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GT DIREITO ADMINISTRATIVO, DIREITOS FUNDAMENTAIS E POLÍTICAS PÚBLICAS. Modalidade da apresentação: Comunicação Oral

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GT – DIREITO ADMINISTRATIVO, DIREITOS FUNDAMENTAIS E POLÍTICAS PÚBLICAS

Modalidade da apresentação: Comunicação Oral

Direito à Saúde e Medicamentos: Uma análise Hermenêutica das posições do Supremo Tribunal Federal em decisões “Líderes de Torcida”

RESUMO

O presente trabalho analisa as relações existentes entre a o Direito à Saúde e a participação do Poder Judiciário na concretização desse direito. A partir da descrição dos conceitos do Direito à Saúde enquanto Direito Fundamental Social analisaremos os votos dos Ministros da Corte Suprema na questão do fornecimento de medicamentos de alto custo e não regulamentados pela Agência Nacional de Vigilância Sanitária – Anvisa. Com um enfoque voltado para a hermenêutica jurídica, nos dedicamos a análise do uso da retórica nas decisões, o que acaba por gerar decisões “líderes de torcida”, sem fundamentação, mas que, agradam aqueles que a recebem. Utilizando pesquisa bibliográfica, análise de jurisprudência e da legislação, constatamos que o Poder Judiciário desenvolve atividade relevante na garantia de direitos, mesmo que não ocorra diálogo entre os pares que compõem um mesmo tribunal, durante a decisão acerca de um caso concreto.

Palavras-chave: Direitos à Saúde. Medicamentos. Hermenêutica.

1. INTRODUÇÃO

Os votos dos Ministros do Supremo Tribunal Federal no caso dos “medicamentos de alto custo” merece análise em razão do alcance não apenas social, mas também jurídico da decisão que vier a ser adotada. É importante verificar como o Poder Judiciário atua na concretização de direitos e como a Hermenêutica Jurídica desempenha papel fundamental neste processo, em especial com o uso da Retórica Jurídica.

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Iniciando, pelo Direito à Saúde, enquanto um Direito Fundamental comumente dito social, o mesmo se mostra inerente à condição humana, encontra previsão no texto Constitucional, propaga-se por todos, e necessita ser exercido para proporcionar a dignidade da pessoa humana, verdadeiro atributo a ser preservado nos direitos fundamentais.

Mas não se tem mostrado tarefa fácil o exercício do Direito à Saúde. Entraves de todas as formas se apresentam: custos surgem, restrições são impostas. O papel do Estado do particular passa a ser buscar a melhor forma de eliminar as barreiras existentes.

Nesta perspectiva, verificamos que o exercício de tal direito, tem-se dado de forma muito frequente com o recurso ao Poder Judiciário. Isso em verdade representa o que se pode designar como a concretização do direito ao desenvolvimento, na forma da promoção do amplo e não discriminatório acesso a políticas públicas.

Demonstrado a necessidade de acesso a medicamentos de alto custo, cidadãos ingressam na Justiça em busca do estabelecimento de um mínimo vital para que possamos ter a tão sonhada dignidade. Esse debate ora pode ser sintetizado na votação em curso no Plenário do Supremo Tribunal Federal, no julgamento dos Recursos Extraordinários 566471 e 657718.

Assim, após verificadas as principais disposições dos votos apresentados, é feito o estudo dos principais aspectos da Hermenêutica Jurídica demonstrando que o uso da retórica se mostra muito frequente na composição de votos na Suprema Corte brasileira.

Analisamos o padrão dos votos, verificando que não podemos dizer que existe um padrão entre eles, decidindo cada Ministro da forma que lhe é pertinente, sem a preocupação do estabelecimento de uma tese a ser defendida pelo Tribunal.

Assim, o presente trabalho se propõe a análise do tema em questão, que se mostra relevante e atual, já que o Direito à Saúde de forma concreta, se apresenta como um dos maiores anseios dos brasileiros.

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Utilizando pesquisa, análise de jurisprudência e levantamento bibliográfico, buscamos fornecer conclusões e instrumental teórico para os estudiosos do assunto. O tema proposto não será esgotado em todas as suas dimensões, mas buscaremos explorá-lo da melhor forma possível esclarecendo e apontando o que se mostrar relevante.

1. A SAÚDE ENQUANTO DIREITO FUNDAMENTAL SOCIAL

Direitos consagrados constitucionalmente que visam a garantir de forma substancial a liberdade e dignidade humana, que são imutáveis1, ou impõe elevado grau de dificuldade para que se possa promover a sua modificação, assim, pode-se definir Direitos Fundamentais no plano interno do Direito Brasileiro.

Com uma definição válida somente para o Direito pátrio, tendo em vista que tais direitos variam de acordo com a ideologia e princípios de cada Estado, e se qualificam como Direitos Humanos no plano internacional, quando visam a regular a liberdade e a igualdade, percebe-se a natureza e alcance dessas normas que foram alçadas de valores morais a positivados em várias esferas de alcance.

Segundo Canotilho2, os Direitos Humanos, e por consequência os Direitos Fundamentais, são frutos de um longo processo de lutas e da evolução humana. Já os Direitos Sociais, guardam estreitas relações com os Direitos Fundamentais e Dignidade da Pessoa Humana, se apresentando como uma série de garantias alcançadas ao longo do tempo pelo povo.

Nesse contexto, temos a definição de Direito a Saúde, encontrada em Ricardo Seibel3, sendo por nós utilizada, onde do direito à vida e da proteção à dignidade

1 BONAVIDES, Paulo. Curso de Direito Constitucional. 30ª ed. São Paulo: Malheiros Editores. 2015. p.575

2CANOTILHO, J.J. Gomes. Direito Constitucional e Teoria da Constituição. 7ª edição.14ª Reimpressão. Coimbra: Almedina Editores, 2003.p. 259.

3LIMA, Ricardo Seibel de Freitas. Direito à saúde e critérios de aplicação. IN: SARLET, Ingo Wolfgang; TIMM, Luciano Benetti(org.). Direitos Fundamentais: orçamento e “reserva do possível”. Porto Alegre: Livraria do Advogado.,2008. p. 265.

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humana certamente decorre, entre outros, o Direito a Saúde, que aparece na Constituição Federal de 1988, já em seu artigo 6º, no rol dos direitos sociais, sendo melhor tratado no artigo 196 com o seguinte enunciado: “A saúde é direito de todos e dever do Estado, garantida mediante políticas sociais e econômicas que visem à redução do risco de doença e de outros agravos e ao acesso universal igualitário às ações e serviços para sua promoção e recuperação.”

O Direito à saúde exige uma aplicabilidade imediata e direta, pois só assim podemos garantir a sobrevivência do ser, de modo que, tratamos aqui de um reflexo do direito à vida e da dignidade da pessoa humana.

Por ser um Direito Social, ele é visto como um Direito a prestações, de acordo com Marcos Sampaio4, na perspectiva de o particular obter algo através do Estado, surgindo aqui, a necessidade de desenvolvimento de política social ativa, devendo-se garantir o mínimo existencial desse direito à toda população.

Nessa perspectiva, a política de saúde pública implementada, teria por missão, garantir a satisfação dos interesses da coletividade, de tal forma que, a fruição dos direitos deve estar relacionada ao bem-estar coletivo.

Vive-se atualmente uma época em que para muitos autores o discurso deveria ser de menos direitos fundamentais em nome de melhores direitos fundamentais5,

como meio de se garantir um mínimo de eficácia para os mesmos, principalmente quando nos vemos diante dos chamados direitos prestacionais, a exigir a atuação do Estado.

Assim, ao falar em eficácia de Direitos Fundamentais devemos levar em conta, de acordo com José Afonso da Silva6, a análise do enunciado desses direitos, com a verificação dos aspectos positivos e negativos que eles impõem para que possam ser realmente efetivos. Principalmente quando da análise do papel do Estado na sua

4SAMPAIO, Marcos.O Conteúdo essencial dos Direitos Sociais. São Paulo: 2013. p.50-55. 5 NABAIS, José Cassalta. Algumas reflexões críticas sobre os Direitos Fundamentais. Revista

de Direito Público da Economia, ano 6, n. 22, abr. 2008.

6SILVA, José Afonso da. Curso de Direito Constitucional Positivo, 24ª Ed.,São Paulo, Malheiros Editores, 2005. p.172 – 190.

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aplicação, já que o programa determinado por uma norma não é, por si só, suficiente para determinar a sua concretização.

Porém, das análises efetuadas, percebemos que a realidade brasileira ainda caminha longe de um contexto que assegure o direito à saúde de todos, de modo universal e igualitário, ainda estamos longe de ter a saúde como um meio promotor do desenvolvimento humano.

É dever do Poder Público garantir meios eficazes para que a população tenha uma assistência clínica e hospitalar adequada; meios de acesso a diagnósticos e prevenção de doenças; bem como, que lhes seja assegurado a obtenção de medicamentos e de tratamentos adequados, na prática, porém, nem sempre isso é possível.

O Direito Fundamental a Política de Saúde Pública, faz com que, no momento de implantação de uma Política Pública, o Direito a Saúde, passe a gozar de proteção jurisdicional de distintos modos, dentre os quais, com a proibição do retrocesso social. Enquanto Direito Público Subjetivo, a Direito a Saúde se manifesta exigindo do Estado prestações de tal forma que, há uma proibição de retroceder, sob o status quo já alcançado, surgindo aqui a ideia de mínimo existencial a ser garantido.

Essa proibição de retrocesso social se dá com a garantia da Dignidade Humana7, como atualmente compreendida, na medida em que, cada ser humano possui valores intrínsecos e desfrutam de uma posição especial no universo.

Assim, podemos identificar o conteúdo mínimo de implementação desse direito fundamental social, aquém do qual, tal direito se torna judicializável de tal forma que, uma omissão gerará uma inconstitucionalidade.

Nessa perspectiva, a reserva do possível constitui um limite fático e jurídico ao cumprimento do direito à saúde, de acordo o pensamento de Ingo Sarlet e Mariana

7BARROSO, Luís Roberto.A Dignidade da Pessoa Humana no Direito Constitucional Contemporâneo: A construção de um Conceito Jurídico à Luz da Jurisprudência Mundial. Trad. Humberto Laport de Mello. 3ª Reimpressão. Belo Horizonte: Editora Fórum, 2014. p. 14.

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Figueiredo8, na medida em que, quando se observa as noções de proporcionalidade e mínimo existencial, temos a reserva das capacidades financeiras do Estado, com o intuito de salvaguardar o núcleo essencial deste direito fundamental.

1. POSICIONAMENTO DOS MINISTROS DO SUPREMO TRIBUNAL

FEDERAL NA QUESTÃO DOS MEDICAMENTOS

A definição de saúde encontrada na Constituição da Organização Mundial de Saúde9, nos apresenta a saúde como sendo: “um estado de completo bem-estar físico, mental e social, e não consiste apenas na ausência de doença ou de enfermidade. ”

Assim, a saúde não se apresenta como algo pronto, de fácil acesso, como um pacote; ela se manifesta e concretiza quando criamos e implementamos as condições para que se possa usufruir das condições para tal, cabendo, portando ao Poder Público atuar em várias frentes para garanti-la. Uma delas se dá com o fornecimento de medicamentos.

No dia 15(quinze) de setembro do ano de 2016 teve início no Supremo Tribunal Federal – STF o julgamento dos Recursos Extraordinários 566471 e 657718, que tratam do fornecimento de remédios de alto custo não disponíveis no Sistema Único de Saúde – SUS e de medicamentos não registrados na Agência Nacional de Vigilância Sanitária – Anvisa.

O julgamento ainda não foi concluído, tendo sido suspenso após pedido de vistas do Ministro Teori Zavascky, porém, será por nós aqui utilizado com fins de

8SARLET, Ingo Wolfgang; FIGUEIREDO, Mariana Filchtiner. Reserva do Possível, mínimo existencial e direito à saúde: algumas aproximações. In: SARLET, Ingo Wolfgang; TIMM, Luciano Benetti(org.).Direitos Fundamentais: orçamento e “reserva do possível”. Porto Alegre: Livraria do Advogado Editora, 2008. p. 11-54.

9 Constituição da Organização Mundial de Saúde (OMS/WHO) – 1946. Disponível em: http://www.direitoshumanos.usp.br/index.php/OMS-Organiza%C3%A7%C3%A3o-Mundial-da-Sa%C3%BAde/constituicao-da-organizacao-mundial-da-saude-omswho.html

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apresentar um exemplo prático acerca de como se posicionam os ministros do Supremo Tribunal Federal, diante da judicialização de uma política pública.

No caso concreto, no Recurso Extraordinário 566471 o Estado do Rio Grande do Norte, se recusou a fornecer medicamento para o tratamento de “microcardiopatia isquêmica” e “hipertensão arterial pulmonar”, por entender que o seu alto custo e a ausência de previsão de fornecimento no Programa de Dispersão de Medicamentos não obrigavam o Estado a arcar com tais custos.

Proferida sentença pela procedência do pedido da parte autora no sentido do direito ao recebimento do medicamento, a mesma foi confirmada pelo Tribunal de Justiça do Estado, cabendo agora a apreciação da questão pelo STF.

O Ministro Marco Aurélio10 enquanto relator da questão, em seu voto, apresentou um suporte fático amplo para a questão, qual seja, o direito fundamental à saúde, enquanto dever do Estado, que deve estabelecer políticas públicas assegurando o seu cumprimento, pelo menos quanto ao mínimo existencial. Assim prossegue o mesmo defendendo que ao judiciário não cabe estabelecer tais políticas, e sim assegurar o seu cumprimento.

Assegura o Ministro, que o fornecimento de medicamentos, deve ocorrer desde que estejam presentes dois requisitos de forma conjunta: a imprescindibilidade do medicamento para concretização do Direito à Saúde e a comprovação da incapacidade financeira para a aquisição.

Informa ainda que, a imprescindibilidade do medicamento será afastada sempre que comprovada a inequívoca insegurança do mesmo, o que se dá quando estamos diante de um medicamento ainda não registrado na Anvisa.

No que tange a comprovação da incapacidade financeira, assegura o Ministro que deve restar comprovada também a incapacidade financeira da família do

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requerente de arcar com o valor do medicamento, devendo ser observado o princípio da solidariedade familiar.

O Ministro Luís Roberto Barroso11 inicia seu voto, apresentando um suporte fático restrito, já que o mesmo informa que, os recursos públicos impõem restrições à concretização do direito à saúde, pois nenhum país do mundo fornece indistintamente todos os medicamentos solicitados à população, informando ainda que, não cabe ao Poder Judiciário definir como se dará a implementação de uma política pública.

Assim, defende em seu voto a impossibilidade de dispensação de medicamento não incorporado ao SUS, independentemente dos custos, salvo em virtude de situação excepcionais. Informa que, caso o medicamento seja fornecido pelo SUS, eventualmente o cidadão pode requerer o seu fornecimento via judicial, tendo ocorrido sua negativa de na via administrativa, com o objetivo de assegurar o cumprimento de política pública.

Barroso adentra a questão da análise econômica do direito, informando que os benefícios que a população recebe com o fornecimento de medicamentos, são infinitamente menores, do que se esses recursos fossem aplicados em outras políticas também na área da saúde. Continua ele a defender a tese apresentada em trabalho anterior12 segundo a qual: “ A atividade judicial deve guardar parcimônia e, sobretudo, deve procurar respeitar o conjunto de opções legislativas e administrativas formuladas acerca da matéria pelos órgãos institucionais competentes. ”

Assim, o Ministro aponta a necessidade de preenchimento de dois requisitos para que se possa pleitear medicamentos judicialmente. São eles: decisão administrativa denegatória e irrazoável demora para se proferir uma decisão.

11 Voto do Ministro Luís Roberto Barroso no Recurso Extraordinário 566.471/RN.

12 BARROSO, Luís Roberto. Da falta de efetividade à judicialização excessiva: Direito à saúde, fornecimento gratuito de medicamentos e parâmetros para a atuação judicial. Disponível em: http://www.conjur.com.br/dl/estudobarroso.pdf; Acesso em: 28.02.2017 às 11:00h.

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Diverge Barroso do Ministro Marco Aurélio por considerar que, não é possível caber aqui a questão da solidariedade familiar, cabendo somente a solidariedade social na resolução desses casos.

Já no caso de medicamentos não liberados pela Anvisa, sustenta o Ministro Barroso, que é necessário estabelecer um diálogo com expertise técnica da área, para que assim possa ser avaliada a possibilidade de incorporar tal medicamento na lista do SUS, informando ainda que é necessário avaliar se não existe um substituto terapêutico sendo dispensado pelo SUS que possa ser utilizado no caso concreto.

Determina ainda o Ministro, que seja comprovada a eficácia do medicamento através da Medicina Baseada em Evidências, comprovado através de laudo médico ou perícia. Por fim, afirma ainda, que é da União a obrigação de arcar com os custos dos medicamentos oriundos das demandas judiciais.

Temos ainda a analisar, o voto proferido pelo Ministro Edson Fachin13, que também se baseia em um suporte fático amplo, de tal modo que, inicia nos apresentando uma definição do Direito à saúde como sendo algo que extrapola os limites da interpretação literal da Lei. Nos apresentando várias experiências internacionais para serem utilizadas a título de inspiração para o caso concreto.

Fachin nos apresenta ainda inspiração em Rawls nos mostrando um ideal de distribuição que permitisse maximizar as chances de acesso aos bens primários, permitindo ao mesmo decidir sobre o destino das pessoas.

Assim, ele demonstra o papel das Agências Reguladoras para a formulação de políticas púbicas, destacando a importância da Anvisa, já que esta também é responsável pela concessão do registro aos medicamentos, e tal registro se torna relevante para que o medicamento possa ser fornecido, pois ele leva em conta tanto as evidências científicas quanto as econômicas que os envolvem.

Enfatiza o Ministro, a ideia de que as preferências e demandas individuais devem ceder às aspirações da coletividade, evitando-se assim, o cometimento de injustiças globais.

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Percebemos assim, que cada Ministro desenvolve seu voto, em um raciocínio único que pouco ou nada faz menção a algum voto anteriormente proferido, sem ocorra nenhum diálogo entre os votos, quase que desenvolvendo um “solilóquio”, em expressão cunhada pelo jurista Lênio Streck14, daí que, se mostra a necessidade de realizarmos uma análise hermenêutica mais aprofundada dos votos realizados.

2. AS DECISÕES “LÍDERES DE TORCIDA”

Pode-se definir a Hermenêutica como a escolha entre o certo e o certo. Na prática ela se apresenta como sendo um exercício de poder, sendo através dela que se dá a construção/produção do Direito.

No exercício de definição da Hermenêutica, ganha destaque o conceito de linguagem, qual seja, a capacidade do ser humano de comunicar-se por intermédio de signos cujo conjunto sistematizado é a língua, pois é através dela, que realizamos o exercício de ponderação que envolve o processo hermenêutico.

Nesse processo, a linguagem15 é aquilo que nos diferencia, com ela demonstramos claramente os limites dos nossos conhecimentos científicos, produzimos os nossos conceitos.

Assim, com o surgimento do pós-positivismo16 a linguagem passa a ter maior importância, enquanto saber científico, através das três dimensões que apresenta, quais sejam: sintática, semântica e pragmática.

Existem várias teorias da linguagem ou da argumentação, que são utilizadas pelos juristas no desenvolvimento do raciocínio que envolve a produção de uma

14 STRECK, LÊNIO Luiz. O solilóquio epistêmico do ministro Roberto Barroso sobre precedentes. Disponível em: http://www.conjur.com.br/2016-nov-03/senso-incomum-soliloquio-epistemico-ministro-barroso-precedentes; Acesso em 24.02.2017, às 21h.

15 FERRAZ JR, Tércio Sampaio.Introdução ao estudo do direito. 2 ed. São Paulo: Atlas. 1994. p. 38

16 PEREIRA, Erick Wilson. Direito Eleitoral – Interpretação e Aplicação das Normas Constitucionais- Eleitorais. São Paulo: Editora Saraiva. 2011. p. 118.

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decisão, sempre atentando para o fato que a linguagem do jurista17, sobretudo daqueles que compõem a Suprema Corte deve ser constitucionalizada, ou seja, ter a base do seu conteúdo interpretativo fundamentado na Constituição.

Assim, produzir direito no pós-positivismo passa a ser um processo criativo, já que o cotidiano interfere nessa criação a todo momento. Devendo ocorrer o controle da precisão dos termos que estão sendo utilizados, pois este vai determinar a qualidade da produção do texto.

Sempre que necessário, os juristas devem desenvolver um processo de elucidação, sobretudo, os que compõe o STF, para que em linguagem natural a população em geral entenda o que está sendo dito em determinada decisão.

Como no STF se chega a decisões de acordo com a contagem de votos entre os Ministros, e não levando em conta a fixação de uma decisão que deixe claro qual seria a concepção18 da Corte Suprema quanto ao que se está discutindo, o uso da retórica ganha especial destaque.

Percebemos assim, que os Ministros do Supremo Tribunal Federal, se utilizam de decisões retóricas, fundadas no uso da argumentação, para, tal qual “Líderes de Torcidas”, que atuam para atender interesses de determinados grupos, agradando-o como podem, proferirem decisões que não dialogam entre si, e não mostram congruência entre os fundamentos utilizados.

Não verificamos no caso concreto, a existência de racionalização decisória, nem percebemos a tentativa de esboço de uma tese entre os Ministros, já que cada um deles se apoia em determinados parâmetros, que se mostram inconciliáveis entre si, e mesmo não tendo ainda, o voto de todos eles, verificamos que os mesmos não parecem levar em conta os efeitos que decorrem daquilo que cada um deles esboça.

17 BASTOS, Celso Ribeiro. Hermenêutica e Interpretação Constitucional. 4ª ed. São Paulo: Malheiros Editores. 2014. p.93.

18 CORREIO, Jone Fagner Rafael Maciel. Racionalidade no Supremo Tribunal Federal Brasileiro: Análise dos Padrões Decisórios e da Razão Fundante da Decisão no Julgamento da Arguição de Descumprimento de Direito Fundamental nº 541. Revista da AGU, Brasilia – DF, v.15, n.01, p.221-254, jan./mar.2016.

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O que se percebe dos textos apresentados, é que cada um deles, ao seu modo, tenta persuadir um grupo específico, assim como nos propôs Perelman em sua teoria, através de verdade evidentes e a utilização de argumentos retóricos19, temos a construção do que seria uma Teoria da Argumentação.

3. CONSIDERAÇÕES FINAIS

O direito à vida encontra-se diretamente relacionado com o direito à saúde, os quais possibilitam a concretização da dignidade humana. O Direito à Saúde enquanto Direito Fundamental Social, se constitui em um dos anseios principais de todo o povo.

A saúde não só no que se refere à ausência de doenças, mas também na perspectiva de se ter uma rede de atendimento, de proteção, a garantia de fornecimento dos medicamentos necessários, a confiança de que, caso necessário o cidadão será prontamente atendido.

Nesse contexto, o direito à saúde se mostra enquanto um direito social prestacional a exigir do Estado uma atuação em prol do particular, em uma constante busca para atender a todos os anseios da população.

Na busca pela concretização desses objetivos, analisamos os votos proferidos pelos Ministros do Supremo Tribunal Federal nos Recursos Extraordinários 566.471 e 657.178 nos quais estão sendo analisadas as problemáticas em torno do fornecimento de medicamentos de alto custo, bem como envolvendo medicamentos não registrados na Agência Nacional de Vigilância Sanitária – Anvisa.

Verificamos que os Ministros Marco Aurélio, Luís Roberto Barroso e Edson Fachin procederam com seus votos, quase que através de “solilóquios”, cada um desenvolvendo e propondo a tese que consideram mais pertinentes para a resolução do caso concreto, com pouquíssimos pontos de encontro de raciocínios e fundamentações.

19 ATIENZA, Manuel. As razões do Direito – Teoria da Argumentação Jurídica. 2ª ed. Rio de Janeiro: Forense Editora, 2014. P.58.

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Da análise dos votos, passamos à sua análise hermenêutica, situando as decisões na fase pós-positivista, com a valorização dos princípios, da moral diante do caráter aberto das normas, primando por decisões retóricas que não dialogam entre si.

Identificamos assim, a atuação dos mesmos, tais quais “Líderes de Torcida”, a se manifestar no atendimento a anseios de determinados grupos, sem o objetivo de construção de uma tese que venha a representar a Suprema Corte.

Percebemos a argumentação dos Ministros na busca do atendimento dos anseios sociais, a partir das análises empreendidas, com o uso da retórica na construção de uma Teoria da Argumentação própria para cada um.

Não obstante esse posicionamento, tendo em vista que, a saúde, através do seu viés social, quando bem garantida se manifesta na concretude da ideia de Dignidade da Pessoa Humana, garantindo o bem maior de todos nós, qual seja, o Direito à Vida, desenvolvemos aqui a uma reflexão inicial acerca da estrutura decisória da Suprema Corte, ressaltando o quanto o desenvolvimento de uma tese a representar o seu posicionamento, acerca de determinada matéria, promoveria a segurança jurídica daqueles que buscam a garantia de um direito.

REFERÊNCIAS

ALEXY, Robert. Teoria dos Direitos Fundamentais, Trad. Virgílio Afonso da Silva. São Paulo: MalheirosEditores, 2008..

ATIENZA, Manuel. As razões do Direito – Teoria da Argumentação Jurídica. 2ª edição. Rio de Janeiro: Forense Universitária, 2014.

BARROSO, Luís Roberto.A Dignidade da Pessoa Humana no Direito

Constitucional Contemporâneo: A construção de um Conceito Jurídico à Luz da Jurisprudência Mundial. Trad. Humberto Laport de Mello. 3ª Reimpressão. Belo Horizonte: Editora Fórum, 2014.

__________ in. Da falta de efetividade à judicialização excessiva: Direito à saúde, fornecimento gratuito de medicamentos e parâmetros para a atuação

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judicial. Disponível em: http://www.conjur.com.br/dl/estudobarroso.pdf; Acesso em: 28.02.2017 às 11:00h.

BASTOS, Celso Ribeiro. Hermenêutica e Interpretação Constitucional. 4ª edição. São Paulo: Malheiros Editores, 2014.

BONAVIDES, Paulo. Curso de Direito Constitucional. 30ª ed. São Paulo: Malheiros Editores, 2015.

CANOTILHO, J.J. Gomes. Direito Constitucional e Teoria da Constituição. 7ª edição.14ª Reimpressão. Coimbra: Almedina Editores, 2003.

Constituição da Organização Mundial de Saúde (OMS/WHO) – 1946. Disponível em:http://www.direitoshumanos.usp.br/index.php/OMS- rganiza%C3%A7%C3%A3o-Mundial-da-Sa%C3%BAde/constituicao-da-organizacao-mundial-da-saude

mswho.html. Acesso em: 08/12/2016 às 16:00hs.

CORREIO, Jone Fagner Rafael Maciel. Racionalidade no Supremo Tribunal Federal Brasileiro: Análise dos Padrões Decisórios e da Razão Fundante da Decisão no Julgamento da Arguição de Descumprimento de Direito Fundamental nº 541. Revista da AGU, Brasilia –DF, v.15, n.01, p.221-254, jan./mar.2016.

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__________. A face oculta dos direitos fundamentais: os deveres e os custos dos direitos. Revista da AGU, abr.2002.

PEREIRA, Erick Wilson. Direito Eleitoral – Interpretação e Aplicação das Normas Constitucionais –Eleitorais. São Paulo: Editora Saraiva, 2011.

QUEIROZ, Rodrigo César Falcão Cunha Lima. Universalização do acesso à saúde e regulação dos planos privados de assistência à saúde: A atuação regulatória da ANS como instrumento de harmonia contratual e viabilização do papel suplementar da inciativa privada na efetivação do direito social à saúde. Natal, 2014. Dissertação (Mestrado em Direito Constitucional). Universidade Federal do Rio Grande do Norte.

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STRECK, LÊNIO Luiz. O solilóquio epistêmico do ministro Roberto Barroso sobre precedentes. Disponível em: http://www.conjur.com.br/2016-nov-03/senso-incomum-soliloquio-epistemico-ministro-barroso-precedentes; Acesso em

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