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Os efeitos das aulas de educação física escolar na vida de mulheres que atualmente tem um estilo de vida ativo

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TATIANA BONFADA TREVISAN

OS EFEITOS DAS AULAS DE EDUCAÇÃO FÍSICA ESCOLAR NA

VIDA DE MULHERES QUE ATUALMENTE TEM UM ESTILO DE VIDA

ATIVO

Ijuí (RS) 2014

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TATIANA BONFADA TREVISAN

OS EFEITOS DAS AULAS DE EDUCAÇÃO FÍSICA ESCOLAR NA VIDA DE MULHERES QUE ATUALMENTE TEM UM ESTILO DE VIDA ATIVO

Trabalho de Conclusão de Curso apresentado ao curso de Educação Física, Departamento de Humanidades e Educação (DHE) da Universidade Regional do Noroeste do Estado do Rio Grande do Sul (Unijuí), como exigência parcial para obtenção do grau de Licenciada em Educação Física.

Orientadora: Profª Dr.ª Maria Simone Vione Schwengber

Ijuí (RS) 2014

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A Banca Examinadora abaixo assinada aprova o trabalho de conclusão de curso:

OS EFEITOS DAS AULAS DE EDUCAÇÃO FÍSICA ESCOLAR NA VIDA DE MULHERES QUE ATUALMENTE TEM UM ESTILO DE VIDA ATIVO

elaborado por

TATIANA BONFADA TREVISAN

como requisito parcial para obtenção do título de Licenciada em Educação Física.

Ijuí (RS), 17 de janeiro de 2014.

BANCA EXAMINADORA

_______________________________________ Professora Dr.ª Maria Simone Vione Schwengber Orientadora

_______________________________________ Professor Dr. Sidinei Pithan da Silva

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DEDICATÓRIA

Agradeço primeiramente a Deus, pois acredito ser ele o ser maior que zelou por mim durante toda minha vida, e aquele que me mantém respirando todos os dias. Agradeço a Deus por estar comigo em todas as vezes que fraquejei, que chorei e disse que não conseguiria, que pensei em desistir por não ter mais

forças, o meu muito obrigado. A minha mãe, amor maior não pode existir! Obrigado mãe pelas inúmeras vezes que te sacrificastes por minha causa, por abrir

mão dos teus sonhos e desejos, para que eu pudesse continuar estudando. Por acreditar em mim e sempre dizer que eu conseguiria. Por suportar a minha ausência e a saudade, quando eu estava em função dos meus estudos. Por me acolher em teu colo, ouvir os meus desabafos, secar minhas lágrimas e dizer “não fica assim filha, você vai conseguir”. Queria que por um descuido Deus te fizesse eterna. Terás sempre o meu amor, o meu respeito, a minha admiração por ser essa mulher batalhadora, que faz tudo pelos seus filhos. O meu muito obrigado por estar comigo nesse momento tão especial. TE AMO MÃE!

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AGRADECIMENTOS

“Quem caminha sozinho pode até chegar mais rápido, mas aquele que vai acompanhado com certeza chegará mais longe e terá a indescritível alegria de compartilhar, alegria esta que a solidão nega a todos que a possuem…”

Nestes sete anos e meio de universidade, foram muitas as pessoas que passaram por minha vida, mas é claro sempre há aquelas que se tornam indispensáveis e merecem um agradecimento especial.

Família: Pai e mano, mesmo vocês não me compreendendo às vezes, obrigado por me apoiarem durante todos esses anos, por junto com a mãe abrirem mão de certas coisas para me manter na universidade. Gabi meu irmão super inteligente espero te ver cursando a tal engenharia ou agronomia daqui uns anos, e ai quero ver você dizer que a universidade é “moleza”. Amo vocês!

Léia minha prima e também grande amiga, que compartilhou comigo de muitos momentos bons e também ruins. Obrigado por me abrigar em sua casa quando precisei, por sempre me apoiar e dizer que eu não desistisse e que os estudos e o conhecimento são algo que não podem me tirar. Obrigado prima, amo você!

Não tenho a certeza sobre o amanhã, porém tenho que agradecer pelos momentos que vivi e ainda vivo contigo. Obrigado Marcelo por esses dois anos de companheirismo, cumplicidade, respeito e amor. Foi e ainda és um grande incentivador, que quando estou triste e desanimada diz “amor você vai conseguir, você é capaz”. O que seria de mim sem você e sua família que me adotou como filha, neste processo sofrido, mas também gratificante. O meu muito obrigado a você, a Dona Maria, seu José, a Marci, a Preta e o Nego.

Amigos: “Amigos são a família que Deus nos permitiu escolher”. Não sei quem escreveu esta frase, porém foi muito feliz em sua colocação. Tiveram amigos passageiros, parceiros de festa, porém tiveram aqueles do início do curso e aqueles feitos no decorrer. Todos estes de uma maneira especial me conquistaram e me proporcionaram momentos inesquecíveis. Como esquecer da temida aula de anatomia que em meio a todo aquele conteúdo de ossos, músculos, coração,

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pulmão, enfim, me deparei com uma loira dos cabelos cacheados, e outra loira do cabelo liso e de cara me identifiquei. O trio inseparável como muitos diziam, que sempre tentava se matricular nas mesmas matérias, que tentou se formar junto pra fazer uma grande festa e não conseguiu, mas que permaneceu e permanece até hoje junto, por um sentimento muito forte. Obrigado Tu e Fabi, amo vocês suas praguinhas.

A minha amiga agora mestranda Gili, que se tornou muito especial na minha vida. Com toda a sua inteligência me incentivando para o mestrado (quer me levar pra POA), e também me co-orientando nesse trabalho. O que seria de mim sem os teus conselhos, os teus vários (diga-se de passagem) puxões de orelha, as tuas gargalhadas que sinto tanta falta e o teu jeito especial de gostar dessa tua amiga complicada. Obrigado minha irmã, que não é de sangue, mas de coração, te amo. Nessa querida, obrigado pelas risadas, pelas brincadeiras, pelas festas, pelos momentos bons, que são os que consigo lembrar quando penso em você. Te admiro por tua determinação e garra e tua forma de encarar a vida. Obrigado por tudo.

Ani sempre determinada, focada e de uma inteligência inigualável, que abriu meus olhos para um novo caminho de estudos o mestrado. Saudades das nossas conversas tomando chimarrão e comendo pipoca, dos teus conselhos, dos filmes, lanches, almoços, enfim, de todos os momentos que passamos juntas nesse tempo que tive o prazer de morar contigo. Obrigado amiga! E ainda das companheiras de moradia, como não agradecer a você Josi pelas sessões de terapia, nas quais uma era psicóloga da outra (hehe), dos almoços cujo cardápio era sempre pensado igual, das tardes vendo novela, tomando chimarrão, comendo brigadeiro e pipoca. Muito obrigado amiga, sinto muito a tua falta.

E de uma forma bem especial aos professores, grandes mestres que me possibilitaram chegar a essa etapa de formação. O meu muito obrigado especial ao professor Sidinei por ouvir os meus desabafos, por acreditar em mim, pelos momentos que pude ser sua aluna e usufruir de todo o seu conhecimento, por mostrar tanto amor a Educação Física e acreditar nela, instigando sempre os seus alunos a dar o seu melhor. Ao professor Paulo Fensterseifer por me deixar sempre mais motivada a lutar pela Educação Física, que me conquistou pela sua simplicidade, mesmo diante de tamanha inteligência. Ao professor Carlan, pela atenção, pelo carisma, apoios fundamentais nessa jornada. Ao professor Fernando

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González por todo o seu conhecimento, pelos momentos que pude compartilhar dele e ter o desejo de ser um pouco assim também.

E claro, um parágrafo especial para minha orientadora. Professora Maria Simone. Tive o prazer de ser sua bolsista durante quatro anos, e com certeza me ensinaste muito. Obrigado por ter paciência comigo, por acreditar na minha capacidade e me incentivar a ir mais longe.

Não poderia deixar de agradecer aqueles que me proporcionaram estagiar, aprimorando assim meus conhecimentos. Obrigado aos meus alunos de ginástica laboral, alunos da escola, alunos dos meus estágios, por me fazerem parte da minha vida e despertar ainda mais o meu amor pela profissão escolhida.

O meu muito obrigado as mulheres participantes da pesquisa que dispuseram de seu tempo para a realização das entrevistas. Sem vocês essa pesquisa não teria acontecido.

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RESUMO

A participação das mulheres no âmbito esportivo sempre esteve cercada por restrições e preconceitos. Elas lutaram e ainda lutam por reconhecimento e valorização de sua participação no cenário esportivo, seja como atletas, técnicas, árbitras, jornalistas, ou como expectadoras. Enfim, buscam um espaço cada vez maior nesse ambiente por muitos anos dominado pelos homens. A participação das mulheres foi restrita e criticada também nas aulas de Educação Física Escolar, as quais tiveram algumas atividades proibidas e ainda hoje apresenta conflitos, tais como: disputas por espaço nas aulas, dificuldades de relacionamento, resistência em aulas coeducativas1. Nesse sentido, a presente pesquisa teve como objetivo perceber em que medida as aulas de Educação Física Escolar influenciaram as escolhas de mulheres que atualmente tem um estilo de vida ativo. Para tal, a pesquisa se caracteriza como qualitativa, e inserida nela a história oral, que tem como característica principal a singularidade. A investigação consiste em um estudo de campo com três mulheres ativas em ambientes como: academia, futebol, tênis, corrida, da cidade de Ijuí/RS. O instrumento para a coleta de dados foi a entrevista baseada nas trajetórias de vida destas mulheres, compreendendo três temas geradores: aulas de Educação Física Escolar; Adesão a prática de esportes/práticas corporais; Ser mulher ativa atualmente. Estes temas compreenderam também as categorias de análise dos dados. Os resultados apontam para três realidades diferentes, nas quais as aulas de Educação Física Escolar não tiveram influência direta nas práticas escolhidas, mas em dois casos serviram para o aperfeiçoamento e o gosto pelo exercício físico.

Palavras-chave: Aulas de Educação Física Escolar. Mulheres ativas. Exercício Físico.

1

Aulas co-educativas significam que meninos e meninas tem as mesmas oportunidades de realizar as atividades, diferente de aulas mistas, nas quais meninos e meninas estão no mesmo espaço, porém as atividades se diferem.

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SUMÁRIO INTRODUÇÃO/JUSTIFICATIVA...10 Problema...13 Objetivos...13 Objetivo geral...13 Objetivos específicos...13 1 REFERENCIAL TEÓRICO...14

1.1 Caracterizando o estilo de vida ativo...14

1.2 Mulheres e esportes no Brasil...20

1.2.1 O corpo da mulher atleta...29

1.2.2 Falando sobre gênero...34

2 METODOLOGIA...40

2.1 Tipo de pesquisa...40

2.2 Procedimentos...43

2.3 Coleta de dados/Instrumento...43

2.4 Universo/população e processo de seleção de sujeitos...44

3 ANÁLISE E DISCUSSÃO DOS DADOS...45

3.1 Mulheres e o universo das práticas corporais e esportivas atualmente..45

3.2 A mulher de hoje seria o gênero frágil?...46

3.3 Mulheres de Ijuí...uma certa especificidade...48

3.4 Aulas de Educação Física Escolar...49

3.5 Adesão a prática de esportes/práticas corporais...52

3.6 Ser mulher ativa atualmente...59

CONSIDERAÇÕES FINAIS...65

REFERÊNCIAS...67

APÊNDICES...71

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INTRODUÇÃO/JUSTIFICATIVA

A motivação e o envolvimento com o tema de estudo originou-se primeiramente por eu ser mulher e, desde cedo, não compreender e nem aceitar a divisão entre meninos e meninas, mulheres e homens, seja no âmbito social, escolar ou esportivo. No período em que fui estudante no Ensino Fundamental não presenciei nas aulas de Educação Física a divisão de atividades para meninos e meninas. Ambos participavam dos mesmos processos, é claro com um tanto de conflito, porém as meninas de minha turma não se mostravam passivas e lutavam por seu espaço. Durante o Ensino Médio não participei das aulas de Educação Física pelo fato de trabalhar, então não posso fazer nenhum relato dessa época.

Quando já estava na universidade percebi em algumas aulas práticas, principalmente aquelas ligadas aos esportes, que algumas meninas (acadêmicas) se excluíam. O motivo não posso afirmar ao certo, mas ocorria geralmente, com elas, a não participação. Como bolsista de pesquisa observei alguns contextos diferentes. Nas aulas de Educação Física de algumas escolas pude perceber a divisão que não via enquanto estudante. Meninas de um lado, meninos de outro. Elas jogavam voleibol e eles futsal. As aulas eram praticamente assim quando havia sol; quando chovia eram na sala com jogos de mesa.

Em uma escola, em específico, essa divisão não ocorria. Meninos e meninas participavam de todas as atividades igualmente. Ninguém ficava de fora. A forma como o professor conduzia as aulas, conteúdos delimitados e escolhidos desde o início e aulas com continuidade, em minha opinião foram determinantes para essa participação e também pelo comportamento entre meninos e meninas, sem grandes conflitos.

Deste modo, refletir acerca da participação das meninas nas aulas de Educação Física e do incentivo delas às práticas corporais e/ou esportes também fora da escola é algo importante, principalmente para a compreensão de que ambos os sexos têm direito à prática e para que as diferenças atribuídas social e culturalmente sejam minimizadas, tendo início na escola e nas aulas de Educação Física.

Diante de algumas leituras e por meio de minhas experiências, surgiram alguns questionamentos: Por que as práticas corporais/esportivas foram e ainda são

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separadas por sexo? Por que, ainda hoje, após toda a luta das mulheres por seus direitos trabalhistas, sociais e esportistas, é difícil a inserção e permanência delas no esporte e/ou práticas corporais, ambientes ditos masculinos? Quais os desafios enfrentados pelas mulheres que se tornaram ativas para superar os preconceitos?

Acredito ser a sociedade e as diversas “culturas” existentes determinantes e influentes no processo das diferenças. Processo que se inicia em casa, baseado em concepções preconceituosas e discriminatórias impostas pela mídia e pela sociedade em que se está inserido(a). Dentro deste contexto, a escola e as aulas de Educação Física podem negar, reforçar ou problematizar tudo o que é atribuído aos gêneros, como: formas de vestir, gostos, interesses, entre outros.

O processo de educação de meninos e meninas inicia-se em casa e muitas vezes quando o bebê ainda está na barriga de sua mãe. Opções de uma ou de outra coisa, do dito certo ou errado, não nasce conosco, porém nos é ensinado e, na maioria das vezes, imposto. De forma cultural e histórica, valores, ideais, costumes nos são passados e esses perpetuados.

O preconceito ainda é muito grande com a menina que joga futebol e o menino que usa cor-de-rosa. A ela chamam de “machona” e a ele de “gay”. Deste modo, os dois sentem-se feridos por uma sociedade preconceituosa e preocupada em formar padrões ideais de pessoas. Aqueles e aquelas que fogem aos padrões são considerados “anormais”, pois lhe é negado o direito de usar a roupa que mais gosta, de fazer o que aprecia e de ser o que é.

Ao serem percebidas diferenças no incentivo de meninos e meninas, na prática de atividades nas aulas de Educação Física muito se perde, uma vez que privar as crianças de determinadas vivências, por não serem consideradas adequadas, limita as possibilidades de meninos e meninas tornando-os(as) hábeis apenas em algumas modalidades. Trabalharmos, ou ao menos compreendermos as relações de gênero dentro da escola e das aulas de Educação Física, permite-nos pensar em alternativas para um trabalho que considere sim as diferenças, mas que essas não sejam determinantes do trabalho do(a) professor(a) de Educação Física.

Um trabalho pautado em movimentos de coeducação, o qual se baseia em oportunidades iguais para ambos os gêneros, não propõe a acabar com as diferenças, mas, sim, a diminuir a distância que existe entre meninos e meninas e oportunizar a ambos experiências que suscitem um novo pensamento sobre o assunto.

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Insisto em dizer que este processo se inicia na escola pela importância que a Educação Física tem como componente responsável por possibilitar ambientes de aprendizagens em que meninos e meninas tenham as mesmas possibilidades de fazer escolhas sobre um estilo de vida saudável, de modo crítico e autônomo; estilo este que pode ser levado para além da escola.

A minha preocupação, no entanto, em focar a pesquisa nas mulheres, refere-se ao fato de que elas até hoje ainda recebem tratamento diferenciado e são postas em posições inferiores aos homens em relação às possibilidades oferecidas em determinadas práticas, como o futebol por exemplo. Dentro do âmbito esportivo as mulheres sofreram e ainda sofrem muitos preconceitos. Um culto à beleza sempre esteve muito presente, por isso muitas práticas foram proibidas para que elas não tivessem seus corpos masculinizados e mantivessem sua feminilidade e graciosidade. Baseadas na Biologia, proibições foram feitas para que a saúde da mulher, bem como o corpo de uma futura mãe, não fosse prejudicada.

Atualmente as mulheres não são somente esposas, mães ou donas de casa, delimitando um contexto diferenciado. Mesmo diante de uma jornada de trabalho diária, dos afazeres domésticos, cuidado com os filhos, rotinas de estudo, muitas mulheres ainda encontram um tempo para cuidar de si. Cada uma apresentando um motivo para manter um estilo de vida ativo que pode ser: pela estética, pela saúde, pelo convívio social, pelo lazer, pela competição.

Como foi exposto no início desta seção, mencionando as aulas de Educação Física e os incentivos a meninos e meninas, defini alguns objetivos para a pesquisa.

Objetivo principal: perceber em que medida as aulas de Educação Física escolar foram influentes para que atualmente mulheres tivessem um estilo de vida ativo.

De modo mais específico:

– Realizar uma breve revisão bibliográfica acerca do tema e principalmente da participação das mulheres em práticas corporais ao longo do tempo.

– Entender a Educação Física escolar na vida das mulheres participantes da pesquisa.

– Perceber como as mulheres pesquisadas tornaram-se ativas em diferentes espaços, como academia, corrida, futebol, voleibol, entre outros.

– Compreender os percalços enfrentados pelas mulheres na adesão e continuidade de suas práticas corporais.

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Para dar conta destas questões na investigação, estruturei o texto da seguinte forma: no Capítulo 1 apresento questões referentes ao estilo de vida ativo e os benefícios da prática regular de exercícios. No Capítulo 2 discorro sobre mulheres e esportes no Brasil, e nos seus subcapítulos escrevo sobre corpo, corpo da mulher atleta e uma descrição de gênero. No Capítulo 3 surgem os resultados da pesquisa baseados nas narrativas das entrevistas feitas com as mulheres participantes. Esta análise dos resultados centra-se nos eixos principais das entrevistas: aulas de Educação Física escolar, adesão às práticas corporais e/ou esportivas, e ser mulher ativa atualmente.

Problema

Qual os efeitos das aulas de Educação Física Escolar na vida de mulheres que atualmente tem um estilo de vida ativo?

Objetivos Objetivo geral:

Perceber em que medida as aulas de Educação Física Escolar foram influentes para que atualmente mulheres tenham um estilo de vida ativo.

Objetivos específicos

- Realizar uma breve revisão bibliográfica acerca do tema e principalmente da participação das mulheres em práticas corporais ao longo do tempo.

- Entender a Educação Física Escolar na vida das mulheres participantes da pesquisa.

- Compreender como as mulheres participantes da pesquisa se tornaram ativas em diferentes espaços como: academia, corrida, futebol, tênis.

- Compreender os percalços enfrentados pelas mulheres na adesão e continuidade de suas práticas corporais.

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1 REFERENCIAL TEÓRICO

Nesta parte são discutidas temáticas importantes em relação aos objetivos da pesquisa. Em seguida são abordadas questões referentes ao estilo de vida ativo, mulheres e esporte no Brasil e corpo da mulher atleta e, mais ao final, trata-se do assunto gênero.

1.1 Caracterizando o estilo de vida ativo

Segundo o dicionário, ativo quer dizer “que está em ação. Capaz de funcionar. Que tem disposição e energia para o trabalho. Engajado em alguma atividade; participante, atuante” (DICIONÁRIO, 2008, p. 175).

O que, no entanto, caracteriza uma pessoa que tem um estilo de vida ativo? Sobre este assunto tratará esta seção, no início discorrendo sobre o estilo de vida ativo no geral, porém buscando fazer referência, sempre que possível, às mulheres, que são o centro desta pesquisa.

É natural, ao homem, movimentar-se. Ao realizarmos nossas tarefas do dia a dia andamos, nos agachamos, levantamos, movemos braços e pernas, subimos e descemos escadas, enfim, são inúmeras as atividades durante um único dia.

A atividade física é o corpo em movimento, em ação. São os músculos esqueléticos do corpo (aqueles que podemos controlar voluntariamente) gastando energia, contraindo-se e relaxando, numa seqüência coordenada entre a ação do tecido muscular e os tendões e os ossos (SABA, 2003, p. 46).

Atividade Física é todo movimento corporal voluntário humano, que resulta num gasto energético acima dos níveis de repouso, caracterizado pela atividade do cotidiano e pelos exercícios físicos. Trata-se de comportamento inerente ao ser humano com características biológicas e sócio-culturais (CONSELHO FEDERAL DE EDUCAÇÃO FÍSICA apud SABA, 2003, p. 48).

Inclui, portanto, as atividades do trabalho, atividades da vida diária, o deslocamento e as atividades realizadas como alternativa de lazer, incluindo exercícios físicos, esportes, dança, artes marciais, jogos, etc (GUISELINI, 2004).

Nas últimas três décadas as pessoas começaram a reconhecer a importância de manter uma vida ativa e praticar atividade física regularmente. Isto porque são

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indiscutíveis os benefícios desta para a qualidade de vida, para a saúde, a prevenção e a reabilitação de problemas de saúde. Ainda são positivos os efeitos sobre o condicionamento, sistema cardiorrespiratório e composição corporal. Obesidade, diabetes, hipertensão, aterosclerose, dores lombares, alguns tipos de câncer, doença pulmonar crônica, osteoporose, acidente vascular cerebral e doença coronariana, são alguns dos problemas relacionados também à inatividade física e que são evitados prematuramente com a prática de atividade física regular.

Alguns fatores como hereditariedade e meio ambiente ─ fatores físicos (clima, altitude, poluição) e sociais (amigos, valores, local de trabalho) ─ influenciam a atividade física, o condicionamento e a saúde. Outro fator está relacionado aos interesses individuais, quando o indivíduo precisa experimentar diversas atividades e escolher uma que é de seu agrado e que se encaixe em sua rotina.

Vários problemas surgem ou podem surgir prematuramente com a inatividade física. Entre eles estão os cardiovasculares. Estes podem assumir várias formas: arteriosclerose, aterosclerose, trombose arterial coronariana, doença coronariana (DC), embolia, hipertensão, infarto do miocárdio (IM), acidente vascular cerebral (AVC), trombose, colesterol elevado. A hipertensão é a doença cardiovascular mais comum. Os fatores de risco de doenças coronarianas que não podem ser alterados são: hereditariedade, envelhecimento, sexo, raça.

Para Nahas (2001, p. 111), a atividade física regular reduz o risco de uma pessoa desenvolver várias doenças crônicas além de proporcionar os seguintes benefícios: reduzir o risco de morte prematura por todas as causas; diminuir o risco de morte por doenças cardíacas; abreviar o risco de desenvolver diabetes; reduzir o risco de desenvolver hipertensão; ajudar no controle da pressão arterial em pessoas hipertensas; diminuir a sensação de depressão e ansiedade; manter a autonomia e independência do idoso; contribuir no controle do peso corporal; auxiliar no desenvolvimento e manutenção de ossos, músculos e articulações saudáveis; ajudar indivíduos idosos a manter a força muscular e o equilíbrio, dando-lhes mobilidade e reduzindo quedas; promover o bem-estar psicológico e a autoestima.

As mulheres brigaram e conquistaram seu espaço também nos esportes.

Foi derrubada a crença de que as mulheres têm menor capacidade para modalidades que não sejam de expressão, como a dança e a ginástica rítmica, e abriu-se espaço, não sem resistência, para que

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participassem também, em áreas antes restritas aos homens (SABA, 2003, p. 181).

A prática de atividade física regular, além dos benefícios usuais, proporciona à mulher uma série de melhorias exclusivas (SABA, 2003). “A atividade física tem comprovado sua eficácia em diversos aspectos da saúde feminina, desde a redução de incômodos estéticos, como a celulite, até a prevenção de cânceres ginecológicos e depressão” (SABA, 2003, p. 282).

Deste modo, Saba (2001) destaca:

havendo um elo emocional forte entre uma pessoa e uma atividade a que se propõe, é estabelecido um círculo virtuoso de prática, satisfação e resultado, que garante a continuidade da atividade, de forma cada vez mais positiva, em uma crescente evolução rumo aos objetivos pretendidos (p. 61).

“Abraçar” uma atividade tornando-a permanente ou ao menos duradoura a torna prazerosa e produtiva (p. 61). Uma vida ativa depende de uma postura diante da vida, ou seja, realizar uma atividade física por menor que seja em cada momento livre. É se mexer, nas férias estar disposto a caminhar, correr, jogar voleibol, peteca, frescobol... Nos dias de trabalho ao final do expediente ir a academia, caminhar, praticar algum esporte, enfim, encontrar uma atividade que dê prazer e que faça bem ao corpo.

Cada vez mais o estilo de vida está sendo vinculado à melhoria das condições gerais das pessoas e do bem-estar. Estilo de vida, segundo Gonçalves e Vilarta (2004, p. 45-46), é “o conjunto de hábitos e comportamentos, aprendidos e adotados durante toda a vida, capazes de influenciar as condições de bem-estar e o nível de integração pessoal com o meio familiar, ambiental e social”.

Nahas (2001 apud GONÇALVES; VILARTA, 2004, p. 46) assim define estilo de vida:

como o conjunto de ações habituais que reflete as atitudes, os valores e as oportunidades na vida das pessoas, em que devem ser valorizados elementos concorrentes ao bem-estar pessoal, como controle do estresse, a nutrição equilibrada, a atividade física regular, os cuidados preventivos com a saúde e o cultivo de relacionamentos sociais.

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Podemos destacar alguns dos comportamentos considerados importantes para influenciar o estilo de vida das pessoas: hábitos alimentares saudáveis e várias refeições ao longo do dia; respeitar necessidades específicas para cada etapa da vida; praticar atividade física apropriada e com regularidade; controlar o estresse físico e emocional; estabelecer laços de convívio familiar e social; dedicar-se ao lazer que envolva algum esporte, hobbie ou trabalho voluntário (GONÇALVES; VILARTA, 2004).

O estilo de vida que levamos é o principal responsável por atingirmos idades mais avançadas, 70 a 80 anos ou mais, do modo mais saudável possível. Ele representa 50% dos fatores envolvidos nesse objetivo. Os outros 50% estão divididos entre meio ambiente (lugar onde vivemos e nossa adaptação a ele), hereditariedade (a carga presente em nossos genes, relativa à longevidade e outros acontecimento familiares) e condições de assistência médica (qualidade e freqüência de cuidados médicos) (GUISELINI, 2004, p. 67).

“Isso mostra que saúde e qualidade de vida dependem principalmente de gerenciamento dos hábitos do dia-a-dia” (GUISELINI, 2004, p. 67).

Estudos têm certa dificuldade em identificar a prevalência do sedentarismo no Brasil devido a os pesquisadores da área não estarem de acordo com os instrumentos utilizados, porém estima-se em 50%-60% de sedentários no país (PITANGA, 2004). O referido autor traz em seu livro um modelo de questionário e a classificação do nível de atividade física.

Sedentário: não realizou nenhuma atividade física por pelo menos 10 minutos contínuos durante a semana.

Insuficientemente ativo: realiza atividade física por pelo menos 10 minutos por semana, porém insuficiente para ser classificado como ativo. Pode ser dividido em dois grupos: A) Atinge pelo menos um dos critérios da recomendação: a) freqüência: 5 dias/semana OU b) duração: 150 min/semana; B) Não atingiu nenhum dos critérios de recomendação.

Ativo: cumpriu as recomendações: a) VIGOROSA: ≥ 3 dias/semana e ≥ 20 minutos por sessão; b) MODERADA OU CAMINHADA: ≥ 5 dias/semana e ≥ 30 minutos por sessão; c) Qualquer atividade somada: ≥ 5 dias/semana e ≥ 150 minutos/semana (CAMINHADA + MODERADA + VIGOROSA).

Muito ativo: cumpriu as recomendações: a) VIGOROSA: ≥ 5 dias/semana e ≥ 30 minutos por sessão OU b) VIGOROSA: ≥ 3 dias/semana e ≥ 20 minutos por sessão + MODERADA e/ou CAMINHADA: ≥ 5 dias/semana e ≥ 30 minutos por sessão (59-60).

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Lembrando que atividades físicas VIGOROSAS são aquelas que precisam de um grande esforço físico e que fazer respirar MUITO mais que o normal. Atividades físicas MODERADAS são aquelas que precisam de algum esforço físico e que fazem respirar UM POUCO mais forte que o normal (p. 58).

Algumas variáveis são consideradas determinantes para a prática de atividades físicas (PITANGA, 2004). São elas:

a) variáveis demográficas: idade, sexo, educação, e status sócio-econômico; b) variáveis cognitivo-comportamentais: identificação de barreiras para a prática de atividades físicas, intenção para exercícios, distúrbios no humor, percepção sobre atividade física e saúde e auto-eficiência; c) social: suporte da família, amigos e escola; e d) ambientais: aspectos climáticos e existência/facilidade de acesso aos locais apropriados para a prática de atividades físicas (DISHMAN 1994 apud PITANGA, 2004, p. 64).

Este mesmo autor citado por Pitanga fala de estratégias para a adoção e a manutenção do estilo de vida fisicamente ativo. Estas estratégias envolvem políticas públicas que podem ter início na escola com atividades que estimulem os alunos a serem ativos também na fase adulta. Além disso, podem ser feitas intervenções com grupos especiais, tais como: idosos, mulheres, que apresentam alguma doença, e deficientes, de forma que sejam planejadas atividades específicas. Ainda no combate ao sedentarismo, é necessário a criação de espaços adaptados para a prática de atividades físicas com acompanhamento de profissionais, principalmente de Educação Física (PITANGA, 2004).

Precisamos considerar que não há como operar mudanças bruscas no estilo de vida de uma pessoa. O ideal é que ela evolua de um estágio a outro de forma gradativa. O “modelo de estágios de mudança” trata um pouco disto; mudanças de comportamento que ocorrem aos poucos para que sejam mais efetivas e duradouras.

Roberts, Robergs e Hanson (1997 apud GOLÇALVES; VILARTA, 2004, p. 49-50) descrevem os quatro estágios de mudança, resumidos a seguir:

PRÉ-CONTEMPLAÇÃO: estágio caracterizado pela ausência da conscientização sobre a importância da mudança comportamental. O paciente/indivíduo também pode negar sua importância ou assumir a opinião de que a mudança gera custos que superam os benefícios.

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CONTEMPLAÇÃO: o indivíduo sente-se motivado e envolvido com a possibilidade da mudança comportamental, a partir de um conjunto de fatos e estímulos dados pelo ambiente, pela família e pela equipe de saúde.

AÇÃO: o paciente envolvido na prática regular de exercício ou atividade física tem maior chance de manter-se nesse estágio ao definir metas possíveis de ser atingidas a curto e longo prazo.

MANUTENÇÃO: para evitar o retorno aos antigos comportamentos não saudáveis, os profissionais de saúde devem adotar, durante o acompanhamento da prática da atividade física, ações preventivas diferenciadas. Não basta a presença do profissional com estímulo verbal, utilizando “palavras de ordem” ou congratulações pela meta atingida. O paciente deve sentir-se dono das próprias decisões relacionadas à saúde e à realização do programa de atividade física proposto. Este deve ser preparado para reconhecer e autogerenciar as mudanças conseguidas com a progressão do programa de atividade física, além de controlar pequenas situações do ambiente familiar e de trabalho, relacionado ao comportamento de risco.

Mais do que apenas uma decisão pessoal, a adoção de novos comportamentos depende da inserção da pessoa nos meios familiar, ambiental e social. Ampliando um pouco esta análise, há que se ponderar que não apenas o estilo de vida é determinante sobre a questão da Qualidade de Vida. Devemos considerar que

a vida social não é norteada pela consciente decisão comum dos membros de uma sociedade... e que a saúde não é plasmada por uma opção pessoal, fruto do estilo de vida, mas pelas condições materiais e simbólicas construídas historicamente (BRANT; MELO 2001 apud GOLÇALVES; VILARTA, 2004, p. 72).

É preciso compreender, no entanto, que um estilo de vida ativo é um importante passo na redução de doenças, e que começar não é o mais difícil, pois os incentivos à prática de exercícios estão em toda a parte. Quando não são os amigos que convidam, os meios de comunicação mostram a todo momento os riscos do sedentarismo, os exercícios “da moda” e os benefícios de algumas modalidades. A própria pessoa sente que não está com o condicionamento tão bom ao realizar uma simples caminhada. Incentivos não faltam e os objetivos são os mais variados, no entanto dar continuidade à prática é o mais complicado.

No caso das mulheres, público aqui investigado, são vários os fatores que levam à prática e também à desistência. Uma mulher que trabalha, estuda, cuida da casa, dos filhos e ainda tem tempo para si, é digna de admiração. São vários os

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motivos que podem levar uma pessoa a ter um estilo de vida ativo: saúde, lazer, competição, grupo social, estética. É isto que se pretende descobrir com esta pesquisa e este público mais específico, relatado mais adiante.

1.2 Mulheres e esportes no Brasil

A História de inserção e participação nos esportes se difere para homens e mulheres em outros países e também no Brasil. Nesta seção, como o próprio título já faz referência discutiremos sobre “mulheres e esportes no Brasil”. Para isto, recorremos à narrativa histórica para entender todo o processo de infiltração das mulheres em diferentes modalidades como atletas, bem como sua exposição na mídia ocupando cargos importantes dentro dos clubes esportivos.

O esporte, antes de tudo, possui uma História que envolve homens e mulheres, realizando ações, consolidando práticas, chegando ao que hoje vivenciamos (GOELLNER, 2004). “O esporte é uma prática regular que se desenvolve no cotidiano das cidades despertando interesse, mobilizando paixões, evocando sentimentos, criando representações de corpo e saúde, enfim convocando nossa imediata participação” (GOELLNER, 2004, p. 361). Recorrer à narrativa histórica para compreender a participação das mulheres no esporte, torna-se importante, para identificar as representações criadas culturalmente em relação a essa participação (GOELLNER, 2004).

Alguns estudos apontam para o esporte como: “um espaço de opressão feminina; questionamento da superioridade masculina; território que pode transformar as relações de gênero; e um espaço de lutas e contestações” (JAEGER, 2006, p. 200). O esporte é considerado uma construção histórica e social na qual diferentes sujeitos disputam posições (JAEGER, 2006) extremamente desiguais, tendo se configurado pelas relações de poder entre homens e mulheres no campo esportivo. Segundo Willis (1994 apud DEVIDE, 2005, p. 22), “o esporte é influenciado pela sociedade, assim como reflete e reforça valores da sociedade em que está inserido”.

Se o esporte, apesar de historicamente dominado pelo homem, for interpretado como uma via de conquistas femininas em relação à auto-estima, segurança, saúde, performance, autonomia, reconhecimento público e histórico, poderá produzir novas

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oportunidades e significados, combatendo os preconceitos, mitos e a opressão feminina nessa área (DEVIDE, 2005, p. 21).

A luta das mulheres pela igualdade social é algo que perdura por muito tempo. O direito ao voto, as questões profissionais, salariais, de saúde, violência e também esportivas, são temas até hoje debatidos. O esporte acabou sendo posto num plano inferior,

sem ser considerado um dos setores nos quais a mulher também poderia reafirmar sua autonomia – setor, aliás, que, por lidar diretamente com o corpo, e muitas vezes com o público, pode ser de vital importância na luta por essa independência efetiva das mulheres em nosso país (KNIJNIK, 2003, p. 87).

Por outro lado, a entrada da mulher brasileira no esporte aconteceu sem grandes confrontações, ela “tornou-se visível, no turfe, na natação, no tênis, e assim sucessivamente, sem representar perigo à hegemonia masculina” (MOURÃO, 2000, p. 7). Era necessário, porém, que um padrão fosse mantido, e é por isso que nas primeiras competições em que participaram as mulheres precisavam ter um visual “belo e feminino”, sem perder o seu charme, a sua graça e a sua feminilidade.

Knijnik (2003, p. 39), quando se refere ao Brasil, diz

que historicamente teve uma Educação Física muito vinculada à vida militar, a qual era inacessível às mulheres até pouco tempo atrás ─, a mulher também vem lutando arduamente para conquistar espaços no meio esportivo enfrentando inúmeras dificuldades. Preconceitos e estereótipos de toda ordem são argüidos e levantados para impedir ou limitar essa participação sob determinada visão de possibilidades, capacidades e deveres do corpo feminino, que irá realizar a prática de forma absolutamente coerente com as noções de fragilidade, de maternidade e de beleza superior das mulheres.

Este processo de infiltração da mulher no esporte foi muito lento, pois, quando se fala em corpo feminino, se “realça sempre grande quantidade de estigmas e de estereótipos há muito enraizados na „cultura esportiva nacional‟” (KNIJNIK, 2003, p. 55). Ainda se tinha a concepção de que a especialidade da mulher era ser bela, e tudo que fugisse disso deveria ser negado. Da mesma forma, tinha-se medo de se

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masculinizar os corpos das mulheres afastando-as dos ideais de beleza e maternidade.

Não houve, na história da emancipação esportiva da mulher brasileira, confrontos, lutas por espaço, e sim um processo lento de infiltração, que se consolida na prática e no exercício da interação, freqüentemente com apoio velado ou aberto dos homens mais esclarecidos da sociedade, mas com um controle normativo que insere a mulher nesta prática sem possibilitar-lhe uma emancipação para a prática de atividades físico-desportivas (MOURÃO, 2000, p. 8).

Durou por um bom tempo a restrição das mulheres no campo esportivo. Era diferente falar em “exercícios gímnicos” e esportes, e, mesmo quando as mulheres praticavam a ginástica, havia restrições, cuja preocupação era fortalecer a mulher enquanto mãe e dona de casa e não como atleta (ROSEMBERG, 1995). Pereira (1984 apud ROSEMBERG, 1995, p. 281) complementa: “no esporte, como um campo de predominância masculina com objetivos de vitória, rendimento e sucesso social é que as dificuldades aparecem”.

As representações sociais e práticas voltadas para a harmonia das formas feminis e para as exigências da maternidade futura da mulher brasileira foram incorporadas pelo Decreto-lei 3.199, de 1941, que vigorou até 1975, cujo artigo 54 dizia: "às mulheres não se permitirá a prática de desportos incompatíveis com as condições de sua natureza". Em 1965 o Conselho Nacional de Desportos estabeleceu regras para a participação feminina nos esportes e, através da Deliberação 7, estipulou: "Não é permitida a prática de lutas de qualquer natureza, futebol, futebol de salão, futebol de praia, pólo, halterofilismo e baseball" (MOURÃO, 2000, p. 12).

“Será nas primeiras décadas do século XX que acontecerá uma maior inserção das mulheres no campo do esporte, seja nas dimensões do lazer, da educação escolar ou da competição” (GOELLNER, 2004, p. 366). Foram recomendadas determinadas atividades físicas e outras foram restritas, porém se desejava um corpo feminino forte e saudável para gerar outros corpos saudáveis (GOELLNER, 2004).

Entre as atividades permitidas estavam ginástica, dança e natação, nas quais beleza e saúde se tornaram grandes incentivadoras das práticas esportivas

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femininas (GOELLNER, 2004). Estas representações eram bem-vistas, pois valorizavam a graciosidade e delicadeza feminina.

Como uma arte de caráter feminino, portanto, própria para as mulheres, a dança é recomendada porque proporciona a descontração dos movimentos, o relaxamento dos músculos, a flexibilidade do corpo, a explosão das emoções, a graça dos gestos, enfim, a experiência de diferentes sensações que traduzem liberdades corporais e expressivas contrárias à qualquer indício de rigidez (GOELLNER, 2000, p. 67).

Outra atividade que a Educação Física recomenda para a mulher é a ginástica. Não todo e qualquer método ginástico, mas aqueles que podem ser aproximados e que reafirmam o universo feminino, da beleza, do encanto, da harmonia das formas, da delicadeza e, por que não dizer, do recato. Afinal, para ser praticada, a exercitação ginástica não exige materiais nem vestes muito específicos. Pode ser feita individualmente, a qualquer momento, sem que os minutos a ela dedicados atrapalhem a execução de todas as tarefas que a mulher desempenha no recôndito do lar, favorecendo, inclusive, sua permanência neste espaço identificado como de seu domínio. Acrescenta-se a esses aspectos, o fato de que a ginástica, ao contrário de muitos esportes, é desprovida do caráter competitivo, observado, nesse tempo, como prejudicial à formação da personalidade feminina (GOELLNER, 2000, p. 68).

É durante a década do século 20 que ocorreram as primeiras aparições públicas das mulheres:

(...) a exibição de natação feita por ocasião dos festejos do centenário da Independência do Brasil, em 1922, no tanque natatório da Urca (...) por Violeta Coelho Neto (...). Ainda no Rio de Janeiro, em março de 1925, duas intrépidas senhoritas, Anésia Coelho e Alice Passalo, fizeram a travessia da Guanabara, uma distância aproximada de cinco km (...). em São Paulo, coube a um pequeno grupo de moças da colônia alemã romper as maiores barreiras antepostas à mulher no desporto pelos costumes e preconceitos locais, ao se apresentar em público para nadar, ainda que envoltas com prodigiosos costumes de banho, abundantes em dobras e babados (LENK, 1982 apud ROSEMBERG, 1995, p. 281).

“Em 1932, a paulista Maria Lenk, com 17 anos, é a primeira mulher brasileira a participar de Jogos Olímpicos (os de Los Angeles)” (ROSEMBERG, 1995, p. 281). “Maria Lenk foi pioneira e, com sua determinação, influenciou as moças no cenário

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nacional, contribuindo para a transformação das representações que restringiam à mulher a prática esportiva” (MOURÃO, 2000, p. 13).

Yara Vaz é um símbolo de conquista no cotidiano carioca e brasileiro, primeiro como representante pessoal, depois como representante profissional, atingindo desde a sua escola de ginástica até a mídia nacional (MOURÃO, 2000). “Aída dos Santos é outra atleta símbolo da mulher brasileira se emancipando na e através da prática do esporte, quando diz que: „se eu tenho essa vida que eu tenho, eu agradeço ao esporte‟”(MOURÃO, 2000, p. 13).

“Essas mulheres-ícones contribuíram para que as representações restritivas, estereotipadas, preconceituosas, ou mesmo discriminatórias, acerca da prática esportiva feminina, fossem sendo alteradas” (MOURÃO, 2000, p. 14).

O movimento de eugenia da raça, dos anos 30, incrementou a participação das mulheres no esporte de forma mais explícita, pois vários já eram os espaços esportivos femininos em diferentes modalidades pelas cidades do Brasil. O exercício era um dos instrumentos utilizados para a formação de uma mulher mais forte, para a função da reprodução de uma sociedade eugênica. Neste momento um contingente maior, mas ainda muito tímido, de mulheres participava de práticas esportivas e ginástica, em clubes e academias; alguns campeonatos femininos se realizaram nesta década e representam um marco para a inserção e crescente participação da mulher nas atividades físico-desportivas (MOURÃO, 2000, p. 15).

[...] a presença da mulher no mundo do esporte representa, ao mesmo tempo, ameaça e complementaridade: ameaça porque chama para si a atenção de homens e mulheres, dentro de um universo construído e dominado por valores masculinos e porque põe em perigo algumas características tidas como constitutivas da sua feminilidade. Complementaridade porque parceira do homem em atitudes e hábitos sociais, cujo exercício simboliza um modo moderno e civilizado de ser (GOELLNER, 2005, p. 89).

No esporte essa prática se repete. A mulher foi considerada como usurpadora ou profanadora de um espaço consagrado ao usufruto masculino. Fosse como atividade de lazer, fosse como prática sistemática com finalidades bélicas o esporte unificou, desde então, o conjunto de adjetivos que representam o mundo masculino: força, determinação, resistência e busca de limites (RUBIO; SIMÕES, 1999, p. 50).

“A ampliação da participação feminina no esporte possibilitou a emergência de algumas competições de grande porte destinadas exclusivamente às mulheres”

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(GOELLNER, 2005, p. 93). Em 1935, por exemplo, surgiram os Jogos Femininos do Estado de São Paulo, que reuniram mulheres em atividades poliesportivas (TAVARES; PORTELA, 1998 apud GOELLNER, 2005, p. 93). De iniciativa do Jornal Sports e tendo como idealizador Mário Filho, criaram-se "Os Jogos da Primavera", também conhecidos como as Olimpíadas Femininas.

A participação da mulher carioca nos "Jogos da Primavera" foi o termômetro da esportivização feminina no Rio de Janeiro, onde a partir de 1949 e durante 23 anos, eles ocorreram a cada mês de setembro, representando para a mulher muito mais do que momentos de congraçamento e rara beleza, uma vez que, nos anos 50, a ginástica e os cuidados com o corpo faziam parte dos preceitos das revistas femininas e se intensificavam nas práticas (MOURÃO, 2000, p. 14).

“Em Porto Alegre, Túlio de Rose criou, em 1954, os Jogos Abertos Femininos que aconteceram até meados da década de 1960” (FOLHA ESPORTIVA, 1957 apud GOELLNER, 2005, p. 93). Muitas das mulheres que participaram destes eventos se tornaram atletas de equipes nacionais e estaduais.

Já no final dos anos 50 e no início dos 60, o Brasil viu despontar outra expressão feminina no esporte nacional, logo transformada em ícone: a tenista Maria Esther Bueno, que conquistou espaço no cenário esportivo internacional ao vencer o Campeonato de Wimbledon nos anos 1959, 1960 e 1965, na categoria individual, e em 1958, 1960, 1963, 1965 e 1966, na categoria de duplas (GOELLNER, 2005, p. 94).

Outro fato indicador da luta das mulheres no âmbito esportivo provém da diferença entre as datas das competições esportivas masculinas e femininas em campeonatos brasileiros (PEREIRA 1984, apud ROSEMBERG, 1995).

Alguns exemplos: natação masculina, 1898 – feminina, 1935; atletismo e basquetebol masculinos, 1925 – femininos, 1940; tênis masculino 1923 – feminino, 1947. Apenas as modalidade voleibol, tênis de mesa e atletismo não apresentam tanta diferença (1995, p. 281).

A partir da segunda metade do século XX, modalidades como vôlei, basquete, natação, tênis e atletismo tornam-se cada vez mais praticadas, possibilitando que a participação das mulheres nas competições nacionais e internacionais tivesse, também, um significativo avanço (GOELLNER, 2004, p. 369).

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Deste modo, a participação das mulheres nos esportes foi crescendo, e nos anos de 1980 e 1990 começaram a praticar judô, pólo aquático, handebol e futebol (GOELLNER, 2004); esportes estes anteriormente proibidos por serem violentos.

Precisamos considerar o esporte como um elemento que garante visibilidade às mulheres em espaço público (GOELLNER, 2004); isto porque não foram poucos os esforços individuais e coletivos para a participação delas no âmbito esportivo, realidade que perpetua nos dias atuais. Muito já foi feito, porém há ainda muito que se fazer para que as mulheres sejam incentivadas e valorizadas nesse fenômeno de grande importância cultural.

As mídias, importantes veículos de comunicação, têm tratado com desigualdade as mulheres, priorizando a imagem masculina.

Quando veicula reportagens sobre a prática esportiva feminina elabora as suas matérias, geralmente,comparando as performances das mulheres em relação às dos homens na mesma modalidade. Ou então, apresenta comentários preconceituosos e imagens de mulheres onde os aspectos relacionados às formas corporais, beleza, sensualidade e sexualidade da atleta são explorados, colocando em segundo plano as experiências e conquistas femininas no esporte (JAEGER, 2006, p. 204).

Além de dar maior preferência à imagem masculina, a mídia produz notícias ou produtos para que os homens consumam, como nas propagandas de cerveja, em que o apelo é tanto pelo futebol quanto por mulheres “gostosonas”. Novamente se vê aqui o interesse pelo físico, por corpos belos, desconsiderando os atributos das mulheres como atletas, técnicas, árbitras, jornalistas ou simples expectadoras do espetáculo esportivo. “O fato é que a ditadura da beleza caminha lado a lado com as desportistas como um valor social associado a performance máxima” (SIMÕES, 2004, p. 32).

As mídias, no entanto, “não criam diretamente as representações sociais. Estas já existem na sociedade; são frutos dos processos interativos e comunicacionais dos grupos sociais” (KNIJNIK; SOUZA, 2004, p. 195). O mass media ajuda a “acelerar ou afrouxar, talvez dirigir o fluxo das representações sociais num sentido ou noutro” (MOSCOVICI, 2003 apud KNIJNIK; SOUZA, 2004, p. 195).

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[...] ressalta a existência de dois tipos de identidade feminina, como se fossem únicos: ou aquela ligada ao ser maternal e familiar, mesmo sendo atleta – isto é, uma concepção ainda remanescente de uma época vitoriana ─; ou uma concepção de corpo (e conseqüentemente de identidade) voltado para a sedução, para o prazer e para a sexualização. Enquanto o corpo masculino é poderoso, heróico, bravo e corajoso, capaz de realizar proezas mesmo machucado, aquele é feito tão-somente para o desfrute sexual (KNIJNIK; SOUZA, 2004, p. 209-210).

A presença das mulheres na mídia esportiva como jornalistas, repórteres ou apresentadoras é grande hoje no Brasil. Isto não garante, no entanto, maior visibilidade ao esporte feminino, pois há um domínio masculino no comércio do esporte e um amplo interesse público no esporte masculino. Deste modo, “o espaço esportivo continua sendo concebido como típico do homem, que domina a cena esportiva em termos de cargos, honrarias, prestígio na mídia, patrocínio e retorno financeiro” (MOURÃO, 2000, p. 5).

Atualmente a participação das mulheres nos esportes ainda é menor que a dos homens. “[...] A entrada da mulher na arena esportiva vem sendo mais lenta, a segregação foi e se mantém contínua” (KNIJNIK, 2004, p. 66). Identifica-se essa diferença nos Jogos Olímpicos, nos clubes esportivos, nas atividades escolares, nas áreas de lazer, em estádios, ginásios, e também nos meios de comunicação (GOELLNER, 2004). A prática das mulheres em determinadas modalidades ainda está cercada de estereótipos, que levam a pensamentos preconceituosos de homossexualidade e aos perigos para a maternidade.

A infiltração da mulher no esporte foi e ainda é um processo lento e progressivo, de forma que não houve movimento feminino. Não ocorreu contestação por parte das mulheres, ficando essas escondidas ou assumindo valores hegemônicos masculinizados para que pudessem ser aceitas (KNIJNIK; SOUZA, 2004). Desta forma, ficam:

De um lado, o retrato de um corpo sensual, tipicamente feminino, pronto para a sedução, um corpo nascido para o sexo. De outro, corpos de mulheres que, por não se adequarem nem estarem em conformidade com esses padrões femininos estabelecidos, são estigmatizados e colocados sob suspeita: as mulheres que derrubam as normas de gênero no esporte ao desenvolverem e mostrarem um corpo atlético e musculoso são vistas como mulheres não apropriadas (SPEER, 2001 apud KNIJNIK; SOUZA, 2004, p. 200).

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“Outro campo de atuação ainda muito restrito para as mulheres quando comparadas aos homens é a atuação delas como técnicas esportivas” (GOELLNER, 2005, p. 95) e também como árbitras.

É inexpressiva, também,

a participação da mulher nos setores de organização e de direção do esporte, como por exemplo, nas federações e confederações esportivas e no Comitê Olímpico Brasileiro, cujos cargos permanecem sob o domínio dos homens mesmo após a indicação do Comitê Olímpico Internacional, em 2000, de que os Comitês Nacionais procurassem promover estratégias de inserção da mulher nos cargos de comando, de forma a se aproximar do percentual de 10% (PFISTER, 2003 apud GOELLNER, 2005, p. 96).

O esporte, bem como outras práticas, vem se transformando. Tem acontecido rupturas em hegemonias e se ampliado o universo das práticas corporais femininas e masculinas. É claro que este processo não ocorre sem conflitos; mais as mulheres que os homens ousam romper as fronteiras e têm, muitas vezes, sua identidade e sexualidade questionadas (DEVIDE, 2005).

Assim, se o esporte se traduz como um importante elemento para a promoção de uma maior visibilidade das mulheres no espaço público e se, ao longo da história do esporte nacional, houve a projeção de vários talentos esportivos femininos, vale registrar que essas conquistas resultam muito mais do esforço individual e de pequenos grupos de mulheres (e também de homens) do que de uma efetiva política nacional de inclusão das mulheres no âmbito do esporte e das atividades de lazer. Enfim, ainda que há muito tempo muitas delas protagonizam histórias no mundo do esporte, em se tratando de Brasil há, sim, um mundo a se fazer (GOELLNER, 2005, p. 97).

tem-se aqui a clareza que o esporte é um bem cultural e, como tal, um direito humano inalienável, e que deve sempre ser um instrumento tanto para a autoexpressão do ser humano quanto para a ampliação da tolerância e da convivência entre os indivíduos, quaisquer que sejam as diferenças que estes possam apresentar entre si (KNIJNIK, 2004, p. 64).

Não podemos ser tão otimistas a ponto de dizer que o preconceito e a discriminação em relação às mulheres acabaram. Elas lutaram e ainda lutam por

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espaço no “universo” dos esportes, assim como na sociedade em geral; buscam reconhecimento por aquilo que fazem e querem ser valorizadas, mostrando sua capacidade além de apenas um “corpo belo”.

Ainda que a presença da mulher nas arenas esportivas tenha servido como referência de liberdade, igualdade e apropriação de seus próprios corpos para outras mulheres, não se pode concluir que esse movimento no esporte tenha contribuído de maneira revolucionária na derrubada de estereótipos de feminilidade. Enquanto instituição social representativa que é, onde significados sobre gênero são constantemente reproduzidos e contestados, o esporte de alto rendimento continua a contribuir para com a legitimação ideológica de heterossexualidade como um princípio organizador do esporte feminino (RUBIO; SIMÕES, 1999, p. 55).

Devemos considerar que homens e mulheres são seres com diferenças (grandes ou pequenas, físicas ou culturais), porém precisam ter a mesma igualdade de direitos, sem discriminações e preconceitos, principalmente aqueles baseados em concepções biológicas centradas no corpo, prejudicando em demasiado as mulheres.

1.2.1 O corpo da mulher atleta

Não há como falar de esporte ou de qualquer outra prática corporal sem se remeter ao corpo, pois o ser humano é baseado no movimento corporal. Homens e mulheres possuem concepções e se apropriam de formas diferentes deste corpo. Assim, nesta seção discorre-se primeiramente, de uma forma mais geral sobre corpo, e depois, de modo mais específico e como o próprio título já faz referência, sobre o corpo da mulher atleta.

Por diversas vezes nos questionamos sobre o corpo e o que é o corpo.

Aquele cantado em versos ou aquele da ciência; aquele que a mão acaricia ou aquele da estética; aquele da juventude ou aquele da velhice; aquele da mídia e do mercado de consumo ou aquele descrito como natural; aquele do homem ou aquele da mulher; aquele da religião ou aquele da lei; aquele da arte ou aquele da medicina; aquele da cirurgia plástica ou aquele da academia (ANDRADE, 2003, p. 119-120).

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Há diversas representações de corpo “que passam pela medicina, pela biologia, pela poesia, pela cultura, pela arte, pela mídia, pelo econômico ou pelo social” (ANDRADE, 2003, p. 120). Há corpos vistos como hegemônicos e existem aqueles que insistem em fugir às regras, e, por vezes são ditos “anormais”. Corpo é tudo aquilo que somos e também o que nos escapa (ANDRADE, 2003); corpo é algo construído histórica e culturalmente (JAEGER, 2006).

Instâncias como “a mídia, a publicidade, a indústria (cosmetologia, da moda, do fitness,...) tornaram o corpo um artefato do mercado econômico/social/cultural” (ANDRADE, 2003, p. 121). Este corpo está sendo sempre “re/descoberto e re/inventado, e todas as marcas que se inscrevem ou se constroem em torno dele são sempre provisórias, característica de cada época, cultura ou grupo social” (ANDRADE, 2003, p. 124). O corpo precisa ser visto além do orgânico, uma vez que é um elemento significativo na cultura.

O corpo está ainda vinculado a relações de poder. “Tais relações estão de forma intrínseca, relacionadas com a produção de determinados saberes – sobre o corpo, sobre a sexualidade, sobre o que é ser homem ou mulher em determinado lugar ou tempo histórico” (ANDRADE, 2003, p. 122). As relações de poder atuam sobre os corpos produzindo identidades sociais e culturais particulares (ANDRADE, 2003). “[...] corpo está sempre mergulhado em campo político onde as relações de poder têm alcance imediato sobre ele, elas o investem, o marcam, o dirigem, o suplicam, sujeitam-no a trabalhos, obrigam-no a cerimônias, exigem-lhe sinais” (GOELLNER; FIGUEIRA, 2004, p. 16).

O corpo é o local no qual as identidades e as características do indivíduo adquirem visibilidade. Neto (2002) destaca que os corpos são as superfícies nas quais se inscrevem as marcas que determinam o que somos, que nos identificam e nos posicionam nos diversos grupos sociais, tais como ser/não ser branco/a, ter/não ter “deficiências” físicas, gordo/magro, usar/não usar piercings, consumir/não consumir determinados bens, serviços e produtos, partilhar/não partilhar de determinadas tradições e costumes, entre outras. Os significados deixados por essas marcas não são fixos e mantêm inter-relações constantes, adquirindo visibilidade nos corpos (NETO, 2002).

Ao olhar para um corpo supõe-se poder “ler” as identidades dos sujeitos a partir dos símbolos e marcas que ostentam (NETO, 2002). Segundo Knijnik e

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Simões (1998 apud KNIJNIK, 2003, p. 32), “falar do corpo e resgatá-lo é referir-se a corporeidade como forma real de inserção do ser humano no mundo, algo como „eu sou meu corpo‟”. E ainda, “o ser humano tem um corpo, mas acima de tudo ele é um corpo”, (p. 69) de forma a “ocupar seu próprio espaço o corpo manifesta-se para alguém, manifestando, assim, sua existência” (p. 32).

Coca (1993 apud KNIJNIK 2003, p. 31) traz a ideia de que “o ser humano esportivo é essencialmente baseado no movimento corporal. A origem de todas as ações esportivas está lá, no corpo, entendido não como objetivo, mas sim como veículo de ser e de estar no mundo”. E ainda, “o corpo não existe sozinho. O que existe é um „eu – corpóreo – socializado‟, com vida, que possui mensagens, história para revelar e para ser descoberto pelos outros” (p. 31).

“O corpo feminino se constrói de maneira diferente do corpo masculino, essa construção se dá reproduzindo valores e padrões adquiridos na convivência social” (RUBIO; SIMÕES, 1999, p. 53). Estes padrões, no entanto, variam de sociedade para sociedade, em um mesmo período histórico, ou em um mesmo grupo social ao longo de um período de tempo (RUBIO; SIMÕES, 1999).

Situamos o corpo feminino como um “constructo que é histórico, social e cultural, produzido de múltiplas formas em tempo e lugares diferentes” (ANDRADE, 2003, p. 120). Algumas representações ao longo do tempo permanecem as mesmas, outras sofrem mudanças por influência dos padrões estéticos da época vigentes. Esta ideia se complementa nas palavras de Goellner e Figueira (2004): “não há uma identidade feminina fixa. Ela é criada e representada de diferentes formas, em diferentes grupos sociais, religiões, etnias, etc.” (p. 15).

[...] o corpo feminino traz as marcas da representatividade do seu papel numa sociedade em constante mudança, onde os valores são atribuídos em maior ou menor “proporção”, à medida que representam corpos socialmente úteis. Por conseqüência, estas marcas, repercutem-se no ser e no agir da mulher (ANTUNES; BATALHA, 2004, p. 200).

“Hoje, mesmo sendo detentora de uma autonomia econômica e emocional, a mulher ainda manifesta comportamentos e conceitos arraigados do imaginário social” (NADER, 1997 apud ANTUNES; BATALHA, 2004, p. 200).

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O corpo social é considerado subjetivo. Ele também “é afetado pela religião, pela profissão, pela classe social e outros intervenientes sociais e culturais” (BRUHNS, 1986, p. 43).

“É a sociedade que ensina o corpo a comportar-se, a soltar-se, a reprimir-se, pois é nele que estão registradas as diferenças existentes, reconhecidas e/ou estabelecidas, como o sexo, idade, hierarquia social, profissão. O corpo é a expressão do que a sociedade e a sua cultura transmite” (ANTUNES; BATALHA, 2004, p. 201).

Deste modo, o corpo de cada indivíduo revela a sua singularidade, bem como as características de seu grupo.

E ainda, para Merleau-Ponty (1994 apud ANTUNES; BATALHA, 2004, p. 201), “o corpo é o lugar onde a transcendência do sujeito se articula com o mundo, a partir do momento em que temos consciência do mundo através do nosso corpo e vice-versa, impregnando-o com a nossa integridade e interioridade”.

O corpo da mulher atleta ainda é repleto de contradições. Ao mesmo tempo que as práticas esportivas exigem características como força, potência, velocidade, a mulher, para ser reconhecida, não pode fugir de uma determinada feminilidade. A maioria das atletas não é reconhecida pelos seus atributos atléticos e sim pelos atributos físicos. “A mulher foi, e talvez ainda o seja, de alguma maneira regulada pelas concepções sociais do que o seu corpo deve ser; mais do que a mulher ser humano, o corpo dela, em total separação do seu interior, deve ser algo que contemple funções preestabelecidas” (KNIJNIK, 2003, p. 65).

Esta ideia se completa nas palavras de Kolnes (1995, apud KNIJNIK 2003, p. 30):

Enquanto os homens atletas são descritos em termos de suas façanhas, de competitividade, de sua força física e psicológica, de sua bravura por jogar mesmo estando seriamente machucados, as mulheres atletas são descritas em termos de sua aparência física, feminilidade, comportamento não-competitivo e relacionamentos.

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“o mito do belo” no esporte feminino atual traduz-se no “discurso da beleza do corpo feminino”, e que este discurso molda as vidas e os corpos das atletas – inclusive sua própria imagem corporal. Trata-se de [...] um discurso pronto para construir um corpo feminino num tamanho específico, com gestos e movimentos restritos, diferentes e sedutores.

Deste modo, as mulheres atletas por muitas vezes acabam reproduzindo estes estereótipos e padrões, a fim de serem aceitas nas práticas corporais e esportivas que decidiram realizar. “A mulher atleta, assim, é separada do seu corpo; o que ela busca (desempenho, resultados, performance) é obtido por meio do corpo, o qual, no entanto, deve parecer o que não é: „feminino‟ na sua significação renascentista (de novo ela) de „belo‟, „frágil‟, „puro‟” (KNIJNIK, 2003, p. 67).

Percebe-se mais claramente questões anteriormente destacadas nos esportes de rendimento, os quais têm maior visibilidade e reproduzem:

um padrão estético e comportamental que é reforçado também em muitos espaços do cotidiano e disseminado pela mídia – sobre “o que é uma mulher “ – um corpo com determinadas proporções e dimensões, uma mulher desejável e invejável nos termos de uma feminilidade determinado pelo olhar masculino e heterossexista e que se mantém como discursivo hegemônico, agindo sobre as meninas e as mulheres, moldando identidades e subjetividades aos seus desígnios (ADELMAN, 2006, p. 25).

Assim, os discursos hegemônicos fazem com que o corpo, esteticamente padronizado, esteja num elevado lugar na lista de prioridades para a construção de identidades e subjetividades (ADELMAN, 2006). E ainda “o esporte pode ser – é, muitas vezes ─ mais um espaço para a „construção de corpos femininos sexualizados e corpos masculinos poderosos‟”(LORBER, 1994 apud ADELMAN, 2006, p. 25).

É necessário, no entanto, que a mulher escape deste “discurso da beleza” e reforce seu autoconceito e imagem corporal, os quais poderão refletir também na performance da atleta (GUTHRIE; CASTELNUEVO apud KNIJNIK, 2003), e que a libertação dos corpos femininos de tabus e de códigos repressivos possa permitir a construção de caminhos à realização e à igualdade, para além da cultura comercial e machista, ainda hegemônica, que ameaça absorvê-la (ADELMAN, 2006).

Referências

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