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UNIVERSIDADE FEDERAL DE MATO GROSSO FACULDADE DE COMUNICAÇÃO E ARTES PROGRAMA DE PÓS-GRADUAÇÃO EM ESTUDOS DE CULTURA CONTEMPORÂNEA

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UNIVERSIDADE FEDERAL DE MATO GROSSO FACULDADE DE COMUNICAÇÃO E ARTES

PROGRAMA DE PÓS-GRADUAÇÃO EM ESTUDOS DE CULTURA CONTEMPORÂNEA

CAMILA BARBOSA PASINATO

O LADO DE FORA E O LADO AVESSO DA CAMISETA: TECNOLOGIA, MUNDO DO TRABALHO E PROCESSOS

COMUNICACIONAIS

CUIABÁ-MT 2016

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CAMILA BARBOSA PASINATO

O LADO DE FORA E O LADO AVESSO DA CAMISETA:

TECNOLOGIA, MUNDO DO TRABALHO E PROCESSOS COMUNICACIONAIS

Dissertação apresentada ao Programa de Pós-Graduação em Estudos de Cultura Contemporânea da Universidade Federal de Mato Grosso como requisito parcial para obtenção do título de Mestre em Estudos de Cultura Contemporânea, na Área de Concentração em Estudos Interdisciplinares de Cultura, Linha de Pesquisa Comunicação e Mediações Culturais.

Orientador: Prof. Dr. Yuji Gushiken

Cuiabá-MT 2016

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A todos que contribuíram para que o lado de fora e o lado avesso da camiseta fosse desenhado, costurado, vestido e escrito.

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Agradecimentos

Ao meu orientador Yuji Gushiken, pela oportunidade, por acreditar em mim até em momentos que nem eu acreditei, por me desafiar, por sua paciência durante todo o processo de orientação, por entender as diferenças de vivência e campos do saber que me construíram, e por muitas vezes se adaptar à minha linguagem visual para que nos comunicássemos melhor.

A Rosane Preciosa e Ludmila Brandão, meus exemplos antes mesmo de entrar para o programa de mestrado, agradeço por suas colaborações valiosas e indicações bibliográficas no desenvolvimento da dissertação.

Ao meu pai e minha mãe que sempre me apoiaram em todas as minhas decisões, fazendo com que eu me sentisse segura e confiante para prosseguir nessa preciosa experiência. Meus exemplos de vida.

Ao Fernando, meu companheiro em todos os momentos, agradeço pelo apoio, carinho e paciência constante.

A Gabriela, que prontamente me ajudou em todas as vezes que precisei, por acreditar na dissertação e em mim.

Ao João, que muitas vezes me socorreu em momentos de dúvida.

A todos que colaboraram com dados preciosos para o abastecimento desse trabalho. Faccionistas, funcionários, designers, estudantes, professores, empresários, fornecedores e representantes: Assim como uma camiseta não existe sem vocês, essa dissertação não existiria. Obrigada por compartilharem o lado de fora e avesso da camiseta comigo.

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Resumo

A camiseta é uma peça de vestuário de consumo massificado em escala mundial, pelas condições de produção hoje difundidas em escala global e pelo baixo custo econômico, constituindo enfaticamente desde o século XX o cotidiano de milhões de pessoas no mundo todo. A peça é produzida no conhecido formato de T, padrão consagrado de reprodução técnica que permitiu à camiseta tornar-se um produto constituinte da cultura mundializada, que advém dos processos globais de circulação de informações. Em perspectiva interdisciplinar, a pesquisa se constrói na interface entre estudos de moda, comunicação e sociologia do trabalho, incluindo pesquisa bibliográfica e pesquisa de campo em oficinas (facções) de vestuário em Cuiabá (Mato Grosso, Brasil). A pesquisa

aponta as seguintes questões: as transformações tecnológicas na indústria têxtil que permitiram a emergência e as constantes alterações estruturais da camiseta como produto do setor de vestuário, a precarização do mundo do trabalho no setor de vestuário, o que demandou reinvenções nas práticas de produção (o lado avesso da camiseta); e os distintos processos de estamparia e customização que caracterizam a dimensão comunicacional e subjetiva dos usos da camiseta no cotidiano (o lado de fora da camiseta). Entre produção econômica e usos sociais, aponta-se a caracterização da camiseta como produto de uma cultura tecnológica historicamente instituída no setor têxtil, de cujas transformações passam a depender os modos de produção do setor de confecções e os distintos usos que constituem o imaginário da moda no cotidiano.

Palavras-chave: Cultura tecnológica; camiseta; mundo do trabalho; processos comunicacionais; Cuiabá.

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Abstract

The T-shirt is a garment of mass consumption on a worldwide scale, due to the conditions of production today spread on a global scale and at a low cost, making part of the everyday lives, since the twentieth century, of millions of people worldwide. The garment, is produced in the well-know T-shaped, a standard established of technical reproduction that allowed the T-shirt to become a product part of the globalized culture that comes from the movement of global flow of information processes. In an interdisciplinary perspective, the research is built on the interface between fashion studies, communication and work sociology, including bibliographic and field research in small garment factories in Cuiabá (Mato Grosso, Brazil). The research topics of the following issues are: the technological transformations in the textile industry that allowed the emergence and the constant structural changes of the T-shirt as a textile product; the precariousness of the labor market in the garment sector, which demanded reinventions in the production practices (the reverse side of the T-shirt); and the different stamping and customization process that characterize the communication and subjective dimension of the T-shirt’s uses in everyday life (the outside of the T-shirt). Between economic production and social uses, it is pointed the characterization of the T-shirt as a product of a technological culture historically established in the textile sector, whose transformations depend on the garment sector’s production modes and the different uses that make up the imaginary of fashion in everyday life.

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Lista de Figuras

Figura 1 - A Camiseta e o formato da letra "T" ... 19

Figura 2 - Camiseta masculina em malha de cor branca com gola "V" ... 20

Figura 3 - Brando usando camiseta branca na capa de sua biografia ... 24

Figura 4 - Diretas já e camiseta com o lema estampado ... 29

Figura 5 - Regata masculina, muito utilizada para a prática de esportes ... 31

Figura 6 - Regata Masculina com cava prolongada, da década de 1970, usada em um corpo feminino, em malha grossa de algodão ... 31

Figura 7 - Baby Look ... 32

Figura 8 - Baby Look Masculina ou Camiseta com modelagem slim ... 32

Figura 9 - René Lacoste usando o modelo de polo que desenvolveu ... 33

Figura 10 - Camisa Polo masculina com detalhes de gola e punho em ribana e abertura frontal por botões ... 34

Figura 11 - Camisa Polo feminina com detalhes de gola em ribana e abertura frontal por botões. Algumas Polos femininas possuem aberturas mais decotadas e finas, como forma de valorizar o busto e deixar a peça mais delicada ... 34

Figura 12 - Blusa em malha mescla com recortes nas mangas com aplicações de paetê. A peça deixa de se caracterizar como uma camiseta, pois possui recortes e aplicações, descaracterizando o formato em "T" ... 35

Figura 13 - Elementos de um tecido ... 36

Figura 14 - Fibra têxtil ... 36

Figura 15 - Fio têxtil ... 37

Figura 16 - Quadro explicativo de fibras têxteis, montado com base nas informações extraídas de apostila de Materiais têxteis - UEL ... 37

Figura 17 - Aspecto do fruto antes e depois da abertura ... 38

Figura 18 - Tabela de aplicação e comprimento da fibra de algodão ... 39

Figura 19 - Diferença entre a fibra do algodão Pima, no centro, e os demais ... 40

Figura 20 - Camiseta de algodão Pima sendo vendida em loja da marca Hering ... 40

Figura 21 - Imagem da produção em toneladas, por região do Brasil ... 41

Figura 22 - Algumas das cadeias que compõem o poliéster ... 42

Figura 23 - Classificação dos tecidos ... 44

Figura 24 - Formação do tecido plano ... 45

Figura 25 - Ligamento têxtil entre trama e urdume, formando um tecido plano ... 45

Figura 26 - Ligamentos têxteis da malha ... 45

Figura 27 - Teares circulares do parque têxtil da Hering em Blumenau - 1988 ... 47

Figura 28 - Tipos de laçada da malha ... 47

Figura 29 - Curso e coluna de malha ... 48

Figura 30 - Esquema de tecnologias da Adidas ... 52

Figura 31 - Camiseta Adidas que utiliza a tecnologia Climacool no recorte da malha ... 53

Figura 32 - Camiseta da Adidas com o adesivo colado escrito em inglês: "isso não é algodão" ... 53

Figura 33 - Camiseta da Nike que utiliza a tecnologia Dri-fit, com detalhe para sua textura porosa, facilitando a entrada de ar e ventilação ... 54

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Figura 35 - Tecnologia PWR - ACTV Puma, marca com sede na Alemanha ... 55

Figura 36 - Camiseta da torcida da seleção de futebol da Itália ... 56

Figura 37 - Camiseta produzida na cidade de Cuiabá-MT, que utiliza malha com composição 100% poliamida. Detalhe da textura microporosa que auxilia na secagem mais rápida do suor ... 58

Figura 38 - Modelagem realizada em papel ... 59

Figura 39 - Exemplo de modelagem em um software ... 60

Figura 40 - Modelagem 3D ... 60

Figura 41 - Plotter com a simulação de corte sendo impresso ... 60

Figura 42 - Máquina de costura doméstica (ou caseira) da marca norte americana Singer ... 70

Figura 43 - Máquina de costura “overloque” em uma fábrica de Cuiabá ... 71

Figura 44 - Máquina de costura Galoneira em uma fábrica de Cuiabá ... 71

Figura 45 - Máquina de costura “reta” em uma fábrica de Cuiabá ... 72

Figura 46 - Ambiente de uma residência onde se instala uma oficina ou facção, na cidade de Cuiabá-MT ... 73

Figura 47 - Malha enfestada na mesa de corte ... 77

Figura 48 - Malha sendo cortada com as partes que compõem a camiseta ... 77

Figura 49 - Máquina que corta a ribana na largura desejada ... 78

Figura 50 – “Galoneira” com aparelho que aplica a ribana na camiseta ... 79

Figura 51 - Camisetas sendo dispostas na mesa de trabalho para a costura das barras na “galoneira” ... 79

Figura 52 - Camisetas prontas no ponto de venda, produzidas e comercializadas em Cuiabá ... 80

Figura 53 - Tela e raqueta de serigrafia, com detalhe ao fundo da imagem de telas para serem desgravadas ... 89

Figura 54 - Processo de serigrafia manual em que as camisetas são dispostas em berços por onde os trabalhadores posicionam as telas, em uma fábrica de Cuiabá ... 90

Figura 55 - Carrossel automático de serigrafia de uma fábrica em Cuiabá ... 91

Figura 56 - Resultado do processo de serigrafia em camiseta infantil ... 91

Figura 57 - Prensa térmica em uma fábrica ... 92

Figura 58 - Plotter da marca Epson imprimindo papéis para transfer vendidos por metro ... 93

Figura 59 - Abadá de um bloco de carnaval em malha 100% poliéster saindo da prensa térmica após processo de sublimação ... 94

Figura 60 - Camiseta em malha leve 100% poliéster, com estampa desenhada pela ilustradora Camila Pasinato, estampada em processo de sublimação, através de prensa térmica e papel de transfer .... 94

Figura 61 - Impressora digital da marca Brother em fábrica de estamparia de Cuiabá, imprimindo diretamente em camiseta de malha 100% algodão ... 95

Figura 62 - Processo de estamparia digital em camiseta colorida - passando pela etapa do fixador de cor, impressão de cor branca, seguido da impressão da cor amarela por cima da branca ... 97

Figura 63 - Camiseta de estamparia digital com mensagem de humor e crítica ... 98

Figura 64 - Camiseta básica com a inserção de estampa e bordado ... 99

Figura 65 - Exemplo de estampa com mensagem de ironia ... 101

Figura 66 - Algumas das camisetas da loja Boneco de Osso ... 102

Figura 67 - Camiseta customizada pelo artista plástico Adriano Figueiredo Ferreira, através da técnica de pintura em tecido ... 104

Figura 68 - Camiseta customizada pela jornalista de moda e fundadora do movimento Ecochic Mônica Horta, através das técnicas de aplicação de renda, stencil e tie-dye ... 104

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Figura 69 - Camiseta customizada pela designer de moda Bianca Poppi, através das técnicas de bordado e tricô... 105 Figura 70 - Camiseta customizada manualmente com estampa de orquídeas pretas através da técnica de serigrafia ou silk-screen ... 106 Figura 71 - Camiseta que leva o símbolo do "Batman", exemplo de transmidiatização comentado por Jenkins (2009), e que foi customizada para se tornar uma regata cavada, mudando de significado, gerando um processo de interatividade... 108 Figura 72 - Camiseta com estampa realizada através de serigrafia pelo próprio usuário, ou seja, customizada através do processo de interatividade, além de ser um exemplo de transmidiatização que carrega certa ironia ao misturar a figura de Che Guevara com o Pikachu ... 109

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Sumário

INTRODUÇÃO... 13

CAPÍTULO 1 – CAMISETA: TECNOLOGIA E CONTEMPORANEIDADE... 19

1.1 A trajetória cultural da camiseta ... 19

1.2 Saberes e matérias-primas ... 35

1.2.1 Fibras Têxteis: a origem do processo produtivo ... 36

1.2.1.1 A fibra natural algodão: técnicas de produção e comercialização ... 38

1.2.1.2 A fibra química poliéster: técnicas de produção e comercialização ... 42

1.2.2 Tecidos: o resultado das fibras têxteis e seus processos produtivos ... 44

1.3 Saberes e tecnologia: produtos da cultura moderna ... 48

1.3.1 Tecnologia aplicada às fibras e tecidos ... 50

1.3.2 Tecnologia aplicada aos sistemas CAD/CAM ... 58

CAPÍTULO 2 - O LADO AVESSO DA CAMISETA ... 62

2.1 A camiseta e o mundo do trabalho ... 62

2.2 Oficinas de costura: processos e modo de organização horizontalizado ... 69

2.3 Cotidiano em uma oficina em Cuiabá – MT ...81

CAPÍTULO 3 - O LADO DE FORA DA CAMISETA: PROCESSOS COMUNICACIONAIS ... 88

3.1 Modos de impressão e a caracterização midiática da camiseta ... 88

3.2 A camiseta como mídia radical ... 98

3.3 Customização: Processos de interação, interatividade e transmidiatização... 103

CONSIDERAÇÕES FINAIS ... 111

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INTRODUÇÃO

A pesquisa de dissertação tem como tema central a camiseta e questões a ela relacionadas: tecnologia, mundo do trabalho e processos comunicacionais. Trata-se da peça do vestuário mais acessível no cotidiano de grande número de indivíduos de costumes ocidentalizados. Sua acessibilidade como peça de vestuário tem como base um conjunto de características que inclui o modo de produção (artesanal ou industrial), o custo relativamente baixo para o consumidor final e a versatilidade em seu uso no dia-a-dia.

A camiseta, para além de sua condição como mercadoria, é considerada nessa pesquisa como produto cultural, ou seja, produto de uma cultura tecnológica que inclui o

know-how (saberes) de produção de fibras naturais na agricultura e de fibras sintéticas na

indústria de novos materiais. Além do viés tecnológico, entende-se a camiseta como um produto cultural ao considerá-la objeto tipificado de uma cultura de consumo específica, uma vez que sua produção está paralelamente relacionada ao cotidiano e acompanha mudanças sociais temporais de seus usuários e contextos.

Têm-se uma análise do objeto de trabalho como um produto da comunicação. Na perspectiva da comunicação como cultura, a comunicação é entendida como sistema de significação através do qual, uma ordem social é comunicada, reproduzida, experimentada e explorada e ainda como um processo simbólico em que a realidade é produzida, mantida, restaurada e transformada (LIMA, 2001).

A pesquisa, em perspectiva interdisciplinar, possui como base teórica o suporte de obras de Giorgio Agamben, Arjun Appadurai, Edgar Morin, Álvaro Vieira Pinto, Maurizio Lazzarato, Henry Jenkins, Félix Guattari, Michael Hardt e Antonio Negri, além de contar com a única bibliografia brasileira sobre camiseta, o livro "A história da camiseta", uma coletânea de vários autores reunidos pelo museu da Hering, publicado em 1988.

A revisão bibliográfica fez emergir uma questão que passou a justificar a pesquisa sobre camiseta. Ainda que se trate de uma peça do vestuário constantemente disponível nos mais distintos mercados, seja pelo preço acessível, pelo design (shape) considerado “básico”, pela alta rotatividade de produção e pela presença significativa na economia, constatou-se haver apenas um livro escrito em língua portuguesa publicado no Brasil e

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14 pouco material de publicação de cunho científico que analise de maneira mais profunda o vestuário específico.

O conceito de tecnologia, de Álvaro Vieira Pinto (2005), é abordado ao longo da dissertação em seus três capítulos, pois a tecnologia torna-se questão central quando se trata da camiseta como tema, em suas diversas etapas de produção e comercialização, bem como produto da comunicação e da cultura.

Pinto (2005) define que, de acordo com o primeiro significado etimológico, a tecnologia é a discussão da técnica, que abrange as habilidades do fazer, as profissões e os modos de produzir algo. Como segundo significado, elucida uma interpretação exclusivamente ligada a técnica, ou seja, o chamado know-how. Como terceiro significado e estritamente ligado ao anterior, é o conjunto de todas as técnicas de que dispõe uma determinada sociedade. E, por fim, como quarto sentido da palavra tecnologia, o autor aponta ser a ideologização da técnica. (PINTO, 2005, p. 220).

Considera-se então que a tecnologia extrapola sua significância do fazer, pois de acordo com Pinto (2005), o homem é o principal produto dele mesmo. Portanto, há a necessidade de um aprofundamento não apenas do objeto de pesquisa em questão, mas também dos indivíduos envolvidos em sua produção, que carrega consigo subjetividades socioculturais próprias.

Foram necessárias pesquisas de campo em fábricas na cidade de Cuiabá (MT), e na cidade de São Paulo, bem como em oficinas de costura ou facções, como são chamadas em alguns estados do Brasil, a fim de cruzar as informações obtidas com os conceitos e críticas de Lazzarato (2006) sobre a posição do trabalhador e suas condições de trabalho, bem como a ordem social em que essas ligações frágeis se constroem. "Se o trabalho aparece agora como a fonte de energia que nutre todas as relações sociais, não é mais porque constitui o mundo social, mas porque o compromisso social e político entre sindicatos, patrões e Estado se constitui em torno da ideia de trabalho. (Lazzarato, 2006, p. 91).

Nessa discussão, tem-se então a camiseta como parte intrínseca desse discurso, como um produto que transporta as características de sua produção aos seus usuários, considerando primordialmente que subjetividades dos produtores são repassadas adiante, assim como o conhecimento relativo a essa produção. Conhecimento este que, além de

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15 sua carga humanística, transporta o know-how da produção em seu caráter mais primário, que é transmito ao longo da cadeia de consumo.

As subjetividades produzidas na relação entre homem e o ambiente de produção é exemplificada por Guattari (1992, p. 11) como a subjetivação maquínica, ou seja, com componentes semiológicos significantes que se manifestam através de instâncias distintas: família, educação, meio ambiente, religião, arte, além de elementos fabricados pela indústria da mídia.

Pontua-se então que a relação estabelecida entre o indivíduo que costura e as máquinas de costura, por exemplo, é construída através das dimensões pessoais e interpessoais. A própria relação entre indivíduo e máquina é permeada de subjetividades que envolvem os ambientes de informações e de tecnologia.

É importante ressaltar que o processo de evolução da camiseta ao longo do tempo deve-se a diversos fatores, consequência principalmente do advento da tecnologia e dos movimentos culturais da segunda metade do século XX, principalmente para que os indivíduos passassem a usar a camiseta não mais como uma underwear, e sim como roupa do dia a dia, como peça de vestuário para diversas ocasiões. Por meio da tecnologia das fibras sintéticas, por exemplo, é possível obter resultados mais satisfatórios do que a camiseta de algodão, inclusive para práticas esportivas.

"A tecnologia defeituosa ou atrasada rouba a eficácia da produtividade do trabalho, reduz a disponibilidade de bens, aumenta-lhes o preço, tornando-os inacessíveis para a maioria dos homens." (PINTO, 2005, p. 231). Entende-se então que o avanço tecnológico proporcionou que a camiseta pudesse acompanhar a evolução do modo de vida de seus usuários, fato que seria improvável sem inovações tecnológicas causando a obsolescência da peça.

"O homem, que por essência está destinado a procurar a natureza, para, sobre ela se constituir a si mesmo, encontra em lugar dela cada vez mais a obra de outros homens." (PINTO, 2005, p. 225). Entende-se então que, ao se abordar a tecnologia, é imprescindível também abordar em termos antropológicos, o ser humano.

A partir do cruzamento entre tecnologia, camiseta e homem, desenvolve-se o

Capítulo 1 da dissertação. Fez-se necessário um levantamento acerca a história da

camiseta, a partir de 1950, subdividido por décadas, ressaltando as mudanças que o século XX instaurou para o modo de vestir da camiseta e sua receptividade entre os usuários.

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16 Por meio das influências da cultura e do comportamento humano vigente em cada época, é perceptível mudanças de posição e significado da camiseta como vestuário. A principal influência é percebida na década de 60 com os baby boomers, nascidos logo após a Segunda Guerra Mundial, caracterizados por sua vontade generalizada de contradizer as normas e regras sociais estabelecidas.

Morin (2006) explica em seu livro “Cultura de Massas no Século XX” a influência dessa juventude e sua posição emergente como categoria social relevante no campo das ciências sociais e humanas, sempre atrelada à produção dos desvios de normas sociais. "Cumpre não esquecer que todo indivíduo é um desvio de certa forma, isto é, por seus traços singulares." (MORIN, 2006, p. 129). Morin ainda explica que a sociedade se torna mais tolerante a esses desvios, ou "ruídos", à medida que se liberta de seus papéis sociais e profissionais.

Após a narrativa sobre a emergência da camiseta como peça de vestuário, o primeiro capítulo aborda informações sobre o desenvolvimento de técnicas voltadas para as partes que compõem a camiseta. Este capítulo trata do desenvolvimento de matérias-primas utilizadas na indústria têxtil, dando ênfase às propriedades do algodão, uma fibra natural, e do poliéster, fibra sintética versátil criada em laboratório.

Além disso, versa sobre a construção têxtil, especificamente o ligamento têxtil de uma malha e suas funcionalidades. E por fim relata a influência da tecnologia inserida em todo o contexto da camiseta, seja na produção através dos maquinários, ou na inovação dos materiais têxteis.

"A atividade fabril é vista como serviço, e o trabalho material da produção de bens duráveis mistura-se com o trabalho imaterial e se inclina na direção dele" (HARDT; NEGRI, 2002. p. 314). Baseado na afirmação dos autores, o Capítulo 2 traz para a discussão o trabalho imaterial que envolve a produção da camiseta, ou seja, ao produzir a peça, além de gerar um produto material, produz-se um bem imaterial: o conhecimento, bem como um produto da cultura e da comunicação. (HARDT; NEGRI, 2002, p. 311). Considera-se, nesta perspectiva, a produção de conhecimento ao desenhar, modelar, cortar, costurar e estampar a camiseta.

Negri e Lazzarato (2011, p. 25) apontam que, no novo modelo produtivo pós-fordista, exige-se do trabalhador a capacidade de escolha e tomada de decisões, pois "[...] é a alma do operário que deve descer na oficina. É a sua personalidade, a sua

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17 subjetividade, que deve ser organizada e comandada. Qualidade e quantidade do trabalho são reorganizadas em torno de sua imaterialidade".

Assim, no segundo capítulo há o estudo das oficinas (ou facções), modelo de trabalho relativamente novo no Brasil, exportado da Itália da década de 1970, exemplificado através dos casos de horizontalização da cadeia produtiva, pelos autores do livro "Empresários e empregos nos novos territórios produtivos: o caso da terceira Itália".

Discute-se ainda como funciona a divisão de trabalho nas oficinas e indústrias, aprofundando em cada etapa produtiva. Neste capítulo abordam-se questões trabalhistas apontadas por Lazzarato (2006), voltadas para o contexto da camiseta, focando como se constitui a organização da vida dos indivíduos envolvidos na produção da peça e suas subjetividades.

O título do capítulo, “O lado avesso da camiseta”, traz à tona uma situação polêmica dado o pouco aprofundamento que se dá sobre as realidades da produção no âmbito industrial, muitas vezes obscura, que repercute amplamente na vida das pessoas envolvidas nesse segmento da cadeia produtiva.

O Capítulo 3 traz uma análise da camiseta como mídia radical e produto de comunicação, possibilitando inúmeras intervenções seja através da estamparia ou customizações, como os populares DIY (Do It Yourself). Demonstrando que a camiseta se apresenta, principalmente por meio dessas intervenções, como agente e indicador de mudanças, revoluções ou aproximações de grupos sociais por meio da interação, interatividade e transmidiatização, conceitos apontados por Jenkins (2009).

As dinâmicas culturais são construídas pela sociedade e estão em constante transformação, fato que sempre provocou e continuará provocando mudanças de significado nas camisetas, por mais que elas sempre reproduzam a sua forma originária do formato em “T”.

A produção econômica da camiseta constitui simultaneamente uma produção cultural que compreende enfrentamentos históricos distintos. Através da sua facilidade de acesso, tanto para produção quanto consumo, a peça torna-se mais suscetível às diferentes traduções da época vivida.

O foco da dissertação é explorar a camiseta, chamada neste estudo por "lado de fora", ou seja, o lado visível da peça, lado em que fica exposto suas intervenções,

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18 exemplificadas por uma marca, estampa, bordado ou customização. Aborda-se neste lado questões que se referem às inovações tecnológicas e a história da peça, sempre levando em consideração a ligação dos dois fatores, pois, como Pinto (2005, p. 234) define: "Toda época teve as técnicas que podia ter", ou seja, ao explorar o "lado de fora", relata-se como a técnica, através do uso da camiseta, age a serviço das necessidades e desejos do usuário. Explora-se também o lado crítico, chamado de o "lado avesso" da camiseta, que se refere ao mundo do trabalho e a submissão dos indivíduos à precariedade e fragilidade em que se encontram os modos de organização do sistema de produção de renda que envolve os artigos têxteis, exemplificados pela camiseta. Trata-se de um lado pouco explorado, uma vez que vai contra o imaginário que se constrói do mundo contemporâneo da moda, em que grandes ou pequenas marcas são embaladas pela onda da sustentabilidade e moda eco-friendly, cada vez mais evidenciadas no mercado.

E por fim, ao falar sobre processos comunicacionais, fala-se da camiseta "de todos os lados", explorando suas virtualidades, bem como seu uso, modos de impressão, ou seja, tecnologia, e como mídia radical.

No que diz respeito à ligação entre a tecnologia e o homem, o trabalho de pesquisa constitui-se em uma discussão interdisciplinar que atravessa os campos da comunicação e da cultura, estudando o envolvimento do indivíduo, suas subjetividades e o ambiente em que produz a camiseta, além de pesquisar como a peça influencia a vida de quem a produz, ou seja, o produtor, e a influência na vida do indivíduo como consumidor.

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CAPÍTULO 1 - CAMISETA: TECNOLOGIA E CONTEMPORANEIDADE 1.1 A trajetória cultural da camiseta

"A camiseta demorou a entrar para a política. Isso porque, antigamente, suas funções eram executadas nos bastidores. Servia para proteger o corpo, aquecendo-o e preservando-o do contato com roupas exteriores, e também para absorver o suor, prolongando a vida útil das camisas. [...] A camiseta permanecia oculta, mais um mistério a ser desvendado na intimidade, como se fosse uma cueca ou uma calcinha." (MACIEL, 1988, p. 61)

Até a década de 50 do século XX, a camiseta era conhecida como undershirt, "camisa de baixo", em inglês, ou "camisa de meia", no Brasil.

O que todas as variações da camiseta têm em comum é a forma em T, de onde vem a origem de seu nome em inglês, T-shirt, a partir do momento em que deixa de ser usada como roupa de baixo. O formato da letra T se relaciona à anatomia do corpo humano. Ao abrir os braços, o homem se assemelha a letra, e a camiseta acompanha sua anatomia de maneira prática, vestindo de forma vertical descendente ao corpo, com orifícios destinados à cabeça, aos braços e tronco.

O formato da peça também se relaciona com a necessidade de padronização do processo produtivo, que demanda rápida produção no corte e na costura, processo em que são reunidas as quatro partes que compõem a peça: uma frente, um verso e duas mangas. A rápida produção da peça tornou-se condição para o consumo massificado do século XX.

Figura 1 - A Camiseta e o formato da letra "T" Foto e montagem: Camila Pasinato

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20 A camiseta, ou t-shirt em inglês, mantém até hoje a mesma estrutura de corte e costura, variando entre gola “careca”, quando possui o formato redondo, acompanhando a anatomia do pescoço, e gola "V", quando a gola da camiseta possui um leve decote com um ângulo que se assemelha a letra V. O que se altera ao longo do tempo é o significado dado à peça por distintos atores sociais em diferentes situações vividas.

Figura 2 - Camiseta masculina em malha de cor branca com gola "V" Foto: Camila Pasinato

Em termos de estamparia ou acabamentos, percebe-se maior conexão com tendências do campo da moda relacionadas a época em que a peça foi concebida, estabelecendo uma relação temporal, diferente da peça lisa, considerada mais versátil no guarda roupa de qualquer indivíduo.

A camiseta produzida no processo de design, corte e costura, ao ganhar o conhecido formato T que caracteriza a peça no mundo do vestuário moderno e ocidental, pode ser encaminhada ao consumidor final com o acabamento dito “básico”, sem outra produção visual que lhe atribua outras distinções. Intervenções no design, a partir de pequenas variações no corte e na costura, tendem a dotar a camiseta de novas formas. Na medida em que ganha distinção de forma e cor, passa virtualmente a ser incorporada pela

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21 designação de uma assinatura, que mercadologicamente pode ser uma marca registrada. Nestas condições de captura pelo mercado é que a camiseta tem modificado o seu valor de troca, o que pode alterar sua condição de peça barata e acessível a produto de grife e usada como signo de distinção de classe social.

Agamben (2009) compara a contemporaneidade com a moda, ou melhor, com o "estar" ou "não-estar-mais-na-moda".

"Essa cesura, ainda que sutil, é perspícua no sentido em que aqueles que devem percebê-la a percebem impreterivelmente, e, exatamente desse modo, atestam o seu estar na moda; mas, se procuramos objetivá-la e fixá-la no tempo cronológico, ela se revela inapreensível." (AGAMBEN, 2009, p. 66)

A camiseta consegue contornar o jogo da moda exatamente por seu formato permanecer o mesmo até hoje e vestir públicos diversos, independente de idade, classe social ou gênero.

Para a melhor compreensão, os próximos parágrafos serão destinados a narrar a trajetória da camiseta, divididos por épocas ou décadas relevantes à sua história, no contexto mundial e no Brasil, começando pela década de 1950, pois antes disso a camiseta era considerada uma peça pouco explorada, usada pelos homens como roupa de baixo. A sua condição de underwear pré-estabelecia uma desaprovação social em seu uso por líderes políticos ou personalidades conhecidas de qualquer outra maneira, principalmente porque só aparecia em público no corpo de trabalhadores braçais em meio a suas atividades, denotando a caracterização popular desse processo de consumo.

Nos anos 50 do século XX, a camiseta, segundo Maciel (1988, p. 62), emancipou-se da condição anterior de peça emancipou-secundária para dar voz à necessidade de protestos de distintos grupos sociais. A camiseta então adquiriu um papel de ferramenta de contestação, condizente com as correntes da cultura jovem do século XX. A condição de veículo de protesto, principalmente do segmento jovem, ainda era abstrata, mas era evidente a recusa da maneira tradicional do vestir, delineada por colarinhos, gravatas, botões e punhos. Ainda segundo o mesmo autor, a simplicidade da camiseta equivalia a um "não" incisivo às desnecessárias complicações do vestir.

A partir da década de 60, a camiseta extrapola sua caracterização apenas de peça de vestuário adquirindo novas maneiras de vestir e tornando-se um meio de comunicação. Isto coincidiu com uma importante revolução no que diz respeito ao consumo de moda: o surgimento do prêt-à-porter (pronto para usar), que dá início ao processo de reprodução

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22 massificada de uma mesma peça de roupa, minimizando gradativamente o monopólio dos ateliês de alta costura que dominavam o mercado e ditavam a moda.

Os baby boomers, jovens da década de 1960, inauguraram um novo estágio da vida antes desconhecido: a juventude, seja por sua força em números expressada pelo pico de nascimentos de bebês no pós-guerra, ou pela força que tinham de se rebelar e ir contra as regras da sociedade, tornando-se a voz de muitas transformações econômicas, políticas e sociais no mundo contemporâneo.

A camiseta ganha força com os jovens. Os anos 60 são cultuados até hoje como o reinado da juventude, na medida em que a categoria passava a reivindicar revisões na vida social e a ditar comportamento. Havia uma necessidade de se quebrar as regras pré-estabelecidas, impostas historicamente pelas gerações anteriores, e neste cenário pela primeira vez a juventude emerge como categoria social relevante no âmbito das Ciências Sociais e Humanas.

A cultura adolescente-juvenil, ainda segundo Morin (2006), é ambivalente, pois ao mesmo tempo em que participa da cultura de massa, procura se disfarçar. No que se refere ao consumo, usa produtos materiais e imateriais que demarcam os valores de "modernidade, felicidade, lazer, amor" (MORIN, 2006, p. 139). Trata-se de uma cultura criada pela adolescência, e produzida pelo sistema. "A criação modifica a produção e a produção modifica a criação". (MORIN, 2006, p. 140).

A camiseta, em seu caráter subjetivo e comunicacional, fazia sentido com o cenário econômico e político do Brasil: um país com uma juventude contestadora, reivindicando novas organizações sociais, novas maneiras de vivência e, consequentemente, de se vestir. Sua proposta era a de ser uma peça rápida, barata e descomplicada, em contraposição às camisas que demandavam tempo e manutenção demasiada (por exemplo, a passadoria e os inúmeros botões para seu ajuste).

A praticidade de vestir uma camiseta evidenciou-se pelo contraste com os trajes antes considerados casuais, como a camisa, em conjunto com a calça social. Estes trajes rigorosamente deveriam estar alinhados, passados a ferro ou a vapor, a camisa formalmente usada por dentro da calça, acompanhada do cinto que deveria combinar com a cor do sapato, e com a meia. Tantos detalhamentos para a prática do vestir não se mostravam compatíveis com a pressão dos horários e prazos da vida moderna.

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23 A peça acabou se tornando o veículo perfeito para manifestações na Nova República. Historicamente, personalidades centrais de sistemas autoritários utilizavam um vestuário formal e complexo, como ternos e gravatas, demonstrando uma composição muito bem alinhada, delineando uma tradução material da necessidade inibidora de controle e segurança presente na sociedade.

Outro fator que contribuiu para o impulso do uso da camiseta foi o advento da moda unissex da década de 1960: as mulheres passaram a se apropriar dos trajes masculinos, fazendo com que a camiseta se tornasse parte do contexto da moda unissex. A peça tornou-se, paradoxalmente, tanto um símbolo de virilidade quanto de feminilidade.

O cinema, através dos atores Marlon Brando e James Dean, contribuiu para a popularização da camiseta como símbolo de rebeldia ao dar visibilidade à peça nos filmes "O Selvagem" e "Uma Rua Chamada Pecado", com atuação de Brando, seguido por "Juventude Transviada", atuado por Dean. Assim, ambos constituíram no cinema a imagem de galãs rebeldes ao portarem camisetas brancas justas delineando tórax e braços, que passaram a constituir o imaginário do corpo masculino ao longo do século XX. "O hábito pode não fazer o monge, mas a camiseta fez um rebelde, e depois, muitos outros." (AUGUSTO, 1988, p. 109).

O ato de usar a camiseta sem o acompanhamento de uma camisa por cima foi considerado extremamente ousado para a época. Através deles e de seus precursores,a camiseta passa então a ter um apelo sensual e rebelde, uma vez que desafiava o papel funcional inicial da peça, o de underwear.

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24 Figura 3 - Brando usando camiseta branca na capa de sua biografia

Fonte: Livro "A História da Camiseta1

Expor a peça que estava antes escondida por trás das outras camadas de roupas foi um ato inédito que criou um marco temporal e histórico, modificando os significados da camiseta até hoje. Pode-se considerar que os jovens, ao se apropriarem da camiseta dessa maneira, romperam com estereótipos vigentes do modo de se vestir e de se portar, e deixaram uma marca no tempo como atores sociais na contemporaneidade.

Segundo Agamben (2009, p. 58), em uma leitura possível, “pertence verdadeiramente ao seu tempo, é verdadeiramente contemporâneo, aquele que não coincide perfeitamente com este nem está adequado às suas pretensões [...]”. O autor complementa afirmando que é exatamente através desse deslocamento e desse anacronismo que o indivíduo é capaz, mais do que os outros, de perceber e apreender o seu tempo.

A partir do gesto de expor a camiseta sem estar escondida por trás de outras camadas de roupas, a peça passou a dotar-se de signos que carrega com ela até os dias de hoje: a de ser uma peça que remete à juventude e à informalidade.

Música, cinema e juventude estão conectados, e a camiseta surgiu no meio desse cenário. "Um dado curioso – e quase desconhecido – é que a música disputa com o cinema a primazia de ter iniciado a moda da camiseta." (MUGGIATI, 1988, p. 130) O autor

1 AUGUSTO, Sérgio. A Estrela Rebelde e Sedutora. A História da Camiseta. São Paulo: Cia. Hering, 1988, p. 108.

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25 explica que um trompetista de jazz teria aparecido em cenas de camiseta exposta antes mesmo de Marlon Brando: era Chet Baker. O músico foi o precursor de outros, como Bob Dylan, e os Rolling Stones.

"A princípio adotada espontaneamente pelo rock, como autêntica bandeira de identificação, a camiseta não demorou a se tornar o veículo de promoção ideal para o showbiz e a indústria fonográfica. A camiseta da turnê americana dos Rolling Stones em 1972 - aquela com a enorme língua vermelha pendendo na boca - era vendida dois anos depois a 100 dólares cada." (MUGGIATI, 1988, p.136)

O caso de sucesso da camiseta da banda Rolling Stones é um exemplo de como a peça possui o signo de juventude muito atrelado a sua forma e a seu uso. De acordo com o relato acima, datado da década de 1980, ela ainda era comercializada por um preço considerado alto, mesmo dois anos após o seu lançamento.

Porém, trata-se de uma peça considerada famosa até os dias de hoje, vendida em inúmeros pontos de comércio no mundo, inclusive em comércios populares como os camelôs. Exemplo de que a camiseta, ainda que esteja com a informação da estampa, possui o poder de acompanhar as épocas, sem se marcar no tempo ou sem se tornar um produto de moda envelhecido ou ultrapassado.

Os baby boomers, e seu aspecto de rebeldes, ao reinventarem o imaginário de juventude, inventaram o comportamento de se juntar com seus iguais, formando distintos grupos sociais que proliferaram na segunda metade do século XX. Morin (2006) afirma que a cultura juvenil, ao mesmo tempo em que reforça o caráter individualizante de seus símbolos e valores, também promove a solidariedade e alimenta o sentimento de grupo. Comportamento antes impraticável, já que antigamente o princípio de ordem era praticado.

O movimento hippie trouxe grande influência para a camiseta em seus diversos âmbitos. Tal grupo social compreendia, por exemplo, que a ideia do dinheiro pervertia as pessoas, que as cidades deveriam ser abandonadas em prol de uma vida no campo em comunhão com os outros e a natureza, além de defenderem o uso de substâncias alucinógenas como uma forma de autoconhecimento.

Essa visão particular de como deveria ser o mundo foi de grande influência no vestir, principalmente porque os hippies recusavam a moda vigente da época e adotaram sua própria maneira de se expressar através do vestuário, que incluía também a camiseta.

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26 Uma maneira nova de se vestir significava uma maneira nova de consumir, e foi então que as indústrias de malharia, percebendo a demanda de consumo, redirecionaram suas produções e investiram em tecnologias que permitissem que a camiseta tradicional branca fosse, em partes, substituída por camisetas coloridas, carregando mensagens de contestação juvenil.

Nos anos 1970, os estilistas se apropriaram da camiseta e a reconheciam como produto da moda brasileira. O novo conceito de uma moda brasileira coincide com o afloramento das lojas de departamento que passaram a vender artigos do vestuário, como a Mesbla, Mappin e lojas Clipper. As marcas, que existiam desde o início do século XX no Brasil, passaram por problemas financeiros a partir da década de 1980, mas fizeram a diferença no cenário urbano. Através da oferta de roupas a preços acessíveis, as lojas sanaram a necessidade dos indivíduos que já não tinham mais tempo de confeccionar as suas próprias roupas em casa.

Com o modelo de comércio importado da França e dos Estados Unidos, as lojas de departamento consistem em um ambiente amplo, onde se comercializam larga variedade de produtos de alto consumo, agrupados por categorias. Além disso, como inovação para o serviço de atendimento ao consumidor, as lojas trouxeram o conceito de autoatendimento, ou seja, o próprio consumidor escolhe os produtos que deseja, sem a intervenção de um vendedor, de maneira muito mais dinâmica e pessoal.

Foi um grande marco para a massificação do consumo do vestuário, antes representado no varejo por pequenas estruturas, no formato de boutiques, que em grande maioria não eram acessíveis à massa populacional, ou pequenos negócios, como lojas nos centros das cidades.

Tratando-se de um ambiente com produção em grande quantidade, foi possível para as lojas de departamento a oferta de preços muito mais acessíveis aos consumidores finais. Ainda assim, foi percebido que estes consumidores não desejavam apenas se vestir, mas sim consumir moda. As lojas então encarregaram-se de promover campanhas publicitárias com o intuito de popularizar conceitos de estilo de vida, com mensagens dirigidas a diferentes grupos sociais. Como estilo de vida, usa-se o conceito defendido por Anthony Giddens, segundo o qual:

"Estilo de vida pode ser definido como um conjunto mais ou menos integrado de práticas que um indivíduo abraça, não só porque essas práticas preenchem necessidades utilitárias, mas porque dão forma material a uma narrativa particular de auto identidade." (GIDDENS, 2002, p.79.)

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27 Ou seja, para Giddens (2002), estilo de vida extrapola a definição do senso comum que a associa ao "consumo superficial". O estilo de vida está ligado às escolhas e ainda segundo o autor, determina um controle que aponta o que é adequado ou inadequado, tanto por parte do indivíduo como por parte de seus pares, ou seja, de seus grupos sociais.

Esse comportamento relacionado fortemente ao consumo e ao estilo de vida vem de décadas anteriores, em que a ditadura da moda sempre esteve presente, principalmente nos antigos ateliês onde as roupas eram feitas sob medida, e sempre buscando um padrão de elevação de status.

Lipovetsky, (1989, p.43), ao falar dos fenômenos de epidemia da moda, comenta sobre o desejo dos indivíduos de se assemelharem aos considerados superiores, gerando o fenômeno do mimetismo, que desde a aristocracia, até recentemente, propagou-se de cima para baixo, do superior ao inferior, ou seja, seguindo um modelo de comunicação extremamente vertical. Por exemplo, enquanto a nobreza mantinha os olhos de desejo pelas vestes do rei, a cidade, por sua vez, desejava ter as vestes da nobreza e assim sucessivamente permeando todas as classes sociais.

A moda causa o comportamento de desejo de imitação e diferenciação dos demais, gerando também uma corrida frenética contra o tempo: "O tempo da moda está constitutivamente adiantado a si mesmo e, exatamente por isso, também sempre atrasado, tem sempre a forma de um limiar inapreensível entre um 'ainda não' e um 'não mais'". (AGAMBEN,2009, p.67)

Morin (2006, p.128) comenta sobre a dinâmica de uma tendência. Seu pensamento pode ser apropriado no campo da moda, que se encontra em um constante ciclo, assim como qualquer tendência:

"O desenvolvimento de uma tendência é um fenômeno extremamente importante, mas extremamente complexo: a tendência é, por uma parte, um feedback positivo, um desvio que cresce por si mesmo; mas seu desenvolvimento é contido, combatido, freado pelos feedbacks negativos, do contrário ela seria epidemia, descontrole (run-away)."

Porém, como o autor afirma, quando a tendência se torna poderosa, surge a contra tendência, que traz um reequilíbrio induzido por um feedback negativo de grau profundo. Podendo fazer com que o antigo ressurja por meio de releituras, e "[...] por outra parte, a face da novidade e ruptura, com relação à tendência dominante que faz às vezes de norma." (MORIN, 2006, p.128)

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28 Um dos maiores desafios da moda é criar algo novo a fim de gerar uma tendência de consumo massificada por um determinado tempo. Assim, no campo da moda é frequente o uso das releituras de peças de épocas passadas, em que o novo, ou seja, a inovação que pode se tornar uma tendência, pode vir através de uma nova tecnologia, que sempre muda com o tempo.

No caso da camiseta, por se tratar de um formato conhecido, a novidade pode surgir através de uma interferência em sua superfície, porém o seu formato em letra T permanece o mesmo, caso contrário se descaracterizaria como tal. Dessa forma, a peça pode acompanhar o fluxo de uma tendência, porém mantém o seu formato, se desvinculando de certa forma da corrida contra o tempo, podendo contornar uma tendência.

Desde que houve a grande mudança de significado através dos jovens da década de 1960, que mudaram o significado da camiseta de undershirt para t-shirt, a peça passou a acompanhar os comportamentos de estilo, desejos e consumo de cada época. Ao falar de juventude e da marca que os jovens deixaram no uso da peça, fala-se de produção de subjetividades, exemplificadas através da micropolítica de Guattari (1992), ou seja, como os modos de subjetividade dominante são reproduzidos.

A camiseta torna-se uma ferramenta para constituir a vida dos indivíduos quando é utilizada como suporte de ideias, sendo um exemplo do que Guattari (1992) define como micropolítica no âmbito das revoluções moleculares, em que os fluxos e desejos se relacionam apoiados na subjetividade, diferente do que se conhece por política representativa, no sentido do que é público e da ciência de se governar um estado ou nação.

O caso das "Diretas já" é um exemplo histórico da dimensão política representativa e do uso da camiseta pela juventude, que teve relação direta com a micropolítica, ou seja, partiu dos desejos e subjetividades dos jovens, indo ao encontro da potência em comunicar mensagens, característica da peça.

A campanha histórica por eleições presidenciais diretas no Brasil em 1984 levou multidões para as ruas com um único desejo impresso em suas camisetas:

"Ao contrário dos grandes jornais e das tevês, as camisetas são veículos de divulgação, cujo controle é acessível ao grande público. Na medida em que o movimento se utiliza de recursos como esse, consegue ultrapassar o bloqueio e sair da clandestinidade, multiplica-se, ganha repercussão e acesso aos media eletrônicos. Sua utilização ampla, no caso, supriu a falta de jornais e tevês,

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29 conduziu a palavra de ordem do dia-a-dia, a todos os lugares. ” (MACIEL, 1988, p. 69)

Figura 4 - Diretas já e camiseta com o lema estampado Fonte: Livro "A História da Camiseta"2

As manifestações das "Diretas Já" podem ser comparadas com as manifestações de junho de 2013, ou "Manifestações dos Vinte Centavos", momento em que a população se uniu através de mídias sociais, marcando encontros em lugares públicos e reivindicar seus direitos. Antes mesmo da imprensa reportar as cenas e reivindicações, no peito dos milhares de brasileiros que foram para as ruas seus desejos de mudança já estavam descritos, seja representado por frases ou cores da bandeira brasileiras em suas camisetas. A camiseta acompanhou momentos históricos no Brasil e no mundo. E a qualquer momento, influências de décadas passadas podem ser expressas na peça. Como foi mencionado acima, no mundo da moda esses fenômenos são denominados influências ou releituras:

"No gesto mesmo no qual o seu presente divide o tempo segundo um 'não mais' e um 'ainda não', ela institui com esses 'outros tempos' - certamente com o passado e, talvez, também com o futuro - uma relação particular. Isto é, ela pode 'citar' e, desse modo, reatualizar qualquer momento do passado (anos 20, anos 70) [...]" (AGAMBEN, 2009, p. 68)

2 MACIEL, Luis Carlos. Vestindo Sonhos e Ideias. A História da Camiseta. São Paulo: Cia. Hering, 1988, p. 68.

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30 Apesar de ser uma peça que veste quaisquer tipos de corpose consequentemente gêneros, existem no mercado a camiseta 'feminina' e a camiseta 'masculina', ainda que mantendo sua forma modular T. O invólucro se mantém enquanto o corpo é que muda. É o corpo que dá forma para a camiseta, seja o de uma mulher preenchendo o volume através dos seios, seja pelo peitoral e braços mais fortes da maioria dos homens, ou até pelo corpo de uma criança.

Além das variações de gêneros que o mercado diferencia na hora da venda, há a variação de formas, que derivaram ou não da camiseta. Existe uma grande dificuldade de se classificar essas peças, pois, em dimensão continental, há a variação de região para região, além do fato de que no mercado do vestuário as nomenclaturas não são fixas, pois vão surgindo conforme os desejos e necessidades dos consumidores, e repassadas na cadeia da moda.

Esclarecido este detalhe, busca-se diferenciar as peças que se originaram do shape da camiseta:

Camiseta regata ou Regata

Trata-se de uma camiseta sem mangas, com a cava mais prolongada ou não. É usada por homens, mulheres e crianças. Comumente encontrada em meia malha ou malha canelada, podendo ser de algodão ou poliéster. Pode ser usada por baixo de camisas ou para praticar atividades esportivas, já que a opção sem manga possibilita maior mobilidade.

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31 Figura 5 - Regata masculina, muito utilizada para a prática de esportes

Foto: Camila Pasinato

Figura 6 - Regata Masculina com cava prolongada, da década de 1970, usada em um corpo feminino, em malha grossa de algodão

Foto: Camila Pasinato

Baby look

É uma peça definida culturalmente como sendo para mulheres por ser mais ajustada ao corpo. O nome em inglês, não se sabe o motivo específico, significa que ao usar a peça a mulher parece estar usando um tamanho menor ou uma camiseta infantil, ficando assim com uma "aparência de bebê" ou "baby look" em inglês.

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32 Figura 7 - Baby Look

Foto: Camila Pasinato

Um fato recente é a comercialização de baby looks masculinas, que possuem o mesmo significado que as consideradas femininas. Muitas vezes encontradas com um decote maior ou uma malha mais fina. Em outras marcas, são comercializadas como "camisetas masculinas slim", supõe-se que seja por uma questão de evidenciar mais a diferença entre a peça feminina e a masculina.

Percebe-se através do discurso a presença do conservadorismo na moda básica, na medida em que ainda designa o lado masculino e feminino pelos detalhes, quando há a segregação entre o justo, exemplificado pela baby look, como usada somente por mulheres. Porém há uma ruptura emergente entre essa divisão, quando surgem os casos de comercialização de baby looks masculinas, ainda que em muitas marcas troca-se o nome por camiseta masculina slim.

Figura 8 - Baby Look Masculina ou Camiseta com modelagem slim Foto: Camila Pasinato

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33 Camisa Polo ou Polo.

René Lacoste, tenista que deu origem a marca Lacoste, trouxe melhorias para a camisa polo. Ele, como muitos jogadores de tênis no início do século XX, sentia-se incomodado em seus movimentos com os trajes habituais de tênis, porque os jogadores tinham que usar camisas de um algodão grosso, de manga comprida, colarinho duro e gravata. Lacoste fez um suéter de mangas curtas de algodão branco e colarinho, modelo inspirado nos suéteres que os jogadores de polo usavam durante as partidas desde o século XIX.

Figura 9 - René Lacoste usando o modelo de polo que desenvolveu Fonte: Site "Moda para Homens" 3

Em seu design, constava um colarinho com botão, e este podia ser virado para cima para proteção extra contra o Sol. Até meados de 1930, a maioria dos jogadores de polo já vestia design Lacoste, que a esta altura já tinha se tornado uma marca. Tempos depois outras marcas surgiram com a réplica do modelo, como a Ralph Lauren em 1950. Os jovens, uma década depois, deram a ela um ar moderno, e em 1980 o modelo se popularizou através dos uniformes de estudantes universitários.4

Pode-se constatar que a Camisa Polo, por mais que tenha seu shape parecido com a camiseta, teve uma origem diferente. Provavelmente porque, naquela época, os tenistas continuaram usando por baixo de seus suéteres (que depois se tornariam mais semelhantes com o modelo de polo que se conhece hoje) a camiseta, que em meados de 1930 ainda era usada como underwear.

3 Disponível em: < http://modaparahomens.com.br/a-historia-da-camisa-polo/>. Acesso em 07 ago 2015. 4 Informações colhidas no site Moda para Homens. Disponível em: <http://modaparahomens.com.br/a-historia-da-camisa-polo/>. Acesso em 07 ago. 2015. E no portal Usefashion, para assinantes. Disponível em: <http://www.usefashion.com/Categorias/Home.aspx>. Acesso em 16 fev 2015.

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34 Hoje as características que marcam uma Polo são: colarinhos de ribana5, da própria malha com entretela, ou de tecido plano. Além disso, possuem abertura frontal na gola por botões e suas mangas podem vir com punhos de ribana. Quase todas possuem como detalhe um brasão personalizado.

Figura 10 - Camisa Polo masculina com detalhes de gola e punho em ribana e abertura frontal por botões Foto: Camila Pasinato

Figura 11 - Camisa Polo feminina com detalhes de gola em ribana e abertura frontal por botões. Algumas Polos femininas possuem aberturas mais decotadas e finas, como forma de valorizar o busto e deixar a

peça mais delicada Foto: Camila Pasinato

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35 Blusa

Sua origem vem da palavra em inglês blouse, porém há grandes dificuldades em se diferenciar a blusa da camiseta, uma vez que nos dicionários da língua portuguesa, por exemplo, de maneira geral a blusa é uma peça de roupa que vai dos ombros até a cintura, podendo ser feminina ou masculina. A camiseta também exerce a mesma função. Pode-se dizer que há variações de acordo com as regiões do Brasil. Em alguns estados, por exemplo, São Paulo, é comum usar a palavra blusa para delimitar blusas de lã ou material pesado de frio, dizendo assim "blusa de frio". Já em outros estados a palavra blusa se refere a uma peça feminina, podendo ser de tecido plano ou malha, com algum detalhe ou recorte diferenciado.

Para simplificar, pode-se dizer que a blusa é uma peça de roupa com mais informações do que a camiseta, podendo ser uma peça feminina, ou uma blusa de frio, usada por homens e mulheres.

Figura 12 - Blusa em malha mescla com recortes nas mangas com aplicações de paetê. A peça deixa de se caracterizar como uma camiseta, pois possui recortes e aplicações, descaracterizando o formato em "T"

Foto: Camila Pasinato

1.2 Saberes e matérias-primas

Para se compreender melhor sobre as matérias-primas que podem compor uma camiseta, será considerada a ordem de como são feitos os tecidos: primeiramente a fibra, que compõe o fio e que juntamente a outros fios formam o entrelaçamento de fios, ou ligamento têxtil, que quando unidos compõem o tecido.

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36 Figura 13 - Elementos de um tecido

Fonte: Livro Textile design: Materiali e tecnologie (tradução nossa)

1.2.1 Fibras Têxteis: a origem do processo produtivo

O mundo dos tecidos começa a partir das fibras têxteis naturais ou químicas, que são as matérias-primas fundamentais da indústria têxtil. De acordo com Costa, Lima e Rosa (2013, p.02) fibra têxtil é um termo geral que designa um corpo flexível, cilíndrico, pequeno, de reduzida seção transversal e elevada razão entre o comprimento e o diâmetro, em no mínimo cem vezes.

Figura 14 - Fibra têxtil

Fonte: Apostila de Fibras, fios e etiquetagem - Senai Cetiqt6

6 PEIXOTO, André. Introdução à tecnologia têxtil. Vol. 1: Fibras, fios e etiquetagem. Apostila: Senai-Cetiqt, Rio de Janeiro, 2005.p. 13

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37 O fio é o conjunto de fibras, torcidas ou dispostas juntas de maneira a formar um feixe contínuo que pode ser transformado em um tecido. O processo da formação de fios chama-se fiação.

Figura 15 - Fio têxtil

Fonte: Apostila de Fibras, fios e etiquetagem - Senai Cetiqt7

As fibras têxteis são divididas em naturais e químicas. Entre as naturais estão as de origem animal, vegetal e mineral. E entre as de origem química estão as artificiais, que são fibras obtidas de polímeros orgânicos naturais; sintéticas, que são obtidas de polímeros orgânicos sintéticos; e as não sintéticas, que são fibras inorgânicas, ou seja, derivadas de metal ou vidro.

Figura 16 - Quadro explicativo de fibras têxteis, montado com base nas informações extraídas de apostila de Materiais têxteis - UEL8

Montagem - Camila Pasinato

Para a fabricação de camisetas, a malha de algodão é a mais utilizada no mercado. Porém, com as intervenções tecnológicas das últimas décadas, a malha de poliéster se faz cada vez mais presente. Desta forma se dará ênfase nas duas fibras supracitadas.

7 PEIXOTO, André. Introdução à tecnologia têxtil. Vol. 1: Fibras, fios e etiquetagem. Apostila: Senai-Cetiqt, Rio de Janeiro, 2005.p. 13

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38 1.2.1.1 A fibra natural algodão: técnicas de produção e comercialização

O algodão é uma das primeiras fibras a serem utilizadas pelo homem. Segundo Vainsencher (2014) a palavra algodão "[...] deriva de al-quTum, na língua árabe, porque foram os árabes que, na qualidade de mercadores, difundiram a cultura do algodão pela Europa. Ela gerou os vocábulos cotton, em inglês, coton em francês; e, cotone, em italiano."

Uma das principais razões para o sucesso do algodão é a sua capacidade de absorção de umidade, fazendo com que a fibra absorva bem a transpiração humana, evaporando-se para o meio, gerando uma sensação de conforto no usuário, que muito combina com a camiseta.

O algodão é praticamente composto por celulose - 88,0 a 96,0 %; pectinas - 0,7 a 1,2 %; cera - 0,4 a 1,0 %; proteínas - 1,1 a 1,9 %; Cinzas - 0,7 a 1,6 % e outros compostos orgânicos - 0,5 a 1,0 (COSTA; LIMA; ROSA, 2013, p.03).

O algodoeiro é uma planta de clima quente, que não suporta o frio e requer solo argiloso ou arenoso. A cultura do algodão exige mão de obra numerosa, é colhida de forma manual ou através de processos mecanizados. Sua colheita pode durar várias semanas, pois nem todas as cápsulas se abrem ao mesmo tempo.

Quando o capulho do algodoeiro amadurece, abre e revela a matéria fibrosa que envolve as sementes. Após ser colhido, o algodão é levado pra usinas de beneficiamento, para se separar a fibra do caroço.

Figura 17 - Aspecto do fruto antes e depois da abertura Fonte: Apostila de Materiais Têxteis - UEL9

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39 Para proceder à classificação do algodão, são analisados o comprimento da fibra, seu tipo e finura. O tipo do algodão é determinado através da análise da cor, brilho e do grau de limpeza.

O comprimento da fibra varia aproximadamente de 28 a 41 milímetros. Quanto maior seu comprimento, melhor será o seu valor comercial. Por esta razão é que comumente divulga-se que o algodão egípcio é o melhor algodão do mundo, por seu maior comprimento e finura.

Figura 18 - Tabela de aplicação e comprimento da fibra de algodão Fonte: Site Embrapa10

Algumas das características do algodão são (SOLDATI, p.77, tradução nossa):  Fácil de lavar;

 Sofre um laceamento depois de lavado;  Fácil de rasgar;

 Encolhimento de cerca de 2 a 4%;  Ótima capacidade de absorção.

Dentre as várias espécies de algodão, uma delas tem obtido destaque: a Gossypium

barbadense, que dá origem ao que popularmente se conhece como algodão Pima, ou

algodão peruano. A espécie é nativa do Peru, e a mistura entre o clima da região, o solo e semente renderam ótimas características.

Outra diferença do algodão Pima para os demais é o fato de ser muito fino e longo. Características que fazem com que a fibra seja mais macia, brilhosa e com maior durabilidade.

10 EMBRAPA. Empresa Brasileira de Pesquisa Agropecuária. Disponível em: <

https://www.embrapa.br/tema-integracao-lavoura-pecuaria-floresta-ilpf/busca-de-noticias/-/noticia/3272256/brasil-podera-produzir-algodao-de-fibra-longa-para-tecidos-de-luxo>. Acesso em: 07 jul 2016.

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40 O que a torna especial como produto é o fato de sua fibra ser colhida manualmente, o que supostamente evitaria danos e preservaria mais suas características. Interessante ressaltar que as marcas que utilizam o algodão peruano se beneficiam aproveitando da imagem construída ao redor da fibra como sinônimo de conforto, pois o algodão Pima, assim como o algodão egípcio foi transformado em marca, sinônimo de conforto.

Figura 19 - Diferença entre a fibra do algodão Pima, no centro, e os demais Fonte: Site "Basico.Com" 11

Figura 20 - Camiseta de algodão Pima sendo vendida em loja da marca Hering Foto: Camila Pasinato

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41 Segundo a Abrapa (Associação Brasileira dos Produtores de Algodão), o algodão está entre as mais importantes culturas de fibras no mundo. Todos os anos, uma média de 35 milhões de hectares de algodão é plantada por todo o planeta.

Seguem outros dados relevantes encontrados no site da Abrapa:12

 A demanda mundial tem aumentado gradativamente desde a década de 1950, a um crescimento anual médio de 2%;

 O comércio mundial da fibra movimenta cerca de US$ 12 bilhões por ano e envolve mais de 350 milhões de pessoas em sua produção;

 A China, Índia, Estados Unidos, Paquistão e Brasil despontam como os principais produtores da fibra;

 O Brasil é o terceiro país exportador e o quinto maior consumidor, com quase 1 milhão de toneladas por ano.

Figura 21 - Imagem da produção em toneladas, por região do Brasil Fonte: Site Abrapa13

12 ABRAPA. Associação Brasileira dos Produtores de Algodão. Disponível em: <http://www.abrapa.com.br/estatisticas/Paginas/Algodao-no-Mundo.aspx>. Acesso em: 22 mar 2015. 13ABRAPA. Associação Brasileira dos Produtores de Algodão. Disponível em: <http://www.abrapa.com.br/estatisticas/Paginas/Algodao-no-Mundo.aspx>. Acesso em: 22 mar 2015.

(42)

42 Atualmente, segundo a Embrapa14, quase cem por cento da produção do Brasil é classificada como fibra média, ou seja, em torno de 28 milímetros. Porém existe uma demanda nacional, em torno de 3%, por fibras longas, que precisam ser importadas do Egito, Peru ou Estados Unidos.

Existem pesquisas em andamento para o cultivo de fibras longas no Brasil, derivadas do cruzamento de fibras peruanas, norte americanas ou egípcias. Elas estão sendo avaliadas em ensaios nos campos experimentais da Embrapa, e em alguns anos poderá ser possível a plantação dessa espécie adaptada aos solos brasileiros.

1.2.1.2 A fibra química poliéster: técnicas de produção e comercialização

A matéria-prima básica do Poliéster (PES) é o p-xileno. Deste composto obtém-se o Benzeno-1,4-Ácido dicarboxílico, mais conhecido como Ácido Tereftálico (ATF); o Dimetil Benzeno- 1,4-Dicarboxilato, conhecido por Dimetiltereftalato (DMT) e o Etanodiol, conhecido como Etileno glicol (ETG). (COSTA; LIMA; ROSA, 2013, p.05).

Figura 22 - Algumas das cadeias que compõem o poliéster Fonte: Livro Textile design: Materiali e tecnologie 15

"De todas as fibras químicas, o poliéster é a que apresenta maior versatilidade." (SOLDATI, 2008, p.82, tradução nossa). Existem vários tipos de poliéster e consequentemente várias aplicações, desde fibras têxteis a vários tipos de plásticos.

14 EMBRAPA. Empresa Brasileira de Pesquisa Agropecuária. Disponível em: <

https://www.embrapa.br/tema-integracao-lavoura-pecuaria-floresta-ilpf/busca-de-noticias/-/noticia/3272256/brasil-podera-produzir-algodao-de-fibra-longa-para-tecidos-de-luxo>. Acesso em: 07 jul 2016.

15 FRASSINE, Roberto. Parte Prima. In: Textile design: Materiali e tecnologie. Milano: Francoangeli, 2008, p. 51.

Referências

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