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A estagnação da taxa de ocupação e o fim precoce do bônus demográfico

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VII Congresso da Associação Latino Americana de População XX Encontro Nacional de Estudos Populacionais

A estagnação da taxa de ocupação e o fim precoce do bônus demográfico

José Eustáquio Diniz Alves1 (ENCE/IBGE)

Suzana Cavenaghi2 (ENCE/IBGE)

Sessão: Mercado de trabalho na América Latina. Mudanças e tendências nos anos 2000

1 Professor e Pesquisador do Programa de Pós-Graduação em População, Território e Estatísticas Públicas da Escola Nacional de Ciências Estatísticas – ENCE/IBGE

2 Professora e Pesquisadora do Programa de Pós-Graduação em População, Território e Estatísticas Públicas da Escola Nacional de Ciências Estatísticas – ENCE/IBGE

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A estagnação da taxa de ocupação e o fim precoce do bônus demográfico

RESUMO

O trabalho é um direito fundamental de todos os cidadãos e cidadãs. O pleno emprego e o trabalho descente é uma bandeira fundamental da Organização Internacional do Trabalho (OIT). Se esta bandeira é válida para todas as pessoas, é especialmente válida para as mulheres, pois na maioria dos países, elas possuem menor inserção no mercado de trabalho, menor grau de cobertura da legislação trabalhista, maior grau de informalidade e menores níveis de remuneração. O relatório “El Progreso de las Mujeres en el Mundo 2015-2016: Transformar las economías para realizar los derechos”, divulgado pela ONU Mulheres, no final de 2015, mostra que na média mundial existe uma tendência à estagnação das taxas de participação de ambos os sexos, mas a América Latina e o Caribe (ALC) foi a região que apresentou o maior incremento na taxa de atividade feminina entre 1990-2013. Se estas tendências se mantivessem a ALC poderia atingir níveis de participação feminina próximos àquelas do Leste Asiático. Porém, a América Latina entrou em recessão em 2015 e deve repetir o baixo crescimento em 2016, conforme dados da Cepal. Este fato já está afetando o desempenho do mercado de trabalho em toda a região. O Brasil, país mais populoso da ALC, vinha apresentado um consistente crescimento da taxa de atividade feminina entre 1950 e 2012. Os dados sócio-demográficos mostram que, durante seis décadas, houve redução das desigualdades sociais entre homens e mulheres no Brasil, inclusive redução nos diferenciais de atividade e rendimento. O empoderamento das mulheres e o bônus demográfico feminino deram uma contribuição fundamental ao desenvolvimento do país. Porém, desde 2013, o Brasil tem sofrido com redução do emprego em geral e, particularmente, a redução da taxa de ocupação feminina. O objetivo deste texto é discutir a crise recente no mercado de trabalho e como o processo de envelhecimento e o fim precoce do bônus demográfico feminino no Brasil, vão ter impacto na qualidade de vida da população e nas perspectivas futuras do país e da região.

Sessão: Mercado de trabalho na América Latina. Mudanças e tendências nos anos 2000

INTRODUÇÃO

A economia clássica considera o trabalho a fonte de toda riqueza. A Declaração Universal dos Direitos Humanos, de 1948, estabelece no Artigo 23° que: “Toda a pessoa tem direito ao trabalho, à livre escolha do trabalho, a condições equitativas e satisfatórias de trabalho e à proteção contra

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o desemprego”. Ao longo do tempo, o trabalho passou a ser entendido como um direito que viabiliza a autonomia dos indivíduos. Os homens sempre tiveram taxas de atividade extra-domésticas mais elevadas do que as das mulheres. Mas com o processo de desenvolvimento (maior urbanização, maiores taxas de educação, etc.) e a transição demográfica (que possibilitou a queda das taxas de mortalidade e natalidade) diversas oportunidades foram abertas para as mulheres e o hiato de gênero (gender gap) na inserção produtiva foi reduzido.

Durante mais de 150 anos, desde a polêmica entre Condorcet, Godwin e Malthus, ainda no final do século XVIII, a preocupação central dos economistas e demógrafos era com os efeitos do crescimento populacional sobre o crescimento econômico e a geração de emprego e renda (ALVES, 2002). Porém, após a publicação, em 1958, do livro “População e desenvolvimento econômico”, de Coale e Hoover (1966), a questão da estrutura etária passou a ter reconhecimento crescente nas análises teóricas sobre o desenvolvimento e a melhoria das condições de vida da população. A razão de dependência demográfica (coeficiente entre o segmento etário da população definido como economicamente dependente - os menores de 15 anos de idade e os maiores de 60 ou 65 anos - e o segmento etário potencialmente produtivo - entre 15 e 60 ou 64 anos) passou a ser uma variável chave nas análises.

De maneira sintética, podemos definir o Bônus demográfico como sendo uma janela de oportunidade que acontece no momento em que a estrutura etária da população possibilita uma redução da razão de dependência, em decorrência de uma maior proporção de pessoas em idade produtiva e uma menor proporção de pessoas em idades dependentes (idosos e crianças). Se bônus demográfico é acompanhado de melhorias das condições gerais de saúde, educação e emprego ele possibilita o incremento das taxas de poupança e investimento (acelerando o crescimento econômico), a redução da pobreza, o aumento da renda per capita, a elevação dos níveis de produtividade e a melhoria das condições de vida da população.

O conceito de bônus demográfico (também se usa dividendo demográfico ou janela de oportunidade demográfica) começou a tomar corpo e a se difundir na academia na década de 1990, mas se difundiu mais amplamente no início do século XXI com a publicação do livro "Population matters: demographic change, economic growth, and poverty in the developing world” (BIRDSALL, KELLEY, SINDING), em 2001, e de artigos tais como "The Demographic Dividend: A New Perspective on the Economic Consequences of Population Change” (BLOOM,

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CANNING, SEVILLA, 2003) e "A Research Plan for the Macroeconomic Demography of Intergenerational Transfers” ( Lee, Mason, 2004)

No Brasil, dois trabalhos pioneiros mostraram o lado positivo das mudanças da estrutura etária para a economia e o bem-estar (Martine, Carvalho e Arias, 1994; Carvalho e Wong, 1995). Mas foi nos anos 2000 que a discussão do bônus demográfico avançou no meio acadêmico e na mídia brasileira, a partir de diversos trabalhos desenvolvidos no âmbito da ABEP (Alves, 2004; Turra e Queiroz, 2005; Rios-Neto, 2005; Alves e Bruno, 2006). Todos estes artigos mostraram que a transição demográfica gera uma janela de oportunidade que é única e essencial para o processo de desenvolvimento. Como diz relatório do UNFPA (2014): “O bônus demográfico é o potencial de crescimento econômico que pode resultar de mudanças na estrutura etária da população, principalmente quando a proporção da população em idade ativa (15 a 64 anos) é maior do que a parcela da população que não se encontra em idade economicamente ativa” (p. 12). Este fenômeno também se observa na América Latina e da península Ibérica, como mostra o trabalho de Saad Miller, Martínez e Holz (2012).

O BÔNUS DEMOGRÁFICO NO BRASIL

No Brasil, com o aumento e a diversificação do consumo, os avanços da medicina, da higiene (saneamento básico), da urbanização e da melhora das condições de vida, as taxas de mortalidade infantil caíram rapidamente depois da Segunda Guerra Mundial. Houve aumento do número de crianças sobreviventes e, em um contexto de famílias numerosas, a base da pirâmide populacional cresceu entre 1950 e 1970, gerando um rejuvenescimento ainda maior da população (a idade mediana estava abaixo de 20 anos). Mas o início do processo de transição da estrutura etária começou concomitantemente à redução das taxas de fecundidade que, na média nacional, teve início na segunda metade da década de 1960.

O fenômeno do bônus demográfico brasileiro pode ser compreendido pelos dados apresentados no gráfico 1 que mostram o aumento do percentual da População Economicamente Ativa (PEA) em relação à população total do país. A PEA passou de 17 milhões de pessoas, em 1950, para 93,5 milhões, em 2010, um crescimento de 5,5 vezes, enquanto a população total passou de 51,9 milhões de habitantes, em 1950, para 191 milhões em 2010, um crescimento de 3,7 vezes. A percentagem da PEA total sobre a população total teve um pequeno declínio entre 1950 e 1970, mas cresceu continuamente nas quatro décadas seguintes. Em 1970, a população economicamente

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ativa (PEA) representava 31,3% da população total, passando para 49% em 2010. Ou seja, antes da transição da fecundidade havia aproximadamente uma pessoa na PEA para cada duas pessoas fora da PEA e a renda originária do trabalho era repartida, na média, por três pessoas. Em 2010, a PEA chegou a quase 50%, significando que uma renda passou a ser repartida somente entre duas pessoas. Desta forma, somente pelo efeito da mudança da estrutura etária, ceteris paribus, a renda dos trabalhadores cresceu cerca de 50% entre 1970 e 2010.

Gráfico 1: População Economicamente Ativa (PEA), total e por sexo, como percentagem da população total. Brasil: 1950-2010

Fonte: IBGE, Censos Demográficos de 1950 a 2010

Ou seja, houve uma queda da razão de dependência (RD), em decorrência da transição demográfica. A razão de dependência vem caindo no Brasil desde 1970 e deve atingir seu ponto mais baixo entre 2015 e 2025. Isto quer dizer que o Brasil está passando pelo melhor momento do seu bônus demográfico. O período exato depende da forma como se mede a razão de dependência. Se adotarmos o período de idade produtiva como sendo de 15 a 59 anos e as idades dependentes como sendo de 0 a 14 anos e 60 anos e mais, então a RD estará em seu nível mais baixo (55,9%) entre 2015 e 2018 (lembrando que a pessoa idosa no Brasil é definida a partir dos 60 anos, conforme o Estatuto do Idoso). Se adotarmos a definição de população em idade ativa como sendo de 15 a 64 anos, então a RD estará em seu nível mais baixo (43,4%) entre os anos de 2021 e 2024. Assim, a conjugação de uma maior proporção da população brasileira participando da PEA e com

0 10 20 30 40 50 60 1950 1960 1970 1980 1991 2000 2010 %

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maiores níveis educacionais caracteriza uma população com direitos e com força produtiva para fazer avançar as condições de vida (Wajnman e Machado, 2003).

Ter maior proporção de produtores líquidos em relação aos consumidores líquidos é garantia essencial da decolagem do desenvolvimento. O nível mais baixo da razão de dependência (RD) varia em função da definição de qual é a população em idade ativa e a população dependente. Mas qualquer que seja o critério adotado, a RD vai começar a subir inevitavelmente. Subirá ou em 2019 ou em 2025. Portanto, o Brasil teria, estruturalmente falando, em torno de 10 anos para colher os últimos ventos favoráveis da estrutura etária. Esta oportunidade única não deveria ser desperdiçada se o Brasil quiser dar um salto no processo de desenvolvimento para garantir bem-estar e qualidade de vida para sua população. Contudo, como veremos mais à frente, a atual crise econômica está comprometendo as condições demográficas favoráveis, como nunca se viu antes na história do país.

O crescimento da PEA brasileira não foi neutro em termos de gênero. Ao contrário, entre 1950 e 2010, a PEA masculina cresceu 3,6 vezes, enquanto a PEA feminina cresceu 16 vezes. Os homens passaram a entrar mais tarde e sair mais cedo da força de trabalho. As taxas de atividade masculinas caíram de 80,8% em 1950 para 67,1% em 2010, enquanto a taxa de atividade feminina passou de 13,6% para 48,9% no mesmo período. Ou seja, as mulheres foram a locomotiva do crescimento do mercado de trabalho brasileiro e deram uma contribuição inestimável ao desenvolvimento do país.

O crescimento da participação feminina no mercado de trabalho brasileiro está bem documentado na literatura, como no livro “Trabalho e Gênero: mudanças, permanências e desafios”, organizado por Maria Isabel Baltar da Rocha (2000), a partir de um seminário ocorrido no âmbito da ABEP. No artigo “Quantas serão as mulheres: cenários para a atividade feminina”, Wajnman e Rios-Neto (2000) apresentam cenários que indicam a maior inserção da mulher no mercado de trabalho, especialmente a maior incorporação das mulheres de maior idade mediana e mais escolarizadas. Os autores mostram que a despeito da tendência de crescimento da taxa de atividade feminina seria pouco provável se atingir a paridade de gênero no mercado de trabalho, embora os diferenciais devessem ser reduzidos.

De fato, a queda das taxas de fecundidade e de mortalidade infantil têm um efeito sobre toda a sociedade, mas transformam em especial a vida das mulheres. Podendo dedicar menos tempo às tarefas de reprodução e de cuidado dos filhos, as mulheres passam a ter mais tempo para cuidar de

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si próprias e de se incorporar ao mercado de trabalho. Adicionalmente, o aumento da esperança de vida elevou o ciclo de vida produtivo da mulher e, juntamente com o aumento das taxas de escolaridade, aumentou o capital humano feminino. O empoderamento das mulheres possibilita o surgimento de um bônus demográfico feminino, pois as mulheres passaram a se dedicar mais tempo às atividades produtivas, elevando o montante de trabalho do país, em termos quantitativos e qualitativos.

Em 1950, cerca de quatro quintos dos homens de 10 anos ou mais de idade estavam no mercado de trabalho. Eles entravam cedo e saiam tarde da atividade econômica. Porém, com o processo de modernização do país, os homens foram ficando mais tempo na escola e passaram a sair mais cedo da força de trabalho devido ao aumento da cobertura da previdência social. Em 2010, a taxa de atividade masculina caiu para dois terços, sendo que as maiores quedas se deram nos extremos da curva. Já no caso das mulheres houve aumento das taxas de atividade em todas as idades. A taxa de atividade feminina era de apenas 13,6% em 1950 e passou para 48,9% em 2010. A curva de 1950 tinha a cúspide na idade 15-19, caindo para as idades posteriores. Para os anos de 1970 e 1980 a cúspide estava na faixa etária de 20-24 anos, caindo para as idades posteriores. Porém, a partir de 1991 as taxas de atividade feminina continuaram crescendo até o grupo etário 30-39 anos e só apresentando uma tendência de queda rápida a partir dos 49 anos. Ou seja, o padrão das taxas específicas de atividade de homens e mulheres ficaram mais parecidas ao longo das últimas 6 décadas, havendo apenas diferença de nível.

Reforçando a análise anterior, o artigo “Participação da mulher no mercado de trabalho e desigualdade da renda domiciliar per capita no Brasil: 1981-2002” de Rodolfo Hoffmann e Eugênia Leone mostra que a maior inserção feminina significou:

“Uma diminuição da contribuição da renda do trabalho masculino e, de outro, um crescimento da contribuição da renda do trabalho das mulheres, bem como da renda proveniente de aposentadorias e pensões, para a desigualdade da distribuição da renda domiciliar per capita. O aumento da contribuição da renda do trabalho feminino para a desigualdade reflete, essencialmente, forte aumento da proporção dessa parcela no rendimento domiciliar” (p. 35).

Numa visão de longo prazo, o gráfico 2 também mostra que a PEA feminina representava apenas 4,8% da população total do Brasil em 1950. Este número subiu ligeiramente para 6,6% em 1970 e depois deu um salto para 21,3% em 2010. O mais significativo a ser destacado é que o bônus

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demográfico brasileiro foi quase que inteiramente gerado pelo aumento da PEA feminina, especialmente das mulheres com maiores níveis educacionais.

Se a taxa de atividade feminina tivesse ficado constante entre 1950 e 2010 não teria ocorrido o bônus demográfico no Brasil. Sem dúvida, o aproveitamento, mesmo que parcial, do bônus demográfico feminino foi uma das forças responsáveis pelos avanços na qualidade de vida da população brasileira entre 1970 e 2010. Porém, o bônus demográfico feminino está ameaçado pela crise do mercado de trabalho e pelo baixo desempenho da economia brasileira na segunda década do século XXI.

A ESTAGNAÇÃO DA TAXA DE ATIVIDADE FEMININA E O CRESCIMENTO DO DESEMPREGO

O crescimento da taxa de atividade feminina foi significativo entre 1950 e 2010 e houve diminuição do hiato de gênero. Contudo, para a continuidade desse processo seria necessário que os ganhos continuassem entre 2010 e 2030, pois só assim o bônus demográfico feminino poderia ser colhido, possibilitando que a sociedade e as famílias se beneficiassem dos benefícios esperados. A interrupção dos ganhos na taxa de atividade feminina pode ser comprovada pela Pesquisa Mensal de Emprego (PME), do IBGE, que fornece informações atualizadas do mercado de trabalho para as seis maiores regiões metropolitanas do país (Recife, Salvador, Belo Horizonte, Rio de Janeiro, São Paulo e Porto Alegre). O gráfico 2 mostra que tanto a taxa de atividade (PEA/PIA) masculina, quanto a feminina, cresceram entre 2002 e 2012. A taxa de atividade masculina passou de 66,2% em março de 2002 para 67,2% em dezembro de 2012, enquanto a taxa feminina passou de 45,2% para 50,4% no mesmo período. Porém, as taxas de atividade caíram, para ambos os sexos, diminuindo para 63,3% no caso dos homens e para 46,6% no caso das mulheres, em fevereiro de 2016. A taxa de atividade só não caiu mais porque o desemprego aumentou. A taxa de atividade masculina estava em fevereiro de 2016 um pouco abaixo de março de 2002 e a taxa de atividade feminina estava um pouco acima em relação ao começo da série. A diferença entre as taxas de homens e mulheres (hiato de gênero) diminuiu entre 2002 e 2009, mas se manteve aproximadamente constante nos anos seguintes.

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Gráfico 2: Taxa de Atividade de homens e mulheres e hiato de gênero, nas seis Regiões Metropolitanas, Março de 2002 a Fevereiro de 2016

Fonte: IBGE, Pesquisa Mensal de Emprego (PME)

Analisando a taxa de ocupação - representada pela população ocupada (PO) dividida pela população em idade ativa (PIA) - ainda com base na PME, observamos no gráfico 3 que as taxas para ambos os sexos crescem entre 2002 e 2012, iniciando uma queda em seguida. A taxa de ocupação masculina subiu de 58,9% em março de 2002 para 64,5% em dezembro de 2012 e a taxa feminina subiu em ritmo mais elevado passando de 38,2% para 47,6% no mesmo período.

Gráfico 3: Taxa de Ocupação (PO/PIA), por sexo, nas seis Regiões Metropolitanas Março de 2002 a fevereiro de 2016

Fonte: IBGE, Pesquisa Mensal de Emprego (PME) 0 10 20 30 40 50 60 70 80 m ar /02 n o v/ 02 ju l/03 m ar /04 n o v/ 04 ju l/05 m ar /06 n o v/ 06 ju l/07 m ar /08 n o v/ 08 ju l/09 m ar /10 n o v/ 10 ju l/11 m ar /12 n ov /12 ju l/13 m ar /14 n o v/ 14 ju l/15 m ar /16 %

Hiato de gênero Homem Mulher

35 40 45 50 55 60 65 70 m ar /02 d ez/0 2 se t/03 ju n /04 m ar /05 d ez/0 5 se t/06 ju n /07 m ar /08 d ez/0 8 se t/09 ju n /1 0 m ar /11 d ez/1 1 se t/12 ju n /13 m ar /14 d ez/1 4 se t/15 % Homem Mulher

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Mas em fevereiro de 2016 a taxa de ocupação masculina voltou para o mesmo nível do início da série e a taxa de ocupação feminina caiu para 42,3%, cinco pontos abaixo do pico da série, mas assim mesmo, quatro pontos acima do nível de março de 2002. O hiato de gênero foi reduzido, mas a queda recente das taxas de ocupação é ruim para ambos os sexos.

O gráfico 4 mostra que as taxas de desocupação de homens e mulheres caíram bastante entre 2002 e 2014. Este fato contrasta com os dados anteriores, pois as taxas de atividade não cresceram na mesma proporção. Isto quer dizer que muitas mulheres não entraram no mercado de trabalho ou se aposentaram precocemente. A taxa de desocupação feminina atingiu o nível mais baixo (5%) no final de 2014. Mas houve um forte aumento chegando a 6,3% para os homens e 7,6% para as mulheres em dezembro de 2015. Em fevereiro de 2016 as taxas foram respectivamente de 7,3% e 9,2%, mantendo o padrão de um maior desemprego entre as mulheres.

Gráfico 4: Taxa de desocupação de homens e mulheres em seis Regiões Metropolitanas. Março de 2002 a Fevereiro de 2016

Fonte: IBGE, Pesquisa Mensal de Emprego (PME)

Embora a taxa de desemprego tenha caído entre 2004 e 2014 nas regiões metropolitanas mais dinâmicas do país, o desemprego entre jovens continuou elevado e acima de dois dígitos. Para os jovens de 15 a 17 anos o desemprego caiu da faixa de 40% entre 2002 e 2009 para 25% entre 2010 e 2014, mas voltou para níveis acima de 40% em 2016. Entre os jovens de 18 a 24 anos o desemprego que estava em torno de 25% no início da série, caiu para algo em torno de 15% até

0 2 4 6 8 10 12 14 16 18 m ar /02 se t/02 m ar /03 se t/03 m ar /04 se t/04 m ar /05 se t/05 m ar /06 se t/06 m ar /07 se t/07 m ar/08 set/08 m ar /09 se t/09 m ar /10 se t/10 m ar /11 se t/11 m ar /12 se t/12 m ar /13 se t/13 m ar /14 se t/14 m ar/15 set/15 m ar /16 % Homem Mulher

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2014 e voltou para o nível dos 20% em 2016. Como mostrou Alves (2016) a atual crise brasileira está parindo uma geração perdida” (p. 32).

A manutenção de altas taxas de desemprego entre os jovens em um momento em que as taxas gerais de desemprego estavam caindo não é um fato esperado pela teoria econômica. Segundo o demógrafo americano Richard Easterlin (1975) “coortes menores tendem a ter melhores oportunidades no mercado de trabalho e na educação”. Portanto, o Brasil, que vive a fase do bônus demográfico, tem uma chance única de avançar com a inclusão social de seus adolescentes e jovens.

Mas o mais preocupante é que existe uma parte dos jovens brasileiros que nem trabalham e nem estudam. É a chamada geração nem-nem (Alves, Cavenaghi, 2014). É preocupante, pois quanto maior o número de jovens fora da população economicamente ativa (PEA) e fora da escola, menores são os benefícios do bônus demográfico. Segundo estudo das demógrafas Ana Amélia Camarano e Solange Kanso (2012), do IPEA, existiam 8,1 milhões de jovens (de 15 a 29 anos) que estavam fora da escola e do mercado de trabalho em 2000 (16,9% da população jovem), atingindo 8,8 milhões (17,2%) em 2010. Segundo as autoras: “Esse crescimento foi diferenciado por sexo. Enquanto o contingente masculino aumentou em 1.107 mil pessoas, o de mulheres diminuiu em 398 mil. Do total de homens jovens, 11,2% encontravam-se na condição de não estudar e não trabalhar em 2010. Entre as mulheres, o percentual foi bem mais elevado, 23,2%, apesar do percentual de homens ter aumentado e o de mulheres diminuído. Do total de jovens que não estudavam e não participavam do mercado de trabalho, 67,5% era composto por mulheres, embora esta participação venha decrescendo desde os anos 1980” (p. 38).

Ainda de acordo com o estudo, aproximadamente dois terços das mulheres que não estudavam e não trabalhavam eram casadas e 61,2% já tinham filhos em 2010. Portanto, eram mulheres que dedicavam a maior parte do seu tempo aos afazeres reprodutivos, que não são contabilizados nas Contas Nacionais. Muitas dessas mulheres engravidaram por não terem alternativas de progresso social e por não terem acesso aos métodos de regulação da fecundidade. Estas mulheres sofrem com o círculo cumulativo da falta de direitos: no trabalho, na educação e na falta de acesso aos direitos sexuais e reprodutivos. O crescimento do número de homens que não estudam e não trabalham é também preocupante, pois além de ser um desperdício do potencial humano, em termos macroeconômico, reflete a falta de oportunidade de trabalho decente, que é um direito humano básico.

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O crescimento do número de jovens “nem-nem” entre 2009 e 2012 é um fato não esperado, pois 2009 foi ano de recessão econômica, mas os anos de 2010 a 2012 apresentaram crescimento do PIB e isto deveria ter aberto oportunidades para os jovens na escola e no mercado de trabalho. Existem diversas pessoas que dizem que o Brasil, devido à queda nas taxas de fecundidade, estaria passando por um processo de “apagão de mão-de-obra”. Contudo, estes dados sobre a geração “nem-nem” mostram o quanto o Brasil está distante de atingir a situação de pleno emprego e de engajar sua juventude em atividades que sejam engrandecedoras dos indivíduos e de uma nação justa, prospera e ambientalmente sustentável. O número absoluto de jovens está diminuindo no Brasil. Este seria o momento para se investir nos direitos da juventude, permitindo que façam a transição para a vida adulta de maneira tranquila, saudável e produtiva. O futuro do país depende da inserção social e da boa qualidade de vida das novas gerações (Camarano, Kanso, 2012). Ou seja, não se trata de criminalizar os jovens por serem nem-nem, mas avaliar como as políticas públicas não estão dando conta de incorporar a juventude no mercado de trabalho e na escola de qualidade, especialmente os jovens das camadas mais pobres da população. Além disto, muitas jovens das camadas pobres não possuem acesso aos serviços de saúde reprodutiva e ficam grávidas em um momento não planejado e não possuem apoio de creches para conciliar as tarefas dos cuidados familiares com a inserção produtiva.

Com a estagflação de 2015 e 2016, a taxa de ocupação (principalmente do emprego formal) tende ao colapso, podendo antecipar de maneira definitiva o fim do bônus demográfico geral e, em particular, provocando o fim do bônus demográfico feminino, como veremos a seguir.

A CRISE DO BÔNUS DEMOGRÁFICO EDUCACIONAL

Para que o bônus demográfico tenha seus efeitos positivos no processo de desenvolvimento e na melhoria das condições de vida da população é necessário o aumento da esperança de vida, o aumento da taxa de ocupação, acompanhada de maior formalização do mercado de trabalho e a elevação das taxas de matricula e dos anos médios de estudo. A chave para o desenvolvimento justo e inclusivo é o aumento do “capital humano” e da produtividade geral dos fatores econômicos. Artigo de Sergei Soares (2008), mostra que o Brasil está passando pela fase do bônus demográfico na escola, tanto em termo relativo quanto absoluto. Ele diz:

“Nas sociedades modernas quase toda a renda é produzida por adultos em idade de trabalhar. Isto quer dizer que a renda nacional e, por extensão, os recursos privados e

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públicos disponíveis para tudo, incluindo educação, dependem do tamanho da população adulta (e de muitas outras variáveis, é claro). Por outro lado, o volume de recursos, tanto privados como públicos, necessários para educar crianças, depende do tamanho da população em idade escolar. A conclusão inescapável é que quanto maior a razão população em idade escolar–população adulta, menor serão os recursos potenciais por aluno” (p.8).

O gráfico 5 mostra o crescimento da população ocupada por nível educacional nas seis regiões metropolitanas cobertas pela PME. A população ocupada passou de 36,6 milhões de pessoas em março de 2002 para 45,3 milhões em fevereiro de 2016. O número de pessoas ocupadas com menos de 11 anos de estudo caiu de 24,7 milhões em março de 2002 para 21,8 milhões em fevereiro de 2016. No mesmo período, o número de pessoas com 11 anos de estudo ou mais deu um salto de 11,9 milhões para 23,5 milhões de pessoas. Uma população ocupada com maiores níveis educacionais é o caminho correto para a maior eficiência econômica, com retornos crescentes para as pessoas e as famílias.

Gráfico 5: População ocupada (PO) por nível educacional, nas seis regiões metropolitanas, Março de 2002 a fevereito de 2016

Fonte: IBGE, Pesquisa Mensal de Emprego (PME)

O gráfico 6 mostra a taxa de ocupação (PO/PIA) por nível educacional nas seis regiões metropolitanas cobertas pela PME. Nota-se que a taxa de ocupação da população com menor nível educacional que estava em 39,4% em março de 2002 não cresceu em nenhum momento da série e

0 5.000 10.000 15.000 20.000 25.000 30.000 m ar /02 se t/02 m ar /03 se t/03 m ar /04 se t/04 m ar /05 se t/05 m ar /06 se t/06 m ar /07 se t/07 m ar /08 se t/08 m ar /09 se t/09 m ar /10 se t/10 m ar /11 se t/11 m ar /12 se t/12 m ar /13 se t/13 m ar /14 se t/14 m ar/15 set/15 m ar /16 N ú m e ro d e p e ssoas ( e m m il)

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começou a cair a partir de dezembro de 2012, chegando a 33,2%. A taxa de ocupação da população com 11 ou mais anos de estudo subiu de 65,5% em março de 2002 para 73% em dezembro de 2012, caindo em seguida até atingir 65,1%. Ou seja, o percentual de população mais educada ocupada ficou no mesmo nível no início e no final da série da PME. Mas pelo efeito de composição, a taxa de ocupação total aumentou de 47,9% em março de 2002 para 49,8% em fevereiro de 2016. De fato, o aumento dos níveis educacionais no Brasil nos primeiros 12 anos do século XXI foram positivos para o aumento da taxa de ocupação no mercado de trabalho e contribuiu para o aumento da renda per capita, a redução da pobreza e o crescimento da chamada “classe média”. Mas o quadro mudou a partir de 2013 e o mercado de trabalho entrou em colapso em 2015 e 2016. Se a situação não mudar nos próximos anos o Brasil pode estar jogando fora o seu bônus educacional, o que compromete o processo de desenvolvimento e melhoria da qualidade de vida.

Gráfico 6: Taxa de ocupação (PO/PIA) por nível educacional, nas seis regiões metropolitanas, março de 2002 a fevereito de 2016

Fonte: IBGE, Pesquisa Mensal de Emprego (PME)

Em março de 2002 havia 1,6 milhão de pessoas desempregadas com menos de 11 anos de estudo e 967 mil desempregados com 11 ou mais anos de estudo. No final da série, a situação tinha se invertido, pois em fevereiro de 2016 havia 716 mil pessoas desempregadas com menos de 11 anos de estudo e 1,3 milhão de pessoas desempregadas com 11 ou mais anos de estudo, como mostra o gráfico 7. Portanto, a crise brasileira atual está desperdiçando o potencial produtivo das pessoas mais escolarizadas, o que significa o não aproveitamento do bônus demográfico educacional.

0 10 20 30 40 50 60 70 80 m ar /02 n o v/ 02 ju l/03 m ar /04 n o v/ 04 ju l/05 m ar /06 n o v/ 06 ju l/07 m ar /08 n o v/ 08 ju l/09 m ar /10 n o v/ 10 ju l/11 m ar /12 n o v/ 12 ju l/13 m ar /14 n o v/ 14 ju l/15 m ar/16

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Gráfico 7: População desocupada, por nível educacional, nas seis regiões metropolitanas março de 2002 a fevereito de 2016

Fonte: IBGE, Pesquisa Mensal de Emprego (PME)

O FIM DO BÔNUS DEMOGRÁFICO E OS DESAFIOS DO ENVELHECIMENTO POPULACIONAL

Existe uma relação muito forte entre o crescimento do Produto Interno Bruto (PIB) e a geração de emprego e renda. Mas entre 2010 e 2015 houve queda do desempenho econômico do Brasil e América Latina e Caribe (ALC). Em 2010, o crescimento econômico do Brasil foi de 7,6% e da ALC foi de 6,1%. Este ritmo foi caindo e a economia entrou em recessão em 2015, com queda do PIB de 3,8% no Brasil e de 0,3% na ALC. Em 2016, a previsão do FMI é de repetição da queda de 3,8% no Brasil e uma recessão de 0,5% na ALC. O Brasil, como o maior país da região, contribuiu para puxar o PIB latino-americano para baixo. Evidentemente, esta recessão provocou uma queda ainda maior da renda per capita, influindo decisivamente para o aumento da pobreza e do desemprego. 0 200 400 600 800 1000 1200 1400 1600 1800 2000 m ar /02 se t/02 m ar /03 se t/03 m ar /04 se t/04 m ar /05 se t/05 m ar /06 se t/06 m ar /07 se t/07 m ar /08 se t/08 m ar /09 se t/09 m ar /10 se t/10 m ar /11 se t/11 m ar /12 se t/12 m ar/13 set/13 m ar /14 se t/14 m ar /15 se t/15 m ar /16 N ú m e ro d e p e ssoas ( e m m il)

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Variação anual do PIB, Brasil e América Latina e Caribe (ALC): 2010-2016

Fonte: FMI, 2016 (visitado 13/04/2016) http://www.imf.org/external/datamapper/index.php

A queda do PIB afeta o mercado de trabalho, pois quanto maior a recessão, maior é o desemprego. Para aproveitar o bônus demográfico, a população ocupada (PO) deveria crescer mais rápido (ou no mínimo no mesmo ritmo) da população em idade ativa (PIA). O gráfico 8 mostra que isto vinha ocorrendo entre 2002 e 2012 e a taxa de ocupação (PO/PIA) estava crescendo em ritmo mais acelerado, de acordo com os dados da PME. A taxa de ocupação passou de 49,7% em março de 2002 para 55% no final de 2012. Mas a taxa caiu ligeiramente em 2013 e 2014 e entrou em queda livre em 2015, chegando a 49,7% em fevereiro de 2016. Ou seja, a taxa de ocupação que, idealmente, deveria ir para a casa dos 60%, caiu para menos de 50%. Portanto, mais da metade das pessoas em idade produtiva estavam fora da PEA nas seis regiões metropolitanas da PME.

A crise do mercado de trabalho veio em um momento em que o nível de emprego deveria estar subindo para que o Brasil aproveitasse de forma adequada a janela de oportunidade demográfica. A nova configuração da estrutura etária, com o processo de envelhecimento, tende a transformar o bônus em ônus demográfico.

-4 -2 0 2 4 6 8 2010 2011 2012 2013 2014 2015 2016 Cr e scim e n to d o PIB ( e m % ) Brasil ALC

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Gráfico 8: População total em idade ativa (PIA), População total ocupada (PO) e Taxa de Ocupação (PO/PIA), nas 6 regiões metropolitanas: março de 2002 a fevereiro de 2016

Fonte: IBGE, Pesquisa Mensal de Emprego (PME)

O gráfico 9, com base nas projeções populacionais do IBGE, mostra que o crescimento da PIA (15-59 anos) vai ocorrer de forma mais lenta até o pico de 142,33 milhões de pessoas em 2031, enquanto no mesmo período a população idosa (60 anos e mais) vai aumentar aceleradamente. Por exemplo, entre 2031 e 2032 a PIA vai diminuir em 58,6 mil pessoas e a população idosa vai aumentar em 1,2 milhões de pessoas. No ano de 2043, a população em idade ativa (PIA) deve decrescer em 1,1 milhão de pessoas, enquanto a população idosa deverá estar crescendo em torno de um volume de 1,4 milhão de pessoas ao ano.

Evidentemente, todo este processo de mudança da estrutura etária terá um grande impacto sobre o mercado de trabalho, a previdência e o sistema de saúde. Em primeiro lugar, deve diminuir a proporção de pessoas que pagam impostos e contribuem com a previdência, o que vai agravar a produção de bens e serviços, uma vez que os níveis de produtividade do trabalho no Brasil são baixos e estão estagnados há bastante tempo (Negri, Cavalcanti, 2014). O envelhecimento populacional, especialmente da parcela com mais de 80 anos de idade, vai aumentar muito os custos do sistema de saúde e deve também pressionar as relações familiares em relação ao cuidado dos idosos. 44 46 48 50 52 54 56 0 5.000 10.000 15.000 20.000 25.000 30.000 35.000 40.000 45.000 50.000 m ar /02 d ez/0 2 se t/03 ju n /04 m ar /05 d ez/0 5 se t/06 ju n /0 7 m ar /08 d ez/0 8 se t/09 ju n /10 m ar /11 d ez/1 1 se t/12 ju n /13 m ar /14 d ez/1 4 se t/15 % N ú m e ro d e p e ssoas ( e m m il) PIA PO PO/PIA

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Gráfico 9: População em idade ativa (15-59 anos) e idosos (60 anos e mais), Brasil: 2001 a 2060

Fonte: Projeções Populacionais do IBGE (Revisão 2013)

Mas o maior impacto do envelhecimento deve ocorrer sobre o equilíbrio atuarial da previdência. Segundo Tafner et al (2014), os gastos com a seguridade social no Brasil, como proporção PIB, são altos, e parecidos com aqueles de sociedades mais maduras. Isto significa que o sistema já possui um déficit atualmente, mas este déficit tende a aumentar muito até a metade do século. Numa situação de déficit fiscal crônico, um aumento do desequilíbrio das contas da previdência apenas vai agravar os problemas do crescimento econômico e do emprego, dificultando a superação da pobreza e a melhoria das condições de vida da população brasileira. O Brasil pode entrar em uma situação de armadilha do baixo crescimento e de déficits públicos elevados, comprometendo o desempenho histórico do PIB. Mas o baixo crescimento econômico pode não implicar em menor degradação ambiental.

CONSIDERAÇÕES FINAIS

Existe uma crise real que já afetou a vida de 205 milhões de brasileiros e, quase inevitavelmente, vai continuar afetando negativamente nos próximos meses (e trimestres) provocando uma redução da qualidade de vida da população. Trata-se da recessão mais longa e mais profunda da história brasileira. A queda do PIB começou no segundo trimestral de 2014 e se aprofundou muito em 2015, quando a queda aumentou ao longo do ano, deixando uma herança negativa para o ano de

0 20.000.000 40.000.000 60.000.000 80.000.000 100.000.000 120.000.000 140.000.000 160.000.000 20 00 20 04 20 08 20 12 20 16 20 20 20 24 20 28 20 32 20 36 20 40 20 44 20 48 20 52 20 56 20 60 Núme ro d e p ess o as 15-59 anos 60 anos e +

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2016. A recessão brasileira inclusive é decisiva para o baixo desempenho econômico da América Latina e Caribe.

Dados do Cadastro Geral de Empregados e Desempregados - CAGED (LEI 4.923/65) - que apresenta uma síntese do comportamento do mercado de trabalho formal no Brasil - apontam para uma queda acentuada do emprego com carteira assinada no Brasil. Depois das eleições de 2014, o saldo entre admitidos e desligados foi negativo em 2,4 milhões de empregos formais entre dezembro de 2014 e fevereiro de 2016. Na média mensal foram fechados 159 mil empregos por mês no período, o que dá uma perda de 5.300 empregos com carteira de trabalho assinada por dia. Nota-se que os dados de dezembro de 2015 foram piores do que dezembro de 2014. No mesmo ritmo, a queda do emprego formal foi maior nos dois primeiros meses de 2016 em relação ao mesmo período de 2015. Houve também queda do rendimento real e da massa salarial.

Há diversos dados mostrando que a recessão vai se agravar em 2016. O FMI estima uma queda de 4% este ano, diante de 3,8% de 2015. Segundo a Boa Vista Serviços, administradora do SCPC (Serviço Central de Proteção ao Crédito), os pedidos de falência no Brasil cresceram 25,2% em março de 2016 na comparação com o mesmo mês do ano passado. O primeiro trimestre do ano teve alta de 31,6% na comparação com o mesmo período de 2015, enquanto que, na comparação mensal, o número de pedidos de falência aumentou 13,5% em março ante abril. Dados da Anfavea mostram que a produção de veículos recuou 27,8% no primeiro trimestre de 2016. Produção caindo e empresas fechando significam trabalhadores desempregados e salários mais baixos. Com a queda da massa salarial cai o nível de consumo da sociedade. Como os níveis de investimento estão muito baixos, a demanda agregada diminui e joga a economia na recessão.

O atual ciclo recessivo que teve início no segundo trimestre de 2014 e já completou sete trimestres em 2015. Segundo cálculos da Fundação Getúlio Vargas, o oitavo trimestre recessivo está em curso e até dezembro de 2016, serão 11 trimestres no vermelho. O tamanho do tombo estimado é de pelo menos 8,7% do PIB. Nos últimos 36 anos, a recessão mais longa durou 11 trimestres, entre 1989 e 1992, quando o PIB caiu 7,7%. Como mostra o gráfico abaixo, a mais intensa, de nove trimestres, ocorreu entre 1981 e 1983, com contração de 8,5%. As mudanças na metodologia da apuração dos números pelo IBGE, de modo geral, resultaram em taxas melhores para o PIB atual. Por exemplo, o crescimento do PIB em 2011, foi revisto de 2,7% para 3,9%. Portanto, a crise atual é, por todas as medidas, a mais longa e profunda da história (Patu e Cuculo, 12/03/2016). Os dados

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disponíveis indicam que os recordes da crise atual podem abranger um intervalo de tempo ainda maior se a recessão se prolongar em 2017.

O Brasil está passando por um momento definidor para o futuro do país. Existe um agudo processo de rebaixamento da estrutura produtiva (desindustrialização) e uma reprimarização da economia em um momento em que mais de 85% da população vive em cidades. A taxa de atividade e a taxa de ocupação sempre estiveram abaixo da expectativa do pleno emprego, mas a partir de 2013 começaram a cair num momento em que a estrutura etária ainda favorece a inserção produtiva da população em idade ativa. Provavelmente teremos uma segunda década perdida, com aumento do desemprego e estagnação da renda per capita.

Desta forma, o pais está desperdiçando o seu melhor momento demográfico e não terá outras condições tão favoráveis no futuro. Perdendo o primeiro bônus demográfico, perde-se também o segundo bônus demográfico, especialmente porque as taxas de poupança são baixas no Brasil. Ou seja, o Brasil pode estar assistindo ao fim precoce do bônus demográfico, especialmente do bônus feminino, o que pode ser também o fim do desenvolvimento brasileiro. A crise na geração de emprego começou em 2013 e 2014, mas se acelerou bastante nos anos de 2015 e 2016. Assim, pode-se afirmar que demografia não é culpada pela atual crise brasileira. Ao contrário, o Brasil passa pelo menor valor da razão de dependência (2015-2024) e vive o seu melhor decênio demográfico da história.

O crescimento econômico é o resultado do aumento do estoque de capital e da ampliação da força de trabalho, multiplicado pela produtividade dos fatores de produção. A produtividade no Brasil está estagnada. E a população em idade ativa vai começar a diminuir depois de 2025. O desenvolvimento econômico e social, que pode ser definido rapidamente como um processo de mudança da estrutura produtiva (perda relativa do tamanho do setor primário e crescimento dos setores secundário e terciário) com aumento da renda per capita e elevação do bem-estar da população, pode entrar em uma fase de “estagnação secular”.

Neste complexo quadro econômico e político, certamente a demografia - considerando a queda da fecundidade e o envelhecimento populacional – não pode ser responsabilizada pela estagflação nacional. Na verdade, os erros da política macroeconômica dos últimos governos brasileiros estão provocando o fim precoce do bônus demográfico, com grande desperdício de pessoas não ocupadas e pessoas que estudaram, mas não encontram uma colocação no mercado de trabalho. Há milhões de jovens que nem estudam e nem trabalham. Recentemente o desemprego começou

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a crescer entre a população mais escolarizada. Esta situação está colocando em xeque as possibilidades de superação da renda média e subida para o bloco dos países de renda alta.

Para agravar todo o quadro, a estagnação do mercado de trabalho das mulheres e o fim do bônus demográfico feminino podem representar, por um lado, o “desempoderamento” das mulheres, e por outro, o “des-desenvolvimento” do Brasil. A estagnação do mercado de trabalho feminino pode afetar negativamente as relações de gênero e a possibilidade de melhoria das condições de vida da maioria da população.

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Referências

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