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A filosofia da política cooperativista na Venezuela de Hugo Chávez: lições preliminares. Henrique T. Novaes * Paulo A.

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A filosofia da política cooperativista na Venezuela de Hugo Chávez: lições preliminares

Henrique T. Novaes* Paulo A. de Lima Filho** Introdução

Este artigo avalia a filosofia da política cooperativista que vêm sendo implementada na Venezuela. Ele faz parte de uma pesquisa em andamento que pretende constrastar as políticas públicas para a promoção do cooperativismo em quatro países da América Latina: Argentina, Brasil e Uruguai, além da Venezuela.

Trabalhamos com a hipótese de que há uma diferença substancial entre as propostas dos Governos de Chávez, Kirchner, Lula, e Tabaré Vasquez. A de Chávez, como veremos a seguir, parece estar voltada inserida numa ótica de desenvolvimento endógeno enquanto que no Brasil, Argentina e Uruguai, apesar das especificidades de cada um, predomina a visão de contenção social ao desemprego em massa.

Uma advertência deve ser feita nesta introdução. Há uma enorme dificuldade de se conseguir dados tanto quantitativos como qualitativos sobre as políticas públicas implementadas no governo Chávez. Em diálogo com quadros da burocracia e da comunidade de pesquisa venezuelana, verificamos que há uma quantidade enorme de políticas sendo implementadas, algumas com caráter inovador, mas que ainda não foram avaliadas nem pelo governo nem por instituições de pesquisa. Ao que tudo indica, será feita uma avaliação da política pública, porém a mesma se dará somente no final do mandato.

Acreditamos que esta dificuldade será sanada à medida que os relatórios de avaliação das políticas públicas forem sendo liberados. É por esse motivo que a análise – ao menos neste momento da pesquisa - não poderá ser minuciosa, principalmente no que se refere ao detalhamento das estatísticas. Nesse sentido, pretendemos neste artigo apenas caracterizar algumas políticas realizadas na Venezuela e demonstrar qual é a filosofia da política cooperativista embutida na mesma.

Gostaríamos de ressaltar também que a avaliação preliminar de uma política em execução é sempre um problema para aqueles que saem na frente, no entanto,

* Doutorando em Política Científica e Tecnológica - Unicamp. hetanov@ige.unicamp.br

** Doutor em Ciências Sociais pela PUC-SP. Coordenador do Instituto Brasileiro de Estudos

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acreditamos que esta divulgação poderá estimular o debate e trará algumas informações à comunidade de pesquisa latino-americana sobre as possíveis novidades na Venezuela, sem falar nas possíveis correções de rota dos fazedores de políticas públicas.

O artigo foi estruturado da seguinte forma. Iniciamos com uma breve análise da história recente da Venezuela. Em seguida, descrevemos as principais missões criadas pelo governo Chávez, dando destaque às missões Vuelvan Caras e Mercal, mais diretamente relacionadas à promoção do cooperativismo. Encerramos o artigo com algumas considerações finais.

A filosofia da Política Pública venezuelana: o papel do cooperativismo no desenvolvimento endógeno

Breve histórico da Venezuela

Não é possível falar da Venezuela sem dar atenção especial ao papel do petróleo na economia deste país. Se antes da eleição de Chávez o petróleo inibia o desenvolvimento de outras atividades produtivas, com Chávez verifica-se uma mudança de rota, ao investir uma parte significativa do excedente gerado pelo petróleo na área social (MARINGONI, 2004).

De acordo com Maringoni, a novidade do governo Chávez é que ele quer transformar o petróleo numa riqueza pública. E isso a elite econômica não quer permitir, daí a tentativa de golpe em abril de 2002 (MARINGONI, 2004).

Ainda não se sabe se efetivamente se trata de uma revolução bolivariana rumo ao

socialismo do século XXI tal como vem sendo pronunciada, ou se teremos um socialismo cristão (CHÁVEZ, 2005). Talvez poderá se conformar uma variante de um capitalismo popular e coletivo, ou a criação de um inédito Estado do Bem-Estar na

América Latina. Independente da sociedade que se conformará, ocorreu de fato uma revolução política, democrática e popular, dentro da ordem do capital e contra a velha ordem deste, que aponta para níveis crescentes de controle social sobre aquele. Ao nosso ver, um bom objeto de pesquisa seria avaliar a evolução deste controle.

É significativo o aumento do orçamento nas áreas sociais; o incentivo à organização e à participação popular; além da prática diária de transformação da riqueza petroleira como um bem do povo venezuelano e não de uma pequena elite como historicamente foi (MARINGONI, 2004).

Maringoni acredita que o processo político venezuelano não conta com uma organização social tão desenvolvida como a do Brasil; mas tem características próprias.

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O que eles estão fazendo é o que classicamente se chamava de uma revolução a partir do alto. Eles tentam, a partir da conquista do governo federal, impulsionar as transformações sociais (MARINGONI, 2004)1.

Um Panorama das missões

Diversas Missões foram criadas pelo Governo Chávez. Villa (2005, p.165) destaca o impacto positivo destes “planos sociais”, não só para amplos setores populares como também para um terço de setores da classe média. O programa de Saúde Barrio

Adentro, é um dos mais famosos. Nesse plano, os médicos, cubanos em sua maioria,

realizam consultas diárias e permanecem em estado de prontidão durante as 24 horas do dia nas regiões mais pobres do país. Na área de educação, o plano abrange três frentes:

a Missão Robinson, que pretendia alfabetizar mais de 1,5 milhões de pessoas entre os anos de 2003 e 2004; a Missão Ribas, que objetiva o estímulo ao reingresso no subsistema de segundo grau de pessoas que ainda não concluíram seus estudos; e, por fim, a Missão Sucre, dirigida à educação superior, cuja realização mais concreta foi a Universidade Bolivariana, que se propõe incorporar quinhentos mil estudantes sem vaga no subsistema de educação superior público e privado (VILLA, 2005, p.166).

De acordo com Rattner (2005),

a impopularidade de Chávez entre a burguesia e a classe média de seu próprio país é decorrente de um conjunto de programas sociais, financiados com os lucros da estatal petrolífera PDVSA, decorrentes da elevação constante dos preços de petróleo no mercado mundial, a partir do segundo semestre de 2004. Essas atividades sociais, denominadas “missões”, são orientadas para a mobilização e conscientização das comunidades carentes através de conselhos, consultas populares e orçamentos participativos (RATTNER, 2005, s/nº) .

Rattner acredita que, dentre essas missões, “merece destaque especial a integração entre esta iniciativa e o programa de preparação para a economia solidária e a formação de cooperativas nas quais são aproveitados recursos humanos previamente preparados pelas “missões” educativas e, em seguida, orientados para o desenvolvimento local” (RATTNER, 2005, s/nº).

As missões Mercal e Vuelvan Caras: estímulo ao surgimento em massa de cooperativas

Villa (2005) e Rattner (2005) chamam a atenção para uma outra missão. Além da educação para o desenvolvimento local - citada nas linhas acima - e a missão para a

1 Para saber mais sobre a história da Venezuela e o contexto em que Chávez sobe ao poder, ver Villa

(2005) e Almendra (2005). Dentre outras propostas de Chávez, Almendra (2005) dá destaque a criação da Petrosul junto com o Brasil e a Argentina e a proposta de criação da TV multiestatal Telesur, juntamente com Argentina, Uruguai e Cuba, além da permissão para o funcionamento de 200 rádios e TVs comunitárias.

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saúde, há uma outra missão que ganhou o nome de Mercal. Para Rattner, esta missão procura

assegurar o acesso da população a uma alimentação básica sadia. Isso se dá através da criação de uma ampla rede de lojas que atendem milhares de consumidores de baixa renda, com frutas e verduras plantadas em hortas comunitárias. A melhoria da segurança alimentar – e conseqüentemente da saúde - anda de mãos dadas com a geração de renda local. Essa preocupação com a população desempregada e os jovens egressos das escolas resultou também na formação de cooperativas de costura, de fabricação de calçados e de hortas para abastecer com verduras e frutas as escolas e creches (RATTNER, 2005, s/nº)2.

Apesar do cooperativismo fazer parte de várias missões, a que está mais diretamente incumbida em promovê-lo chama-se Vuelvan Caras. Poderíamos iniciar, com as palavras do Ministro da Economia Popular – Elías Jaua, que relatou ao jornalista da Agência Carta Maior (2005) que “Em um dia de loucura criativa, convocamos todos os venezuelanos que estavam desempregados para conversar com representantes do governo em vários pontos do país. Cerca de um milhão de pessoas atenderam ao chamado e partimos daí, com um processo de capacitação profissional para inserção em alguma atividade produtiva. A missão começou, assim, com a capacitação em diferentes ofícios o que exigiu do governo uma contratação massiva de instrutores”. Das 6.840 cooperativas formadas neste processo, quase 6 mil receberam financiamento do governo, a maioria delas funcionando no campo. Ainda nos baseando nas declarações do governo, vale a pena ressaltar o papel da Missão Vuelvan Caras (MVC) no

desenvolvimento endógeno bem como a definição do último dada por estes:

La Misión Vuelvan Caras, más allá de la generación de nuevos empleos, pretende iniciar un cambio en el modelo económico, modificando las relaciones de producción, con un enfoque de desarrollo endógeno que parte de las fuerzas propias, “desde adentro, por dentro”, bajo las premisas de la economía popular, centrada en la equidad, la solidaridad y la cooperación. Este desarrollo se sustenta en la educación y el trabajo, tal como lo establece el Artículo 3 de la Constitución de la República Bolivariana de Venezuela (MISSION, s/d).

A missão foi criada em setembro de 2005. Um ano depois de criada, a MVC contabilizava os seguintes números: 147 Núcleos de Desenvolvimento Endógeno em funcionamento; 853 em fase de planificação; 61.965 pessoas incorporadas nestes núcleos; mais de 257 mil pessoas recebendo capacitação; 16.786 instrutores; 2.122

2 De acordo com Brito (2006, p. 5), “aunque desde el punto de vista estadístico formal no hay cifras que

dibujen el impacto económico producido, desde fuentes gubernamentales afirman que la Red Mercal rompió todas las expectativas de cobertura y volúmenes en cuanto a la población beneficiada y toneladas métricas de alimentos distribuidos. Afirman haber constituido la red de distribución más grande del país colocando en el mercado nacional la cantidad de 6.000 toneladas de alimentos diarios. Actualmente cuenta con 14.775 establecimientos y beneficia aproximadamente a 15 millones de venezolanos con productos de calidad a precios que se sitúan un 35% por debajo de los precios de las cadenas de comercialización tradicionales”.

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cooperativas da missão; e 10.100 cooperativas em fase de planificação (CARTA MAIOR, 2005).

O vice-ministro para a Formação e Desenvolvimento Popular, Juan Carlos Joyo, afirmou, quando o programa fez um ano de vida, que era difícil fazer um balanço desta missão “porque a diferencia de otras misiones, que en términos reales sus resultados concretos son perfectamente identificables, Vuelvan Caras envuelve un conjunto de elementos de formación, organización, capacitación sociopolítica y productiva que podríamos sintetizar en un cambio en las expectativas del venezolano en aras de sentar las bases de una nueva sociedad y cambiar el modelo socioeconómico” (Vice-Ministro Juan Joyo, 2005).

Para o ministro da Economia Popular, Elias Jaua,

A despecho de lo que piense la oposición, esto [a Missão Vuelvan Caras] no es un programa de empleo o financiamiento masivo de cooperativas, es un contexto mucho más complejo que involucra la creación de herramientas para salir adelante con una mejor calidad de vida en el marco de este socialismo del siglo XXI que estamos desarrollando (Ministro da Economia Popular Jaua, 2005).

A nossa análise das políticas dos governos latino-americanos não se baseia somente nas declarações do governo, freqüentemente alicerçadas num discurso muitas vezes preso ao espetáculo da mudança. No entanto, é curioso verificar que no caso venezuelano, parece haver uma clara conexão entre o discurso e a prática da política pública, pautada na inserção do cooperativismo numa concepção de transformação social. Resta saber se há possibilidades de sustentação destas cooperativas, pois verificamos, tomando por base as políticas implementadas na Prefeitura de São Paulo (Marta Suplicy, entre os anos 2001-2004), que logo após a mudança de governo, a grande maioria das cooperativas criadas na gestão da Marta Suplicy desvaneceu-se3.

Uma ressalva faz-se necessária. Freqüentemente alguns analistas apressados afirmam que o cooperativismo deveria funcionar sem subsídios do Estado. Esquecem que não existe uma empresa capitalista perfeita, esquecem também que as mesmas nunca deixam de usar os fundos públicos para se manterem no capitalismo. Se formos para a agricultura, o argumento se aprofunda, pois não existe um país no mundo que não subsidie seus agricultores. Neste sentido, por que querem eles que as cooperativas alcancem a perfeição que nem mesmo as empresas capitalistas conseguem?

3 Como estão surgindo milhares de cooperativas todos os dias (a toque de caixa, como nos disse um

venezuelano), há grande possibilidade de fragilização de muitas (ou algumas?) destas. Isso não invalida a necessidade de uma política em larga escala, mas chama a atenção para a complexidade do tema.

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As políticas de expropriação de fábricas

Se é verdade, como aponta o lema do Movimento Nacional de Empresas Recuperadas (MNER-Argentina), que toda empresa que “fecha, deve ser ocupada e colocada para produzir”, o que fazem os trabalhadores quando as fábricas não fecham?4 Não há respostas por parte dos mesmos num contexto onde poucas fábricas fecham? E o que pode fazer o Governo num contexto onde as fábricas não fecham?

Primeiramente, podemos afirmar que Chávez tem uma política para a transformação das fábricas fechadas em fábricas co-gestionadas. Em janeiro de 2005, Chávez expropriou a antiga fábrica de papel e celulose Venepal. Da falência desta empresa, da pressão dos trabalhadores e da decisão do Estado de recuperá-la sob co-gestão por motivos de interesse público, surgiu a Invepal. Trata-se de uma empresa que se tornou estatal, onde seus trabalhadores, que agora integram a Cooperativa de Industria y Papel (Covinpa), administrarão as ações, junto com os Ministérios do Trabalho, Economia Popular e Finanças (51% do capital provém do Estado e 41% da cooperativa dos trabalhadores). Chávez também tem uma política para o atual contexto, onde poucas fábricas fecham. Ele anunciou – em julho de 2005 - a intenção de expropriar mais 700 fábricas que estão improdutivas ou trabalhando muito abaixo de sua capacidade (IBARRA, 2005; MORENO, SANABRIA, 2006). Essa política faz parte de uma resposta ao boicote de alguns empresários que resolveram paralisar a produção.

Cabe ressaltar que a proposta de expropriação de 700 fábricas fechadas ou sub-utilizadas não se concretizou nesse número. De acordo com Moreno e Sanabria (2006), em função de um erro do próprio movimento dos trabalhadores. Para eles,

Lamentablemente, esta oportunidad fue desaprovechada, la dirigencia de la UNT no presentó ningún plan concreto al movimiento obrero para llevar adelante esas tomas de empresas y proponer su expropiación (MORENO, SANABRIA, 2006, s/nº)5.

Ao nosso ver, a diferença fundamental é que na filosofia de Chávez está implícita uma e um diálogo maior com os trabalhadores que buscam a estatización bajo control obrero6.

4 Numa pesquisa realizada em 2004 junto a trabalhadores de FRs, perguntaram se era legítimo ocupar

fábricas que não fecharam: 90% dos trabalhadores responderam que não (REBÓN, 2004). Para saber mais sobre as Fábricas Recuperadas, ver Novaes (2005).

5 De acordo com Moreno e Sanabria (2006), havia empresas que já eram estatais e está se implementando

um novo modelo de gestão: a cogestão. Neste caso, trata-se de uma gestão compartilhada entre a burocracia e os trabalhadores.

6 Assim como na Argentina e em menor medida no Brasil, muitos trabalhadores reivindicam a estatização

das fábricas com controle operário. Pode-se verificar que não há um consenso entre os trabalhadores latino-americanos com relação a estatização ou autogestão das fábricas. É interessante observar ainda que nem o governo brasileiro nem o argentino estatizou nenhuma fábrica. Sobre a sistematização deste debate, ver Novaes e Minto (2006). Sobre este debate na Venezuela, ver Lebowitz (2005) e Moreno e Sanabria (2006).

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Isso não significa, ao contrário do que se pensa, que a relação entre os trabalhadores e o governo de Chávez não esteja cheia de contradições.

Uma política que ainda não tivemos condições de avaliar é a que se refere ao direcionamento das compras do governo federal às cooperativas e micro-empresas. Dados preliminares nos mostram que governadores da linha de Chávez estão realizando tal política. Se Chávez também estiver utilizando as demandas do Estado, isso poderá ser interpretado como uma tentativa de democratização dos fundos públicos, antes destinados de forma privilegiada a pequenas parcelas do capital transnacional e em menor medida nacional.

Também tivemos pouca informação sobre a política de Incubação de cooperativas. Em conversa com uma funcionária de um dos Estados que seguem a linha de Chávez, soubemos já houve uma mudança de rota na política de Incubação. A partir desta mudança de rota, este Estado passou a assessorar somente cooperativas. Na etapa seguinte da pesquisa, procuremos saber se o governo federal dá prioridade para a Incubação de cooperativas, se o mesmo se preocupa com a inadequação da tecnologia convencional e se as cooperativas estão promovendo processos de Adequação Sócio-Técnica (NOVAES, 2005, Capítulo 2).

Apesar de não fazer parte deste artigo, uma breve comparação com a filosofia da política cooperativista de Lula nos ajuda a entender que pode estar havendo diferentes papéis para o cooperativismo na América Latina.

Em primeiro lugar, faz-se necessário destacar que a subida de Lula não representou uma ruptura histórica rumo a construção de uma sociedade voltada para a satisfação das necessidades humanas. A tendência do Governo Lula é nitidamente pró-capital - principalmente pró capital-financeiro. Como linha menor, temos algumas vozes que pretendem criar um social-democracia tardia no Brasil. Para Patrus Ananias, temos que “reconstruir o Estado de Bem-Estar social” (Ananias, 2006)7.

Na próxima fase da pesquisa, procuraremos colocar em relevo a visão predominante governo Lula sobre o cooperativismo. Podemos adiantar neste artigo que o governo Lula atribui um papel pouco estratégico ao cooperativismo. Um sintoma bem claro da pouca relevância do cooperativismo é a forma como foi criada a Secretaria Nacional de Economia Solidária (SENAES), 4 meses depois do 1º dia de Governo. Ao que tudo indica, esta Secretaria somente foi criada devido à pressão (de baixo) do movimento de Economia Solidária.

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É necessário ressaltar que ainda que não concordemos com muitas das posições do secretário Paul Singer8, trata-se de um fiel defensor do cooperativismo popular, inclusive dentro de uma ótica socialista, algo que parece não se repetir em outras esferas deste governo. Cabe esclarecer também que no Brasil o cooperativismo não está sendo impulsionado pela ausência de política do Ministério do Trabalho além de outros, mas pela pouca importância atribuída a este no quadro de direita popular ou, no máximo, de uma social-democracia tardia que se configura em alguns ministérios mais à esquerda. A visão hegemônica do governo é a da esperança de que o emprego com carteira assinada voltará a crescer, cabendo ao cooperativismo apenas o papel de trabalho

temporário, passageiro, até que atravessemos a tempestade. É em função disso que a

visão que acaba predominando não é a de Singer – compromissada com a promoção do cooperativismo rumo a uma sociedade alternativa – mas sim a visão de cooperativismo como forma de conter o desemprego em massa. Isso nos permite concluir que a SENAES é uma espécie de pedra proto-socialista num colar declaradamente pró-capital. Ao contrário disso, na Venezuela, foco deste artigo, é certo que a criação de cooperativas de trabalhadores é uma política central e estratégica do processo de

desenvolvimento endógeno. Não só devido à larga escala e ao grau de abrangência da

política, mas também pelo papel atribuído ao cooperativismo numa política maior, que é a de desenvolvimento endógeno.

Podemos representar simbolicamente de que forma se dá a combinação entre as visões dos diversos ministérios no Brasil e da Venezuela. No Brasil há pequenos vetores (principalmente SENAES e o Ministério do Desenvolvimento Social) que impulsionam o cooperativismo de trabalhadores. Estes são anulados, seja pelo contexto macro-econômico, seja pelo papel atribuído ao mesmo pelos outros ministérios. Ao contrário, na Venezuela, parece que há pequenas oposições entre o Ministério da Economia Popular e as demais políticas do governo chavista9.

Considerações finais

Procuramos evidenciar neste artigo, ainda que de forma introdutória, a filosofia da política pública para a promoção do cooperativismo no governo de Chávez. Nossa pretensão não é tomá-lo como um modelo, mas salientar que o cooperativismo pode se

encaixar em diferentes projetos de sociedade, como sugere Tiriba (2002). 8 Ver, por exemplo, Novaes (2005, Capítulo 3).

9 Para saber sobre as Políticas de Mercado de Trabalho nos países do Mercosul (fomento ao emprego;

proteção aos desempregados; formação profissional e desenvolvimento dos recursos humanos), ver Cacciamali (2005).

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Apesar de requerer um aprofundamentos das pesquisas, que será solucionado numa visita a este país no ano de 2007, podemos adiantar que a filosofia da política cooperativista que vêm sendo adotada na Venezuela faz parte de uma revolução democrático-popular que tem no cooperativismo um dos pilares fundamentais para a consecução do desenvolvimento endógeno. A nós, só resta a pergunta: estará o governo Chávez atuando na raiz dos problemas? Só a história poderá responder.

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