Data de Criação: 17/02/2021
Criado por: Biblioteca SP
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Os artigos reproduzidos neste clipping de notícias são, tanto no conteúdo quanto na forma, de inteira responsabilidade de seus autores. Não traduzem, por isso mesmo, a opinião legal ou manifestação de integrante da SiqueiraCastro.
Sumário das
Matérias:
Vazamentos se multiplicam e expõem falhas
Valor ––17 de fevereiro...01
Restrições em calamidade podem ser permanentes
Valor ––17 de fevereiro...07
Projeto pode reduzir pedágio em rodovias federais
Valor ––17 de fevereiro...10
OIT questiona flexibilização trabalhista
Valor ––17 de fevereiro...12
Proposta do Senado irá prevalecer na reforma tributária
Valor ––17 de fevereiro...13
Lava-Jato teve 150 investigações arquivadas por falta de provas
Valor ––17 de fevereiro...15
Decisão de Moraes provoca apreensão
Valor ––17 de fevereiro...18
China estuda limitar venda de terras-raras para empresas dos EUA
Valor ––17 de fevereiro...20
Mais um pacote nefasto para facilitar posse e uso de armas
Valor ––17 de fevereiro...23
Um leilão para limpar a matriz elétrica da Amazônia
Valor ––17 de fevereiro...25
Cedae atrai fornecedores de tecnologia
Valor ––17 de fevereiro...28
EDF mira leilões para expandir geração a gás
Valor ––17 de fevereiro...31
Movimento falimentar
Mais operadores disputam táxi-aéreo
Valor ––17 de fevereiro...35
Produtores da divisa entre MT e PA vivem incerteza tributária
Valor ––17 de fevereiro...39
Eleva recorre à Justiça de forma preventiva para amortizar ágio
Valor ––17 de fevereiro...42
Caso da Viação Cometa será primeiro a ser julgado no STJ
Valor ––17 de fevereiro...45
Fiagro e agenda regulatória
Valor ––17 de fevereiro...47
Justiça concede liminar para suspender Carnaval digital de SP
Folha ––17 de fevereiro...50
Procon-SP entra em investigação sobre vazamento de dados de mais de 100 milhões de contas de celular
Folha ––17 de fevereiro...52
Operadoras de telefonia têm 15 dias para explicar vazamento de dados ao Ministério da Justiça
Folha ––17 de fevereiro...54
Covid: empresas buscam selos que certificam segurança de ambientes de trabalho
Globo ––17 de fevereiro...55
Penas para golpes digitais como vazamentos de dados não passam de um ano de prisão
Globo ––17 de fevereiro...58
STF julga se teles devem continuar usando espaços públicos sem pagar nada
OESP ––17 de fevereiro...62
Plano de saúde não pode limitar sessões de terapia ocupacional, diz STJ
Conjur ––17 de fevereiro...65
Instrutores de motocicleta receberão adicional de periculosidade
Migalhas ––17 de fevereiro...67
A nova lei de recuperação judicial e falências
Migalhas ––17 de fevereiro...69
Carf declara a decadência de cobrança em recurso apresentado fora do prazo
Valor Econômico
Caderno: Primeira Página,
quarta-feira 17 de fevereiro de 2021.
Vazamentos se multiplicam e
expõem falhas
Pandemia acelerou a
digitalização das empresas, mas na visão de especialistas em
cibersegurança, medidas de
proteção não foram tomadas no mesmo ritmo
Por Daniela Braun, Adriana Aguiar, Beatriz Olivon e Laura Ignacio — De São Paulo e Brasília
O ano mal começou e já houve o vazamento de dados de mais de 223 milhões de pessoas, 40 milhões de CPNJs, 107 milhões de veículos e, mais recentemente, de 102,8 milhões de celulares. “Estamos vivendo uma pandemia digital”, causada pela digitalização apressada das empresas e a adoção do “home office”, diz Marco DeMello, CEO da PSafe. Segundo especialistas, o investimento em segurança digital ainda é decidido na ponta do lápis. “Muitos preferem correr o risco”, afirma Marcos Sêmola, sócio da EY no Brasil. “Outro ponto é se a empresa afastará clientes com uma camada de segurança a mais em seu site ou aplicativo”, diz.
Advogados especializados em direito digital afirmam que a legislação é branda para punir esses crimes.
01
‘
Pandemia digital’ exige olhar
do CEO das empresas
Megavazamentos de dados deste ano expõem falhas
Por Daniela Braun — De São Paulo
O ano mal começou e os
megavazamentos de dados colocam em xeque não só a credibilidade de instituições privadas e públicas no país, mas o quanto priorizam investimentos em segurança da informação. A pandemia acelerou a digitalização das empresas, mas na
visão de especialistas em
cibersegurança, medidas de proteção não foram tomadas no mesmo ritmo. A adoção do “home office” a toque de
caixa por grande parte das
companhias abriu uma brecha
adicional.
“Estamos vivendo uma pandemia digital”, diz Marco DeMello, CEO da PSafe, empresa que detectou dois
megavazamentos recentes. “Cada
colaborador remoto se transforma em um ponto a mais de vulnerabilidade.”
Só este ano, vazaram dados de mais de 223 milhões de pessoas, 40 milhões de CPNJs, 107 milhões de veículos e, mais recentemente, de 102,8 milhões de celulares.
Tamanha quantidade de informações ajuda os criminosos a criarem táticas novas e mais convincentes de abordar suas vítimas. “Antes a abordagem era genérica, mas hoje vem com nome completo e CPF”, diz Alexandre Bonatti, diretor de engenharia da Fortinet, voltada para cibersegurança. “A probabilidade de uma pessoa cair num golpe desses, mesmo informada, é muito maior.”
A estimativa de investimentos de instituições públicas e privadas em segurança no país é de US$ 900 milhões este ano, um avanço de 12,5% em relação a 2020, segundo a
consultoria IDC. O comércio
eletrônico, por sua vez, cresceu mais de 40%, no ano passado, com a pandemia.
Na avaliação de especialistas, a decisão do quanto investir em cibersegurança ainda é tomada na na ponta do lápis. “Se o prejuízo com um vazamento for de R$ 1 milhão e o investimento em segurança for de R$ 1,5 milhão, muitos preferem correr o risco”, diz Marcos Sêmola, sócio de cibersegurança da consultoria EY no Brasil. “Outro ponto que conta é se a empresa afastará clientes criando uma camada de segurança a mais em seu site ou aplicativo, por exemplo.” DeMello ressalta que segurança da informação não é mais assunto da área de tecnologia. “A discussão tem que estar com o CEO e fazer parte da pauta do conselho das empresas.”
02 A PSafe identificou o primeiro
megavazamento em meados de
janeiro ao notar a venda de mais de 40 milhões de CPNJs em uma rede oculta, ambiente conhecido como deep ou dark web, invisível aos sistemas de buscas tradicionais. Em contato com o hacker, e se fazendo passar por um comprador, a PSafe teve acesso à oferta de pacotes de dados de US$ 100 cada, com informações como nome, CPF, título eleitoral, foto de rosto, renda mensal, participação no Bolsa Família, score de crédito, incluindo dados de pessoas falecidas.
Já os dados de mais de 102 milhões de números de celulares, nomes e tempos de chamadas, que segundo o invasor pertenciam às operadoras Vivo e Claro, eram vendidos por 0.026 Bitcoin cada - o equivalente R$ 6,2 mil por pacote de 55 milhões de números de uma operadora e de 47
milhões de outra. Procuradas
pelo Valor, as operadoras Telefônica
e Claro afirmaram que não
identificaram incidentes de
vazamento em suas bases de dados. O
Ministério da Justiça pediu
informações às operadoras de celular sobre o assunto.
Luis Corrons, pesquisador sênior da Avast, na Espanha, diz que o valor dos dados depende do volume, da profundidade e de quem são as informações. “Dados de políticos, por exemplo, costumam valer mais”, afirma.
No primeiro megavazamento, além de nomear a pasta como “Serasa Experian”, o criminoso disse à PSafe que os dados vieram da base da empresa, mostrando conjuntos de dados similares e o uso do formato
Moisaic, também adotado pela Serasa. A afirmação levou a Secretaria Nacional do Consumidor (Senacon), o Procon de São Paulo e a Autoridade Nacional de Proteção de Dados (ANPD), órgão criado no fim de setembro para regulamentar a Lei Geral de Proteção de Dados (LGPD), a pedirem esclarecimentos à empresa. A Serasa afirma que as alegações são infundadas. “Com base em nossa análise detalhada até este ponto, concluímos que a Serasa não é a fonte. Também não vemos evidências de que nossos sistemas tenham sido comprometidos.”
A ANPD, que investiga os dois megavazamentos, oficiou a Policia Federal, o Gabinete de Segurança
Institucional da Presidência da
República, o Comitê Gestor da Internet no Brasil e a PSafe para colaborarem com as investigações. A autoridade informou que a Serasa já enviou as informações solicitadas. Criada em outubro como parte da estrutura do Departamento Estadual de Investigações Criminais (Deic) da Polícia Civil do Estado de São Paulo, a Divisão de Crimes Cibernéticos (DCCIBER) também iniciou um
inquérito para apurar o
megavazamento de dados revelado em janeiro.
Segundo o delegado Carlos Ruiz, responsável pela 3ª Delegacia de Polícia sobre Violação de Dispositivos Eletrônicos e Redes de Dados da DCCIBER, além dos vazamentos, estão em investigação mais de 700 casos de crime organizado operando em meios digitais.
03 Os casos de ransomware, o sequestro de dados, contra empresas têm sido frequentes. “Recebemos de três a quatro ocorrências mensais”, afirma Ruiz. A identificação dos criminosos, no entanto, costuma ser complicada, porque envolve pedidos de resgate em criptomoedas e invasões que partem do exterior. “São casos que se originam frequentemente na Rússia e no Leste Europeu”, informa.
A polícia também esbarra na falta de informações das próprias empresas. “Às vezes, a equipe de TI não quer revelar que os criminosos acham uma brecha sistêmica porque a área não estava bem estruturada”, afirma o
delegado. A perícia digital
terceirizada costuma ser uma
recomendação nesses casos.
Considerando que, a partir de agosto, a ANPD passa a aplicar as sanções da Lei Geral de Proteção de Dados, incluindo multas de até R$ 50 milhões, a pressão por medidas mais efetivas de segurança aumenta sobre instituições e empresas.
A resposta às pressões, na visão dos
especialistas, está não só em
aumentar a verba de cibersegurança, mas ter uma gestão de riscos continuada. “Risco é um vetor onipresente”, diz o sócio da EY.
DMello, da PSafe, alerta que as empresas precisam usar recursos tão avançados quanto os dos criminosos, que alugam serviços de inteligência artificial na nuvem para promover ataques. “Usar antivírus é como pegar um guia de ruas em papel para se orientar hoje em dia”, compara. A PSafe anunciou, na sexta-feira, uma fusão com a startup brasileira de inteligência artificial CyberLabs.
Considerando que grande parte dos
ataques bem-sucedidos usam
engenharia social, Corrons, da Avast, recomenda o treinamento constante de funcionários. “Há alguns anos, uma empresa do Japão enviou um ‘phishing’ aos funcionários para alertar sobre o problema”, conta. “Após um treinamento, de 100 pessoas que haviam caído no falso golpe, só três persistiram.”
A certificação digital é outra
alternativa na avaliação de Ghassan Dreibi, diretor de cibersegurança da Cisco. “Se não podemos mudar nossos
CPFs precisamos repensar a
autenticação das pessoas”, afirma. Resta saber se o governo ou associações setoriais ajudarão a bancar a conta. A assinatura de um certificado custa, em média, R$ 140 por ano.
Penas brandas encorajam
criminosos da internet
Há no Brasil casos de
condenação judicial de crackers
envolvidos em fraudes
financeiras via internet
bankings
Por Adriana Aguiar, Beatriz Olivon e Laura Ignacio — De São Paulo e Brasília
04 Renato Opice Blum: Brasil deverá atualizar legislação com penas mais severas para aderir à Convenção de Budapeste — Foto: Silvia Costanti/Valor Apesar da trabalhosa identificação dos hackers e dos crackers - que invadem sistemas e tiram proveito disso - e da modernização da legislação brasileira com a entrada em vigor da Lei Geral de Proteção de Dados (LGPD), as penas aplicadas a esses criminosos costumam ser tão suaves que a sensação de impunidade ainda incentiva os megavazamentos de dados. “É uma lei muito carinhosa”, afirma o especialista em direito digital e proteção de dados, Renato Opice Blum, sócio do Opice Blum, Bruno e Vainzof Advogados Associados.
Segundo o advogado, tramitava no Congresso o projeto de lei nº 76, de 2003, do senador Eduardo Azeredo (PSDB), que previa penas mais altas nessas situações. “Mas veio a discussão sobre o Marco Civil da Internet e decidiram regulamentar a legislação civil primeiro”, diz. Em seguida, como houve o vazamento das fotos da atriz Carolina Dieckmann, o deputado Paulo Teixeira (PT) fez, segundo Opice Blum, “a toque de caixa” o projeto que se tornou a Lei nº 12.737, de 2012.
A chamada “Lei Carolina Dieckmann” incluiu o artigo 154 no Código Penal, que instituiu penas de até dois anos de reclusão. “São penas ridículas, que podem, na prática, gerar pagamento de cestas básicas ou quando muito prestação de serviço à comunidade”, diz. Mas Opice Blum ressalta que para aderir à Convenção de Budapeste, sobre o combate global a cybercrimes,
o Brasil deverá atualizar a sua legislação com penas mais severas. Há no Brasil casos de condenação judicial de crackers envolvidos em fraudes financeiras via internet banking a penas de 5 a 20 anos de detenção, segundo o advogado, mas após somados todos os crimes cometidos como: invasão de sistemas,
associação criminosa, falsa
identidade, lavagem de dinheiro. “A base da condenação por invadir um sistema é muito baixa embora, hoje, os dados das pessoas só estejam abaixo da sua própria vida”, diz. Em dezembro de 2018, por exemplo, a juíza de direito substituta da 3ª Vara Criminal de Brasília, Bianca Fernandes Pieratti, condenou um réu que invadia contas bancárias do Banco do Brasil para subtrair para si quantias de dinheiro às penas de 15 anos e 4 meses de reclusão e pagamento de multa.
Já no caso dos dois primeiros megavazamentos de dados ocorridos no país após a entrada em vigor da LGPD, a Polícia Federal ainda investiga quem são os responsáveis, a pedido da Autoridade Nacional de Proteção de Dados (ANPD), que
fiscalizará o cumprimento da
legislação. O primeiro incidente revelou dados de cerca de 220 milhões de CPFs e outro de 103 milhões de contas de celulares.
Após a identificação de onde saíram todos esses dados, contudo, ainda haverá um logo caminho para uma eventual condenação. A própria ANPD só pode aplicar as multas previstas na lei, de até R$ 50 milhões, a partir de agosto. Contudo, qualquer cidadão poderá usar a LGPD para
05 pedir relatório sobre o uso dos próprios dados, além de cobrar o pagamento de indenização.
De acordo com a sócia na área de tecnologia do TozziniFreire Carla Couto, antes da existência da LGPD grandes empresas como a Netshoes e o Banco Inter já foram penalizadas por vazamentos de dados pessoais. Em ambos os casos foi firmado acordo. A empresa, por exemplo, concordou em pagar R$ 500 mil pelo vazamento de dados de 2 milhões de clientes.
Com a LGPD em vigor, um dos primeiros casos em que a norma fez efeito foi a decisão da 13ª Vara Cível de São Paulo de condenar a construtora Cyrela a pagar uma indenização de R$ 10 mil por danos morais a um cliente por compartilhar seus dados com terceiros. Após a aquisição de um imóvel, o cliente alega que recebeu contatos de instituições financeiras, empresas de arquitetura e de fornecimento de mobiliário planejado. A sentença determinou à empresa não repassar dados sensíveis do cliente a terceiros, sob pena de multa, além de pagar indenização.
De acordo com a advogada, o vazamento pode configurar violação à LGPD se ficar comprovado que a empresa alvo do vazamento não deu a devida proteção aos dados. Se o titular dos dados se sentir lesado e tiver indícios da conduta inadequada da empresa, acrescenta, pode ajuizar ação de indenização.
No mesmo sentido, Danilo Doneda, indicado pela Câmara dos Deputados ao Conselho Nacional de Proteção de Dados, afirma que a LGPD pode ser
base para pessoas prejudicadas individualmente, ou até uma ação coletiva na Justiça. “Mesmo que o sistema de segurança tenha falhado diante de um hacker, por exemplo, a
empresa terá responsabilidade
objetiva pelo vazamento”, diz. “Mas se conseguir comprovar que tomou o máximo de cuidados, pode ter a
responsabilidade amenizada no
Judiciário”.
Segundo Doneda, a partir da
definição da origem dos recentes megavazamentos de dados, por exemplo, toda pessoa com informação tornada pública poderá perguntar: por qual motivo essa informação fazia parte de um banco de dados, como era a segurança do armazenamento e se era comercializada. “Com base na LGPD, os cidadãos podem pedir um relatório completo sobre o uso dos seus dados pessoais e a empresa tem 15 dias para responder”, diz.
A LGPD pode não fazer com que esse tipo de vazamento deixe de acontecer, segundo Doneda, “mas à medida que as empresas investirem mais em segurança de dados para cumprir a lei, a tendência é tornar mais difícil e cara a fraude para o hacker”.
Além da LGPD, outras legislações preveem punições em caso de vazamento ou uso indevido de dados, como o Código Penal (CP) e o Código de Defesa do Consumidor (CDC). O artigo 154-A do CP, por exemplo, trata como crime a invasão de dispositivo de informática para obter, adulterar ou destruir dados ou informações para obter vantagem ilícita (pena de detenção de três meses a um ano e multa). Se isso resultar na obtenção de conteúdo de comunicações eletrônicas privadas,
06 segredos comerciais ou industriais, informações sigilosas, a pena é de reclusão de seis meses a dois anos e multa.
No CDC, o artigo 72 trata daquele que impedir ou dificultar o acesso do consumidor às informações dele em cadastros, banco de dados e fichas (pena de detenção de seis meses a um ano ou multa). Já o artigo 73 diz que
quem deixar de corrigir
imediatamente informação sobre
consumidor nesses registros também pode sofrer pena (detenção de um a seis meses ou multa).
https://valor.globo.com/impresso/notici
a/2021/02/17/vazamentos-se-multiplicam-e-expoem-falhas.ghtml
Valor Econômico
Caderno: Primeira Pagina,
quarta-feira 17 de fevereiro de 2021.
Restrições em calamidade
podem ser permanentes
Nova redação da cláusula de calamidade seria, na concepção de Guedes, a contrapartida à
prorrogação do auxílio
emergencial
Por Ribamar Oliveira, Lu Aiko Otta, Marcelo Ribeiro e Vandson Lima — De Brasília
O Ministério da Economia quer ampliar e tornar permanente a “cláusula de calamidade pública” prevista na Lei Complementar 173, adotada em maio de 2020 para combater os efeitos da pandemia e com validade até o fim deste ano. Segundo uma fonte credenciada, o ministro Paulo Guedes pretende que ela seja aplicada a qualquer tipo de calamidade e passe a fazer parte do arcabouço jurídico permanente do país. Nesses casos, União, Estados e
municípios ficam proibidos de
conceder aumentos aos servidores, criar empregos e realizar concursos, entre outras restrições.
Segundo essa fonte, a nova redação da “cláusula de calamidade pública” não está pronta, mas tratá mais medidas que a da LC 173. Seria uma
07
contrapartida ao novo
auxílio-emergencial.
Guedes quer tornar ‘calamidade pública’ permanente e mais ampla
Novo texto seria, para ministro, contrapartida à prorrogação do auxílio emergencial
Por Ribamar Oliveira, Lu Aiko Otta, Marcelo Ribeiro e Vandson Lima — De Brasília
O ministro da Economia, Paulo Guedes, quer ampliar e tornar
permanente a “cláusula de
calamidade pública” que atualmente está prevista na lei complementar
173/2020, informou uma fonte
credenciada do governo. “Na LC 173, a cláusula é restrita à pandemia da covid-19 em 2020 e tem validade até 31 de dezembro deste ano”, explicou. Agora, segundo a mesma fonte, Guedes quer que ela seja aplicada a todos os tipos de calamidade que assolem o Brasil, um Estado ou município e passe a fazer parte do arcabouço jurídico permanente do país. Ou seja, que as medidas de
ajuste que podem ser
automaticamente adotadas pelos
Executivos (federal, estadual ou
municipal) nas situações de
calamidade não tenham prazo
determinado.
A LC 173, que ficou conhecida como “Orçamento de Guerra”, estabelece que a União, os Estados e os municípios afetados pela calamidade pública decorrente da pandemia da
covid-19 ficam proibidos, até 31 de dezembro deste ano, de conceder
aumento, reajuste ou qualquer
vantagem aos membros de Poder ou de órgãos, servidores e empregados públicos e militares.
Não poderão também criar emprego, cargo ou função que implique
aumento de despesa, realizar
concurso, admitir ou contratar
pessoal a qualquer título, criar ou majorar auxílios, vantagens, bônus ou
abonos. O presidente, os
governadores e os prefeitos estão proibidos ainda de criar despesa obrigatória de caráter continuado e de adotar medida que implique reajuste de despesa obrigatória acima da variação da inflação.
A fonte disse que o novo desenho da “cláusula de calamidade pública” que
Guedes deseja ainda não foi
concluído, mas que ela “terá mais medidas do que a LC 173. Ainda não está claro também qual será a abrangência do conceito a ser proposto para “calamidade pública” e se ele incluirá a situação de insolvência das contas.
O difícil é saber o limite para
caracterizar a situação de
“calamidade” das finanças de um ente da federação. Na PEC Emergencial (PEC 186/2019), a proposta do governo prevê que, toda vez que a despesa obrigatória atinja 95% da receita corrente, as medidas de ajuste serão acionadas.
Outra fonte explicou que a
preocupação do ministro da
Economia é com a duração desta segunda onda da pandemia de covid-19 e com a eventualidade de uma terceira onda. “Neste ano, as medidas
08 de ajuste previstas na cláusula de calamidade já foram adotadas”, explicou. “Mas se a pandemia durar mais um ano, por exemplo, teremos
que adotar outras medidas”,
ponderou. Assim, a nova cláusula, com todas as suas proibições, poderia ser usada para fechar o Orçamento de 2022.
A nova redação da cláusula de calamidade seria, na concepção de
Guedes, a contrapartida à
prorrogação do auxílio emergencial, demonstrando a preocupação do governo com a sustentabilidade das contas públicas. Mas, a rigor, as medidas de ajuste deste ano já foram adotadas. Portanto, a nova redação da cláusula não implicaria medidas adicionais.
Diante de eventuais resistências à aprovação de uma “cláusula de calamidade pública” mais abrangente, na forma de uma Proposta de Emenda Constitucional (PEC), discute-se no Congresso Nacional, discretamente, uma proposta menos ambiciosa, mas que dê conforto ao governo para a renovação do auxílio emergencial. A alternativa poderia ser uma expansão
do Bolsa Família dentro do
Orçamento de 2021, disse uma fonte ao Valor.
A “PEC de Guerra”, como Guedes está chamando a proposta, ainda é a hipótese central em estudo. Governo e Congresso discutem um texto que, acoplado à proposta que já está no Senado tratando do Pacto Federativo, formará o que o ministro chama de “protocolo de crise”. Esse protocolo combina duas coisas: autorização para gastar mais em caso de calamidade e medidas de contenção de gastos.
Como o calendário está apertado, parlamentares avaliam que o governo e o Congresso devem bater o martelo sobre o formato e o valor da nova rodada do auxílio emergencial até a
próxima semana. Apesar da
expectativa de que as parcelas mensais do auxílio serão de R$ 200 ou R$ 250 - inferiores ao que se
concedeu no ano passado -,
parlamentares pontuam que o valor não está fechado.
“Acredito que o plenário vai ter a
sensibilidade de reconhecer a
importância da reedição do auxílio para conseguir colocar o pão na mesa das famílias mais humildes e impactadas pela pandemia”, disse o líder do DEM na Câmara, Efraim Filho (PB), ao Valor. “Igualmente, o plenário terá a responsabilidade de aprovar o valor e as parcelas de
acordo com a capacidade do
Orçamento do país que a equipe econômica apontar”, ponderou.
Há a expectativa de que o presidente do Senado, Rodrigo Pacheco (DEM-MG), promova debate sobre o
financiamento do benefício em
reunião de líderes amanhã.
Lideranças da Câmara destacam que um encontro com o presidente da casa, Arthur Lira (PP-AL), está marcado para o mesmo dia.
https://valor.globo.com/brasil/noticia/2 021/02/17/guedes-quer-tornar- calamidade-publica-permanente-e-mais-ampla.ghtml Retorne ao índice 09
Valor Econômico
Caderno: Brasil, quarta-feira 17 de
fevereiro de 2021.
Projeto pode reduzir pedágio
em rodovias federais
Experiência deve começar com renovação da concessão da rodovia Presidente Dutra
Por Lu Aiko Otta — De Brasília
Natália Marcassa: cobrança atingirá todos os usuários, mas custo será menor — Foto: Alex Ferreira/Câmara dos Deputados
Entre as 35 prioridades legislativas do governo, está um projeto de lei que cria condições para se implantar nas rodovias concedidas um sistema de cobrança de tarifa por quilômetro rodado chamado passagem livre, ou free flow. Com ele, todos os veículos que trafegarem na rodovia pagarão pedágio. Mesmo naqueles casos em que o motorista usa a via diariamente para ir à escola ou ao trabalho.
10
Mas, como a cobrança será mais ampla, a tarifa vai cair. Foi o que afirmou ao Valor a secretária de Fomento, Planejamento e Parcerias do Ministério da Infraestrutura, Natália Marcassa de Souza.
O sistema de passagem livre será testado no trecho de Guarulhos (SP) da Nova Dutra, cuja concessão deve ser leiloada no terceiro trimestre. Mas a intenção é ampliar seu uso e para isso se mostrou necessário mudar a lei.
Além de criar no regramento brasileiro o sistema de pedágio com livre passagem, o projeto de lei altera o Código de Trânsito em dois pontos. Primeiro, qualifica a evasão do pagamento do pedágio como infração grave. Segundo, permite que o valor
das multas seja entregue às
concessionárias.
Para que a cobrança por distância percorrida funcione, é preciso ampliar o uso de tags pelos motoristas. São chips que associam o veículo a um meio de pagamento, de forma que a cobrança do pedágio pode ser feita posteriormente. É a ampliação do sistema pré-pago que já opera no Brasil. Nas futuras concessões, diz Natália, será dado desconto de 5% nas
tarifas cobradas por meio de
tagueamento.
Na Dutra, apenas 10% dos veículos
pagam pedágio, comentou a
secretária. São aqueles que fazem trajeto mais longo pela via. Os que a utilizam apenas entre praças de pedágio não pagam.
No trecho de Guarulhos, o free flow será cobrado a partir do quinto ano do contrato da Nova Dutra. Antes disso, uma série de obras na região metropolitana segregará o fluxo de longa distância do local, que será feito por vias marginais.
Um sistema híbrido entre o pedágio tradicional e a cobrança por distância percorrida é usado na praça de pedágio de Magé (RJ) da Rio-Teresópolis, disse Natália. Lá, são concedidos descontos progressivos para usuários frequentes. Assim, a tarifa de R$ 14 pode chegar a R$ 1,75, em 30 dias de uso. A média mensal fica perto de R$ 5. São Paulo já adota esse modelo em algumas rodovias desde 2015.
O projeto de lei que altera as regras dos pedágios já foi aprovado na Câmara e aguarda votação no Senado. A secretária acredita que será aprovado sem dificuldades.
Outros temas de interesse da pasta na lista de prioridades legislativas do governo são: o marco da navegação de cabotagem, o projeto de lei que autoriza a construção de ferrovias por autorização e o que aperfeiçoa regras para debêntures de infraestrutura.
Neste ano, o Ministério da
Infraestrutura pretende leiloar 52 ativos. São 22 aeroportos das regiões Norte, Sul e Centro-Oeste, mais a relicitação do aeroporto de São Gonçalo do Amarante (RN) e a venda das participações da Infraero nos aeroportos de Guarulhos, Galeão, Confins e Brasília. Os investimentos previstos para esse grupo são de pelo menos R$ 6,13 bilhões.
11 Em portos, serão arrendados 17
terminais e desestatizada a
Companhia Docas do Espírito Santo (Codesa). Os investimentos são de no mínimo R$ 4,08 bilhões. Em rodovias, vão a leilão seis trechos que totalizam 7,2 mil km e exigirão investimentos de R$ 84,31 bilhões, pelo menos. Estão previstas ainda as concessões da Ferrovia de Integração Oeste-Leste (Fiol) e a renovação de contrato da MRS, no total de 10,4 mil km e investimento mínimo de R$ 41,57 bilhões.
Para 2022, estão previstos, por exemplo os leilões de concessão de 16 aeroportos, entre eles Congonhas (SP) e Santos Dumont (RJ). Também será relicitada a concessão de Viracopos (SP) e vai ao mercado uma Parceria Público-Privada (PPP) de aeroportos no Amazonas. Os investimentos são de no mínimo R$ 5,66 bilhões.
https://valor.globo.com/brasil/notici a/2021/02/17/projeto-pode-reduzir-pedagio-em-rodovias-federais.ghtml Retorne ao índice
Valor Econômico
Caderno: Brasil, quarta-feira 17 de
fevereiro de 2021.
OIT questiona flexibilização
trabalhista
Entidade mantém pressão sobre o governo Bolsonaro sobre medidas adotadas na pandemia Por Assis Moreira — De Genebra
A Organização Internacional do Trabalho (OIT) mantém pressão sobre o governo de Jair Bolsonaro, com indagações sobre flexibilização de regras trabalhistas adotadas em resposta à pandemia.
O Comitê Sobre a Aplicação de Convenções e Regulamentações da entidade examinou alegações de entidades como Central Única dos Trabalhadores (CUT), Central dos
Sindicatos Brasileiros (CSB) e
Internacional de Serviços Públicos (ISP) sobre a adoção das medidas provisórias 927 e 936.
Essas centrais se queixaram de que as duas MPs “prejudicaram severamente o direito de barganha coletiva” ao assegurar que acordos individuais entre o empregador e o trabalhador prevalecessem sobre a negociação coletiva.
Em relatório publicado no site da OIT, o comitê nota que o governo Bolsonaro enfatizou a necessidade de
12
respostas rápidas e efetivas à emergência causada pela pandemia e que Brasília refutou qualquer violação da Convenção nº 98 da OIT, que
estabelece parâmetros para
negociações coletivas.
Em sua avaliação, o comitê
“reconhece plenamente as
circunstâncias excepcionais” no país por causa da pandemia e a “absoluta necessidade” de adotar medidas urgentes para mitigar o impacto econômico e social. Mas, ao mesmo tempo, enfatiza sua posição de que medidas adotadas na crise, colocando de lado a aplicação de acordos coletivos, devem ser de caráter excepcional, limitadas no tempo e
fornecer garantias para os
trabalhadores mais afetados.
O mesmo comitê faz novas indagações ao governo Bolsonaro em relação à sensível Convenção nº 169, que trata dos direitos dos povos indígenas. Pede que indique como é garantido
que medidas legislativas ou
administrativas que podem afetar os povos indígenas são aplicados de forma sistemática e coordenada em todo o país.
https://valor.globo.com/brasil/noticia/2 021/02/17/oit-questiona-flexibilizacao-trabalhista.ghtml
Valor Econômico
Caderno: Brasil, quarta-feira 17 de
fevereiro de 2021.
Proposta do Senado irá
prevalecer na reforma
tributária
Texto que deve ir a votação deve ser o da PEC 110, elaborada por ex-deputado Luiz Carlos Hauly Por Vandson Lima — De Brasília
Roberto Rocha: “vou fazer tudo combinado com o governo e a Câmara, mas prepondera o conteúdo da PEC 110” — Foto: Pedro França/Agência Senado Com a perspectiva de que a reforma tributária agora comece a tramitar pelo Senado, após acordo entre os presidentes da Câmara, Arthur Lira (PP-AL), e do Senado, Rodrigo
Pacheco (DEM-MG), caberá ao
senador Roberto Rocha (PSDB-MA) a relatoria da proposta, dando forma ao
texto que será avaliado pelo
Congresso Nacional. Quem confirma é o próprio senador.
13
Rocha diz que vai privilegiar as mudanças contidas na PEC 110,
elaborada pelo economista
tributarista e ex-deputado federal Luiz Carlos Hauly (PSDB-PR). Além desta, há outras duas propostas em discussão - a PEC 45/2019, de preferência da Câmara, e um projeto de lei do governo, que funde PIS e Cofins na nova CBS (Contribuição sobre Bens e Serviços).
“O texto da comissão mista é apenas sugestivo. Assim que o relatório da
comissão estiver pronto, vou
incorporar o conteúdo, trazer também a proposta do governo. Vou fazer tudo combinado com o governo e a Câmara, mas prepondera o conteúdo da PEC 110”, avisou.
Rocha diz que a reforma poderá ser votada no Senado em um mês, ou mais tardar até o início de abril. “As discussões já foram feitas. Assim que tiver o parecer da comissão mista, o
que deve ocorrer em março,
incorporo, levo a proposta para votar na CCJ do Senado e no plenário. Em mais ou menos um mês, mais tardar no início de abril, a gente vota no Senado”, previu.
A partir daí, diz Rocha, será possível votar a reforma tributária em definitivo entre agosto e outubro. “Aprovada no Senado, a Câmara vai ter aí 100 dias para discutir, votar e mandar de volta ao Senado que dará a palavra final. Acredito que tudo se resolve no máximo até outubro, como estabelecido pelos presidentes da Câmara e Senado”.
Nos bastidores, o fato de a tramitação começar pelo Senado é algo visto por parlamentares como um acordo para esvaziar a negociação feita pelo ex-presidente da Câmara, Rodrigo Maia (DEM-RJ), que indicou Aguinaldo Ribeiro (PP-PB) como relator e negociou para que a tributária fosse
discutida primeiro entre os
deputados. Maia teve embates com Lira e o ministro da Economia, Paulo Guedes, que não concorda com a
proposta defendida pelo
ex-presidente da Câmara e por
Aguinaldo.
Rocha, defensor e amigo do
presidente Jair Bolsonaro diz que não se mete na briga política, mas que há sim a possibilidade de que o relator na Câmara não seja Aguinaldo. “Não
necessariamente precisa ser
Aguinaldo, porque não é a PEC 45 [a base do texto]. Isso cabe ao presidente da Câmara definir”.
Aguinaldo na sexta-feira afirmou que não havia “nada certo por enquanto” em relação à tramitação da reforma O líder do DEM na Câmara, deputado Efraim Filho (PB) disse que a, Câmara
deve priorizar a reforma
administrativa.
14 Aguinaldo negou que esteja pensando em não entregar o parecer neste caso e disse que tem desprendimento em relação ao tema, mas não quis precisar uma data para entregar o parecer. “Eu preciso antes conversar com os presidentes Rodrigo Pacheco e Arthur Lira, com o presidente da comissão, com os líderes dos partidos com o governo. Tem muita negociação para ser feita antes ”. (colaboraram Marcelo Ribeiro e Raphael Di Cunto)
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Valor Econômico
Caderno: Politica, quarta-feira 17 de
fevereiro de 2021.
Lava-Jato teve 150
investigações arquivadas por
falta de provas
Investigação que cercou
esquema de corrupção na
Petrobras conduziu apurações que não chegaram a resultados Por André Guilherme Vieira — De São Paulo
Antonio Palocci: convertido em delator, ex-ministro fez acusações que não puderam ser comprovadas pela polícia — Foto: Reprodução
Motivo de terror para empreiteiros e a classe política por vários anos, nem sempre a Lava-Jato de Curitiba foi
15
efetiva no combate à corrupção. A força-tarefa fracassou em ao menos 150 investigações, denúncias e ações penais arquivadas por ausência de provas, apesar de ter colocado atrás das grades a nata do empresariado e um ex-presidente da República. Levantamento feito pelo Valor em
peças judiciais desde que a
investigação para apurar corrupção na Petrobras foi deflagrada, em 17 de março de 2014, mostra que o avanço da Lava-Jato sobre políticos com privilégio de foro sofreu quase tantos revezes quanto vitórias no Supremo
Tribunal Federal (STF). Das
denúncias oferecidas em 29
inquéritos em tramitação na Corte, 20 foram analisadas pela 2ª Turma: 11 foram aceitas e 8 foram rejeitadas. O STF julgou 6 ações penais da Lava-Jato, com 4 condenações e duas absolvições. Há 7 denúncias no Supremo: 3 esperam deliberação para aceitação ou rejeição; uma teve análise suspensa por pedido de vista e o restante aguarda notificação de investigados.
Há controvérsia em parte das mais de 270 delações firmadas em vários estados na 1ª e 2ª instâncias e na alçada de tribunais superiores. A Polícia Federal (PF) também fechou acordos, apesar de o Ministério Público Federal (MPF) ter sido contra.
No caso do ex-ministro da Fazenda Antonio Palocci, o acordo proposto pela defesa dele foi rejeitado duas vezes pelo MPF do Paraná, que o considerou fantasioso. Mas uma negociação foi costurada com a PF
durante um período de desentedimento entre os órgãos. O ministro Edson Fachin validou a delação de Palocci no fim de 2018. A PF, então, fez duas buscas em endereços do banqueiro sócio do BTG, André Esteves, em 2019.
As ações ocorreram em São Paulo e acabaram anuladas em agosto de 2020 pelo ministro Gilmar Mendes. A própria PF concluiu não haver provas dos relatos de Palocci, que acusou o banqueiro e o ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva.
Esteves e o então líder do PT no Senado, Delcídio do Amaral, já haviam sido presos em novembro de 2015 por suposta interferência na delação do ex-diretor da Petrobras, Nestor Cerveró, com a Procuradoria-Geral da República (PGR). Delcídio foi o primeiro parlamentar preso no exercício do cargo.
O banqueiro ficou preso por 24 dias em Bangu 8, no Rio. Entretanto, foi absolvido por falta de provas em julho de 2017.
Delcídio se tornou delator depois de passar 85 dias encarcerado. Solto após acordo de delação, acusou de obstrução a então presidente Dilma Rousseff, seu ministro da Justiça José Eduardo Cardozo e os ministros do Superior Tribunal de Justiça (STJ) Francisco Falcão e Marcelo Navarro. Os quatro teriam planejado frear a Lava-Jato por meio da nomeação deste último para o STJ, em 2015. O ministro Fachin arquivou o caso por falta de provas em setembro de 2017. Outro episódio em que o MPF não conseguiu comprovar acusações de
16 delator envolveu o ex-presidente da Transpetro, Sérgio Machado. Em outubro de 2017, o ministro Fachin
engavetou investigação sobre
supostas tentativas de interferir na
Lava-Jato do senador Renan
Calheiros (AL), do ex-senador
Romero Jucá (RR) e do ex-presidente José Sarney, todos do MDB.
Em 8 de fevereiro, o
vice-procurador-geral da República, Humberto
Jacques, pediu a rejeição de denúncia contra Sarney motivada pela delação de Machado por considerá-la vazia. O delator disse que foi nomeado para o cargo público em troca de propina ao ex-presidente e a outros políticos do MDB.
O MPF de Curitiba afirmou, em nota, que tanto o órgão quanto a PF “não investigam pessoas, mas fatos”, e que apurar notícias de crimes “é dever constitucional desses órgãos e razão de sua existência”.
Segundo o comunicado, “a
instauração de uma investigação não deve necessariamente resultar em
propositura de denúncia ou
acusação”, e investigações são
instaladas “com base em evidências (licitamente obtidas) justamente para verificar, ao seu término, se há a comprovação do delito e fundados indícios de sua autoria”.
O MPF disse que arquivamento de investigação não significa inexistência de crime. “A prática mostra que a grande maioria dos arquivamentos ocorre porque, na avaliação do MPF, não foram colhidos indícios fortes o suficiente para a propositura de ação penal”.
Segundo o órgão, “muitos fatos
criminosos revelados pelos
colaboradores, por exemplo,
ocorreram há anos, o que dificulta a coleta de provas; outros, ainda que provados, em vista do prazo, também são arquivados em vista da ocorrência da prescrição”.
Para o MPF, “a grande maioria das investigações criminais, em todas as unidades da federação, resultam em
arquivamentos”. E o “esforço
concentrado” da Lava-Jato permitiu “obter aproveitamento muito maior das investigações”.
O arquivamento de cerca de 150 procedimentos parece pouco diante do colosso em que se converteu as
investigações, desdobradas para
outros estados e instâncias judiciais. Somente a hoje extinta força-tarefa do Ministério Público Federal (MPF) e da Polícia Federal (PF) de Curitiba produziu resultado sem precedente:
179 ações penais com 174
condenações em 1ª e 2ª instâncias, além de 209 acordos de delação, 17 de leniência (firmados com empresas na esfera cível) e 80 ações policiais. Dos 291 réus julgados por Sergio Moro, 228 foram condenados e 63 absolvidos. O MPF recorreu para elevar as penas em 44 das 45 decisões do ex-juiz.
As 80 fases da trama investigativa que pautou o Judiciário, acossou Congresso e iniciativa privada e privou de um sono tranquilo as
classes política e empresarial,
envolveram 1.450 buscas e
apreensões, 163 prisões temporárias, 132 preventivas e 211 conduções coercitivas - que ocorrem quando a polícia é autorizada a levar um
17 suspeito para depor. A medida está proibida pelo STF desde junho de 2018.
Apesar de a operação ter seguido irrefreável até meados de 2018, os
métodos de investigação e a
receptividade obtida na sociedade, imprensa e em parte do poder público desviaram a Lava-Jato para o caminho dos excessos e injustiças. Essa é a avaliação do advogado Celso Vilardi, que afirma não se opor à Lava-Jato e reconhece os méritos da investigação.
Para ele, o mesmo fator que conferiu à Lava-Jato potência para avançar por terreno em que tentativas anteriores fracassaram revelou-se o ponto fraco da operação.
“Ela se desenvolveu com delações e qualquer investigação desse tipo tem aspectos em que é impossível chegar a um resultado”, diz.
“Delator pode falar a verdade, uma verdade não comprovável e pode mentir. Na Lava-Jato teve as três situações”, afirma. “E mentiras que eram tragédias anunciadas”.
https://valor.globo.com/politica/noticia/
2021/02/17/lava-jato-teve-150- investigacoes-arquivadas-por-falta-de-provas.ghtml
Valor Econômico
Caderno: Opinião, quarta-feira 17 de
fevereiro de 2021.
Decisão de Moraes provoca
apreensão
Procuradores alertam para
insegurança jurídica
Por Isadora Peron — De Brasília
Integrantes do Ministério Público Federal (MPF) avaliam que a decisão do ministro Alexandre de Moraes, do Supremo Tribunal Federal (STF), de proibir que o órgão defina a
destinação de recursos obtidos
através de acordos de delação premiada e condenações criminais vai paralisar o andamento de processos em todo país e pode ter impacto até na área cível. Para subprocuradores e procuradores ouvidos pelo Valor, a
determinação traz insegurança
jurídica e pode prejudicar a reparação de danos.
O despacho, da semana passada, foi dado em uma ação movida pelo PT e PDT após vir à tona que a força-tarefa da Lava-Jato em Curitiba queria criar uma fundação com recursos de um acordo fechado com a Petrobras.
A Associação Nacional dos
Procuradores da República (ANPR) já definiu que vai pedir para entrar como “amicus curiae” na ação, para poder se pronunciar no processo.
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O presidente da entidade, Fabio George, afirma que o MPF já tem um longo histórico na formulação de acordos desta natureza, e que o modelo tem conseguido dar uma resposta rápida aos problemas.
“Nós somos intermediários de
acordos que beneficiam sociedade e, no fim, quem vai ser prejudicado com essa decisão é a própria sociedade”, disse.
Segundo ele, a decisão de Moraes, de que cabe ao governo federal - junto com o Congresso Nacional - fixar a maneira como estes recursos serão utilizados, vai burocratizar todo o processo. “Na prática, esse é um dinheiro que vai ficar nas contas da União e que no fim vai ser utilizado no pagamento de juros.”
A procuradora da República, Monique Cheker, que já atuou na Operação Lava-Jato, afirma que a decisão de Moraes faz com que todos os juízes “fiquem travados”. Segundo ela, há o temor de que isso afete até os acordos cíveis, apesar de o foco ser a esfera criminal.
Ela também diz que o ministro, ao embasar a sua posição, faz uma
“referência muito frágil à
Constituição”, pois cita apenas dois artigos que tratam da universalidade do orçamento e da unidade. “A finalidade do direito penal não é gerar receita ou riqueza. O compromisso que o Estado tem, representado pelo órgão de acusação, é que a vítima seja atendida e ressarcida, que haja sentimento de justiça social, e que o autor do fato, dentro da lei, seja
punido ou faça uma composição penal com o MP”, disse.
Para a subprocuradora-geral da
República Luiza Frischeisen, a
decisão vai ao encontro de todos esforços que estão sendo feitos no
âmbito da chamada “justiça
restaurativa”, que envolve um acordo entre vítima e o criminoso, com a participação do Ministério Público e da comunidade.
A procuradora Zani Cajueiro
argumenta na mesma linha. “A justiça restaurativa é um processo de conscientização, por isso acordos são
importantes. Oportunidade de
autoridades dialogarem com a
sociedade e resolver os problemas locais de forma célere. Justiça tardia é injustiça.”
Em seu despacho, o ministro do STF afirmou que é necessário respeitar os
limites estabelecidos pela
Constituição e a expressa atribuição ao Congresso para deliberar sobre a destinação das receitas públicas. https://valor.globo.com/politica/noticia/ 2021/02/17/decisao-de-moraes-provoca-apreensao.ghtml
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Valor Econômico
Caderno: Mundo, quarta-feira 17 de
fevereiro de 2021.
China estuda limitar venda de
terras-raras para empresas dos
EUA
Governo chinês avalia restrição de exportação dos minerais que compõem o chamado grupo de
terras-raras. Retaliação
comercial afetaria a produção da indústria bélica americana
Por Sun Yu e Demetri
Sevastopulo — Financial Times, de Pequim e Washington
A China estuda a possibilidade de limitar a exportação de terras-raras, minerais que são cruciais para a fabricação dos caças americanos F-35 e outros armamentos sofisticados,
segundo fontes envolvidas em
consulta governamental.
O Ministério da Indústria e
Tecnologia da Informação chinês propôs em janeiro um projeto de
controle sobre a produção e
exportação dos 17 tipos de terras-raras na China, que responde por cerca de 80% da oferta mundial. Executivos do setor disseram que funcionários do governo chinês lhes perguntaram o quanto as empresas nos Estados Unidos e na Europa, inclusive as que prestam serviços para
20
a área de defesa, seriam afetadas se a China restringisse as exportações de terras-raras.
“O governo quer saber se os EUA podem ter problemas para fabricar caças F-35 se a China proibir as exportações”, disse um assessor do governo chinês que pediu para não ser identificado. Os executivos do setor acrescentaram que Pequim queria entender melhor com que rapidez os EUA poderiam garantir fontes alternativas de terras-raras e aumentar a capacidade própria de produção.
A fabricação de aviões de combate como o F-35, um caça da Lockheed Martin, depende fortemente do uso de terras-raras para componentes críticos, como seus sistemas de
geração de energia elétrica e
magnetos. Um relatório do Serviço de Pesquisa do Congresso (CRS) dos EUA aponta que cada F-35 exige 417 quilos de materiais de terras-raras.
A iniciativa chinesa é uma
consequência da deterioração das relações sino-americanas e de uma guerra crescente entre os dois países na área de tecnologia. O governo Trump tentou dificultar a importação por empresas chinesas de tecnologia
americana sensível, como
semicondutores de última geração. O governo Biden já indicou que também restringirá certas exportações, mas trabalhando em conjunto com aliados ocidentais.
O controle das terras-raras por Pequim ameaça se tornar uma nova fonte de atrito com Washington, mas alguns alertam que qualquer
movimento agressivo pode acabar por prejudicar a própria China, ao estimular os rivais a desenvolverem produção própria.
Em um relatório de novembro, Zhang Rui, analista da Antaike, uma consultoria de Pequim apoiada pelo governo, disse que os fabricantes de armas dos EUA podem estar entre os primeiros alvo de qualquer restrição à exportação.
O Ministério das Relações Exteriores da China ameaçou no ano passado impor sanções à Lockheed Martin, à Boeing e à Raytheon por venderem armas a Taiwan, ilha que Pequim
reivindica como parte de seu
território soberano.
Pelas diretrizes da proposta em estudo, os produtores de terras-raras seriam obrigados a cumprir as leis chinesas de controle de exportação que regulam as remessas de materiais que “ajudam a salvaguardar a segurança do Estado”. O Conselho de Estado da China e a Comissão Militar Central terão a palavra final sobre se a lista deve incluir terras-raras.
As terras-raras são fundamentais para a fabricação de outros produtos, como smartphones, veículos elétricos e turbinas eólicas.
Mas alguns executivos e autoridades questionam a sensatez de incluir as terras-raras formalmente no regime
de controle de exportações.
Argumentam que isso motivaria os rivais de Pequim a acelerarem o desenvolvimento de capacidade de produção e minaria o predomínio da China no setor.
21 “Os controles de exportação são uma faca de dois gumes que deve ser aplicada com muito cuidado”, disse Zhang, da Antaike.
O Pentágono está cada vez mais preocupado com a dependência que os EUA têm da China para obtenção das terras-raras, que são usadas em produtos como mísseis guiados de alta precisão e drones.
Ellen Lord, a principal autoridade para aquisições da área de defesa até o ano passado, disse ao Congresso, em outubro, que os EUA precisavam criar estoques de certas terras-raras e
restabelecer o processamento
doméstico. Ela afirmou que os EUA têm uma “vulnerabilidade real” porque a China inunda o mercado para destruir qualquer concorrência sempre que outros países começam a minerar ou produzir terras-raras. Nos últimos meses, o Pentágono assinou contratos com mineradoras
americanas e australianas para
aumentar sua capacidade de refino doméstico e reduzir sua dependência de refinadoras chinesas.
O Conselho de Segurança Nacional dos EUA não respondeu a pedido para comentar o assunto.
As próprias mineradoras chinesas de terras-raras estão preocupadas com a
possibilidade de que a nova
regulamentação amplie o poder do Ministério da Indústria e Tecnologia da Informação para controlar sua produção.
A China começou a estabelecer limites para a produção de terras-raras em 2007, para tentar manter os preços altos e reduzir a poluição, mas essa
política não tem força de lei e muitas mineradoras excedem sua cota de produção regularmente. As novas regras permitiriam ao governo aplicar multas pesadas para vendas sem aprovação.
“A nova regra não tornará a China mais forte na cadeia mundial de fornecimento quando as minas locais
não podem operar a plena
capacidade, e impor um veto às exportações é algo mais fácil de falar do que de fazer”, disse um executivo, que pediu para não ser identificado, do Guangdong Rare Earth Group, um dos maiores grupos de terras-raras do país.
Em nota, o Ministério da Indústria e Tecnologia da Informação diz que a lei ajudaria a “proteger o interesse nacional e garantir a segurança de recursos estratégicos”.
Segundo dados do governo, a demanda da China por terras-raras é
tão alta que excedeu
sistematicamente a oferta interna nos últimos cinco anos, o que elevou as importações chinesas de mineradoras dos EUA e de Mianmar.
Uma ampla gama de setores tem impulsionado a demanda na China, como geração de energia eólica e veículos elétricos.
Embora o predomínio da China na mineração de terras-raras esteja ameaçado, o país tem um quase monopólio do processo de refino, que transforma os minérios em materiais prontos para uso.
O país controla cerca de quatro quintos da capacidade mundial de refino de terras-raras. Os minérios
22 extraídos em território americano precisam ser enviados para a China, já que os EUA ainda não têm uma capacidade de refino própria.
Executivos do setor, porém, disseram que a força da China na área de refino tem mais a ver com sua maior tolerância à poluição do que com vantagem tecnológica.
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Valor Econômico
Caderno: Opinião, quarta-feira 17 de
fevereiro de 2021.
Mais um pacote nefasto para
facilitar posse e uso de armas
Bolsonaro dificulta o
rastreamento oficial de armas e munições obtidas ilegalmente
O presidente Jair Bolsonaro nunca esteve preocupado com vacinas contra a covid-19, nem com o número de brasileiros mortos pela pandemia (240 mil e subindo). Mas mantém sua obsessão e prioridade de liberar o máximo possível venda e uso de armas no país. Bolsonaro já assinou inúmeros decretos a respeito, a maioria deles barrado pelo Congresso ou pelo Supremo Tribunal Federal - a última pendenga é a da isenção tarifária para a compra de armas do exterior, como se fossem um bem essencial. Na sexta-feira, editou mais quatro decretos com o mesmo fim, um pior do que o outro - e é dever do Congresso e do Supremo barrá-los também.
Os Bolsonaro tem estranha fixação por armas e o deputado Eduardo
Bolsonaro é um ativo garoto
propaganda dos produtos
estrangeiros. Nunca os filhos e o presidente procuraram justificar esse desejo pela necessidade de aparelhar
adequadamente o Estado para
enfrentar a criminalidade e aprimorar
23
a segurança pública - não é disso que se trata. Nessa campanha incomum, Bolsonaro tem procurado diminuir o controle do Exército e da Polícia Federal sobre a autorização, uso e rastreamento de armas e munições. No decreto 10.627, de sexta-feira, esse objetivo é explícito. Ele estabelece
que deixam de ser produtos
controlados projéteis para armas com até 12,7 mm de calibre e máquinas e prensas, mesmo as de produção industrial, para recarga de munições.
Como se fossem brinquedos
inofensivos, cessa a vigilância sobre miras de vários tipos, inclusive telescópicas. O exame de aptidão psicológica para manuseio de armas de fogo, deveria ser feita por psicólogos registrados na Policia Federal. Agora, qualquer psicólogo poderá fazê-lo.
O laudo de capacidade técnica para o uso de armas por atiradores poderá ser substituído por um “atestado de
habitualidade” expedido por
entidades de tiro. Para caçadores,
colecionadores e atiradores, os
decretos ficam perto de conceder o direito de armamento ilimitado. Para eles, o Exército só terá de autorizar a
compra de armas acima da
quantidade permitida: cinco unidades
para colecionadores, 15 para
caçadores e 30 para atiradores.
Estas três categorias, que já podem adquirir mil e 5 mil munições para armas de uso restrito e uso permitido,
respectivamente. Poderão,
adicionalmente, adquirir material para recarga de até 5 mil cartuchos (uso permitido) e 2 mil (uso restrito). A capacidade de se armar foi ainda
ampliada de outras maneiras. As pessoas autorizadas poderão a partir dos decretos comprar seis armas - antes a permissão era para 4. No caso de policiais, agentes prisionais e membros das Forças Armadas, dos tribunais e do Ministério Público o limite sobe a 8 armas.
As brechas abertas por Bolsonaro desde sua posse já fizeram quase dobrar o número de armas legalmente em circulação no país. Não há, e não haverá, diminuição da violência por esse caminho - as estatísticas de homicídios voltaram a crescer. A predileção do presidente tem outras consequências nefastas. Bolsonaro está facilitando a obtenção de armas pelas milícias e dificultando o rastreamento oficial de armas e munições obtidas ilegalmente.
O universo das milícias não é estranho à família Bolsonaro. O então deputado estadual Flavio Bolsonaro, envolto em processo por rachadinhas, condecorou milicianos como Adriano da Nóbrega, morto há pouco mais de um ano, e empregou em seu gabinete familiares dele. Fabrício Queiroz,
velho amigo do presidente e
funcionário de Flávio, tem ligações com essas organizações de ex-policiais e criminosos armados.
Em episódio nunca esclarecido, o Planalto fez pressões para a remoção de José Nóbrega de Oliveira, delegado da Receita no Porto de Itaguaí,
responsável pelo aumento de
apreensões no porto. Em 2020 ele perdeu poderes, como o de decidir quais importações seriam fiscalizadas fisicamente, atribuição que passou a compartilhar com a alfândega do Porto de Vitória. Oliveira se demitiu
24 em janeiro (Folha de S. Paulo, 16 de janeiro).
Há mais motivos, alem dos óbvios, para barrar os decretos de Bolsonaro. O presidente disse que pode haver no Brasil uma encrenca maior do que em Washington, em dezembro - o
Congresso foi invadido por
partidários do presidente Donald Trump, sob o argumento de fraudes - se for derrotado nas urnas. É preciso impedir que extremistas de direita - ou de qualquer credo -se armem com facilidade e ampliem seu poder de
pressão e de fogo contra a
democracia, pela qual Bolsonaro sempre demonstrou pouco respeito. https://valor.globo.com/opiniao/noticia/ 2021/02/17/mais-um-pacote-nefasto-
para-facilitar-posse-e-uso-de-armas.ghtml Retorne ao índice
Valor Econômico
Caderno: Opinião, quarta-feira 17 de
fevereiro de 2021.
Um leilão para limpar a matriz
elétrica da Amazônia
Soluções renováveis híbridas são viáveis e reduziriam conta de energia dos consumidores
Por A. Henklain, Brandão, Silva e C. Campos
— Foto:
PublicDomainPictures/Pixabay
Na Amazônia, há 211 sistemas isolados de suprimento de energia elétrica, distribuídos pelo Acre, Amapá, Amazonas, Mato Grosso, Pará, Rondônia e Roraima, com carga
total de 475 MW, atendidos
basicamente por termelétricas a
25
diesel, cujos custos de geração são elevados, onerando as contas de energia dos consumidores de todo o Brasil em R$ 8 bilhões ao ano e despejando na atmosfera amazônica 3,5 milhões de toneladas de CO2 eq. Nem todas as localidades são atendidas 24 horas por dia, 7 dias por
semana, tendo em vista o
fornecimento irregular de
combustível e as dificuldades de transportá-lo para regiões remotas. Além disso, centenas de comunidades remotas permanecem sem nenhum atendimento.
Isso é um escândalo e a maioria dos brasileiros desconhece que subsidia, todos os meses, a geração de energia suja e cara (4% a 8% das nossas contas). Ou seja, ao pagar a conta de luz, parte da renda de cada trabalhador é utilizada para pagar essas usinas. Não houvesse o subsídio aos sistemas isolados, cada brasileiro teria de R$ 80 a R$ 120 a mais por ano para gastar no bem estar de sua família e as indústrias brasileiras seriam mais competitivas.
Termelétricas a diesel oneram consumidores em R$ 8 bi por ano e despejam 3,5 milhões de toneladas de CO2
Pagar subsídio para gerar energia a partir do diesel, em pleno século XXI,
é injustificável diante do
desenvolvimento tecnológico de
fontes de energia renovável, como a solar fotovoltaica, a biomassa, o biogás e a eólica. À medida que os leilões privilegiam e dão continuidade a soluções ultrapassadas, o Brasil continua se submetendo ao martírio do custo e poluição elevados.
Hoje o mundo inteiro adota as soluções híbridas, em que sistemas de armazenamento de energia, usinas
fotovoltaicas, eólicas e outros
sistemas se combinam para gerar
energia ininterruptamente, com
menor custo e de forma sustentável.
Exemplos desses sistemas são
encontrados em Mianmar, no Havaí, nas Ilhas Canárias e nas Ilhas da Sicília. São soluções modernas e criativas para os sistemas isolados, substituindo o diesel e reduzindo progressivamente a necessidade de subsídios, pois essas tecnologias limpas de armazenamento e de geração de energia têm cada vez mais escala de produção, menores preços e qualidade, durabilidade e eficiência mais elevadas.
Com tais sistemas sendo instalados por empreendedores com maior apetite a riscos, o exemplo será seguido por outros e os preços
decrescentes dos equipamentos
proporcionarão soluções de
suprimento mais competitivas às localidades isoladas, até se chegar ao
ponto de os subsídios serem
completamente desnecessários.
O incentivo à adoção de sistemas desse tipo no Brasil livraria os consumidores do ônus de subsidiar o uso do diesel para gerar energia elétrica. Não se trata de milagre, da transferência do responsável pelo pagamento dos subsídios ou mesmo de sua eliminação por decreto. Estamos falando de localidades no meio da Amazônia, com acesso difícil e logística complexa para transportar, instalar e manter os equipamentos funcionando, de acordo com padrões de qualidade elevados.
26 Assim, é urgente que seja estruturada política pública de longo prazo de atendimento dos sistemas isolados por meio de energias renováveis para que o subsídio que hoje alimenta a
conta CCC, de consumo de
combustíveis, comece a migrar para as soluções sustentáveis, reduzindo-se ao longo do tempo, em virtude dos ganhos crescentes de produtividade das formas limpas de produzir e guardar energia.
E a mudança tem que começar já!
Neste contexto, o leilão para
suprimento de energia aos sistemas isolados de 2021, que atenderá 23
localidades em 5 estados da
Amazônia, com potência de 97 MW,
deve ser tratado como uma
oportunidade ímpar para implantar
projetos demonstrativos da
viabilidade tecnológica, econômica e ambiental de soluções renováveis híbridas, com o propósito de acelerar a transição energética.
Para isso, as regras estabelecidas pelo MME, EPE e Aneel em portarias, instruções e na minuta do edital do Leilão dos Sistemas Isolados 2021 (vejam a Consulta Pública Aneel no 70/2020) ainda precisam evoluir muito. Na prática, os prazos curtos de
cadastramento, os períodos de
suprimento contratual iguais para fontes renováveis e poluentes, as dificuldades de registro das soluções
híbridas, as penalidades por
indisponibilidade que oneram muito mais as soluções renováveis, e mesmo a incoerência de o prazo de cadastramento das soluções expirar antes da publicação da versão definitiva e oficial do Edital do leilão, criam barreiras e, no limite,