o que nos esclarece sobre o seu significado – ação da criança sobre o mundo e ação do mundo sobre a criança. Se há reciprocidade, precisamos pesquisar a parte que cabe aos fatores externos e a parte que diz respeito aos fatores internos da organização cognitiva, pois as contribuições, apesar de terem direções opostas, são complementares (SEBER, 1991,p.15).

A organização cognitiva, enquanto fator interno do desenvolvimento ocorre de forma sequencial e integrativa, ou seja, mediante situações de conflitos cognitivos são produzidas novas coordenações das estruturas mentais, tendo por referência as experiências precedentes. Em outras palavras, uma nova informação será assimilada a partir da reconstrução dos conhecimentos prévios (sequencial) e de sua integração para elaboração de novas formas de conhecimento (integrativa). Pelo “...caráter sequencial e integrativo do desenvolvimento, nada aparece sem uma ligação com as conquistas que precederam a que está sendo alcançada aqui e agora, e que toda aquisição nova prepara o caminho para os progressos subseqüentes” (SEBER, 1991, p. 16).

A pesquisa tem revelado que no caso de alunos considerados com problema de aprendizagem, a construção do conhecimento não é diferente, parte-se de suas experiências prévias, ampliando-as.

Segundo Jean Piaget (1959), a aprendizagem não parte do zero, pois a formação de novos hábitos consiste sempre numa diferenciação dos esquemas anteriores. O conhecimento adquirido não é puro registro, nem cópia, mas resultado de uma organização em graus diversos dos esquemas de que o sujeito dispõe.

Por meio de suas pesquisas Piaget afirma que a aprendizagem só é eficaz na medida em que proceda a uma estruturação que não seja produzida pela simples

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acumulação passiva de constatações empíricas. O êxito de algumas aprendizagens marca a filiação genética contínua entre as constatações intuitivas e as estruturas operatórias. Filiação não significa identidade de natureza, mas construção progressiva, na qual parece que a atividade do sujeito desempenha papel primordial.

As afirmações acima indicam que para ser educador, enquanto mediador da aprendizagem é preciso uma postura de investigação, de busca da lógica do pensamento, sem impor-lhe uma coerência artificial. Para tanto, é imprescindível ouvir o aluno e também deixá-lo fazer perguntas, pois seus questionamentos oferecem indícios sobre a forma em que está organizando seu pensamento e as relações mentais que estabelece para construir suas representações. De posse desses dados, o educador tem elementos para planejar sua ação com mais possibilidade de êxito.

Outro aspecto importante a ser considerado é que embora as situações de conflito cognitivo sejam consequências das interações (fatores externos ao desenvolvimento), nem toda interação desencadeia conflito cognitivo. Para beneficiar-se da interação, o sujeito precisa dispor de referenciais que lhe permitem assimilar o objeto enquanto um elemento perturbador, mas com possibilidade de compreensão pela organização dos esquemas cognitivos disponíveis. O esforço de compreender produz novas coordenações entre os esquemas que permitem superar as limitações dos conhecimentos anteriores, portanto há um avanço qualitativo em relação aos mesmos.

A interação que não desencadeia conflito e que não gera avanços conceituais é aquela que não provoca esforço de compreensão, pois o sujeito já tem a resposta ou não dispõe de esquemas para produzi-la. Exemplificando, em uma situação de sala de aula, para que o aluno se beneficie das interações, as atividades e questionamentos dos professores precisam ser assimiláveis, ou seja, o aluno não tem a resposta, mas pode construí-la pela reorganização de seus esquemas mentais ou conhecimentos prévios. Ao contrário, quando não conta com os referenciais necessários ou já conhece a resposta, o objeto não se constitui em elemento perturbador e não desencadeia conflitos cognitivos, logo não gera avanços conceituais.

As considerações acima indicam que existe uma relação entre desenvolvimento e aprendizagem, as estruturas estabelecidas constituem a capacidade básica para a aprendizagem, que depende do nível de desenvolvimento no sentido de as novas aquisições necessitarem de um referencial precedente. Por outro lado, a aprendizagem deve visar ao maior grau de desenvolvimento possível, já que a competência intelectual está relacionada às estruturas cognitivas disponíveis.

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Em suma,

numa visão interacionista a aprendizagem depende, entre outros aspectos, de estruturas elementares, isto é, as experiências (com o objeto de conhecimento e com outros sujeitos) são compreendidas conforme as estruturas pré-existentes, que, ao mesmo tempo que possibilitam a assimilação, se revelam insuficientes para evitar um desequilíbrio, cuja superação (pela reequilibração) consiste em maior equilíbrio e consequentemente em desenvolvimento” (MIRANDA, 2000, p.52/53).

A aprendizagem está relacionada também ao aspecto afetivo, pois se trata de um processo que não acontece no vazio ou na ausência do outro, mas em uma dinâmica relacional, permeada tanto pelo cognitivo quanto pelo afetivo.

A afetividade constitui elemento inseparável e irredutível das estruturas da inteligência, portanto não se pode abordar o ato de aprender desvinculado dos afetos, desejos e interesses. Na aprendizagem o sujeito mobiliza estruturas cognitivas e afetivas, apropriando-se do conteúdo e transformando-o em conhecimento elaborado.

Tais considerações reportam ao campo das relações professo-aluno, pois na aprendizagem ocorre o vínculo com outra pessoa, a que ensina. No campo das relações que se estabelecem entre o professor e o aluno são criadas as condições para o aprendizado, independente do objeto de conhecimento a ser trabalhado.

Essa relação pode influenciar no rendimento do aluno e na construção de sua auto-estima, que ocorre a partir da referência recebida de pessoas que se encontram mais próximas. Desta forma, experiências negativas no início da vida acadêmica podem ocasionar uma auto- imagem comprometida e de insegurança em relação ao potencial.

Sendo assim, faz-se necessário uma avaliação mais crítica e elaborada da problemática da aprendizagem que desencadeie uma práxis pedagógica que não anule as capacidades e nem ressalte as limitações, mas que seja voltada para as potencialidades do sujeito.

Tais considerações remetem à ação mais adequada ao aluno com problema de aprendizagem, uma vez que o mesmo dispõe de inteligência e capacidade de aprender, cabendo aos educadores estabelecer a mediação apropriada, pois se uma criança não aprende da forma que é ensinada, deve-se ensiná-la de forma que ela possa aprender.

A interação com o outro, seja adulto ou criança, tem um caráter estruturante na elaboração do conhecimento, além do aspecto afetivo possibilita desafio e apoio para a

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atividade cognitiva. Para que ocorra a construção do saber escolar, é preciso oferecer certos tipos de interações sociais, que nem sempre acontecem no âmbito da instituição.

Todos os aspectos relacionais e pedagógicos da aprendizagem são abordados nos cursos de formação continuada com os educadores da escola campo da pesquisa. É fundamental que eles compreendam que o meio social pode bloquear ou favorecer o desenvolvimento do pensamento, conforme a relação estabelecida. Sendo assim, o meio se constitui num espaço de atividade intelectual e de aprendizagem, visto que propicia trocas simbólicas através de saberes compartilhados, ao mesmo tempo em que torna manifesta a curiosidade e a expressão das necessidades afetivas e cognitivas.

Nessa perspectiva afirma Davis:

se a construção de conhecimentos se dá na interação social – entre professores e alunos e entre os próprios alunos – faz-se urgente refletir sobre a estrutura e o modo de funcionamento da escola buscando fazer dela um espaço onde o saber socialmente construído seja, de fato, socialmente distribuído (1993, p.54).

Dessa forma, a escola poderá cumprir com sua função social, favorecendo o direito inalienável de acesso e permanência de todos, independente das diferenças que caracterizam os alunos.

REFERÊNCIAS

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FERNANDÉZ, A. A inteligência aprisionada. Porto Alegre: Artes Médicas, 1991. MIRANDA, Maria Irene. Crianças com Problemas de Aprendizagem na

Alfabetização - Contribuições da teoria piagetiana. Araraquara: J.M. Editora, 2000.

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PATTO, Maria Helena Sousa. Psicologia e Ideologia: uma introdução crítica à psicologia escolar. São Paulo: T.A. Queiroz, 1984.

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