TEORIA DAS SINGULARIDADES ALEXEI DAVYDOV
1. Introduc¸˜ao
Essencialmente trataremos de Teoria de Singularidades real, con-siderando objectos reais. Vamos relembrar algumas no¸c˜oes b´asicas. 1.1. Variedades e aplica¸c˜oes.
Defini¸c˜ao 1. Variedade ´e um objecto que ´e construido localmente, como o espa¸co aritm´etico Rn (a dimens˜ao n deste espa¸co tamb´em se designa por dimens˜ao).
Exemplos.
A recta real ´e uma variedade de dimens˜ao 1 (Fig. 1a).
A esfera unit´aria x2 + y2 + z2 = 1 em R3 ´e uma variedade de dimens˜ao 2 e a bola aberta limitada por esta esfera ´e uma variedade de dimens˜ao 3 (Fig. 1b).
O nosso tempo-espa¸co (provavelmente) ´e uma variedade de dimens˜ao 4.
A posi¸c˜ao do corpo r´ıgido em R3 ´e descrita por um ponto de uma variedade 6-dimensional (Fig. 1c). A uni˜ao dos eixos coordenados no plano com a topologia induzida n˜ao ´e uma variedade (Fig. 1d).
O x (a) S2 M P S2 -S1 -x y O (b) (c) (d) linha real posi¸c˜ao poss´ivel de um aixo M P centro de massa
rota¸c˜ao em torno do eixo M P
Figura 1. Variedades e n˜ao-variedades.
Nota 1. O significado de “localmente constru´ıdo” ser´a explicado mais tarde aquando da introdu¸c˜ao da no¸c˜ao de “rela¸c˜ao de equivalˆencia”. Defini¸c˜ao 2. Uma aplica¸c˜ao da variedade M na variedade N ´e uma lei que a cada ponto x ∈ M faz corresponder um ponto y ∈ N
f : x "→ y = f(x). 1
Continuidade e diferenciabilidade de uma aplica¸c˜ao s˜ao no¸c˜oes locais. Devido a tal facto, define-se continuidade e diferenciabilidade de apli-ca¸c˜oes entre variedades da mesma forma como se define essas no¸c˜oes no espa¸co aritm´etico (Fig. 2).
Assim, uma aplica¸c˜ao entre variedades diz-se localmente cont´ınua e diferenci´avel sse as suas componentes, em coordenadas locais, s˜ao cont´ınuas e diferenci´aveis.
Desta forma
f pertence `a classe Ck sse f
i pertence `a classe Ck O conjunto de todas as aplica¸c˜oes entre as variedades M e N que pertencem `a classe Ck denota-se, normalmente, por Ck(M, N ), onde k ´e ou um n´umero n˜ao negativo e inteiro ou um dos simbolos “∞” e “w” (quando k = w significa que a aplica¸c˜ao ´e anal´ıtica).
Nota 2. Sempre que se diz que uma aplica¸c˜ao ´e diferenci´avel, sem pre-cisar a sua classe, deve entender-se que ´e C∞.
M N f f (x) φ(x) ψ(f (x)) U V φ ψ (U, φ) x (V, ψ) ψ◦ f ◦ φ−1 φ(U ) IRm ψ(V ) IRn carta carta em em
Figura 2. Continuidade e diferenciabilidade de aplica-¸c˜oes entre variedades.
Exemplo 1. Considere a fun¸c˜ao latitude h : (x, y, z) "→ z definida na superf´ıcie terrestre normalizada (Fig.3) logo h ´e uma aplica¸c˜ao entre a esfera e a recta real. Na vizinhan¸ca do Polo Norte a aplica¸c˜ao h ´e diferenci´avel, uma vez que ´e possivel definir uma vizinhan¸ca do Polo Norte na qual, considerando as coordenadas locais x, y a nossa fun¸c˜ao toma a forma f : (x, y)"→!1− x2− y2.
1.2. Pontos cr´ıticos e valores cr´ıticos. A aplica¸c˜ao diferenci´avel entre variedades (M e N ) define, de uma forma natural, a aplica¸c˜ao entre os espa¸cos tangentes (T M e T N ) associadas `as variedades (Fig. 4):
TEORIA DAS SINGULARIDADES 3
x2+ y2+ z2= 1 x y z φ x y z (x, y, z)"−→ z =√1− x2− y2 (U, φ) O (x, y) carta
Figura 3. A fun¸c˜ao latitude z definida na superf´ıcie terrestre ´e diferenci´avel.
M f N v(x(t)) f (x(t)) f∗(v(x(t))) f ◦x x t x(t)) TxM Tf (x)N plano tangente plano tangente
Figura 4. Aplica¸c˜ao induzida entre os espa¸cos tan-gentes das variedades M e N
Nas coordenadas locais usuais x, v e y, w na vizinhan¸ca de P e f (P ), respectivamente, a aplica¸c˜ao induzida f∗ ´e definida por:
f∗ : (x, v) "→ "
y = f (x), w = ∂f ∂x(x)v
#
onde ∂f∂x(x) ´e a matriz Jacobiana da aplica¸c˜ao f calculada no ponto x. Defini¸c˜ao 3. Um ponto x ∈ M ´e designado por ponto cr´ıtico da aplica¸c˜ao diferenci´avel f se a caracter´ıstica da aplica¸c˜ao linear ∂f∂x(x) n˜ao ´e m´axima. A imagem de um ponto cr´ıtico ´e um valor cr´ıtico. Nota 3. A caracter´ıstica de uma aplica¸c˜ao linear ´e definida como a dimens˜ao da imagem da aplica¸c˜ao. Numa base concreta uma aplica¸c˜ao linear ´e definida por uma matriz. Assim a caracter´ıstica ´e igual ao
n´umero m´aximo de colunas ou linhas linearmente independentes dessa matriz.
Agora vamos procurar tornar claro a importˆancia dos pontos cr´ıticos. Se um ponto x0 n˜ao ´e um ponto cr´ıtico de uma aplica¸c˜ao diferen-ci´avel ent˜ao, em coordenadas locais apropriadas x1, . . . , xm no espa¸co das imagens rec´ıprocas e y1, . . . , yn no espa¸co das imagens com origens no ponto x e na sua imagem, respectivamente, a aplica¸c˜ao considerada toma a seguinte forma:
y1 = x1 y2 = x2 . . . . yn= xn se m≥ n, ou y1 = x1 y2 = x2 . . . . ym = xm ym+1 = 0 . . . . yn= 0 se m≤ n, (1)
As aplica¸c˜oes deste tipo s˜ao designadas por submers˜oes e imers˜oes, respectivamente. Uma aplica¸c˜ao que seja, simultaneamente, uma imer-s˜ao e uma submerimer-s˜ao, num dado ponto, chama-se difeomorfismo local. Considere-se que a nossa aplica¸c˜ao ´e uma fun¸c˜ao diferenci´avel, mais concretamente consideremos que ´e a fun¸c˜ao potencial de um determi-nado sistema mecˆanico que cresce infinitamente (Fig. 5). Se o sistema ´e dissipativo ent˜ao, na natureza a sua posi¸c˜ao estacion´aria normalmente tende para algum ponto onde o potencial ´e um m´ınimo local. Mas cada m´ınimo ´e um valor cr´ıtico da fun¸c˜ao potencial.
E -E = U (x) O g x m m energia total
estados est´aveis do sistema
TEORIA DAS SINGULARIDADES 5
No in´ıcio do desenvolvimento da teoria de singularidades Whitney investigou singularidades t´ıpicas de aplica¸c˜oes definidas entre varieda-des de dimens˜ao dois. Ele mostrou que, num sistema de coordenadas locais adequado, as singularidades tomam nas vizinhan¸cas da origem uma das seguintes trˆes formas:
( y1 = x1 y2 = x2 , ou ( y1 = x1 y2 = x22 , ou ainda ( y1 = x1 y2 = x32+ x1x2 (Fig. 6a a 6c, respectivamente). O x2 x2 2 x32+ x2x1 (c) O x1 O x2 x1 x1 x2 O y1= x1, y2= y1= x1, y2= x2 y1= x1, y2= y1 (a) (b) O y1 y1 y2 y2 y2
Figura 6. Classifica¸c˜ao de Whitney.
Estas singularidades podem ser observadas ao investigar o contorno vis´ıvel de duas montanhas (Fig. 7a). Cada ponto desse contorno ´e um ponto cr´ıtico da aplica¸c˜ao definida na superf´ıcie da montanha e com imagem no plano.
(a) (b)
Figura 7. Duas montanhas e o reconhecimento de imagem. O contormo vis´ıvel desempenha um papel importante na teoria do reconhecimento de imagem (Fig. 7b).
Para tra¸car o contormo vis´ıvel ´e necess´ario resolver um problema de extremos: encontrar a altitude m´axima em cada direc¸c˜ao. Neste
problema, a altitude ´e a fun¸c˜ao objectivo (de duas vari´aveis) e a di-rec¸c˜ao (azimute) ´e o parˆametro. Exemplos mais gen´ericos deste tipo de problema tˆem a forma de um problema de extremos diferenci´avel com restri¸c˜oes; isto ´e, o problema ´e do tipo:
Encontrar o m´ınimo (ou o m´aximo) de f (x) quando g(x) = a, onde x, a satisfazem a restri¸c˜ao natural dim x ≥ dim a. O gr´afico da solu¸c˜ao do problema pertence ao conjunto dos valores cr´ıticos do par de aplica¸c˜oes (f, g) (Fig. 8). temperatur a T (H, T ) T H O superficie montanhosa altura H imagem de
Figura 8. Problema diferenci´avel de extremo e gr´afico da sua solu¸c˜ao.
Esta observa¸c˜ao implica a conhecida regra dos multiplicadores de Lagrange:
Corol´ario 1.1. Se um ponto P ´e a solu¸c˜ao de um problema de extremo diferenci´avel com restri¸c˜oes:
f (x)−→ min(max) quando g(x) = a
onde dim x≥ dim a, ent˜ao existem multiplicadores (de Lagrange) λ0, λ tais que pelo menos um deles ´e diferente de zero e
λ0df (P ) + λdg(P ) = 0.
Demonstra¸c˜ao. Seja n = dim x. Se dim a tamb´em ´e n ent˜ao facilmente se verifica que o corol´ario ´e verdadeiro uma vez que num espa¸co de dimens˜ao n quaisquer n+1 vectores s˜ao linearmente dependentes. Seja n > dim a e seja o ponto P solu¸c˜ao do nosso problema. Considere-se o par de aplica¸c˜oes f e g tais que
x"→ (t = f(x), a = g(x)).
Suponhamos que λ0 e λ n˜ao existem; ent˜ao o ponto P n˜ao ´e ponto cr´ıtico para esta aplica¸c˜ao. Desta forma, e porque n > dim a, o par de aplica¸c˜oes ´e uma submers˜ao na vizinhan¸ca deste ponto. Conse-quentemente, o ponto (f (P ), g(P )) ´e um ponto interior da imagem da aplica¸c˜ao (f, g). Por este motivo o ponto P n˜ao pode ser solu¸c˜ao do nosso problema.
TEORIA DAS SINGULARIDADES 7
Assim, o ponto P dever´a ser ponto cr´ıtico da aplica¸c˜ao (f, g), o que implica que existe λ0, λ que verificam as condi¸c˜oes do corol´ario. 1.3. Rela¸c˜oes de equivalˆencia. Rela¸c˜ao de equivalˆencia ´e uma rela-¸c˜ao bin´aria “∼” entre dois objectos (habitualmente esses objectos s˜ao da mesma natureza) que satisfaz as seguintes trˆes condi¸c˜oes:
1. para qualquer objecto X verifica-se que X ∼ X (reflexividade); 2. se X ∼ Y ent˜ao Y ∼ X (simetria);
3. se X ∼ Y e Y ∼ Z ent˜ao X ∼ Z (transitividade).
Dois objectos dizem-se equivalentes, com respeito a uma rela¸c˜ao de equivalˆencia, se esses objectos satisfazem essa rela¸c˜ao de equivalˆencia. O conjunto de todos os objectos equivalentes constitui uma classe que se designa por classe de equivalˆencia. Qualquer objecto de uma classe de equivalˆencia ´e seu representante.
Exemplo 2. As seguintes rela¸c˜oes bin´arias s˜ao rela¸c˜oes de equivalˆencia como facilmente se verifica.
• Rela¸c˜ao de equivalˆencia qualitativa: dois objectos s˜ao equivalentes se eles possuem a mesma caracter´ıstica qualitativa A. Por exem-plo, dois corpos s˜ao equivalentes se a parte inteira dos seus pesos (em kg) ´e a mesma.
• Duas variedades diferenci´aveis s˜ao equivalentes se elas forem difeo-morficas (diferenci´aveis).
• Duas aplica¸c˜oes f e g entre duas variedades diferenci´aveis M e N s˜ao equivalentes se existe difeomorfismos h : M → M e k : N → N tais que g = k◦ f ◦ h−1, ou em outras palavras o diagrama
M −→ Nf
h↓ ↓ k
M −→ Ng
(2)
´e comutativo. Esta equivalˆencia ´e chamada equivalˆencia esquerda-direita ou LR-equivalˆencia devido ao facto de k actuar `a esquerda de f na formula k ◦ f ◦ h−1 e h actuar `a direita (mudan¸ca de coordenadas `a esquerda (no espa¸co das imagens) e `a direita (no espa¸co das imagens rec´ıprocas), respectivamente).
Defini¸c˜ao de Germe
Dois objectos (curvas, conjuntos, aplica¸c˜oes, etc.) definidos na vizi-nhan¸ca de um ponto P da variedade diferenci´avel M s˜ao equivalentes nesse ponto se coincidirem em alguma vizinhan¸ca desse ponto. Para este tipo de equivalˆencia a classe de equivalˆencia a que o objecto per-tence ´e designada por um germe do objecto no ponto P . A cada objecto desta classe d´a-se o nome de representante do germe.
Por exemplo, as fun¸c˜oes x e |x| na recta real tˆem o mesmo germe se for considerada a parte positiva do eixo. Mas em qualquer outro ponto fora dessa parte, aquelas fun¸c˜oes tˆem germes diferentes.
Nota 4. Agora j´a ´e poss´ıvel explicar o que significa afirmar que uma variedade ´e localmente constru´ıda como um espa¸co aritm´etico de di-mens˜ao n. Para definir variedade considera-se um espa¸co topol´ogico de Hausdorff, X, possuindo uma base topol´ogica numer´avel. A colec¸c˜ao de homeomorfismos definidos entre subconjuntos abertos deste espa¸co e subconjuntos abertos de Rn para algum n, define um Ck-atlas no espa¸co X se:
• o dom´ınio destes homeomorfismos cobre todo o espa¸co X;
• quaisquer que sejam os homeomorfismos h1 e h2 pertencentes a esta colec¸c˜ao, a composi¸c˜ao h2◦ h−11 ´e ou de classe Ck ou n˜ao est´a definida.
Dois Ck-atlas s˜ao compat´ıveis se a sua uni˜ao ´e ainda um Ck-atlas. Uma variedade ´e um espa¸co X, definido como anteriormente, conjun-tamente com a classe de equivalˆencia formada por atlas compat´ıveis. Note-se que num espa¸co X podem ser introduzidas v´arias classes de equivalˆencia de atlas compat´ıveis.
Nota 5. Um subconjunto de uma variedade diferenci´avel ´e designado por Ck subvariedade se o germe deste subconjunto em qualquer ponto deste subconjunto coincide com o germe na origem de um plano r-dimensional em Ck-coordenadas locais apropriadas com a origem nesse ponto; r ´e a dimens˜ao da variedade. A diferen¸ca n − r, onde n ´e a dimens˜ao da variedade ambiente, ´e a codimens˜ao dessa subvariedade.
Considere-se qualquer grupo de transforma¸c˜oes actuando no espa¸co de germes dos objectos que estamos a considerar.
Defini¸c˜ao 4. Singularidade local de um objecto num ponto ´e a ´orbita do germe deste objecto nesse ponto sob a ac¸c˜ao deste grupo. A forma normal desta singularidade ´e qualquer ponto dessa ´orbita, preferencial-mente um dos mais simples representantes dessa ´orbita.
Note que a singularidade ´e unicamente definida, mas a sua forma normal pode ter diferentes express˜oes.
Por exemplo, o grupo de LR-equivalˆencia age no espa¸co de germes das aplica¸c˜oes. A forma normal de um germe de uma aplica¸c˜ao de caracter´ıstica m´axima ´e uma imers˜ao ou uma submers˜ao, com formas normais (1).
O primeiro objectivo do curso ´e aprender a encontrar formas normais para singularidades de fun¸c˜oes diferenci´aveis nos seus pontos cr´ıticos. No caso de fun¸c˜oes de uma vari´avel (para potenciais na recta) isso pode ser feito directamente com base no lema de Hadamard:
Lema de Hadamard. Se uma fun¸c˜ao f de classe Ck, k ≥ 1, em Rn tem o valor zero num determinado ponto ent˜ao, numa vizinhan¸ca desse ponto, essa fun¸c˜ao pode ser escrita na forma
TEORIA DAS SINGULARIDADES 9
onde todas as fun¸c˜oes fi s˜ao de classe Ck−1, em qualquer sistema de coordenadas diferenci´aveis x1, x2, . . . xn com origem neste ponto. Demonstra¸c˜ao. Seja x1, x2, . . . xnqualquer sistema de coordenadas dife-renci´avel com a origem no ponto que se est´a a considerar. Tomemos, neste sistema de coordenadas, uma pequena bola centrada na origem e considere-se um ponto x pertencente a esta bola.
Assim temos f (x) = 1 ) 0 d dtf (tx)dt = 1 ) 0 n * i=1 ∂f ∂xi (tx)xidt = n * i=1 xi 1 ) 0 ∂f ∂xi (tx)dt Todas as fun¸c˜oes fi, fi(x) = 1 + 0 ∂f
∂xi(tx)dt, est˜ao bem definidas na bola
considerada e s˜ao de classe Ck−1.
Corol´ario 1.2. Se uma fun¸c˜ao f da classe Ck, k ≥ 1, em Rn est´a definida na vizinhan¸ca de um ponto P ∈ Rn e, nesse ponto, todas as suas derivadas at´e `a ordem r, r < k, s˜ao nulas, ent˜ao, na vizinhan¸ca desse ponto, a fun¸c˜ao pode ser escrita na forma:
f (x) = *
|α|=r+1
xαfα(x)
onde α = (α1, α2, . . . , αn) ´e o vector de inteiros n˜ao negativos, |α| ´e a soma desses inteiros. Todas as fun¸c˜oes fα, em qualquer sistema de coordenadas diferenci´avel x1, x2, . . . , xn com origem nesse ponto, s˜ao de classe Ck−r−1, e xα = xα1
1 xα22. . . xαnn
A demonstra¸c˜ao deste corol´ario ´e baseado no lema de Hadamard e no princ´ıpio da indu¸c˜ao matem´atica.
Vamos fazer uso do corol´ario a fim de obter localmente a forma normal da fun¸c˜ao diferenci´avel, definida na recta real, na vizinhan¸ca do ponto cr´ıtico P a menos de uma R-equivalˆencia. Se no ponto P todas as derivadas de ordem r da nossa fun¸c˜ao forem nulas e f(r+1)(P ) ,= 0 ent˜ao, pelo corol´ario, na vizinhan¸ca do ponto P temos
f (x)− f(P ) = xr+1fr+1(x),
onde fr+1 ´e uma fun¸c˜ao diferenci´avel, em qualquer sistema de coorde-nadas com a origem nesse ponto; por outro lado fr+1(P ) ,= 0 porque por hipotese f(r+1)(P ),= 0. Tomando, na vizinhan¸ca da origem, novas coordenadas diferenci´aveis: ˜x = x!|fr+1(x)| reduz-se a nossa fun¸c˜ao `a forma:
f (˜x) = f (P ) + ˜xr+1signfr+1(O).
Portanto uma fun¸c˜ao diferenci´avel de uma s´o vari´avel com uma ex-pans˜ao em s´erie de Taylor diferente de zero, na vizinhan¸ca do seu ponto
cr´ıtico com valor cr´ıtico zero toma uma das seguintes trˆes formas nor-mais:
ou x2s+1 quando r = 2s, ou ± x2s quando r = 2s− 1. depois de uma adequada mudan¸ca de vari´avel.
Agora ´e f´acil verificar que o ponto cr´ıtico que se considera n˜ao fornece nenhum extremo local da fun¸c˜ao no 1o sub caso, mas no 2o caso j´a se verifica a existˆencia de um extremo local (Fig. 9)
y== x 2s+1 x y O y= x O x y y= x 2s O x y (a) (b) (c) y= −x 2s
Figura 9. Formas normais de fun¸c˜oes na vizinhan¸ca do ponto cr´ıtico.
Defini¸c˜ao 5. Um ponto cr´ıtico de uma fun¸c˜ao ´e designado n˜ao degene-rado se a diferencial de segunda ordem, nesse ponto, ´e n˜ao degenerada. Em coordenadas locais significa que a matriz Hessiana da fun¸c˜ao, nesse ponto, tem caracter´ıstica m´axima.
2. Espac¸o dos Jactos e sua Topologia
Nesta sec¸c˜ao introduzimos a no¸c˜ao de “proximidade” no espa¸co das aplica¸c˜oes entre variedades.
2.1. Espa¸co das fun¸c˜oes: a sua topologia fraca e fina. Come¸ca-mos esta sec¸c˜ao com um simples exemplo, que ilustra a importˆancia do controlo das derivadas na natureza (os especialistas na condu¸c˜ao indicam que o controlo correcto da velocidade e da acelera¸c˜ao implica a economia de combust´ıvel at´e pelo menos metade). Seguidamente vamos analisar um exemplo.
Exemplo 3. Considere-se o seguinte sistema mecˆanico cuja fun¸c˜ao po-tencial ´e definida por U (x) = x2 e x∈ R. O potencial tem apenas um m´ınimo em x = 0 que corresponde ao ´unico estado estacion´ario est´avel do sistema.
Consideremos perturba¸c˜oes do potencial e a respectiva transforma¸c˜ao dos estados estacion´arios est´aveis do sistema.
Se controlarmos apenas a varia¸c˜ao dos valores do potencial ent˜ao, na vizinhan¸ca da fun¸c˜ao potencial existe uma nova fun¸c˜ao potencial, diferenci´avel, com muitos pontos cr´ıticos n˜ao degenerados nos quais,
TEORIA DAS SINGULARIDADES 11
localmente, o potencial ´e m´ınimo (Fig. 10a). Estes novos estados podem estar t˜ao longe da origem quanto se queira e, cada um deles ´e um estado estacion´ario est´avel do sistema.
Se existir possibilidade de controlar tanto o valor da fun¸c˜ao potencial como a derivada da mesma, ent˜ao pequenas perturba¸c˜oes dessa fun¸c˜ao apenas originam pontos cr´ıticos na vizinhan¸ca da origem e, portanto, pode-se obter muitos m´ınimos locais em torno da origem (Fig. 10b). Devido a tal facto todos os estados estacion´arios est´aveis do sistema, tamb´em, est˜ao localizados na vizinhan¸ca da origem e existe pelo menos um estado estacion´ario est´avel.
U ˜ U U= x 2 x O x O O ˜ U x O ˜ U$ x (c) ˜ U ˜ U$ O x O x ˜ U$$ ˜ U$$= 2 x O y= 2x (a) (b)
Figura 10. M´ınimos locais de perturba¸c˜oes de fun¸c˜oes potencial. Agora vamos considerar que ´e poss´ıvel controlar o valor do potencial e as duas primeiras derivadas da fun¸c˜ao potencial, ent˜ao qualquer fun¸c˜ao potencial, suficientemente perto da fun¸c˜ao potencial inicial, tem apenas um ponto cr´ıtico e este ponto ´e um m´ınimo local (global) da fun¸c˜ao potencial (o estado estacion´ario est´avel do sistema) e est´a localizado na vizinhan¸ca da origem (Fig. 10c).
Sendo poss´ıvel controlar as derivadas seguintes, tamb´em o fen´omeno observado vai ser o mesmo.
No espa¸co Ck(Rm, R) (ou Ck(U, R) onde U ´e um conjunto aberto de Rm) usualmente introduz-se uma topologia fraca ou forte, designada por Cr-topologia, r≤ k. Um conceito importante que ´e necess´ario ex-plicar ´e o conceito de vizinhan¸ca de um ponto f do espa¸co considerado
nestas duas topologias. Para explicar este conceito fixemos quaisquer coordenadas no espa¸co das imagens e das pr´e-imagens. Ent˜ao, para:
i. qualquer subconjunto K do dom´ınio (=Rm) das fun¸c˜oes em es-tudo,
ii. qualquer fun¸c˜ao & positiva e cont´ınua, definida nesse dom´ınio defina-se o conjunto V (f, K, &) das fun¸c˜oes g cujas derivadas satisfazem a desigualdade
|∂|α|(g− f)
∂xα (P )| < &(P ).
para qualquer ´ındice α,|α| ≤ r em qualquer ponto P do conjunto K. Na topologia Cr o conjunto aberto ´e uma uni˜ao infinita ou uma intersec¸c˜ao finita de conjuntos do tipo V (f, K, &). O conjunto K tem que ser compacto, no caso da topologia fraca, e precisa coincidir com todo o dom´ınio Rm (ou com o conjunto U ) no caso da topologia forte (ou fina). A topologia forte ou fina tamb´em ´e designada por topologia de Whitney.
Com o objectivo de introduzir este tipo de topologias no espa¸co das aplica¸c˜oes Ck entre variedades ´e necess´ario uma no¸c˜ao adicional: con-tacto de aplica¸c˜oes diferenci´aveis.
2.2. Rela¸c˜oes de Equivalˆencia: contacto num ponto.
Defini¸c˜ao 6. Duas aplica¸c˜oes, f e g, da classe Cr, definidas de Rm em Rn tˆem, no ponto x, contacto da ordem k, k ≤ r, se
|f(˜x) − g(˜x)|
|˜x − x|k −→ 0 quando ˜x → x, onde |.| ´e a norma usual no espa¸co Euclideano.
A no¸c˜ao de contacto ´e uma no¸c˜ao local e, por isso, pode ser definida para aplica¸c˜oes entre variedades diferenci´aveis.
Lema 2.1. Contacto de ordem r, no ponto x, ´e uma rela¸c˜ao de equi-valˆencia.
Demonstra¸c˜ao. ´E ´obvio que a propriedade de reflexividade ´e verificada, pois: |f(˜x) − f(˜x)| ≡ 0.
Tamb´em ´e ´obvio que a propriedade da simetria se verifica visto que: |f(˜x) − g(˜x)| ≡ |g(˜x) − f(˜x)|.
Finalmente vamos provar que a propriedade da transitividade se ver-ifica: Sejam as fun¸c˜oes f, g, s para as quais se verifica
|f(˜x) − g(˜x)|
|˜x − x|k −→ 0 e
|g(˜x) − s(˜x)|
TEORIA DAS SINGULARIDADES 13
Fazendo o uso da desigualdade triangular obtem-se: 0≤ |f(˜x) − s(˜x)| |˜x − x|k = |f(˜x) − g(˜x) + g(˜x) − s(˜x)| |˜x − x|k ≤ ≤ |f(˜x) − g(˜x)| |˜x − x|k + |g(˜x) − s(˜x)| |˜x − x|k
Mas, por hipotese, os dois termos na parte direita da desigualdade tendem para zero quando ˜x → x. Portanto, a propriedade da transi-tividade ´e v´alida.
Defini¸c˜ao 7. Uma classe de equivalˆencia da rela¸c˜ao de contacto de ordem k, num ponto, ´e designada por jacto de ordem k nesse ponto. O jacto de ordem k num ponto x que ´e definido pela aplica¸c˜ao f ´e denotado por jkf (x).
Lema 2.2. Duas aplica¸c˜oes diferenci´aveis tˆem o mesmo jacto de or-dem k num ponto sse as derivadas destas fun¸c˜oes, em coordenadas locais, no espa¸co s˜ao iguais at´e `a ordem k, inclusive.
Demonstra¸c˜ao. A primeira afirma¸c˜ao segue-se trivialmente da segunda, usando o lema de Hadamard.
Para demonstrar a implica¸c˜ao no sentido inverso (⇒) vamos assumir o contr´ario, isto ´e, que:
“Duas aplica¸c˜oes tˆem o mesmo jacto de ordem k num ponto, mas algumas das suas derivadas de ordem inferior a k + 1, nesse ponto, s˜ao diferentes”.
Denotemos por l a menor das ordens das derivadas que verificam a condi¸c˜ao anterior e tomemos os mesmos componentes das nossas fun¸c˜oes que tˆem derivadas de ordem l diferentes.
Sem perda de generalidade podemos assumir que o ponto que es-tamos a considerar ´e a origem. Pelo lema de Hadamard a diferen¸ca entre os componentes considerados, f , pode ser escrita, na vizinhan¸ca da origem, na forma:
f (x) = * |α|=l
xαfα(x)
onde todas as fα s˜ao fun¸c˜oes cont´ınuas, e pelo menos uma delas n˜ao se anula na origem, uma vez que os componentes escolhidos tˆem pelo menos uma derivada de ordem l diferente, no ponto considerado.
Restingindo a fun¸c˜ao f a uma linha x = tv (para qualquer vector v e t suficientemente pequeno) temos:
f (tv) = tl* |α|=l
vαfα(tv).
Para t = 0 a soma no lado direito da equa¸c˜ao anterior ´e um polin´omio homog´eneo de ordem l com respeito a v. Este polin´omio tem pelo menos um coeficiente diferente de zero, uma vez que pelo menos uma fαn˜ao se
anula na origem. Por isso, para t = 0 o valor do polin´omio ´e diferente de zero para algum vector v0 n˜ao nulo. O que implica, para x = tv0, que: |f(tv0)| |tv0|k = |tl| , |α|=l vα 0fα(tv0)| |t|k|v 0|k =|t|l−k | , |α|=l vα 0fα(tv0)| |v0|k .
O lado direito da ´ultima express˜ao n˜ao tende para zero quando t→ 0 porque l ≤ k e a frac¸c˜ao
| , |α|=l
vα 0fα(tv0)|
|v0|k ´e diferente de zero quando t = 0.
Mas, por defini¸c˜ao de contacto de ordem k, num ponto, o seu limite tem que ser zero. Assim, temos uma contradi¸c˜ao. Isto significa que o lema ´e v´alido.
Nota 6. O ´ultimo lema implica que para uma fun¸c˜ao anal´ıtica f o seu jacto infinito num ponto (= j∞f (.)) define completamente o germe dessa fun¸c˜ao no ponto. Isso n˜ao ´e sempre verdade para uma fun¸c˜ao diferenci´avel. Duas fun¸c˜oes na linha real, f ≡ 0, e g zero para x = 0 e e−1/x2
quando x,= 0, tˆem na origem contacto de ordem infinita mas as duas fun¸c˜oes s˜ao diferentes em todos os pontos excepto a origem (Fig. 11)! O x y y = 1 y = 0 y = e−1/x2
Figura 11. O jacto infinito de uma fun¸c˜ao diferenci´avel n˜ao define o germe.
O espa¸co dos k-jactos de aplica¸c˜oes diferenci´aveis entre duas varie-dades M , N ´e designado por Jk(M, N ). ´E uma variedade diferenci´avel porque em coordenadas locais qualquer ponto jkf (x) deste espa¸co tem coordenadas naturais definidas pelas coordenadas x na variedade M e todas as derivadas de f nesse ponto at´e ordem k :
x1, x2, . . . , xm; f (x); ∂f ∂xi (x), 1≤ i ≤ m; . . . ; ∂ kf ∂xα(x) com |α| ≤ k. Por exemplo, o espa¸co dos k-jactos de fun¸c˜oes na linha ´e uma varie-dade (k + 2)-dimensional.
Devido `a f´ormula para a derivada da fun¸c˜ao composta, qualquer mudan¸ca diferenci´avel de coordenadas locais na variedade implica uma mudan¸ca diferenci´avel de coordenadas locais no espa¸co dos jactos. Para o espa¸co dos 1-jacto esta aplica¸c˜ao ´e:
(x, f (x), f$(x))"→ (y, f(φ(y)), f$(φ(y))φ$ y(y))
TEORIA DAS SINGULARIDADES 15
se x = φ(y) e y ´e uma nova coordenada no espa¸co pr´e-imagem.
O desenvolvimento de Taylor de f num ponto x at´e ordem k define jrf (x) para qualquer r, r < k. Portanto existe uma projec¸c˜ao natural do espa¸co dos jactos de ordem superior para o espa¸co dos jactos de ordem inferior. Isso d´a a cadeia de projec¸c˜oes:
J0(M, N )← J1(M, N ) ← J2(M, N )← . . . ´
E claro que o espa¸co dos 0-jactos ´e simplesmente M× N e que h´a duas projec¸c˜oes naturais dele em cada factor
M ←− J0(M, N ) = M × N → N.
2.3. Espa¸co das aplica¸c˜oes: suas topologias fraca e forte. Agora vamos introduzir as topologias fraca e forte (fina) no espa¸co das apli-ca¸c˜oes diferenci´aveis entre as variedades diferenci´aveis M e N .
O espa¸co dos jactos Jr(M, N ) ´e uma variedade diferenci´avel com a topologia induzida de uma forma natural pela estrutura diferenci´avel M e N . Existe uma distˆancia ρ que define esta topologia e, conse-quentemente, d´a-nos a possibilidade de descrever as vizinhan¸cas na Cr -topologia no espa¸co Ck(M, N ), k ≥ r, praticamente da mesma forma que s˜ao descritas no espa¸co das fun¸c˜oes.
As vizinhan¸cas de um ponto f do espa¸co Ck(M, N ), k ≥ r, s˜ao definidas da seguinte forma.
Defini¸c˜ao 8. Para qualquer subconjunto K do dom´ınio das nossas fun¸c˜oes e para qualquer fun¸c˜ao cont´ınua e positiva & definida neste dom´ınio definimos o conjunto V (f, K, &) das fun¸c˜oes g que satisfazem a desigualdade:
ρ(jrf (P ), jrg(P )) < &(P ).
para cada ponto P do conjunto K. Da mesma forma, nas Cr-topologias o conjunto aberto ´e uma uni˜ao infinita ou uma intersec¸c˜ao finita de conjuntos do tipo V (f, K, &), mas o conjunto K ´e um compacto na variante fraca enquanto que na variante forte ´e a pr´opria variedade M .
´
E de notar que numa variedade compacta as topologias fraca e forte (ou fina) s˜ao a mesma coisa.
Nota 7. A aplica¸c˜ao jkf : x "→ jkf (x), x ∈ M ´e designada pela ex-tens˜ao ao jacto de ordem k da aplica¸c˜ao f . A base da Cr-topologia forte (ou fina) em Ck(M, N ), k ≥ r, tamb´em pode ser definida da seguinte forma:
Defini¸c˜ao 9. Para um subconjunto aberto U no espa¸co dos jactos Jr(M, N ) o conjunto base B(U ) inclui todas as aplica¸c˜oes com a ex-tens˜ao ao jacto de ordem r que tˆem imagem em U .
A colec¸c˜ao de todos estes tipos de conjuntos tamb´em define a Cr topologia forte como ´e f´acil verificar. Esta defini¸c˜ao permite intro-duzir uma topologia diferenci´avel forte no espa¸co das aplica¸c˜oes dife-renci´aveis. Nomeadamente, se Wr ´e a colec¸c˜ao de todos os subconjun-tos abersubconjun-tos em C∞(M, N ), ent˜ao a base da C∞-topologia ´e a uni˜ao de todos os Wr com todos os r n˜ao negativos (note-se que Wr ⊂ Wr+s para qualquer s ≥ 1 devido `a continuidade de projec¸c˜ao can´onica Jr+s(M, N ) → Jr(M, N ) a qual “esquece” as derivadas de ordem maior que r).
Vamos agora mostrar que a topologia fina ´e realmente forte.
Proposi¸c˜ao 2.3. Uma sucess˜ao de aplica¸c˜oes {fn}∞n=1 de classe Ck converge na Cr-topologia fina, r≤ k, se e s´o se existir um compacto no espa¸co das pr´e-imagens e ´ındice n0 tais que neste compacto a sucess˜ao {jrf
n}∞n=1 converge uniformemente para a extens˜ao ao jacto de ordem r de alguma aplica¸c˜ao f de classe Ck, e fora do compacto, qualquer fun¸c˜ao fn com n≥ n0 coincide esta fun¸c˜ao limite f.
Demonstra¸c˜ao. Para um espa¸co de pr´e-imagens que seja compacto a afirma¸c˜ao ´e trivial. Portanto, basta considerar o caso em que o espa¸co das pr´e-imagens n˜ao seja compacto.
´
E tamb´em evidente que a existˆencia de um compacto K e um ind´ıce n0 proporciona a convergˆencia na Cr-topologia. Para provar a neces-sidade ´e suficiente mostrar que se tal n˜ao existir ent˜ao a sequˆencia n˜ao converge. As seguintes afirma¸c˜oes s˜ao ´uteis.
Lema 2.4. Numa variedade existe uma sucess˜ao de subconjuntos com-pactos tais que qualquer compacto precedente pertence ao interior do pr´oximo e a pr´opria variedade ´e a uni˜ao de todos estes compactos. Lema 2.5. Para um subconjunto compacto de uma variedade e para qualquer vizinhan¸ca desse compacto existe uma fun¸c˜ao diferenci´avel n˜ao-negativa que tem os valores entre zero e um e mais o valor um em cada ponto deste compacto e zero fora dessa vizinhan¸ca.
Vamos usar os lemas para provar a necessidade na proposi¸c˜ao 2.3 e depois provaremos os lemas.
Denotemos para f o limite da nossa sucess˜ao. Trata-se de uma aplica¸c˜ao Cr porque, em qualquer compacto, a convergˆencia na topolo-gia Cr ´e uniforme para extens˜oes a jactos de ordem r.
Vamos assumir o contr´ario: para qualquer compacto n˜ao existe o ´ındice procurado. Com base neste pressuposto mostramos que existe uma subsucess˜ao de fun¸c˜oes {fij}, uma sequˆencia de pontos {xij} e,
tamb´em, uma fun¸c˜ao positiva e cont´ınua, &, no espa¸co das pr´e-imagens tais que ρ(jrfij(xij), j
rf (x
ij)) ≥ &(xij), onde ρ ´e uma m´etrica
com-pat´ıvel com a topologia em Jr(M, N ). Mas isto vai contradizer a con-vergˆencia da nossa sucess˜ao, logo, implicar a proposi¸c˜ao (Fig. 12).
TEORIA DAS SINGULARIDADES 17
Esta parte da demonstra¸c˜ao ´e baseada no princ´ıpio da indu¸c˜ao ma-tem´atica. Tomemos a sucess˜ao {Ki}∞i=1de compactos que satisfazem o lema 2.4.
Assumir o contr´ario, implica que existem ´ındices i1 e um ponto x1 tal que
ρ(jrfi1(x1), j rf (x
1)) > 0.
Denotemos o valor da ´ultima distˆancia por a1. Seja s1 o menor ´ındice tal que o compacto Ks1 cont´em o ponto x1 e &1 ´e a fun¸c˜ao constante
com valor a1. Este ´e o primeiro passo da indu¸c˜ao.
a1 al al+1 x1 xl xl+1 Jr(M, N ) Ks1 Ksl Ksl+1 Ksl+1 M jrf i1(M ) jrf (M ) jrf il(M ) jrf il+1(M )
Figura 12. A topologia fina ´e realmente forte.
No segundo passo, vamos assumir que j´a encontramos pontos x1, x2, . . . , xl, aplica¸c˜oes fi1, fi2, . . . , fil com i1 < i2 < · · · < il, um
com-pacto Ksl contendo estes pontos e uma fun¸c˜ao positiva &l tais que:
ρ(jrfij(xij), j rf (x
ij))≥ &l(xij) ∀j, 1 ≤ j ≤ l.
No 3o passo da indu¸c˜ao ´e necess´ario construir tais objectos para o valor do ´ındice igual a l + 1.
Devido ao facto de termos assumido o contr´ario, para o compacto Ksl+1 n˜ao existe qualquer ´ındice a partir do qual todas as aplica¸c˜oes
na nossa sucess˜ao coincidam fora deste compacto. Portanto existe uma aplica¸c˜ao fil+1, com ´ındice il+1 > il, diferente da aplica¸c˜ao limite em
algum ponto xil+1 situado fora do compacto Ksl+1. Seja Ksl+1 o primeiro
compacto da nossa sucess˜ao que cont´em o ponto xil+1. Denotemos por
al+1 = ρ(jrfil+1(xil+1), j rf (x
il+1)) e tomemos uma fun¸c˜ao φ,
diferen-ci´avel n˜ao negativa que satisfaz as condi¸c˜oes do Lema 2.5, isto ´e, forma o valor 1 no compacto Ksl e o valor nulo fora do compacto Ksl+1 e mais
com valores enter zero e um. A fun¸c˜ao, &l+1 diferenci´avel e positiva ´e definida da seguinte forma:
&l+1(x) = φ(x)&l(x) + (1− φ(x))al+1. ´
Assim, existem pontos x1, x2, . . . , xl, xl+1, aplica¸c˜oes fi1, fi2, . . . , fil,
fil+1 com i1 < i2 <· · · < il < il+1, um compacto Ksl+1 contendo estes
pontos e uma fun¸c˜ao positiva &l+1 tais que: ρ(jrfij(xij), j
rf (x
ij))≥ &l+1(xij) ∀j, 1 ≤ j ≤ l + 1.
Aplicando o pr´ıncipio da indu¸c˜ao matem´atica deduzimos que fora da vizinhan¸ca da nossa aplica¸c˜ao limite f que ´e definida pela fun¸c˜ao &∞, existe uma subsucess˜ao {fij}∞j=1 de aplica¸c˜oes da nossa sucess˜ao. Este
facto contradiz a convergˆencia desta sucess˜ao para esta aplica¸c˜ao f . Desta forma a nossa suposi¸c˜ao n˜ao ´e v´alida ⇒ a proposi¸c˜ao 2.3 ´e ver-dadeira.
Agora vamos provar os lemas.
Demonstra¸c˜ao do lema 2.4. Uma variedade tem base numer´avel da to-pologia porque, de acordo com a defini¸c˜ao, ela ´e um espa¸co topol´ogico de Hansdorff satisfazendo o segundo axioma de numerabilidade. Con-sideremos elementos desta base que tˆem fecho compacto.
Em primeiro lugar ´e poss´ıvel enumer´a-los U1, U2, . . . , Ul, . . . dado que eles satisfazem a condi¸c˜ao de numerabilidade. Em segundo lugar, a uni˜ao destes elementos cobre a variedade porque cada ponto da va-riedade tem uma destas vizinhan¸cas.
Definamos agora o compacto K1 como o fecho de U1 e, indutiva-mente, o compacto Ki+1como o fecho da uni˜ao U1, U2, . . . , Ur do menor n´umero pos´ıvel de elementos que cobre o compacto Ki. De acordo com a constru¸c˜ao utilizada a cadeia K1, K2, . . . , Kl, . . . satisfaz a condi¸c˜ao do lema.
Demonstra¸c˜ao do lema 2.5. Para provar o lema consideremos que a nossa variedade ´e coberta por dois compactos: U1 e U2 que s˜ao a viz-inhan¸ca e o complementar do compacto considerado, respectivamente. Tomemos uma parti¸c˜ao diferenci´avel da unidade subordinada `a cober-tura da variedade referida anteriormente. Definimos a fun¸c˜ao φ como a soma dos fun¸c˜oes dessa parti¸c˜ao que tˆem suportes em U1. A fun¸c˜ao φ ´e diferenci´avel com os valores entre zero e um, e mais ´e igual a 1 no nosso compacto e zero fora da sua vizinhan¸ca. Portanto, satisfaz as condi¸c˜oes do lema.
Nota 8. Uma parti¸c˜ao diferenci´avel da unidade ´e uma colec¸c˜ao de fun-¸c˜oes diferenci´aveis n˜ao negativas {φj} tais que:
• os seus suportes constituem, localmente, uma cobertura finita da variedade;
• em cada ponto a soma dos valores das fun¸c˜oes ´e igual a 1.
A parti¸c˜ao ´e subordinada a alguma cobertura se, para cada fun¸c˜ao da parti¸c˜ao, existe um elemento da cobertura que cont´em o suporte desta fun¸c˜ao.
TEORIA DAS SINGULARIDADES 19
Para qualquer cobertura de uma variedade existe uma parti¸c˜ao dife-renci´avel da unidade que ´e subordinada a essa cobertura [3].
A proposi¸c˜ao 2.3 implica o seguinte corol´ario:
Corol´ario 2.6. O conjunto das aplica¸c˜oes pr´oprias ´e aberto no espa¸co das aplica¸c˜oes Ck-diferenci´aveis na topologia Cr fina, r ≤ k.
Demonstra¸c˜ao. Vamos assumir o contr´ario; existe uma fun¸c˜ao pr´opria que ´e ponto de fronteira do conjunto das fun¸c˜oes pr´oprias. Conside-remos a sucess˜ao de aplica¸c˜oes n˜ao pr´oprias, mas que convergem para esse ponto. De acordo com a Proposi¸c˜ao 2.3 existe um compacto e um ´ındice tal que todas as aplica¸c˜oes com maior ´ındice coincidem, fora do compacto, com a aplica¸c˜ao f . Mas a restri¸c˜ao destas aplica¸c˜oes ao compacto s˜ao aplica¸c˜oes pr´oprias porque elas s˜ao cont´ınuas. Ent˜ao, a partir deste ´ındice todas as aplica¸c˜oes da nossa sucess˜ao s˜ao pr´oprias o que contradiz a nossa suposi¸c˜ao. Consequentemente, o corol´ario ´e verdadeiro.
2.4. Algumas aplica¸c˜oes cont´ınuas em topologias fortes. Nesta sec¸c˜ao vamos mostrar que algumas aplica¸c˜oes ´uteis s˜ao cont´ınuas na topologia forte.
Proposi¸c˜ao 2.7. Para variedades diferenci´aveis M , N a aplica¸c˜ao ex-tens˜ao ao jacto de ordem k
jk : f "→ jkf entre C∞(M, N ) e C∞(M, Jk(M, N )) ´e cont´ınua nas topologias Ck+s e Cs finas, respectivamente, para qual-quer inteiro n˜ao negativo s, e consequentemente nas C∞-topologias for-tes (finas).
Esta proposi¸c˜ao implica imediatamente que:
Corol´ario 2.8. Se a imagem de um conjunto fechado, sob a ac¸c˜ao da extens˜ao ao jacto de ordem k de uma aplica¸c˜ao diferenci´avel, n˜ao tem intersec¸c˜oes com algum subconjunto fechado do espa¸co dos jactos, ent˜ao essa imagem para qualquer aplica¸c˜ao, suficientemente pr´oxima da ini-cial, na topologia forte diferenci´avel (ou em qualquer Ck+s-topologia forte, s≥ 0, ) tamb´em n˜ao intersecta esse subconjunto fechado.
Corol´ario 2.9. O conjunto das imers˜oes (submers˜oes) ´e aberto no espa¸co das aplica¸c˜oes diferenci´aveis na C1-topologia forte.
Corol´ario 2.10. O conjunto das fun¸c˜oes apenas com pontos cr´ıticos n˜ao degenerados ´e aberto no espa¸co das fun¸c˜oes de classe C2 na C2 -topologia fina.
Corol´ario 2.11. O conjunto de campos de vectores que tˆem apenas pontos estacion´arios n˜ao degenerados ´e aberto no espa¸co dos campos C1 na C1-topologia fina.
Demonstra¸c˜ao dos corol´arios. As demonstra¸c˜oes s˜ao praticamente as mesmas; mostraremos somente que o segundo decorre do primeiro:
Se uma fun¸c˜ao n˜ao ´e submers˜ao ou imers˜ao num ponto, ent˜ao o 1-jacto da fun¸c˜ao nesse ponto pertence ao subconjunto fechado no espa¸co dos jactos, definido em coordenadas locais como a intersec¸c˜ao dos n´ıveis zero dos menorores de maior dimens˜ao da matriz jacobiana. De acordo com o corol´ario 2.8, o conjunto de fun¸c˜oes com extens˜oes do jacto de ordem 1 que n˜ao tem intersec¸c˜ao com este conjunto ´e aberto.
Nota 9. Mas em todos estes corol´arios necessitamos de ter um controle cuidado dos objectos no infinito no espa¸co das pr´e-imagens.
Por exemplo, o campo de vectores v(x) = e−|x|sin x (isto ´e um campo C1) definido na recta real tem apenas pontos estacion´arios n˜ao dege-nerados. Mas os valores pr´oprios associados `a sua lineariza¸c˜ao nesses pontos tende, exponencialmente, para zero `a medida que o ponto se aproxima do infinito. Assim, para preservar a n˜ao degenerescˆencia dos pontos estacion´arios necessitamos considerar vizinhan¸cas do nosso campo definidas por fun¸c˜oes, &, exponencialmente decrescentes na recta real (se no espa¸co tridimensional das vari´aveis x, v, v$a fun¸c˜ao distˆancia ´e a Euclideana.)
Demonstra¸c˜ao da Proposi¸c˜ao 2.7. Podemos dizer, de uma forma muito simples, que proposi¸c˜ao afirma que o jacto de ordem s da extens˜ao ao jacto de ordem k de uma aplica¸c˜ao diferenci´avel depende continua-mente da aplica¸c˜ao (e isto ´e ´obvio). Para provar isto consideramos um subconjunto aberto U pertencente a Js(M, Jk(M, N )). E sufi-´ ciente mostrar que para a base respectiva B(U ) conjunto aberto -em C∞(M, Jk(M, N )) o conjunto (jk)−1(B(U )) ´e tamb´em aberto em C∞(M, N ).
Num ponto o jacto de ordem (k + s) de uma aplica¸c˜ao define o jacto de ordem s da sua extens˜ao ao jacto de ordem k, como f´acilmente se depreende.
Denotamos por jk,s a seguinte aplica¸c˜ao jk,s : jk+sf (x) "→ js(jkf )(x) que ´e, certamente, cont´ınua. As aplica¸c˜oes js ◦ jk e j
k,s ◦ jk+s s˜ao a mesma aplica¸c˜ao em C∞(M, Js(M, Jk(M, N ))) (veja-se a figura 13).
Portanto
(jk)−1(B(U )) = B((jk,s)−1(U ))
Mas o conjunto (jk,s)−1(U ) ´e aberto pois ´e a pr´e-imagem de um aberto por uma aplica¸c˜ao cont´ınua; ent˜ao, o conjunto B((jk,s)−1(U )) ´e aberto como elemento da base da topologia. Logo, o conjunto (jk)−1(B(U )) ´e tamb´em aberto.
Proposi¸c˜ao 2.12. Sejam L, M , N variedades diferenci´aveis. Para uma aplica¸c˜ao φ : M → N a aplica¸c˜ao φ∗ : f "→ φ ◦ f entre C∞(L, M )
TEORIA DAS SINGULARIDADES 21
= Jk+s(M, N ) Js(M, Jk(M, N )) Jk(M, N ) js(jkf )(x) jk+sf jk+sf (x) js(jkf ) jkf (x) jkf jk,s x M jk+sf (x) jk,s( )
Figura 13. Diagrama comutativo com aplica¸c˜oes ex-tens˜oes de jactos.
e C∞(L, N ) ´e cont´ınua em qualquer Ck-topologia, e logo cont´ınua na topologia diferenci´avel fina.
Demonstra¸c˜ao. Seja U um subconjunto aberto em Jk(L, N ) e seja B(U ) o respectivo subconjunto em C∞(L, N ); por defini¸c˜ao de topolo-gia B(U ) ´e aberto. Ent˜ao, ´e suficiente mostrar que (φ∗)−1(B(U )) ´e um conjunto aberto.
A aplica¸c˜ao φ induz de forma natural a aplica¸c˜ao diferenci´avel e cont´ınua:
Φ : jkf (x)"→ jk(φ◦ f)(x)
entre os espa¸cos dos jactos Jk(L, M ) e Jk(L, N ) (veja-se figura 14). Ent˜ao a pr´e-imagem Φ−1(U ) ´e um conjunto aberto e o respectivo con-junto base B(Φ−1(U )) ´e aberto em C∞(L, M ) de acordo com a defini¸c˜ao de topologia. Jk(L, M ) Jk(L, N ) U −1(U ) ∗ C∞(L, M ) C∞(L, N ) B(U ) B( −1(U )) = −1 ∗ (B(U )) Φ Φ Φ ϕ ϕ
Figura 14. Continuidade da L-equivalˆencia.
Mas o ´ultimo conjunto coincide com (φ∗)−1(B(U )) como facilmente se vˆe. Assim, a aplica¸c˜ao φ∗ ´e cont´ınua em qualquer Ck-topologia fina, e por isso tamb´em o ´e na topologia diferenci´avel fina.
Nota 10. A ´ultima proposi¸c˜ao implica que a L-equivalˆencia ´e cont´ınua nas topologias fortes. Mas se nesta proposi¸c˜ao a aplica¸c˜ao fˆor entre as variedades L e M , ent˜ao a aplica¸c˜ao φ∗ pode ser cont´ınua ou n˜ao dependendo tal facto da aplica¸c˜ao φ. Por exemplo, para a fun¸c˜ao di-ferenci´avel φ, φ(x) = x/√1 + x2, definida na linha real consideremos a fun¸c˜ao composi¸c˜ao f ◦ φ onde f ´e uma fun¸c˜ao diferenci´avel qualquer (tamb´em definida na recta real). Se a respectiva aplica¸c˜ao φ∗ : f "→ f ◦ φ ´e cont´ınua na Ck-topologia forte, ent˜ao a pr´e-imagem, sob esta aplica¸c˜ao, de uma vizinhan¸ca da fun¸c˜ao zero
{f | ρ(jk(f ◦ φ), 0) < e−x2}
definida pela fun¸c˜ao &(x) = e−x2 tem que ser aberta. Mas qualquer fun¸c˜ao pertencente a esta pr´e-imagem tem que ter valor nulo no ponto x = ±1. Logo n˜ao ´e possivel formar conjuntos abertos. Ent˜ao a aplica¸c˜ao φ∗ n˜ao ´e cont´ınua nas topologias fortes.
Mas ´e cont´ınua se assumirmos, adicionalmente, que a aplica¸c˜ao φ ´e pr´opria, em particular, se esta aplica¸c˜ao ´e um difeomorfismo. Ent˜ao a R-equivalˆencia tamb´em ´e cont´ınua nas topologias finas.
3. Transversalidade e Teoremas de Transversalidade No espa¸co aritm´etico 3-dimensional duas linhas rectas n˜ao se inter-sectam e dois hiperplanos t´ıpicos tˆem intersec¸c˜ao de dimens˜ao 1. Nesta sec¸c˜ao vamos apresentar algumas generaliza¸c˜oes muito distantes destes factos.
3.1. No¸c˜oes de transversalidade.
Defini¸c˜ao 10. Sejam L, M, N variedades diferenci´aveis. Duas aplica-¸c˜oes diferenci´aveis f : L→ N e g : M → N s˜ao transversais nos pontos P ∈ L e Q ∈ M se:
• as imagens f(P ) e g(Q) s˜ao diferentes ou • f(P ) = g(Q) e se verifica a igualdade
f∗(P )TPL + g∗(Q)TQM = TSN, (3)
onde TPL, TQM, TSN s˜ao espa¸cos tangentes, f∗ e g∗ as aplica¸c˜oes induzidas dos fibrados tangentes, e S = f (P ) = g(Q)
Defini¸c˜ao 11. Estas aplica¸c˜oes s˜ao transversais nos conjuntos A ⊂ L e B ⊂ M se s˜ao transversais para qualquer par de pontos P ∈ A e Q∈ B.
Defini¸c˜ao 12. As aplica¸c˜oes f e g s˜ao transversais se a transversali-dade toma lugar para A = L e B = M.
A nota¸c˜ao utilizada para as defini¸c˜oes acima s˜ao: f !P,Q g, f !A,B g, f ! g, respectivamente.
TEORIA DAS SINGULARIDADES 23
Exemplo 4. Sejam L, M linhas reais com coordenadas u e v, respec-tivamente, e seja N o plano real R2
x,y. Considere a aplica¸c˜ao induzida pelo mergulho do eixo dos xx$ neste plano, e a aplica¸c˜ao definida pelas f´ormulas: x = v e y = v2+ &, onde o parˆametro & pode ser:
a) menor que zero, b) igual a zero ou c) maior que zero (veja-se a figura 15). x y g(IR ) L g∗(±&)T±√#IR g∗(0)T0IR = TOOx
(a) & < 0 (b) & = 0 (c) & > 0 (d)
O O O O x x x y y y g(IR ) g(IR ) g (I R ) L L L
Figura 15. Transversalidade e n˜ao transversalidade.
No subcaso (a) as imagens das nossas aplica¸c˜oes n˜ao se intersectam e, portanto, as aplica¸c˜oes s˜ao transversais por defini¸c˜ao.
No subcaso (b) as aplica¸c˜oes tamb´em s˜ao transversais, mas as ima-gens tˆem dois pontos de intersec¸c˜ao.O primeiro termo da equa¸c˜ao (2) d´a o subespa¸co linear horizontal R(1, 0) em qualquer ponto da imagem. O segundo termo define o subespa¸co linear R(1, 2v) no ponto (v, v2+ &) da imagem. A soma destes dois subespa¸cos d´a todo o plano se v ,= 0. No subcaso considerado isto ´e verdadeiro porque para o ponto de in-tersec¸c˜ao v2 =−& > 0.
Finalmente no caso (c) existe um ponto O que pertence `a intersec¸c˜ao das imagens, mas neste caso o segundo subespa¸co ´e tamb´em horizontal uma vez que para este ponto v2 = & = 0. Logo, a soma destes sub-espa¸cos coincide com cada um deles e n˜ao d´a o plano tangente para o espa¸co das imagens no ponto de intersec¸c˜ao. Ent˜ao as aplica¸c˜oes n˜ao s˜ao transversais nas origens.
Se a aplic¸c˜ao g ´e definida por x = 0, y = v3 ent˜ao as imagens das nossas aplica¸c˜oes tˆem outra vez a origem como ponto de intersec¸c˜ao. Neste ponto os espa¸cos tangentes das imagens somados d˜ao todo o plano (veja-se figura 15). Mas as aplica¸c˜oes continuam a n˜ao serem transversais nas pr´e-imagens deste ponto porque agora o segundo sub-espa¸co linear ´e trivial (= 0-dimensional) como ´e f´acil de ver.
Se na defini¸c˜ao de transversalidade uma das variedades pr´e-imagem, por exemplo M, ´e uma C1-subvariedade da variedade imagem e a aplica¸c˜ao ´e apenas o mergulho induzido g = i : M (→ N, ent˜ao definiremos de maneira an´aloga a tranversalidade de f a M num ponto,
a transversalidade de f a M num subconjunto A ⊂ L e a transver-salidade de f a M (A = L). Sendo a respectiva nota¸c˜ao dada por: f !P M, f !AM, f ! M.
3.2. Corol´arios de no¸c˜oes de transversalidade. Seja L, M, N va-riedades diferenci´aveis e f, g s˜ao aplica¸c˜oes diferenci´aveis de L e M, para N , respectivamente. Algumas afirma¸c˜oes simples e ´uteis decorrem da defini¸c˜ao de transversalidade.
Corol´ario 3.1. Seja L uma C1-subvariedade de N com codimens˜ao k, g(Q)∈ L para algum ponto Q ∈ M e z1, z2, . . . , zn s˜ao as coordenadas diferenci´aveis locais na vizinhan¸ca do ponto g(Q) no qual a subvarie-dade L ´e definida pelas equa¸c˜oes z1 = z2 =· · · = zk = 0. Ent˜ao g!Q L se e s´o se o germe, no ponto Q, da aplica¸c˜ao ˜g : (.)"→ (g1, g2, . . . gk) ´e o germe da submers˜ao ( onde g = (g1, g2, . . . gn)).
Demonstra¸c˜ao. Em z-coordenadas escolhidas o espa¸co tangente da sub-variedade L no ponto g(Q) coincide com o subespa¸co linear gerado pelos vectores unit´arios dos eixos zicom k < i≤ n (veja-se figura 16). Ent˜ao, se a aplica¸c˜ao ˜g ´e uma submers˜ao no ponto Q, a imagem g∗(Q)TQM tem que conter k vectores que, conjuntamente com os vectores unit´arios, fornecem uma base para o espa¸co tangente Tg(Q)N , e, portanto, g !Q L. Reciprocamente, se g !Q L ent˜ao a imagem g∗(Q)TQM tem que conter tais vectores adicionais, de acordo com isso, a aplica¸c˜ao ˜g tem caracter´ıstica m´axima no ponto Q. Logo esta aplica¸c˜ao ´e submers˜ao no ponto Q. zk+1, zk+2, . . . , zn g(M ) g(Q) = O g∗(Q )TQM φ(g(Q)) (φ ◦ g )∗ (Q )T Q M z1 ,z2 ,. .. ,zk φ : z"−→ (z1, z2, . . . , zk) L z1 ,z2 ,. .. ,zk projec¸c˜ao
Figura 16. Em coordenadas apropriadas: transversal-idade ⇔ submers˜ao.
Exemplo 5. Consideremos um campo de vectores diferenci´avel na recta real. Trata-se da sec¸c˜ao g : x "→ (x, v(x)) do fibrado tangente para a recta. Os seus pontos estacion´arios s˜ao exactamente a inter-sec¸c˜ao desta inter-sec¸c˜ao com a inter-sec¸c˜ao zero (v ≡ 0) que ´e a subvariedade diferenci´avel do fibrado tangente da codimens˜ao 1. De acordo com o corol´ario 3.1, a sec¸c˜ao g ´e transversal a esta subvariedade no ponto Q, v(Q) = 0, se e s´o se a aplica¸c˜ao x "→ v(x) tem caracter´ıstica m´axima
TEORIA DAS SINGULARIDADES 25
neste ponto, isto ´e, v$(Q),= 0. Ent˜ao, a transversalidade aqui significa que o ponto estacion´ario, Q, ´e n˜ao degenerado.
O mesmo ´e verdadeiro para um campo de vectores numa variedade de dimens˜ao 1.
Exemplo 6. Consideremos o C2-potencial, U , no espa¸co aritm´etico Rm
x. Os seus pontos cr´ıticos s˜ao exactamente aqueles onde U$ = 0. Ent˜ao, o seu aparecimento corresponde ˜a intersec¸c˜ao da imagem da extens˜ao ao jacto de ordem 1 do potencial com a subvariedade diferen-ci´avel no espa¸co dos jactos de ordem 1 definido pela equa¸c˜ao U$ = 0. Tendo em conta o corol´ario 3.1, a extens˜ao ao jacto de ordem 1 do potencial ´e transversal a esta subvariedade se e s´o se a aplica¸c˜ao x "→ U$(x) tem caracter´ıstica m´axima no respectivo ponto. Isto significa que, em tal ponto, a matriz Hessiana U$$ ´e n˜ao degenerada. Logo, aqui a transversalidade significa que o ponto cr´ıtico do potencial ´e n˜ao degenerado.
Tamb´em se pode dizer o mesmo para um C2-potencial numa varie-dade.
Corol´ario 3.2. Se para k ≥ 1 as aplica¸c˜oes Ck f e g s˜ao transversais ent˜ao o conjunto S de todos os pontos P ∈ L, Q ∈ M satisfazendo a igualdade f (P ) = g(Q) ´e vazio ou uma Ck-subvariedade no produto directo L× M de dimens˜ao dim L + dim M − dim N (de codimens˜ao dim N ). Em particular, quando dim L + dim M − dim N < 0 este conjunto ´e sempre vazio.
Demonstra¸c˜ao. Se o conjunto S ´e vazio o corol´ario ´e v´alido. Seja S ,= ∅. Sejam (P, Q) ∈ S e r a caracter´ıstica da aplica¸c˜ao f no ponto P. Ent˜ao, quaisquer que sejam as coordenadas locais consideradas existem exac-tamente r componentes desta aplica¸c˜ao com diferenciais linearmente independentes no ponto P . Podemos, perto deste ponto, tomar estas componentes como primeiras r componentes das coordenadas locais xi no espa¸co das pr´e-imagens. Assim, depois da reordena¸c˜ao das coorde-nadas locais no espa¸co das imagens, a aplica¸c˜ao f , toma a forma
zi = xi, 1≤ i ≤ r; zj = fj(x), r < j≤ n,
onde x1, x2, . . . , xl e z1, z2, . . . zn s˜ao coordenadas locais de classe Ck e C∞, respectivamente, no espa¸co das pr´e-imagens e espa¸co das imagens com origens nos pontos P e f (P ), respectivamente, e todos os fj s˜ao fun¸c˜oes Ck. Todas as derivadas f$
j(P ), r < j ≤ n, s˜ao nulas pois, a caracter´ıstica de f no ponto Q ´e igual a r. Ent˜ao, nestas coordenadas, a imagem f∗(P )TPL coincide com o espa¸co linear gerado pelos primeiros r vectores unit´arios.
As aplica¸c˜oes f e g s˜ao transversais nos pontos P, Q. Ent˜ao, a ima-gem g∗(Q)TQM ter´a de nos dar os n− r vectores b´asicos do espa¸co tangente Tf (P )N . Portanto, nas coordenadas z escolhidas as ´ultimas
n−r componentes da aplica¸c˜ao g tˆem diferenciais linearmente indepen-dentes no ponto Q. Ent˜ao, perto deste ponto, elas podem ser tomadas como as ´ultimas (n− r) coordenadas locais yi de classe Ck, com quais-quer outras coordenadas y1, . . . , ym−n+r tamb´em de classe Ck.
Nas coordenadas escolhidas a aplica¸c˜ao g assume a forma zi = gi(y), 1≤ i ≤ r; zj = ym−n+j, r < j ≤ n, onde todos os gj s˜ao fun¸c˜oes Ck.
Consequentemente, ´e f´acil verificar que o conjunto S ´e definido, perto do ponto (P, Q), pelo sistema de n equa¸c˜oes
xi− gi(y) = 0, 1≤ i ≤ r; ym−n+j− fj(x) = 0, r < j ≤ n. O lado esquerdo destas equa¸c˜oes s˜ao fun¸c˜oes Ck, e as suas diferenciais no ponto (P, Q) s˜ao linearmente independentes: a matriz das derivadas calculada na origem cont´em a submatriz n×n, triangular com diagonal unit´aria. Donde, pelo teorema da fun¸c˜ao impl´ıcita este sistema define, pr´oximo do ponto (P, Q), uma subvariedade Ck de codimens˜ao n ( ou dimens˜ao dim L + dim M − dim N).
Nota 11. Se, para al´em das condi¸c˜oes do ´ultimo corol´ario, a aplica-¸c˜ao f ´e pr´opria, ent˜ao a restriaplica-¸c˜ao ao conjunto S da projecaplica-¸c˜ao natural do produto directo L× M ao segundo factor (sendo dom´ınio de g) ´e tamb´em uma aplica¸c˜ao pr´opria.
Nota 12. Se a variedade L ´e uma subvariedade em N e f ´e o mergulho induzido ent˜ao, a subvariedade S ´e definida naturalmente em M , e neste caso ou ´e vazia ou a sua codimens˜ao ´e igual `a codimens˜ao de L em N .
Exemplo 7. Consideremos um potencial C2 numa variedade diferen-ci´avel M que depende diferenciavelmente do parˆametro λ percorrendo uma variedade diferenci´avel Λ. No espa¸co dos potenciais dos 1-jactos (como uma fun¸c˜ao de duas vari´aveis x ∈ M e λ) o conjunto de jactos satisfazendo U$
x = 0 ´e uma subvariedade diferenci´avel de codimens˜ao m = dim M. Pelo ´ultimo corol´ario a transversalidade do potencial da extens˜ao ao 1-jacto a esta subvariedade implica que os seus pontos cr´ıticos formem uma subvariedade diferenci´avel de codimens˜ao m (e ent˜ao, de dimens˜ao dim Λ) no produto directo M × Λ.
Note-se que aqui transversalidade n˜ao significa que um ponto cr´ıtico de um potencial tem de ser n˜ao degenerado. Por exemplo, o potencial U (x) = x3 + λx no eixo real, onde a diferenciabilidade depende do parˆametro real λ, tem uma extens˜ao 1-jacto transversal `a subvariedade U$
x = 0 mas para λ = 0 o seu ´unico ponto cr´ıtico ´e degenerado (Fig.17). O conjunto de todos os pontos cr´ıticos forma a par´abola λ = −3x2 que ´e uma subvariedade de codimens˜ao (dimens˜ao) 1 no plano x, λ.
TEORIA DAS SINGULARIDADES 27
U λ x λ =−3x2 O O λ x U = x3+ xλ
Figura 17. Pontos cr´ıticos do potencial x3+ xλ.
Proposi¸c˜ao 3.3. Para uma dada aplica¸c˜ao pr´opria diferenci´avel g : M → N o conjunto de todas as aplica¸c˜oes diferenci´aveis f : L → N transversais a g ´e aberto para a topologia fina C1.
Demonstra¸c˜ao. ´E baseada no corol´ario 2.8. Por este corol´ario ´e sufi-ciente mostrar que no espa¸co J1(L, N ) o conjunto S de jactos que nos d˜ao a n˜ao transversalidade `a aplica¸c˜ao pr´opria dada, g, ´e fechada.
Seja {σi}∞i=1 uma sequˆencia convergente de jactos em S e σ o seu limite. Precisamos de mostrar que σ ∈ S. Denotemos por Pi, Hi, (P , H) as imagens do jacto σi (σ, respectivamente) nas variedades L e N , respectivamente, sob as projec¸c˜oes naturais.
Seja fi um qualquer representante do jacto σi. Tomemos qualquer ponto Qi na pr´e-imagem do ponto Hi sob a aplica¸c˜ao g tal que as aplica¸c˜oes fi e g n˜ao s˜ao transversais nos pontos Pi, Qi. Aqui, a n˜ao transversalidade significa que a caracter´ıstica da aplica¸c˜ao linear
"
fi∗(Pi) 0 0 g∗(Qi)
# (4)
do plano tangente TPiL× TQiM no plano tangente THiN ´e menor que
dim N . Obviamente esta caracter´ıstica ´e a mesma para qualquer re-presentante (=fi) do jacto σi.
Consideremos uma vizinhan¸ca qualquer do ponto H com fecho com-pacto e pr´e-imagem deste fecho K sob a aplica¸c˜ao g. K ´e comcom-pacto pois g ´e uma aplica¸c˜ao pr´opria. Come¸cando por um qualquer ´ındice, todos os pontos Hi pertencem a esta vizinhan¸ca, e ent˜ao todos os pontos Qi pertencem a este compacto. Pelo teorema de Bolzano-Weierstrass existe uma subsequˆencia convergente {Qij}∞j=1. Sem perda de
generali-dade podemos supor que esta subsequˆencia ´e precisamente a sequˆencia {Qi}∞i=1. Seja Q o seu limite.
Pela dependˆencia cont´ınua da aplica¸c˜ao linear (4) do jacto σi e do ponto Qi a sua caracter´ıstica para o jacto σ no ponto Q ´e tamb´em menor que dim N. Da´ı que o jacto limite σ tamb´em perten¸ca a S.
J1(L, N ) σ1 σ σ2 σi P1 P P2 Pi Q1 Q2 Q Qi K M L N H1 H H2 Hi g(M ) f f1 fi f2 j1f j1f 1 j1f 2 j1f i j1f (L) j1f 1(L) j1f i(L) j1f 2(L) g
Figura 18. Conjunto de jactos supondo que a n˜ao transversalidade ´e fechada.
Nota 13. Na proposi¸c˜ao acabada de demonstrar a qualidade de ser pr´opria da aplica¸c˜ao g ´e muito importante para a abertura do conjunto de aplica¸c˜oes f transversais a g. A afirma¸c˜ao n˜ao ´e verdadeira sem esta suposi¸c˜ao.
Por exemplo, consideremos a aplica¸c˜ao g : u "→ (0, u/(1 + u2)1/2). Ent˜ao o mergulho no plano do c´ırculo (x−1)2+(y−1)2 = 1 ´e transversal com g porque as suas imagens n˜ao se intersectam. Mas existem per-turba¸c˜oes delas, t˜ao pequenas quanto queiramos, que n˜ao s˜ao transver-sais com g (Fig. 19).
(x− 1)2+ (y− 1)2= 1 (x − 1)2+ (y− 1 + &)2= 1 y g(IR) & O x 1 1
Figura 19. A qualidade de ser pr´opria ´e muito impor-tante para a abertura.
3.3. Teoremas de Transversalidade. Os teoremas de transversali-dade s˜ao uma das mais importantes ferramentas na teoria das singu-laridades. Sejam L, M e N variedades diferenci´aveis.
TEORIA DAS SINGULARIDADES 29
Teorema de transversalidade de Bakhtin-Lin. Para qualquer apli-ca¸c˜ao pr´opria diferenci´avel g : M → N o conjunto de aplica¸c˜oes dife-renci´aveis f : L → N transversais a g ´e aberto para a topologia fina C1 e denso para a topologia fina C∞.
Teorema de transversalidade de jactos de Bahtin-Lin. Para qual-quer aplica¸c˜ao pr´opria diferenci´avel g : M → Jk(L, N ) o conjunto de aplica¸c˜oes diferenci´aveis f : L→ N com extens˜oes k-jacto transversais a g ´e aberto para a topologia fina Ck+1 e denso para a topologia fina C∞.
Estas teoremas conduzen-nos `as seguintes afirma¸c˜oes.
Corol´ario 3.4 (Teorema de transversalidade fraca). Para qualquer sub-variedade C1, M em N fechada em N , o conjunto de aplica¸c˜oes dife-renci´aveis f : L→ N transversais a M ´e aberto para topologia fina C1 e denso para a topologia fina C∞.
Corol´ario 3.5 (Teorema de transversalidade de Thom). Para qualquer subvariedade C1, M , em Jk(L, N ), fechada em Jk(L, N ), o conjunto de aplica¸c˜oes diferenci´aveis f : L → N de extens˜oes k-jacto transver-sais a M ´e aberto para a topologia fina Ck+1 e denso para a topologia fina C∞.
Primeiramente demonstremos os corol´arios recorrendo aos teoremas de transversalidade de Bahtin-Lin.
Demonstra¸c˜ao. O teorema de transversalidade fraca segue imediata-mente do teorema de transversalidade de Bahtin-Lin onde a aplica¸c˜ao g ´e tomada como o mergulho de M em N (que ´e uma aplica¸c˜ao pr´opria porque a subvariedade M ´e fechada em N ). Pelo mesmo argumento o teorema de transversalidade de jactos de Bahtin-Lin implica o teorema de transversalidade de Thom.
Nota 14. Os teoremas de transversalidade de Bahtin- Lin e os coro-l´arios tamb´em s˜ao v´alidos para aplica¸c˜oes Cr suficientemente diferen-ci´aveis, mas, neste caso, a densidade ´e para a topologia Cr respectiva-mente. Note-se que neste espa¸co o conjunto de aplica¸c˜oes diferenci´aveis ´e sempre denso [5].
Antes de demonstrarmos os teoremas de transversalidade de Bahtin-Lin formularemos alguns corol´arios simples an´alogos aos Corol´arios 2.10, 2.11. Ilustraremos a utilidade dos teoremas de transversalidade. Corol´ario 3.6. No espa¸co das fun¸c˜oes diferenci´aveis o conjunto de fun¸c˜oes apenas com pontos cr´ıticos n˜ao degenerados ´e aberto para a topologia fina C2 e denso na topologia fina C∞.
Corol´ario 3.7. No espa¸co dos campos vectoriais diferenci´aveis o con-junto daqueles apenas com pontos cr´ıticos n˜ao degenerados ´e aberto na topologia fina C1 e denso na topologia fina C∞.
Demonstra¸c˜ao. O theorema de transversalidade de jactos de Bakhtin-Lin implica estos corol´arios.
O 1-jacto de fun¸cao num ponto cr´ıtico pertence ao subconjunto M dos jactos com primeira derivada nula. Este subconjunto ´e uma sub-variedade. Pelo theorema de transversalidade de jactos, o conjunto das fun¸c˜oes cuja extens˜ao de 1-jacto ´e transversal a M ´e aberto na topolo-gia fina C2 e denso na topologia fina C∞. Mas aqui, ser transversal significa que os pontos cr´ıticos s˜ao n˜ao degenerados.
Analogamente, o 0-jacto de um campo vectorial num ponto cr´ıtico pertence ao subconjunto M dos jactos com valor nulo de velocidade. Este subconjunto ´e uma subvariedade. Pelo theorema de transversali-dade de jactos, o conjunto dos campos, com extens˜oes 1-jacto transver-sais a M , ´e aberto natopologia fina C1 e denso na topologia fina C∞. Novamente aqui, ser transversal significa que pontos criticos s˜ao n˜ao degenerados.
Nota 15. Diz-se que um objecto gen´erico (=t´ıpico) tem alguma pro-priedade se esta propro-priedade ocorre para qualquer objecto de um sub-conjunto denso e aberto no espa¸co dos objectos na topologia apro-priada. No nosso caso usaremos normalmente topologias finas diferen-ci´aveis (ou suficientemente diferendiferen-ci´aveis). Por exemplo, pelo Corol´ario 3.6 uma fun¸c˜ao diferenci´avel gen´erica tem apenas pontos cr´ıticos n˜ao degenerados.
3.4. Demonstra¸c˜ao do teorema de transversalidade de Bahtin-Lin.
Demonstra¸c˜ao do teorema de Bahtin-Lin. Precisamos apenas de mos-trar que o conjunto das aplica¸c˜oes transversais ´e denso no espa¸co das aplica¸c˜oes na topologia diferenci´avel fina, pois devido `a Proposi¸c˜ao 3.3 verifica-se que esse conjunto ´e aberto.
As duas afirma¸c˜oes seguintes s˜ao muito ´uteis.
Teorema 3.8. Para variedades L, E, M e aplica¸c˜ao diferenci´avel F : L×E → N transversal a uma aplica¸c˜ao pr´opria g : M → N o conjunto de &∈ E para os quais a aplica¸c˜ao f# : (., &)"→ F (., &) ´e transversal a g ´e residual em E.
Teorema 3.9. O espa¸co das aplica¸c˜oes Ckcom a topologia Cr fina, para 0≤ r ≤ k, ´e um espa¸co de Baire.
Nota 16. Um subconjunto residual tem de conter uma intersec¸c˜ao nun-ca maior do que um n´umero cont´avel de subconjuntos densos abertos. Um espa¸co topol´ogico diz-se um espa¸co de Baire se algum dos seus subconjuntos residuais ´e denso. Por exemplo, qualquer variedade ´e um espa¸co de Baire. ´E ´obvio que a intersec¸c˜ao de um n´umero cont´avel de subconjuntos residuais ´e residual.
TEORIA DAS SINGULARIDADES 31
Pela defini¸c˜ao de topologia diferenci´avel fina ´e suficiente mostrar a densidade das aplica¸c˜oes transversais para qualquer topologia fina Ck, k ≥ 1.
Seja U um conjunto aberto de uma base topol´ogica cont´avel em N com fecho compacto e pertencente a alguma vizinhan¸ca de coordenadas V e seja K o fecho de algum conjunto do mesmo tipo mas apenas em L. ´E suficiente mostrar a densidade do conjunto de todos os mapas f transversais a g nos compactos K e g−1( ¯U ), respectivamente (o ´ultimo conjunto ´e compacto pelo facto de a aplica¸c˜ao g ser pr´opria e da com-pacidade do conjunto ¯U ).
Na verdade, pela Proposi¸c˜ao 3.3 este conjunto ´e aberto. Conse-quentemente, tomando a intersec¸c˜ao de todos estes conjuntos sob, n˜ao mais do que um n´umero cont´avel de pares desses compactos, obtemos o subconjunto de aplica¸c˜oes residuais transversais a g (pois qualquer variedade ´e coberta por tais compactos). Mas um subconjunto residual ´e sempre denso em C∞(L, N ) para qualquer topologia fina, devido ao Teorema 3.9.
Assim, precisamos de mostrar que existe uma pequena perturba¸c˜ao para qualquer aplica¸c˜ao f ∈ C∞(L, N ) transversal a g nos compactos K e g−1( ¯U ), respectivamente.
Se a intersec¸c˜ao f (K) ∩ ¯U ´e vazia ent˜ao n˜ao h´a necessidade de se provocar qualquer perturba¸c˜ao, j´a que a aplica¸c˜ao f ´e, ela mesma, transversal.
Seja f (K)∩ ¯U n˜ao vazia, e consideremos K$ = K∩ f−1( ¯U ). Pela continuidade da fun¸c˜ao f existem vizinhan¸cas W, W$ do compacto K$, t˜ao pequenas quanto queiramos, com fechos compactos e tais que ¯W ⊂ W$ e f ( ¯W$)⊂ V . A imagem do compacto ¯W$ para qualquer aplica¸c˜ao suficientemente pr´oxima de f pertence `a vizinhan¸ca de coordenadas V . Mas, mantendo-nos nesta vizinhan¸ca podemos supor estar no dom´ınio do espa¸co aritm´etico n-dimensional Rn. Consequentemente, para valo-res de &∈ Rn suficientemente pequenos a perturba¸c˜ao
f# : x"→ f(x) + &φ(x), (5)
onde a fun¸c˜ao diferenci´avel φ ´e igual a um no compacto ¯W e zero fora do compacto ¯W$, da nossa aplica¸c˜ao inicial, est´a correctamente definida.
A diferen¸ca K\ W ´e compacta e, pela escolha de W , a sua imagem sob a aplica¸c˜ao f n˜ao tem intersec¸c˜ao com o conjunto ¯U . Por con-seguinte, para valores suficientemente pequenos de &, a imagem deste compacto sob a aplica¸c˜ao f#tamb´em n˜ao intersecta o conjunto ¯U . Mas isto significa que as aplica¸c˜oes f# e g s˜ao transversais nos compactos K\ W e g−1( ¯U ). Mais, a aplica¸c˜ao F : (x, &)"→ f
#(x) ´e uma submers˜ao no ponto (x, &) se x ∈ ¯W e o valor de & ´e suficientemente pequeno para que a perturba¸c˜ao esteja bem definida. Mas uma submers˜ao ´e transver-sal a qualquer aplica¸c˜ao.
f−1( ¯U ) K$ K W W$ ¯ U f ( ¯W ) f ( ¯W$) f (K) f V
Figura 20. Transversalidade nos compactos K e g−1( ¯U ) Assim, existe um n´umero positivo δ tal que, para qualquer valor de &, |&| ≤ δ, a aplica¸c˜ao F ´e transversal a g nos compactos (K\W ) ∪ ¯W e g−1( ¯U ), respectivamente. Mas K ⊂ (K\W ) ∪ ¯W . Ent˜ao para tais valores de & as aplica¸c˜oes F e g s˜ao transversais nos compactos K e g−1( ¯U ), respectivamente, e portanto, em algumas vizinhan¸cas suficien-temente pequenas L$ e M$ destes compactos respectivamente.
Pelo Teorema 3.8 o conjunto dos & que nos d˜ao a transversalidade entre f# e g em L$ e M$, respectivamente, ´e residual na bola E = {& | |&| < δ}. Portanto, existe um & arbitrariamente pequeno capaz de nos fornecer tal transversalidade, e por conseguinte a transversalidade entre f# e g nos compactos K e g−1( ¯U ), respectivamente.
Mas a nossa perturba¸c˜ao est´a localizada no compacto ¯W$ e depende continuamente do parˆametro &. Portanto, numa dada vizinhan¸ca de f a aplica¸c˜ao f#pertence a esta vizinhan¸ca para um & suficientemente pe-queno. Da´ı que o conjunto de aplica¸c˜oes transversais a g nos compactos K e g−1( ¯U ) seja denso.
Assim concluimos a demonstra¸c˜ao do Teorema de transversalidade de Bahtin-Lin.
Nota 17. A demonstra¸c˜ao do Teorema de transversalidade de jactos de Bahtin-Lin pode ser feito da mesma forma. S´o precisamos usar a perturba¸c˜ao & ´e um polinomio de grau k e vizinhan¸cas de tipo V na espa¸o de jactos.
O Teorema 3.8 segue do Corol´ario 3.2 e da afirma¸c˜ao seguinte: Teorema de Bertini-Sard. Para variedades diferenci´aveis M , N e aplica¸c˜ao g : M → N de classe Cr, a medida dos valores cr´ıticos desta aplica¸c˜ao ´e zero se r > min{0, m − n}. Al´em disso, o conjunto dos valores n˜ao cr´ıticos ´e residual.