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A IMPORTÂNCIA DO PENSAMENTO NA EDUCAÇÃO MORAL

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Academic year: 2021

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A IMPORTÂNCIA DO “PENSAMENTO” NA EDUCAÇÃO MORAL

Aluna: Marina Passos Ribeiro da Silva Orientador: Marcelo Andrade

Introdução

O projeto de pesquisa em andamento é uma continuidade das investigações anteriores do GECEC (Grupo de Estudos sobre Cotidiano Escolar e Culturas) sobre educação, diversidade cultural e ética aplicada, desenvolvidas junto a escolas de Ensino Médio da cidade do Rio de Janeiro. A pesquisa compreende a importância de aprofundar tal temática junto aos professores de Ensino Médio, visto que esse nível de ensino vem apresentando novos desafios para o âmbito educacional.

A investigação tem como objetivo mais amplo entender as possíveis relações e interações dialógicas entre o campo ético-filosófico e o campo de ensino-aprendizagem. As principais questões da pesquisa estão relacionadas à problemática das reivindicações pelo direito às diferenças e, a partir dessa perspectiva, os conflitos existentes (racismo, sexismo, homofobia e intolerância religiosa).

O projeto de pesquisa tem como finalidade mapear e entender a interação entre o nosso contexto plural (multicultural) e a efetivação de uma prática educativa baseada no conceito arendtiano de “estatuto do pensamento”, enquanto uma categoria possível e necessária para os estudantes matriculados no Ensino Médio.

Busca-se refletir sobre a relação do pensamento com a educação e entender como os professores do Ensino Médio conduzem os conflitos relativos ao desrespeito à diferença – especialmente racismo, sexismo, homofobia e intolerância religiosa – ocorridos no contexto escolar.

Vale salientar as duas motivações que amparam a apresentação do projeto. A primeira envolve a urgência e a necessidade com que o tema da intolerância tem se imposto atualmente. A segunda, trata-se da tentativa de contribuir na superação de certo desprestígio em relação ao conceito de tolerância seja no ambiente escolar, seja no âmbito social mais amplo.

Inserção no grupo de pesquisa

Iniciei no GECEC em março de 2014, como bolsista de iniciação científica. Desde então, tenho sido responsável diretamente pela organização do acervo bibliográfico do grupo, que auxilia professores, mestrandos e doutorandos em suas pesquisas. Além disso, participo semanalmente das reuniões da equipe e elaboro as atas das mesmas, nas quais procuro sintetizar informações e debates sobre os textos estudados e algumas atividades acadêmicas.

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Os assuntos debatidos semanalmente nas reuniões do GECEC têm ampliado o meu repertório de conhecimentos e saberes, bem como me fazem refletir bastante sobre temas cotidianos e sobre minha possível trajetória profissional.

Como estudante do Curso de Pedagogia e interessada em temas relacionados à formação humana, tenho entendido melhor os temas centrais do multiculturalismo (racismo, sexismo, homofobia e intolerância religiosa) de diferentes maneiras. Além disso, os assuntos abordados nas reuniões do grupo de pesquisa têm contribuído para o meu melhor desenvolvimento nas disciplinas do curso de graduação, por me possibilitar a articulação dos temas que são discutidos no grupo com os conteúdos estudados na grade curricular.

Objetivos

Identificar junto aos professores do Ensino Médio os processos sociais escolares que reproduzem e/ou reforçam os preceitos, as discriminações, as intolerâncias e as apatias diante das diferenças que dignamente nos constituem como humanos;

Analisar as possíveis relações entre o “estatuto do pensamento” e uma proposta de educação para a tolerância e contra a barbárie, em resposta aos desafios identificados no cotidiano escolar;

Contribuir com a fundamentação e a consolidação de processos de ensino-aprendizagem que pretendam responder aos atuais desafios da escola em tempos de preconceitos, discriminações, violências e intolerâncias;

Identificar as características fundamentais de uma proposta pedagógica que esteja atenta a um processo educativo que desloque para seu centro o conceito de “pensamento”, configurando uma educação mais respeitosa das diferenças que nos constituem como humanos.

Metodologia

A metodologia utilizada para atingir os objetivos desta pesquisa consiste numa ampla revisão da obra de Hannah Arendt para fundamentar uma proposta de “educação para o pensamento”, articulando-a aos achados de pesquisas empíricas realizadas com e pelos mestrandos e doutorandos do Programa de Pós-graduação em Educação da PUC-Rio.

Quanto à investigação no âmbito do cotidiano escolar, utilizamos dois instrumentos metodológicos: observação e entrevistas, que estão sendo realizadas por doutorandos que atuam no âmbito do grupo de pesquisa.

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Pensando com Hannah Arendt

Neste momento do relatório, apresentarei as principais ideias que norteiam o projeto de pesquisa e das quais venho me aproximando nos últimos quatro meses, através de leituras indicadas pelo professor orientador. São elas: (a) o julgamento de Eichmann e o impacto que ele causou em Hannah Arendt, a autora central da pesquisa; (b) a importância e ausência do conceito de pensamento para Hannah Arendt entender o caso Eichmann; (c) como o conceito arendtiano de pensamento pode nos ajudar hoje a repensar a educação escolar.

a – O julgamento de Eichmann

O julgamento do oficial nazista Adolf Eichmann, realizado em Jerusalém no ano de 1961, é considerado um dos episódios mais marcantes na carreira da autora Hannah Arendt.

A personalidade de Eichmann apresentava um “novo tipo criminoso”, que cometia um tipo específico de crime: assassinatos em massa no contexto de um sistema totalitário. Eichmann justificava a execução de seus crimes como um ato de obediência, enaltecido como uma virtude. Seu único erro seria o de seguir leis e obedecer ordens, de acordo com determinações superiores, fundamentadas pelas normas legais.

Eichmann possuía um comportamento impecável, cumpridor de seus deveres; estava sempre atento em seguir às normas vigentes; um perfeito pai de família; realizava com eficiência a sua principal função: atacar violentamente a vida de milhares de judeus, levando-os à morte.

Os aspectos da personalidade de Eichmann causaram perplexidade na filósofa Hannah Arendt, visto que, apesar de ter cometido crimes brutais, Adolf Eichmann não era um “monstro”, mas, sim, um homem comum, como tantos outros. Tal normalidade, conduziu Arendt a buscar novos modelos que explicassem o mal encontrado naquele oficial, para além da patologia, possessão demoníaca, determinismo histórico ou alienação ideológica; por entender que o mal não pode ser explicado como uma fatalidade, mas como uma possibilidade da liberdade humana.

Outra característica do réu despertou a atenção de Arendt: a sua linguagem, com uso excessivo de clichês. Para a filósofa, os clichês indicavam que Eichmann apresentava dificuldades em se expressar espontaneamente e era incapaz de pensar e entender o ponto de vista alheio.

Após observar o comportamento e o histórico de vida do réu Adolf Eichmann, Hannah Arendt o definiu como um homem comum, normal, burocrata, banal e superficial. E foi, a partir dessa percepção, que formulou a sua concepção de “banalidade do mal”.

Arendt estava convencida de que o mal era algo banal, que acontecia sem explicações, não tinha raízes e nem profundidade; mas era capaz de propagar-se em uma superfície específica, vulnerável, sobre a massa de cidadãos que não desenvolvera a

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capacidade de pensar, tão pouco a de dar significado aos acontecimentos e ao próprio comportamento. Sendo assim, Eichmann não poderia ser considerado um assassino convicto, pois o mal que cometia era banal, sem explicação convincente ou algum tipo de motivação.

Vale ressaltar que Arendt não pretendia, com a utilização da expressão “banalidade do mal”, justificar os crimes bárbaros cometidos ou desresponsabilizar o reú. Ao contrário, ela estaria convencida de sua responsabilidade pelos crimes e da punição que ele merecia; a intenção da autora era, portanto, compreender o tipo de mentalidade que poderia colaborar no surgimento de indivíduos como Eichmann.

Outro ponto que deve ser destacado, é o significado do termo “banalidade” no ponto de vista arendtiano. Banalidade não é algo sem importância ou comum. Banal é algo que ocupa o espaço do que é comum, “não por ser comum, mas por ser vivenciado

como se fosse algo comum” (Andrade, 2010, p. 114, grifos do autor). Em suma, é

quando a banalidade passa a ocupar, de maneira inadequada, o lugar da normalidade.

b – A importância do pensamento

Com base no julgamento de Eichmann, nas conclusões arendtianas a respeito do perfil do réu e da análise das características de sua personalidade, Hannah Arendt deu continuidade aos estudos. Ela percebeu a precariedade na capacidade humana de julgar e a “possibilidade de repensar as tradicionais formas de entender a nossa formação moral” (idem, p. 115).

No entanto, também é verdade que ela se impressionou muito com o adesismo inquestionável de parcelas significativas da sociedade alemã, mesmo aquelas altamente formadas nos princípios morais mais sofisticados. O que tudo indica é que, no caso do nazismo alemão, o alto nível instrucional de boa parte da sociedade e as especulações filosóficas mais sofisticadas sobre ética e moral de alguns eminentes pensadores alemães não foram suficientemente fortes para conter a barbárie que se instaurou. A terrível e simples verdade era que o nacional-socialismo tinha aprovação da maioria da sociedade alemã: “A situação era tão simples quanto desesperada: a esmagadora maioria do povo alemão acreditava em Hitler” (Arendt, 1999, p.114), por mais educada e moralmente formada que fosse a sociedade. (Andrade, 2010, p. 116)

Vale lembrar que a perplexidade da autora teve início ao perceber a superficialidade com que o réu encarava o cumprimento de sua incumbência: “encaminhar de maneira eficiente milhares de judeus para a morte” (idem, p. 111). Eichmann simplesmente agia, em virtude do cumprimento de seus deveres; era incapaz de pensar e considerar os fundamentos e consequências de suas ações. Sendo assim, seus atos monstruosos e sua consciência tranquila perante os mesmos poderiam ser explicados pela sua irreflexão, o que a autora chamará de “ausência do pensamento”.

Arendt considera que o pensamento é uma saída do mundo. Esta saída não estaria relacionada com uma fuga do mundo ou dos problemas, mas, sim, com o

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rompimento do cotidiano. Significa uma pausa, para refletir e ir ao encontro aos acontecimentos cotidianos, com a finalidade de dar significado a eles. Era justamente esse rompimento que Eichmann não tinha; ele vivia num mundo de frequentes clichês.

O afastamento do mundo que Arendt propõe, visa um diálogo do eu consigo mesmo, buscando dar significado ao mundo; esse significado só é possível na atividade do pensamento. Na perspectiva arendtiana, o pensamento não é composto por regras, normas ou preceitos, mas de possibilidades de ressignificação do mundo.

c – Pensar uma educação para o pensamento

A perspectiva arendtiana apresentada nos permite repensar a tarefa educativa no que diz respeito ao ensino e à difusão de valores morais.

Vivemos em tempos difíceis. Testemunhamos uma época sobrecarregada de crises que atinge diversos contextos e gera grande instabilidade na economia e no sistema financeiro, na relação de confiança entre as instituições, nas mudanças epistemológicas, guerras e terrorismos, intolerâncias religiosas e no próprio sistema educacional, que é o principal foco da nossa pesquisa.

A escola preocupa-se em cumprir prazos e em transmitir os conteúdos propostos, específicos a cada nível de ensino. Há ainda certo despreparo dos professores, que se deparam com diversos desafios. A questão, então, seria como lidar com os conflitos sociais que ocorrem e são reforçados dentro da escola e educar para e no pensamento, visando desenvolver o senso moral dos alunos.

Alguns procedimentos como a fala, o debate e a leitura de textos e trabalhos em grupos são mais valorizados que o silêncio para o pensamento. Não buscamos, em nossa pesquisa, desvalorizar a utilização desses métodos, pelo contrário, reconhecemos a importância deles na educação, mas acreditamos que “toda conversa dialógica – entre educador/a e educando, educando e texto e educandos entre si – deveria levar ao silencio, isto é, deveria instigar o educando para o seu diálogo consigo mesmo” (Andrade, 2010, p. 124).

Consideramos que o cenário educacional é caracterizado pela ausência de estímulos ao pensamento. No campo da educação moral, os valores morais mais fundamentais, como a justiça, a igualdade, a liberdade, a solidariedade, o diálogo e a tolerância, tornam-se secundários diante das prioridades determinadas pelo sistema escolar.

Não seria necessária a realização de projetos grandiosos para trabalhar esses valores com os alunos, pois eles estão presentes em nosso cotidiano e em simples atividades, como debates sobre os assuntos que estão sendo noticiados pelas diferentes mídias ou as próprias experiências dos alunos, relacionados à moralidade podem e devem ser otimizados. Nossa aposta é que a partir dessas deve-se estimular o diálogo silencioso consigo mesmo, o pensamento na perspectiva de Hannah Arendt.

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O universo escolar deve assumir o compromisso de educar para o pensamento. Desarrumando as certezas e provocando certa insegurança das coisas que antes eram profundamente seguras. Promover a interação, a reflexão, o questionamento, a crítica e o silêncio do aluno, pois esses são instrumentos que colaboram na edificação do pensamento que não precisa e nem deve posicionar-se no campo das certezas, mas das possibilidades.

Conclusões

A pesquisa encontra-se em andamento. No entanto, algumas conclusões parciais são possíveis, tais como:

1) O estatuto sobre a personalidade de Eichmann, o oficial nazista analisado por Hannah Arendt, tem indicado que o problema do mal não tem uma explicação em nossa tradição filosófica, teológica, literária ou psicológica, mas revela um homem comum, com comportamentos considerados bons e desejáveis;

2) O “estatuto do pensamento” proposto por Hannah Arendt não apresenta um código moral fechado, mas uma moral negativa, ou seja, sobre aquilo que não devemos fazer, como os atos intolerantes;

3) A banalidade do mal, estudada por Arendt, pode ser uma categoria de análise importante para entendermos os atos intolerantes praticados contra grupos minoritários ainda hoje na sociedade brasileira.

Referências

1- ANDRADE, Marcelo. A banalidade do mal e as possibilidades da educação

moral: contribuições arendtianas. Revista Brasileira de Educação, volume 15, nº 43,

jan-abr 2010, p. 109-125.

2- ANDRADE, Marcelo. Hannah Arendt e a educação: educar para o pensamento e

contra a barbárie. In: Projeto de Pesquisa apresentado como requisito parcial para a

solicitação ao Programa “Apoio a Projetos na Área de Humanidades” (Edital 15/2011), junto ao Amparo à Pesquisa do Estado do Rio de Janeiro (FAPERJ)

Referências

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