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A multa do artigo 475-j do código de processo civil - questões controversas

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REVISTA DIREITO, CULTURA E CIDADANIA – CNEC OSÓRIO / FACOS

A multa do artigo 475-j do código de processo civil - questões

controversas

Sabrina Oliveira de Souza1

Resumo: A constante busca por celeridade, efetividade da tutela jurisdicional e economia processual, desde o início do século XX principalmente, gerou inúmeras alterações e inclusões de artigos no Código de Processo Civil, sempre em consonância com a Constituição Federal de 1988. O presente artigo científico aborda o cumprimento de sentença no processo civil brasileiro, fazendo uma análise de como se deu a evolução da execução civil até chegarmos ao advento da lei n. 11.232/2005 que trouxe o sincretismo processual e a inovação da execução sobre devedor condenado ao pagamento de quantia certa, trazendo considerações sobre a intenção do legislador ao incluir o artigo 475-J do CPC no ordenamento jurídico, bem como as divergências apresentadas pela doutrina e jurisprudência em relação a multa.

Palavras-chave: Execução civil. Sincretismo processual. Cumprimento de sentença. Incidência da multa.

Abstract: The constant quest for celerity, efficacy of judicial protection and procedural economy since the beginning of century the twentieth generated mainly numerous changes and additions of articles in the Code of Civil Process, all consistent with the Constitution of 1988. This article addresses the scientific completion of sentence in Brazilian civil procedure, making an analysis of how was the evolution of civil execution until we reach the advent of Law n. 11.232/2005 that has brought procedural syncretism innovation and execution on the debtor sentenced to pay the certain amount, bringing considerations about the intention of legislators to include Article 475-J of the CPC in the legal system as well as the divergences presented by the doctrine and jurisprudence regarding the fine.

Keywords: Civil execution. Procedural syncretism. Completion of sentence. Effect of fine.

Considerações iniciais

A constante busca por celeridade, efetividade da tutela jurisdicional e economia processual, principalmente a partir do século XX, gerou inúmeras alterações e inclusões de artigos no Código de Processo Civil, sempre em consonância com a Constituição Federal de 1988. Neste sentido, o presente artigo científico aborda a aplicação da multa do art. 475-J do CPC no ordenamento jurídico bem como as divergências apresentadas pela doutrina e jurisprudência em relação ao tema. Para tanto, para que fosse possível uma análise mais aprofundada, foi necessário verificar como se deu a evolução da execução civil no Processo Civil brasileiro até chegarmos ao advento da Lei n. 11.232/2005 que trouxe o sincretismo processual e a inovação da execução sobre devedor condenado ao pagamento de quantia certa.

1 Acadêmica do 9º semestre do Curso de Direito da Faculdade Cenecista de Osório – FACOS. Contato: saoliza@hotmail.com

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Alguns doutrinadores apontavam a execução civil como o “calcanhar de Aquiles”2 do ordenamento jurídico, então, as alterações de leis processuais sobre essa matéria ao longo da história, buscavam maior proteção ao ser humano, mais celeridade para fazer valer o direito constitucional da razoável duração do processo e a eficácia da tutela jurisdicional para tão logo, fazer a entrega do direito pleiteado, que estava em lide processual, sendo na execução, a transferência patrimonial.

A Lei n. 11.232, publicada em 2005, incluiu no ordenamento jurídico brasileiro o art. 475-J do CPC, prevendo ao devedor, que deixar de cumprir voluntariamente a obrigação de pagar quantia certa no prazo de quinze dias, a incidência de multa de 10% sobre o valor da condenação. Assim, aboliu a execução de título judicial como processo autônomo, tornando a execução apenas mais uma fase processual unida à cognição, denominada como fase de “cumprimento de sentença”.

Para melhor entender o propósito da Lei n. 11.232/2005, foi necessário um estudo aprofundado do instituto da execução civil, as suas origens, as formas como já foram realizadas, o porquê das inúmeras alterações legislativas neste instituto, enfim, aspectos mais gerais do sistema executivo brasileiro até o advento da referida Lei que incluiu o artigo 475-J do CPC, tema central de nosso trabalho.

Como técnicas de pesquisa, definimos coletar dados através da doutrina processual civil e pesquisa jurisprudencial. Com base na doutrina processual civil com ênfase na execução – cumprimento de sentença -, na pesquisa nos extensos manuais consultados, via de regra, duas ou três páginas são reservadas a este tema, abordando a questão de que existem divergências quanto à natureza jurídica da multa, quanto ao termo a quo de sua incidência.

Em sites de instituições de ensino superior encontramos pouco material (monografias, dissertações, teses) específico sobre o tema. Todavia, embora trazendo uma análise mais geral, em contraponto aos manuais e aos materiais das instituições de ensino, foi encontrado muito material, tanto em periódicos, como nos

2 Conforme adjetiva Athos Gusmão Carneiro. In: CARNEIRO, Athos Gusmão. Cumprimento da sentença civil e procedimentos executivos. 2. ed. atual. ampl. Rio de Janeiro: Forense, 2010.

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sites do Superior Tribunal de Justiça (STJ) e Tribunal de Justiça do Estado do Rio Grande do Sul (TJRS), o que demonstra a atualidade do tema, mesmo após quase sete anos da publicação da Lei n. 11.232/2005. De tal forma, constatamos que assim, como a doutrina (ainda) não é uníssona, os referidos Tribunais em análise, já apresentaram decisões muito controversas.

A relevância do tema é constatada quando nos remetemos ao procedimento anterior a lei em questão, onde o credor percorria longo caminho para ver seu direito sentenciado (fase de cognição) e depois, continuava de “mãos vazias” até que, de posse da sentença, ajuizasse então o processo de execução. Mais um longo caminho para que enfim, tivesse em mãos o “bem da vida”3

que pleiteava, ou seja, para só então, depois de dois processos autônomos obter a efetividade da tutela jurisdicional que almejava.

A execução civil é um instituto repleto de especificidades, para tanto, merece máxima atenção, pois é através deste que o bem da vida será entregue ao “vencedor” da lide. Neste contexto, apresentaremos as divergências apontadas pela doutrina pátria, no que se refere a multa do art. 475-J do CPC, sobre a sua natureza jurídica, o termo inicial de incidência da multa de 10% sobre o valor da condenação, em sentenças cíveis transitadas em julgado, pelo descumprimento voluntário da obrigação de pagar quantia certa.

Evolução histórica da execução civil

A execução civil é um instituto de suma importância no processo civil brasileiro, se efetiva através de atos materiais e tem finalidade prática, pois é neste momento em que o magistrado impõe o comando concreto da norma para modificações diretas no mundo dos fatos, havendo a transferência de patrimônio. É a forma pela qual a pessoa do credor, busca judicialmente, a satisfação de seu crédito, ou melhor, “[...] execução civil é aquela que tem por finalidade conseguir por meio do processo, sem o concurso da vontade do obrigado, o resultado prático a que tendia a regra jurídica

3 Expressão característica de Araken de Assis. In: ASSIS, Araken de. Cumprimento de Sentença. 3. ed. atual. Rio de Janeiro: Forense, 2010.

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que não foi obedecida”4

. Essa busca pela satisfação do credor existe desde os primórdios da civilização, e sob forte influência do direito romano, partimos da autotutela5 e chegamos à jurisdição.

Uma vez proibida a autotutela, o Estado instituiu a jurisdição, através do processo, como forma de resolver os conflitos intersubjetivos. A jurisdição, no sistema ao qual nos filiamos, sendo este o romano-canônico, instituiu-se o processo de conhecimento, onde o direito é declarado e o processo de execução, destinado então a especificamente dar eficácia, fazer valer a vontade da norma jurídica disposta na sentença do processo de cognição, o que ocorre efetivamente no plano das relações humanas6 com a transferência de patrimônio.

A execução civil passou por grandes modificações até chegarmos ao que hoje, podemos dizer que é um instituto mais humano e mais eficaz. O direito romano, fonte de nosso sistema jurídico, já admitiu como forma de execução de uma dívida a execução corporal7, onde o patrimônio do devedor era respeitosamente mantido, mas seus direitos personalíssimos, sua própria dignidade humana era o que respondia pela dívida, pois o descumprimento da obrigação era entendido como uma ofensa ao credor. O devedor inclusive já pode ser mantido na condição de escravo8, e como tal, podia ser vendido. Enfim, eram formas de punições que por tal proporção, poderiam ser consideradas como sanção parcialmente penal9, o que perdurou no direito romano até o século II a.C., chamado de período arcaico.

4 LIEBMAN, Enrico Tullio. Processo de execução. 2. ed. São Paulo: Saraiva, 1963. p. 4.

5 Nesse sentido: “Nas fases primitivas da civilização dos povos, inexistia um Estado suficientemente forte para superar os ímpetos individualistas dos homens e impor o direito acima da vontade dos particulares: por isso, não só inexistia um órgão estatal que, com soberania e autoridade garantisse o cumprimento do direito, como ainda não havia sequer leis [...] Assim, quem pretendesse alguma coisa que outrem o impedisse de obter haveria de, com sua própria força e na medida dela, tratar de conseguir por si mesmo, a satisfação de sua pretensão. [...] a esse regime chama-se autotutela”. In: CINTRA, Antonio Carlos de Araújo; GRINOVER, Ada Pellegrini; DINAMARCO, Cândido Rangel. Teoria geral do processo. 12. ed. São Paulo: Malheiros, 1996. p. 21.

6 SILVA, Ovídio A. Baptista da. Curso de processo civil. 2. ed. São Paulo: RT, 1998.

7 DINAMARCO, Cândido R. Execução civil: doutrina e direito positivo. v. 1. 2. ed. rev. aum. São Paulo: Revista dos Tribunais, 1987.

8 DINAMARCO, Cândido R. Execução civil: doutrina e direito positivo. v. 1. 2. ed. rev. aum. São Paulo: Revista dos Tribunais, 1987.

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Com a consolidação do Estado10 em evolução, jurisdicionalizando o poder de aplicação do direito, passou-se a pensar na humanização da execução. No período clássico, a execução tinha um caráter patrimonial, porém ainda desproporcional, pois incidia sobre todo o patrimônio do devedor. Chegando ao período pós-clássico, já no século VI da era cristã, os romanos passaram a entender a execução não como forma de vingança ao devedor, mas como forma de simplesmente o credor buscar a satisfação do seu crédito. A partir desse momento, a execução civil passou a incidir sobre o patrimônio do devedor somente no quantum11 necessário para o adimplemento da dívida.12

Essas formas de execução civil do direito romano, também foram utilizadas por muito tempo pelo direito luso-brasileiro13, um sistema de ameaças de sanções, o que

10 Nesse sentido “ao Estado se reconhece a função fundamental de promover a plena realização dos valores humanos, isso deve servir, de um lado, para pôr em destaque a função jurisdicional pacificadora como fator de eliminação de conflitos que afligem as pessoas e lhes trazem angústia; de outro, para advertir os encarregados do sistema, quanto à necessidade de fazer do processo um meio efetivo para a realização da justiça. Afirma-se que o objetivo-síntese do Estado contemporâneo é o bem-comum e, quando se passa ao estudo da jurisdição, é lícito dizer que a projeção particularizada do bem comum está nessa área é a pacificação com justiça.” In: DINAMARCO, Cândido R. Execução civil: doutrina e direito positivo. v. 1. 2. ed. rev. aum. São Paulo: Revista dos Tribunais, 1987. p. 12-13.

11 DINAMARCO, Cândido R. Execução civil: doutrina e direito positivo. v. 1. 2. ed. rev. aum. São Paulo: Revista dos Tribunais, 1987.

12 Para que pudesse proceder a execução, era necessário um processo de conhecimento exigência esta, indispensável para que não houvesse dúvida quanto à certeza e exigibilidade da dívida. E conforme entendimento de alguns doutrinadores, ainda neste processo de conhecimento, haveria a liquidação dessas condenações. Os requisitos da obrigação a executar: certeza, liquidez e exigibilidade do título, ainda hoje persistem para a fase de execução do processo civil. Conforme Marinoni e Arenhart, exigibilidade é o poder referente a prestação devida, de se exigir o cumprimento, pois sem ela, não há o que se buscar cumprimento; a certeza é referente a existência da obrigação que se busca o cumprimento, é a ausência de dúvida quanto a obrigação; e a liquidez é referente a extensão, determinação da obrigação a ser executada, é a exata definição do que é devido. In: MARINONI, Luiz Guilherme; ARENHART, Sérgio Cruz. Curso de processo civil: execução. v. 3. 2. ed. rev. e atual. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2008. p. 119-121.

13 No Reino de Portugal, era possível a escravização do devedor, somente após as Ordenações Afonsinas (1447) foi vedada a sujeição do mesmo a situação de escravo, sendo permitido no máximo, manter o devedor em cárcere público. Em meados do século XVIII, com as Ordenações Filipinas, Portugal restringiu a execução definitivamente ao limite necessário do patrimônio do devedor para prover a dívida. Em 1500, época em que o Brasil foi descoberto, assim como em Portugal, vigia muito insignificantemente, as Ordenações Manuelinas, que ficaram em vigência até o advento das Ordenações Filipinas. Vigoraram, mesmo após a Proclamação da Independência, em 1822, as Ordenações Filipinas, quando em 1850, adveio o Regulamento nº 737 que passou a complementar as regulamentações dessas Ordenações. Neste sentido, como forma de aprofundar esse contexto histórico: DINAMARCO, Cândido R. Execução Civil. Doutrina e Direito Positivo. Volume 1, 2ª ed. Revista e Aumentada. Editora Revista dos Tribunais, São Paulo: 1987. p. 5/45 e SILVA, Ovídio de Araújo Baptista da. GOMES, Fábio Luiz. Teoria Geral do Processo Civil. 4ª Ed. Revista e Atualizada com a recente reforma processual. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2006. p. 11/32.

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hoje chamamos de execução indireta14, ou seja, através de penas de multa, prisão e demais sanções se buscava fazer com que o devedor adimplisse a dívida.

No Brasil, em 1891 foi promulgada a Constituição Republicana, que delegou competência aos Estados para legislar sobre direito processual15, que resultou em uma legislação descentralizada, desencadeando, portanto, um pensamento mais humano e mais garantista do processo, que culminou posteriormente em 1939 com o advento do nosso primeiro Código de Processo Civil.

Hoje, sabe-se que a execução civil sofre restrições e limitações, o patrimônio do devedor é atingido somente pelo quantum necessário para o cumprimento da dívida, desde que não atinja o mínimo necessário para a sua subsistência e sendo vedada a sanção sobre a pessoa do devedor, permitida somente a prisão civil, após a súmula vinculante do STF nº 2516, excepcionalmente em casos de dívidas de prestação alimentar.

A partir de 1988, ondas reformistas surgiram para buscar uma adequação das normas infraconstitucionais à moderna e garantista Constituição Federal, buscando a constitucionalização do direito e processo civil, sem nenhuma ruptura brusca daquele modelo bem articulado do código Buzaid, mas adequando ao desenvolvimento da sociedade, como meio de resposta as suas reivindicações por um processo menos burocrático e mais efetivo17.

A “terceira onda reformista”18

ocorreu essencialmente com as alterações dadas pela Lei 11.232 de 22 de dezembro de 2005 que modificou a sistemática do Código de

14 Execução indireta seria a coerção indireta, pois são atos que atuam sobre a vontade do devedor. A execução indireta faz uso de sanções, multas, para convencer, constranger o devedor a adimplir, pois, por si só, não realiza o direito material reconhecido ao credor.

15 Aprofundando esse contexto histórico: DINAMARCO, Cândido R. Execução Civil: Doutrina e Direito Positivo. V. 1, 2 ed. rev. aum. São Paulo: Revista dos Tribunais, 1987. e SILVA, Ovídio de Araújo Baptista da. GOMES, Fábio Luiz. Teoria Geral do Processo Civil. 4 ed. rev. atual. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2006.

16 BRASIL, Supremo Tribunal Federal. Súmula vinculante n. 25: “É ilícita a prisão civil de depositário infiel, qualquer que seja a modalidade do depósito”.

17 RUBIN, Fernando. Do código Buzaid ao projeto para um novo código de processo civil: uma avaliação do itinerário de construções/alterações e das perspectivas do atual movimento de retificação. Porto Alegre: Magister. Publicado em 05 mai. 2011. Disponível em: <http://www.editoramagister.com/doutrina_ler.php?id=989>. Acesso em: 12 set. 2011.

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Processo Civil, trouxe um sincretismo processual entre as fases cognitiva e executiva, o que acabou criando novos conceitos e buscando maior celeridade e efetividade do processo.

A lei n. 11.232/2005

O Código de Processo Civil brasileiro possui cinco livros, quais sejam: Livro I – do Processo de Conhecimento; Livro II – Do Processo de Execução, Livro III - Do Processo Cautelar, Livro IV - Dos Procedimentos Especiais e Livro V – Das Disposições Finais, o que conforme redação original dada pela Lei 5.869 de 11 de janeiro de 1973, separava radicalmente as matérias no chamado Código Buzaid19. Porém, grandes alterações trouxeram um novo modelo de processo civil.

A execução civil é considerada por grande parte dos doutrinadores, o principal problema do Processo Civil brasileiro, em relação a morosidade, engessamento de todo o Poder Judiciário, ao desacordo com o direito constitucional de razoável duração do processo e efetividade da tutela jurisdicional.

Quebrando paradigmas e trazendo novos conceitos, em 2005, foi publicada a Lei n. 11.232 que modificou significativamente a execução civil, pois aboliu a execução de título judicial como processo autônomo, advindo então, o processo sincrético (cognição + execução). Sendo assim, esta modalidade de execução passou à denominação de fase de “cumprimento de sentença” e não mais ação de execução de sentença.

Anteriormente a Lei n. 11.232/2005, tema central de nosso trabalho, o credor precisava ver tramitar todo um processo de conhecimento e somente com a sentença condenatória em mãos, deveria ajuizar um novo processo, então aquele de execução por quantia certa para que depois de longo tempo, pudesse alcançar efetivamente o seu direito reconhecido na fase de cognição. Ou seja, eram

cumprimento voluntário da decisão condenatória: a questão da efetividade do art. 475-J do CPC. Revista da Ajuris / Associação dos Juízes do Rio Grande do Sul. Ano 36. n. 113 (mar. 2009). Porto Alegre: AJURIS, 2009.

19 MARINONI, Luiz Guilherme. MITIDIERO, Daniel. Código de Processo Civil. Comentado Artigo por Artigo. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2008.

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necessários dois processos autônomos para que pudesse obter a efetividade da tutela jurisdicional que almejava.

O sincretismo processual

Uma das grandes novidades do processo civil brasileiro foi trazida pela lei n. 11.232 de 22 de dezembro de 2005, que modificou o procedimento de execução de sentença, trazendo um sincretismo processual, ou seja, rompendo paradigmas e unindo os processos de conhecimento e execução.

Na clássica visão do Código de Processo Civil de 1973 era necessária a provocação da jurisdição em dois momentos, ou seja, duas atividades jurisdicionais, dois processos para a resolução de um único conflito. Primeiramente o juiz, durante o processo de conhecimento, com base nos fatos, provas, fundamentos jurídicos trazidos pelas partes, formava seu convencimento, e adequando os fatos à “vontade da norma” visando a certeza jurídica quanto ao direito material pleiteado, prolatava a sentença. Somente depois do trânsito em julgado desta sentença é que se poderia buscar a efetiva satisfação do direito reconhecido na mesma, através de um novo processo, o processo de execução20. Ou seja, mesmo findo o processo de conhecimento com sentença condenatória, esta nada entregava ao credor, que continuava carente de “justiça” e que para ter em mãos, o direito que lhe fora reconhecido, precisava percorrer longos anos talvez na lide com o então chamado processo de execução21.

A segurança e a certeza da existência do direito delimitavam os processos de conhecimento e execução, impossibilitando a simultaneidade dessas atividades jurisdicionais, pois a cognição era requisito essencial para o processo de execução até o advento da lei n. 11.232/2005, que concentrou as atividades de cognição e

20 SILVA, Ovídio de Araújo Baptista da; GOMES, Fábio Luiz. Teoria geral do processo civil. 4. ed. rev. e atual. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2006.

21 “[...] quem ia a juízo buscar um bem da vida, recebia sentença meramente condenatória. Se o devedor não a cumprisse espontaneamente, o credor era obrigado ao exercício de nova ação, em busca do efetivo recebimento.” In: BRASIL. Superior Tribunal de Justiça. Recurso Especial n. 940274. Relatório-Voto Min. Humberto Gomes de Barros. Julgado em 07 abr. 2010. Acesso em: 19 out. 2010. Também nesse sentido: CARNEIRO, Athos Gusmão. Cumprimento da sentença civil e procedimentos executivos. 2. ed. atual. ampl. Rio de Janeiro: Forense, 2010. p.8.

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execução por título judicial em procedimento único quando condenado o devedor ao pagamento de quantia certa22.

Essa “unificação” dos processos de conhecimento e execução é chamado de sincretismo processual, ou seja, as duas atividades jurisdicionais passando a realizar-se em uma única relação jurídica processual. Essa foi a intenção do legislador, com lei n. 11.232/2005, “[...] desburocratizar, simplificar, informalizar a ação e o processo de execução, que continuam revestindo a atividade jurisdicional satisfativa – de entrega do bem da vida ao credor […], de sua natureza executiva”.23

As alterações da lei n. 11.232/2005, além de modernizar o processo civil brasileiro tornaram-no mais célere e menos formalista, adotando e instituindo o cumprimento de sentença, o que antes chamávamos de “execução de sentença”.

A multa do art. 475-j do código de processo civil: questões controversas

Conforme anteriormente explicitado, a lei n. 11.232/2005 trouxe a possibilidade do credor fazer valer o seu direito de receber quantia certa ou já fixada em liquidação de sentença por meio de cumprimento de sentença, com a redação do artigo 475-J do CPC, sem a necessidade de instaurar um novo processo, ou seja, uniu o processo de conhecimento e execução, transformando-os em fases de um único processo. Pois anteriormente à lei, aquele que tivesse seu direito declarado em processo de conhecimento, teria de percorrer mais um caminho, no então processo de execução, para ter seu direito efetivamente nas mãos24.

22 Aprofundando este contexto: MARINONI, Luiz Guilherme; ARENHART, Sérgio Cruz. Curso de processo civil: execução. v. 3. 2. ed. rev. atual. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2008; BUENO. Cássio Scarpinella. A nova etapa da reforma do Código de Processo Civil. v. 1. São Paulo: Saraiva, 2006. p. 186.

23 NERY JUNIOR, Nelson. Código de processo civil comentado. 9. ed. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2006.

24 Nesse sentido: “O processo de conhecimento, instaurado para verificar com quem está a razão diante do litígio, não mais termina com a sentença que fica na dependência da execução. Agora, o processo de conhecimento prossegue até que a tutela do direito almejada seja prestada, mediante a atividade executiva necessária. Isto porque o processo, ainda que vocacionado à descoberta da existência do direito afirmado, destina-se a prestar tutela jurisdicional à parte que tem razão, o que não acontece quando se profere a sentença de procedência dependente de execução.” In: MARINONI, Luiz Guilherme; ARENHART, Sérgio Cruz. Curso de processo civil: execução. v. 3. 2. ed. rev. atual. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2008. p. 53.

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Imprimindo então maior celeridade à prestação jurisdicional, essa junção de processos de conhecimento e execução em um único processo, simboliza o sincretismo processual, que nada mais é que a possibilidade de após a sentença condenatória na fase de conhecimento, o mesmo juiz possa implementar o cumprimento da obrigação, sendo esta a fase de execução, afinal, “[...] o processo de conhecimento goza de ‘executividade intrínseca’”25

Com a finalidade então de instituir o cumprimento de sentença sistemática, o conceito de sentença teve que ser redefinido, passando a ser ato do juiz que conforme arts. 267 e 269 do CPC poderá, além de extinguir o processo, resolver o mérito constituindo, declarando, condenando ou mandando cumprir através de sentenças tidas como mandamentais ou executivas. Pois anteriormente à Lei n. 11.232/2005, a sentença condenatória tinha como eficácia específica à declaração do débito ou do inadimplemento, constituindo um título executivo. Com o advento da referida lei que incluiu o art. 475-J do CPC, a sentença passou a ordenar o cumprimento da obrigação sob pena de multa expressa no caso de inadimplemento26.

25 Neste contexto, sem entrar no mérito em relação ao termo a quo de incidência da multa do art. 475-J do CPC, importante a decisão do Superior Tribunal de Justiça, contextualizando a importância da Lei 11.232/2005 no cenário processual brasileiro: “[...]A aprovação da Emenda Constitucional n. 45/2004 implementou a primeira parte da reforma do Poder Judiciário e possibilitou novos debates a respeito da elaboração de mecanismos que pudessem imprimir maior celeridade à prestação jurisdicional, em prestígio à cláusula constitucional imodificável que assegura a razoável duração do processo (inciso LXXVIII do art. 5º da Constituição Federal). 4. A Lei n. 11.232/2005 trouxe novo paradigma ao Processo Civil brasileiro, que, a despeito de anteriormente segregar o processo executório do cognitivo e sujeitar o credor a outro processo verdadeiramente de conhecimento (embargos de devedor), passou a admitir que o cumprimento da sentença fosse efetivado no bojo da ação de conhecimento. 5. Essa novel característica simboliza o sincretismo entre o processo de conhecimento, em que o juiz condena, e a execução, na qual o mesmo juiz possibilita o cumprimento da obrigação, no sentido de que o processo de conhecimento goza de "executividade intrínseca". […] 7. Compete ao devedor cumprir espontaneamente a obrigação no prazo de quinze dias (art. 475-J), sob pena de, não o fazendo, pagar multa pecuniária de 10% (dez por cento) sobre o valor da condenação.[...]”. In: BRASIL, Superior Tribunal de Justiça. AgRg no REsp 1080716/RJ, Rel. Ministro BENEDITO GONÇALVES, PRIMEIRA TURMA, julgado em 15/10/2009, DJe 21/10/2009. (grifo nosso)

26 Neste contexto, importante verificar decisão do Superior Tribunal de Justiça sobre as alterações no processo civil brasileiro com o advento da Lei n. 11.232/2005: “[...]No panorama jurídico anterior à Lei nº 11.232/2005, a sentença condenatória tinha, como eficácia específica, a declaração do débito e do inadimplemento, mais a constituição do título executivo. Não havia, na sentença, uma ordem específica proferida pela autoridade judiciária, determinando ao devedor o adimplemento da obrigação. A determinação de adimplemento contida na sentença nada mais era que a que previamente estava contida na lei cuja violação motivou a propositura da ação. - Com a introdução do art. 475-J, a sentença condenatória passou a ser dotada de uma nova eficácia. Além de declaração do direito e constituição do título executivo, ela também passou a conter uma ordem específica e independente, dirigida ao devedor, para que cumpra a obrigação. A independência dessa ordem,

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Neste sentido, o valor da condenação será acrescida da multa de 10% sempre que o devedor deixe de cumprir voluntariamente a obrigação de pagar quantia no prazo de quinze dias subsequentes à sentença civil condenatória líquida ou liquidada. Ainda cabe ressaltar que, sendo parcial o pagamento do valor da condenação, a multa, conforme o § 4º do art. 475-J do CPC, incidirá sobre o saldo remanescente.27 Portanto, para evitar a incidência da multa, é necessário então, que o devedor efetue o pagamento integral do valor fixado na condenação no prazo de quinze dias.

Importante ressaltar que embora a lei tenha reconhecido o processo sincrético como modelo, para título executivo judicial, existem alguns casos em que o processo executivo será autônomo, o que ocorrerá nos casos de execução de sentença penal condenatória (art. 475-N, II do CPC); execução de sentença arbitral (art. 475-N, IV do CPC); execução de decisão homologatória de sentença estrangeira (art. 475-N, IV do CPC). Isto porque, não existe um processo com a participação do devedor, portanto, ao contrário da execução de sentença cível condenatória, naqueles casos, será necessária a citação pessoal do devedor para que possa ser desenvolvida a execução, portanto, inaplicável a multa de 10% do art. 475-J do CPC.

Existe ainda uma hipótese em que o a citação do devedor é necessária para prosseguir a execução, é o caso da execução contra a Fazenda Pública. Isto ocorre porque a Lei n. 11.232/2005 não revogou ou alterou o regime de execução por quantia certa contra a Fazenda Pública prevista nos artigos 730 e seguintes do Código de Processo Civil, ou seja, essa concentração das atividades em procedimento único sofre restrições quanto a processos em que figuram como parte a Fazenda Pública, portanto inaplicável a multa de 10% prevista no art. 475-J do CPC, prevalecendo assim, o princípio da especialidade.28

dada pelo juiz, verifica-se pela existência de uma sanção específica para punir o respectivo inadimplemento, que é a multa fixada pelo art. 475-J. Essa multa apenas se aplica ao devedor que inadimplir a sentença. Ela, portanto, torna o ato judicial algo mais que a lei, cujo inadimplemento gera sanções autônomas.[...]” In: BRASIL, Superior Tribunal de Justiça. MC 14.258/RJ, Rel. Ministra NANCY ANDRIGHI, TERCEIRA TURMA, julgado em 17/06/2008, DJe 24/11/2008.

27 THEODORO JÚNIOR. Humberto. Curso de Direito Processual Civil: processo de execução e cumprimento da sentença; processo cautelar e tutela de urgência. v. 2. 46. ed. rev. atual. Rio de Janeiro: Forense, 2011.

28 Para aprofundar estudo: MARINONI, Luiz Guilherme; ARENHART, Sérgio Cruz. Curso de processo civil: execução. v. 3. 2. ed. rev. atual. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2008; e BUENO. Cássio Scarpinella. A nova etapada reforma do Código de Processo Civil. v. 1. São Paulo: Saraiva, 2006. p. 186.

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Ponto de relevante controvérsia também na doutrina e na jurisprudência é quanto a aplicabilidade da multa do art. 475-J do CPC, também na execução provisória, ou seja, antes do trânsito em julgado da sentença. Ocorre que o referido artigo não faz referência no sentido de que a condenação do devedor deve estar transitada em julgado, portanto em sentença líquida ou decisão de liquidação, no prazo de quinze dias, o devedor deverá cumprir a obrigação voluntariamente sob pena de multa, observando que “[...] tal prazo passa destarte automaticamente a fluir, independentemente de qualquer intimação, da data em que sentença se torne exequível, que por haver transitado em julgado, quer porque interposto recurso sem efeito suspensivo.”29

Neste aspecto, a corrente majoritária, composta principalmente por Araken de Assis, Athos Gusmão Carneiro, Cássio Scarpinella Bueno, Guilherme Rizzo do Amaral, Luiz Guilherme Marinoni e Sérgio Cruz Arenhart, entende não haver incompatibilidade da multa do art. 475-J do CPC com a execução provisória e a vontade de recorrer, pois no momento em que o devedor é intimado da sentença condenatória fica ciente que lhe restam as alternativas de pagar o valor da condenação em sua integralidade no prazo legal sob pena de incidência de multa ou “assumir o risco” 30

e interpor recurso, pois assim impediria a utilização do recurso meramente como ato protelatório. Pois está claro no Código de Processo Civil, em seu art. 475-O que “a execução provisória da sentença far-se-á, no que couber, do mesmo modo que a definitiva [...]”31

.

Contudo, a corrente doutrinária minoritária, composta por Humberto Theodoro Júnior e Fredie Didier Junior, dentre outros autores, coloca que a multa não tem caráter repressivo de litigância de má-fé, tendo função meramente de remuneração moratória, portanto infundada a alegação de que a aplicação da multa vise a interposição de recurso protelatório. Afinal, “[...]se o recurso for manifestamente protelatório, o executado não ficará impune; ficará, isso sim, sujeito a uma punição

29 CARNEIRO. Athos Gusmão. Cumprimento de sentença civil e procedimentos executivos. 2. ed. atual. ampl. Rio de Janeiro: Forense, 2010. p. 53.

30 CARNEIRO. Athos Gusmão. Cumprimento de sentença.civil e procedimentos executivos. 2. ed. atual. ampl. Rio de Janeiro: Forense, 2010.

31BRASIL, Código de Processo Civil. Artigo 475-O. Disponível em: <http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/leis/l5869.htm>. Acesso em: 23/05/2012.

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mais grave, cabível por atentado à dignidade da justiça. A pena, em tala caso, poderá atingir até 20% do valor da execução (arts. 17, VII, 18, § 2º, 598, 600, II e 601)”32

Além das controvérsias brevemente apresentadas anteriormente, em relação à multa do art. 475-J do CPC, o legislador deixou outros pontos em aberto, que geraram divergência na doutrina e consequentemente na jurisprudência, como a natureza jurídica da multa e o termo inicial de sua incidência, aos quais passaremos a analisar de forma mais pontual.

Da natureza jurídica da multa do art. 475-J do Código de Processo Civil

A busca pela celeridade ao pagamento da dívida pela qual o devedor foi condenado em quantia certa, o legislador inseriu no ordenamento jurídico a previsão da multa pelo não cumprimento voluntário da obrigação, fixada em 10% sobre o montante final da dívida. Dentre vários pontos de divergência originados com essa previsão, um deles diz respeito à natureza jurídica da multa.

Então, sobre a natureza jurídica da multa do art. 475-J CPC, seria ela de natureza coercitiva, punitiva ou ainda de natureza híbrida? São três as correntes apresentadas, a primeira afirma ser a multa de natureza coercitiva, outra de relevância é a que entende ser a multa de natureza punitiva e a minoritária, conhece a multa como de natureza mista, ou híbrida.

Cumpre ressaltar que tanto a multa de natureza coercitiva, como punitiva, ambas são sanções processuais pecuniárias, diferem somente na forma de atuação. Assim, a multa punitiva reprime a violação de deveres processuais, enquanto a coercitiva incide sobre a vontade da parte estimulando-a ao cumprimento da obrigação.

Entendem alguns doutrinadores que simplesmente pelo fato da multa estar prevista, já basta para que a sua existência seja uma forma de coerção, atuando

32 THEODORO JÚNIOR, Humberto. Curso de direito processual civil: processo de execução e cumprimento de sentença, processo cautelar e tutela de urgência. v. 2. 46. ed. rev. atual. Rio de Janeiro: Forense, 2011. p. 51.

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psicologicamente sobre a vontade do devedor para a adimplência da dívida33. Dentre alguns doutrinadores que tratam deste estudo, está José Miguel Garcia Medina, Tereza Arruda Alvim Wambier, Luiz Rodrigues Wambier, Cássio Scarpinella Bueno, Araken de Assis.

Levando em consideração que a intenção do legislador é fazer com que o devedor cumpra a obrigação de pagar quantia certa, a natureza jurídica da multa, para alguns doutrinadores, é claramente coercitiva, servindo incutir no devedor a intenção precípua da lei n. 11.232/2005, que é o cumprimento imediato das decisões jurisdicionais, sem delongas, questionamentos34.

Em contraponto a esta corrente doutrinária, entendendo então, que a multa em análise tem natureza jurídica punitiva, compõem esta corrente Luiz Guilherme Marinoni, Sérgio Cruz Arenhart, Humberto Theodoro Júnior, Sérgio Shimura, dentre outros.

A argumentação segue no sentido de que, a multa, somente incidirá quando houver a inadimplência voluntária da obrigação, sendo então, uma penalidade ao devedor que deixar de cumprir a sentença condenatória, pois “[...] essa multa não objetiva permitir ao juiz constranger o demandado a pagar, uma, vez que é previamente fixada na lei, não podendo ser graduada segundo as circunstâncias do caso concreto para dar ao juiz poder para efetivamente compelir ao pagamento.”35 portanto, esta é uma multa de natureza punitiva e não coercitiva..

O Tribunal de Justiça do Estado do Rio Grande do Sul, em decisão de Agravo de Instrumento36, acompanha esta corrente doutrinária, ora em estudo, se manifestando

33 WAMBIER, Teresa Arruda Alvim; ALVIM NETO, José Manoel Arruda. O grau de coerrção das decisões proferidas com base na prova sumária: especialmente a multa. Disponível em: <http://www.uel.br/revistas/uel/index.php/iuris/article/view/4136/3549>, acesso em: 09.02.2012. 34 BUENO, Cássio Scarpinella. Variações sobre a multa do caput do art. 475-J do CPC. Disponível em: <http://www.scarpinellabueno.com.br> , acesso: 19/03/2012.

35 MARINONI, Luiz Guilherme; ARENHART, Sérgio Cruz. Curso de processo civil: execução. v. 3. 2. ed. rev. e atual. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2008. p. 110.

36 “AGRAVO DE INSTRUMENTO. EXECUÇÃO PROVISÓRIA. EXECUÇÃO PROVISÓRIA DE ASTREINTES. INCIDÊNCIA DA MULTA DO ARTIGO 475-J. POSSIBILIDADE. VERBA HONORÁRIA. CUMPRIMENTO DA SENTENÇA. PERCENTUAL MANTIDO. A execução provisória de crédito decorrente de astreinte é admitida quando a multa está fixada em sentença sujeita a recurso recebido somente no efeito devolutivo, assim como fixada em decisão interlocutória posterior à sentença que

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no sentido de que a natureza jurídica da multa do art. 475-J do CPC é punitiva e não coercitiva, e também sobre a aplicabilidade da multa do art. 475-J do CPC na execução provisória.

Salienta esta corrente, que a multa em análise, muito se parece com a cláusula penal contratual, porém não fixada independentemente da vontade das partes, ou seja, é imposta pela lei37, portanto, tendo caráter punitivo por não propiciar a execução indireta da obrigação, sendo apenas um plus que agregará ao montante da condenação.

Podemos mencionar ainda, a corrente doutrinária defendida especialmente por Fredie Didier Júnior38, posicionando-se no sentido de que a multa em questão como de natureza mista, híbrida ou dúplice. A argumentação desta corrente segue no sentido de que, pelo simples fato de haver a previsão da multa de 10% sobre o valor da condenação, caso o devedor não efetue o pagamento da dívida no prazo de quinze dias, já se pode considerar como uma multa de força coercitiva, pois sua previsão busca forçar o devedor a adimplir a obrigação de pagar quantia certa. Caso essa coerção não atinja seu objetivo, passado o prazo estipulado de quinze dias, aparece a força punitiva da multa, quando esta passa então a acrescer sob o montante da condenação.

também tenha sido alvo de recurso não dotado de efeito suspensivo. Na espécie, tanto o título executivo em que aplicada a multa, quanto a sentença que serve como seu fundamento, ainda não estão dotados de efetividade porque sujeitos a recurso recebido somente no efeito devolutivo. A execução, pois, deverá seguir o regime do artigo 475-O do CPC. Cabível a incidência da multa do artigo 475-J do CPC mesmo quando se trata de execução provisória. O fato de a multa do artigo ter caráter punitivo, e não coercitivo, não faz com que deixe de ser exigida do devedor que descumpre a intimação para pagar a quantia a que foi condenado na sentença, dentro do prazo legal de quinze dias. Obviamente, a decisão que aparelha como título executivo judicial o pedido de cumprimento da sentença, por estar submetida a recurso, poderá ser modificada. Mas isso não autoriza o devedor a desrespeitar a previsão do artigo 475-J do CPC, quando há execução provisória. Precedentes desta Corte. Verba honorária mantida. Percentual adotado que segue as diversas decisões desta Corte em casos análogos de cumprimento da sentença, condizente com o grau de zelo profissional do patrono da parte exeqüente, diversas vezes instado a responder os vários recursos manejados pela parte executada, o que tem feito de forma zelosa, não podendo ser descartada, ainda, a complexidade da causa em questão. NEGADO PROVIMENTO AO AGRAVO DE INSTRUMENTO.” RIO GRANDE DO SUL, Tribunal de Justiça do Estado. Agravo de Instrumento Nº 70044015584, Quarta Câmara Cível, Tribunal de Justiça do RS, Relator: José Luiz Reis de Azambuja, Julgado em 28/09/2011). (grifo nosso)

37 MARINONI, Luiz Guilherme; ARENHART, Sérgio Cruz. Curso de processo civil: execução. v. 3. 2. ed. rev. e atual. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2008.

38 DIDIER, Jr. Fredie; BRAGA, Paula Sarno; OLIVEIRA, Rafael. Curso de Direito Processual Civil. v. 2. 2 ed. Bahia: Jus Podivim, 2008.

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Embora aja divergência, seguimos a compreensão da corrente doutrinária que fundamenta a multa como sendo de natureza coercitiva, visto que, estando a possibilidade de sua incidência expressa no artigo, isso basta para exercer pressão no íntimo do executado para que cumpra o débito no prazo legal.

Termo inicial de incidência da multa do artigo 475-J do Código de Processo Civil

A referida lei trouxe a possibilidade do credor fazer valer o seu direito de receber quantia certa ou já fixada em liquidação de sentença por meio de cumprimento de sentença, com a redação do artigo 475-J39 do Código de Processo Civil, sem a necessidade de instaurar um novo processo.

O legislador, com a lei n. 11.232/2005, incluindo no ordenamento jurídico brasileiro o art. 475-J do CPC, prevê uma multa de 10% sobre o valor da condenação quando o devedor, no prazo legal, deixa, voluntariamente de cumprir a obrigação de pagar quantia certa. A aplicação da multa é método para fazer com que o devedor busque o adimplemento e para que o credor, de forma célere, veja a tutela jurisdicional ser prestada efetivamente, sendo esta, a principal missão intentada pelo legislador para o referido artigo.

Dessa forma, condenado o devedor ao pagamento de quantia certa, nos termos do caput do artigo 475-J do Código de Processo Civil, não adimplindo a obrigação espontaneamente, no prazo de quinze dias, incorrerá em multa de 10% sobre o valor da condenação. Porém não está fixado a partir de que momento a multa pelo inadimplemento passa a incidir sobre o valor da dívida, aspecto este que acabou

39 “Art. 475-J. Caso o devedor, condenado ao pagamento de quantia certa ou já fixada em liquidação, não o efetue no prazo de quinze dias, o montante da condenação será acrescido de multa no percentual de dez por cento e, a requerimento do credor e observado o disposto no art. 614, inciso II, desta Lei, expedir-se-á mandado de penhora e avaliação. § 1º Do auto de penhora e de avaliação será de imediato intimado o executado, na pessoa de seu advogado (arts. 236 e 237), ou, na falta deste, o seu representante legal, ou pessoalmente, por mandado ou pelo correio, podendo oferecer impugnação, querendo, no prazo de quinze dias.§ 2º Caso o oficial de justiça não possa proceder à avaliação, por depender de conhecimentos especializados, o juiz, de imediato, nomeará avaliador, assinando-lhe breve prazo para a entrega do laudo.§ 3º O exequente poderá, em seu requerimento, indicar desde logo os bens a serem penhorados.§ 4ºEfetuado o pagamento parcial no prazo previsto no caput deste artigo, a multa de dez por cento incidirá sobre o restante.§ 5º Não sendo requerida a execução no prazo de seis meses, o juiz mandará arquivar os autos, sem prejuízo de seu desarquivamento a pedido da parte.”. BRASIL, Código de Processo Civil.

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gerando polêmicas e divergências doutrinárias e jurisprudenciais. Assim, referente ao termo inicial de incidência da multa, a doutrina não é unânime, podendo ser encontrados diversas posições sobre o tema.

São três as principais correntes sobre o tema, os que entendem que a multa passa a incidir após a intimação pessoal do devedor no caso do não cumprimento voluntário da dívida; a segunda julga a necessidade apenas da intimação do advogado do devedor para passar a fluir o prazo e a terceira corrente, que entende bastar o trânsito em julgado da sentença condenatória ou do acórdão, para que a multa passe a incidir sobre o montante da dívida no caso de inadimplemento do devedor.

Entendendo ser necessária a intimação pessoal do devedor, apresentamos a primeira corrente doutrinária, defendida principalmente por José Miguel Garcia Medida, Luiz Rodrigues Wambier e Tereza Arruda Alvim Wambier. Defendem esta necessidade da intimação na pessoa do devedor para que a multa passe a incidir, pois argumentam que no sistema processual civil brasileiro, existem intimações que devem ser dirigidas aos advogados, pois exigem capacidade postulatória; e outros que devem ser dirigidos às partes, porque exigem atos subjetivos que dependem de sua participação, o que entendem ser o caso disposto no art. 475 – J do CPC.

Estando sucumbente o devedor, o cumprimento de obrigação é “ato cuja realização dependa de advogado, mas é ato da parte. Ou seja, o ato de cumprimento ou descumprimento do dever jurídico é algo que somente será exigido da parte, e não de seu advogado, salvo se houver exceção expressa, respeito, o que inexiste no art. 475-J, caput do CPC.”40 o, portanto evidente a necessidade de intimação dirigida diretamente à pessoa do devedor, “porquanto o dever jurídico de suportar uma condenação (no caso pagar a dívida) é algo que unicamente será exigido da parte, e não do seu procurador.”41

40 In: WAMBIER, Luiz Rodrigues. WAMBIER, Tereza Arruda Alvim. MEDINA, José Miguel Garcia. Sobre a necessidade de intimação pessoal do réu para o cumprimento da sentença, no caso do art.475-J do CPC (inserido pela Lei 11.232/2005). Disponível em http://www.abdpc.org.br Acesso: 02/11/2011.

41 “[...]Segundo nosso entendimento, já manifestado em outros escritos, é necessária a intimação do executado para que este cumpra a sentença, devendo a intimação para o cumprimento da sentença dar-se na pessoa do réu, e não deve ser feita através de seu advogado. É que, no caso, se está diante de ato material de cumprimento da obrigação, que é ato pessoal do réu, e não do seu

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Observam ainda que, a intimação do advogado, por meio eletrônico, como tem sido feito no Brasil, pode ser falha, ou a comunicação entre advogado e cliente pode ser difícil, o que traria também prejuízos ao próprio devedor, pois caso haja o inadimplemento, ele terá que pagar a multa somada ao montante da dívida.

Desta forma, diante dos argumentos da primeira corrente apresentada, defendendo a necessidade da intimação pessoal do devedor para passar a fluir o prazo quinzenal, o que no nosso entender seria um retrocesso processual, pois sabe-se das dificuldades de proceder a intimação pessoal do devedor, que, por vezes, poderá utilizar de vários artifícios para dificultar essa intimação.

Todavia, não tendo a lei, previsto qualquer intimação pessoal do devedor, outros doutrinadores como Araken de Assis, Guilherme Rizzo Amaral, Humberto Theodoro Junior, seguem o entendimento, de que a partir do momento em que a condenação passa a ser exigível, o prazo de quinze dias para o cumprimento voluntário passa a correr, passando a incidir a multa nos dias subsequentes a esses quinze dias, sem a necessidade de uma nova intimação.

Nesta seara, o prazo corre automaticamente a partir da exigibilidade do título, pois entende-se que aquele que está em juízo sabe que após a condenação, terá quinze dias para adimplir a obrigação, caso contrário, incorrerá em multa de 10% sob o valor da condenação, sem demais formalidades e exigências de novas intimações, que não se compatibilizam com a vontade do legislador ao “reformar” o processo de execução”, conforme mencionado em decisão do Superior Tribunal de Justiça, AgRg no REsp 1057285/RJ42. Salientando havendo ou não patrimônio ou recursos financeiros, o executado arcará com a multa no caso do inadimplemento.43

advogado. Afinal, “se o ato é personalíssimo da parte, a via adequada para instalá-la ao cumprimento é a sua intimação pessoal e direta e não de seu advogado, porquanto o dever jurídico de suportar uma condenação (no caso pagar a dívida) é algo que unicamente será exigido da parte, e não do seu procurador.” In: MEDINA, José Miguel Garcia. Processo Civil Moderno. Execução. Vol. 3. São Paulo: Editora Revista dos Tribunais, 2008. p. 220.

42 “PROCESSUAL CIVIL - AGRAVO REGIMENTAL NO RECURSO ESPECIAL - EXECUÇÃO - FASE DE CUMPRIMENTO DE SENTENÇA - MULTA DE 10% PREVISTA NO ART. 475-J DO CPC - PRAZO DE 15 DIAS PARA O PAGAMENTO - DESNECESSIDADE DE INTIMAÇÃO. É desnecessária a intimação do devedor para efetuar o pagamento da multa de 10% (dez por cento) prevista no artigo 475-J do Código de Processo Civil, pois é medida incompatível com a celeridade que buscou-se dar à fase de cumprimento de sentença, iniciando-se o prazo de 15 (quinze) dias com o trânsito em julgado da sentença condenatória. Agravo regimental improvido. In: BRASIL, Superior Tribunal de Justiça.

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A partir do momento que se torna exigível a sentença, com o seu trânsito em julgado44, decorrido o prazo de 15 dias mencionado no artigo, a multa passa a incidir automaticamente sem necessidade de nova intimação. O devedor para evitar a multa, deve tomar a iniciativa de cumprir a obrigação no prazo legal, sendo que esse prazo, conforme essa corrente doutrinária, “[...] a sentença condenatória líquida, ou a decisão de liquidação da condenação genérica, abrem, por si só, o prazo de quinze dias para o pagamento do valor da prestação devida. É do trânsito em julgado que se conta dito prazo, pois é daí que a sentença se torna exequível.”45

.

Neste mesmo sentido, encontramos decisões do Tribunal de Justiça do Rio Grande do Sul, entendendo devida a multa prevista no art. 475-J do CPC em razão do não cumprimento voluntário da sentença, independendo de “ […] intimação, pessoal ou por nota de expediente, do devedor para pagar o valor devido para então incidir a multa. Isto porque é ela devida a partir do primeiro dia imediatamente após o decurso de 15 dias do trânsito em julgado da decisão, na hipótese de não ter havido o pagamento do valor devido”46

.

AgRg no REsp 1057285/RJ, Rel. Ministro SIDNEI BENETI, TERCEIRA TURMA, julgado em 20/11/2008, DJe 12/12/2008.

43 ASSIS, Araken de. Manual da Execução. 13 ed. rev. atual. ampl. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2010.

44 Uma outra divergência é encontrada dentro desta própria corrente doutrinária, no que trata da aplicabilidade da multa do artigo 475-J do CPC, também na execução provisória, ou seja, antes do trânsito em julgado da sentença quando interposto recurso sem efeito suspensivo. Neste sentido, as palavras de Athos Gusmão Carneiro: “[...] na sentença condenatória por quantia líquida (ou na decisão de liquidação de sentença), a própria lei passa a alertar para o tempus iudicati de quinze dias, concedido para que o devedor cumpra voluntariamente sua obrigação. Tal prazo passa destarte automaticamente a fluir, independentemente de qualquer intimação, da data em que sentença se torne exequível, que por haver transitado em julgado, quer porque interposto recurso sem efeito suspensivo.” (grifo do próprio autor) CARNEIRO. Athos Gusmão. Cumprimento de sentença.civil e procedimentos executivos. 2. ed. atual. ampl. Rio de Janeiro: Forense, 2010. p. 53.

45 OLIVEIRA, Carlos Alberto Alvaro de. As Novas Reformas do Código de Processo Civil. Rio de Janeiro: Forense: São Paulo, 2006. p. 143/145.

46 RIO GRANDE DO SUL, Tribunal de Justiça do Estado. Agravo de Instrumento Nº 70038562534, Décima Sétima Câmara Cível, Tribunal de Justiça do RS, Relator: Bernadete Coutinho Friedrich, Julgado em 14/10/2010. Sob o mesmo entender: “AGRAVO DE INSTRUMENTO. BRASIL TELECOM. CUMPRIMENTO DE SENTENÇA. MULTA. TERMO INICIAL DO PRAZO. DESNECESSIDADE DE INTIMAÇÃO. O prazo de quinze dias previsto no art. 475-J, caput, do CPC, começa a correr do trânsito em julgado da sentença condenatória, sendo desnecessária a intimação pessoal do devedor ou de seu procurador. AGRAVO DE INSTRUMENTO DESPROVIDO.” In: RIO GRANDE DO SUL, Tribunal de Justiça do Estado. Agravo de Instrumento Nº 70038125159, Segunda Câmara Especial Cível, Tribunal de Justiça do RS, Relator: Altair de Lemos Junior, Julgado em 29/09/2010)” (grifo nosso).

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Da mesma forma, o Superior Tribunal de Justiça, afirma que para não gerar dúvidas, “[...] não se pode exigir da parte que cumpra a sentença condenatória antes do trânsito em julgado (ou, pelo menos, enquanto houver a possibilidade de interposição de recurso com efeito suspensivo) [...]”47

mas que passado o prazo de quinze dias estipulado pela lei, independentemente de qualquer outra intimação para a parte sucumbente48, seja na pessoa do devedor ou de seu advogado, cumprir com a obrigação, a multa passa a incidir automaticamente sobre o valor da condenação.

Justificando, portanto, essa compreensão, com o argumento de que a intimação da sentença condenatória é a ciência de que ou poderá usar de recurso no prazo legal, ou deverá efetuar o pagamento da condenação também no prazo de quinze dias, conforme expresso em lei, sob pena de incidir em multa de 10% sobre o valor da condenação. Entendem que, a partir do momento da intimação da sentença, esta já passa a produzir seus efeitos, sendo possível a incidência da multa no caso de inadimplemento.

Todavia, em relação à compreensão de que basta o trânsito em julgado da sentença ou acórdão para o prazo passar a correr, entendemos ser um posicionamento arriscado, pois se encontrando o processo em instância superior, a elaboração de cálculos, mesmo que aritméticos, poderá ficar prejudicada, podendo neste caso, o devedor efetuar pagamento a menor e incorrer na multa de 10% sobre o saldo, afrontando possivelmente, princípios constitucionais como o do devido processo legal.

47 BRASIL, Superior Tribunal de Justiça. Recurso Especial nº 954859/RS, Terceira Turma, Relator: Min. Humberto Gomes de Barros. Julgado em 16/08/2007.

48 “AGRAVO REGIMENTAL. PROCESSUAL CIVIL. VIOLAÇÃO DO ART. 535 DO CPC. NÃO-OCORRÊNCIA. AUSÊNCIA DE PREQUESTIONAMENTO. CUMPRIMENTO DA SENTENÇA. INTIMAÇÃO PESSOAL DO DEVEDOR PARA PAGAMENTO. DESNECESSIDADE. MULTA DO ART. 475-J DO CPC. 1. Não há por que falar em violação do art. 535 do CPC quando o acórdão recorrido, integrado pelo julgado proferido nos embargos de declaração, dirime, de forma expressa, congruente e motivada, as questões suscitadas nas razões recursais. 2. Aplicam-se os óbices previstos nas Súmulas n. 282 e 356/STF quando as questões suscitadas no recurso especial não tenham sido debatidas no acórdão recorrido nem, a respeito, tenham sido opostos embargos declaratórios. 3. A jurisprudência desta Corte encontra-se sedimentada no sentido de que é desnecessária a intimação pessoal do devedor ou de seu patrono para o cumprimento da sentença condenatória. 4. Agravo regimental desprovido.” In: BRASIL, Superior Tribunal de Justiça. AgRg no Ag 1047052/RJ, Rel. Ministro JOÃO OTÁVIO DE NORONHA, QUARTA TURMA, julgado em 06/08/2009, DJe 17/08/2009). (grifo nosso)

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Por fim, a corrente doutrinária liderada por Nelson Nery Júnior, Rosa Maria de Andrade Nery e Cássio Scarpinella Bueno, a qual entendem que a multa tem seu termo inicial com a intimação do advogado do devedor por meio da imprensa oficial. Sustentam que embora a lei não seja clara neste sentido, não é necessária nenhuma outra providência jurisdicional substitutiva da vontade do devedor, desde que a decisão jurisdicional a ser cumprida reúna suficiente eficácia, mesmo que a hipótese de eficácia comporte execução provisória apenas49.

Ainda nesse sentido, em decisão de Recurso Especial nº 940274/MS50, o Ministro João Otávio de Noronha, atenta para o fato de que é dever do advogado assumir o papel de responsável pela administração da justiça, conforme a Constituição Federal prevê em seu artigo 13351 e o Estatuto da OAB e Código de Ética, sendo ele, o representante legal do devedor, não pessoa estranha, seguindo na mesma linha de entendimento do Ministro Relator do venerando Acórdão.

O Superior Tribunal de Justiça, também salienta não há necessidade de procuração outorgada com poderes especiais para que o advogado do sucumbente possa receber intimação para o cumprimento da sentença, pois em casos em que há a constrição patrimonial do devedor, com intervenção direta do judiciário sobre o patrimônio do mesmo, a intimação pode ser realizada através de advogado constituído nos autos, de acordo com o próprio Código de Processo Civil, “[...] sem exigir que haja a constituição de poderes específicos para tanto, não é razoável se

49 “Embora a lei não seja clara, penso que o prazo de 15 dias para pagamento “voluntário” isto é, sem necessidade de início de qualquer providência jurisdicional substitutiva da vontade do devedor, deve fluir desde o instante em que a decisão jurisdicional a ser “cumprida” reúna eficácia suficiente, mesmo que de forma parcial (v. no particular, o art. 475-I, § 2º). Assim, para todos os efeitos, desde que seja possível promover-se, sempre me valendo das expressões consagradas pelo uso, a “execução" do julgado, este prazo de 15 dias tem fluência. Inclusive quando a hipótese comportar “execução provisória”.Como a fluência de prazos não pode depender de dados subjetivos, parece-me, com os olhos bem voltados para o dia-a-dia forense, que este prazo correrá do “cumpra-se o v. acórdão”, despacho bastante usual que, tem geral, é proferido quando os autos do processo voltam do Tribunal, findo o segmento recursal, ou, ainda na pendência dele e independentemente de seu esgotamento, naqueles casos em que a “execução provisória” é admitida. […] Assim, intimadas as partes, por intermédio de seus advogados, de que o “venerando acórdão” tem condições de ser cumprido, está formalmente aberto o prazo de 15 dias para que o “venerando acórdão” seja cumprido.” In: BUENO, Cássio Scarpinella. A nova etapa da reforma do código de processo civil: comentários sistemáticos às Leis n. 11.187, de 19-10-2005, e 11.232, de 23-12-2005. vol. I. São Paulo: Saraiva, 2006, p. 77-78.

50 BRASIL, Superior Tribunal de Justiça. REsp 940274/MS. Relator Min. Humberto Gomes de Barros. Terceira Turma. Julgado em 07/04/2010.

51 BRASIL, Constituição Federal de 1988. “Art. 133 - O advogado é indispensável à administração da justiça, sendo inviolável por seus atos e manifestações no exercício da profissão, nos limites da lei.”.

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entender que o recebimento, pelo advogado, da simples intimação para o cumprimento da sentença necessite de procuração com poderes específicos.”52

Adotando embasamento em consonância com esta corrente doutrinária, o Tribunal de Justiça do Estado do Rio Grande do Sul53 coloca que, conforme seu entendimento consolidado, “[...]a incidência da multa prevista no art. 475 - J do CPC conta-se a partir do primeiro dia útil à data da publicação da intimação do advogado do devedor para o adimplemento do crédito exequendo”, em conformidade com o que vem decidindo o Superior Tribunal de Justiça54.

Ou seja, a partir da intimação dos advogados da parte sucumbente55, este passa a ver fluir seu prazo quinzenal para o pagamento voluntário da condenação, ciente de

52 BRASIL, Superior Tribunal de Justiça. REsp 1080939/RJ, Rel. Ministro BENEDITO GONÇALVES, PRIMEIRA TURMA, julgado em 10/02/2009, DJe 02/03/2009.

53 RIO GRANDE DO SUL. Tribunal de Justiça. Agravo de instrumento n. 70037735099. Primeira câmara especial cível. Relator: Breno Beutler Junior. Julgado em 24 ago. 2010. Acesso em: 05 nov. 2010. “AGRAVO DE INSTRUMENTO. NEGÓCIOS JURÍDICOS BANCÁRIOS. EXPURGOS INFLACIONÁRIOS. PLANO ECONÔMICO. INCIDÊNCIA DA MULTA PREVISTA NO ART. 475-J, DO CPC. FIXAÇÃO DE HONORÁRIOS ADVOCATÍCIOS EM SEDE DE CUMPRIMENTO DE SENTENÇA. 1.Da incidência da multa prevista no art. 475-J, do CPC: De acordo com o entendimento consolidado deste órgão fracionário e conforme já decidido pelo Superior Tribunal de Justiça, a incidência da multa prevista no art. 475 - J do CPC conta-se a partir do primeiro dia útil à data da publicação da intimação do advogado do devedor para o adimplemento do crédito exequendo. 2. Da fixação de honorários em cumprimento de sentença: cabível a fixação de honorários advocatícios em sede de cumprimento de sentença,. diante a jurisprudência consolidada desta corte e do STJ. AGRAVO DE INSTRUMENTO DESPROVIDO.” (grifo nosso)

54 “AGRAVO REGIMENTAL NO RECURSO ESPECIAL. PROCESSO CIVIL. EXECUÇÃO. CUMPRIMENTO DE SENTENÇA. ARTS. 475-I E 475-J DO CPC. LEI N. 11.232 DE 2005. CRÉDITO EXEQUENDO. MEMÓRIA DE CÁLCULO. MULTA. PRAZO DO ART. 475-J DO CPC. TERMO INICIAL. PRIMEIRO DIA ÚTIL POSTERIOR À PUBLICAÇÃO DA INTIMAÇÃO DO DEVEDOR NA PESSOA DO ADVOGADO. 1. A fase de cumprimento de sentença não se efetiva de forma automática, ou seja, logo após o trânsito em julgado da decisão. De acordo com o art. 475-J combinado com os arts. 475-B e 614, II, todos do do CPC, cabe ao credor o exercício de atos para o regular cumprimento da decisão condenatória, especialmente requerer ao juízo que dê ciência ao devedor sobre o montante apurado, consoante memória de cálculo discriminada e atualizada. 2. Concedida a oportunidade para o adimplemento voluntário do crédito exequendo, o não-pagamento no prazo de quinze dias importará na incidência sobre o montante da condenação de multa no percentual de dez por cento (art. 475-J do CPC), compreendendo-se o termo inicial do referido prazo o primeiro dia útil posterior à data da publicação de intimação do devedor na pessoa de seu advogado. 3. Agravo regimental desprovido.” In: BRASIL, Superior Tribunal de Justiça. AgRg no REsp 1052774/RS, Rel. Ministro JOÃO OTÁVIO DE NORONHA, QUARTA TURMA, julgado em 05/11/2009, DJe 16/11/2009. (grifo nosso)

55 “AGRAVO DE INSTRUMENTO. ELETRIFICAÇÃO RURAL. CUMPRIMENTO DE SENTENÇA. MULTA DO ART. 475-J DO CPC. INTIMAÇÃO. NECESSIDADE. JURISPRUDÊNCIA CONSOLIDADA NO STJ. DIFERENÇA ENTRE O VALOR DEPOSITAO E O EFETIVAMENTE DEVIDO. INCIDÊNCIA DA MULTA. POSSIBILIDADE. À luz da nova sistemática do CPC, prevista no art. 475-J, o devedor condenado ao pagamento de quantia certa dispõe do prazo de quinze dias para efetuar o pagamento, sob pena de multa no percentual de 10% do valor da condenação.

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que passado os quinze dias sem o adimplemento, passará a correr em multa de 10% sobre o valor da condenação56. Forma de intimação que entendem não gerar nenhum prejuízo ao devedor, pois pessoalmente ele já foi intimado quando do processo de cognição, o que justificaria a desnecessidade de uma nova intimação pessoal.

Portanto, de acordo com o entendimento da terceira corrente doutrinária, no sentido de que o prazo de quinze dias para a incidência da multa passa a fluir a partir da intimação do advogado do devedor, acreditamos ser este o posicionamento mais adequado, pois seria a melhor forma de alcançar o objetivo pretendido pela reforma processual que trouxemos à discussão.

Frente aos breves posicionamentos doutrinários trazidos, podemos observar a discordância também na jurisprudência do nosso Tribunal de Justiça estadual, bem como no posicionamento do Superior Tribunal de Justiça durante um período, o que nos leva ao sentimento de que a real missão da lei 11.232/2005, incluindo o art. 475-J no CPC, que era o sentimento de segurança jurídica à sociedade, visando a busca de celeridade, efetividade do sistema processual, não teve seu objetivo alcançado devido à omissão do legislador ao termo inicial da multa de 10% e a previsão de sua forma de intimação, o que especificamente causou grande número de recursos embasados por esta própria controvérsia doutrinária e jurisprudencial.

Todavia, conforme jurisprudência pacificada do STJ, a sanção somente incidirá após a intimação do devedor, ainda que na pessoa de seu advogado, para pagamento espontâneo. Precedentes do STJ. Havendo diferença entre o valor depositado para fins de garantia de juízo e o valor efetivamente devido, cabível a incidência da multa prevista no art. 475-J do CPC sobre a diferença. AGRAVO DE INSTRUMENTO DESPROVIDO, EM DECISÃO MONOCRÁTICA.” In: RIO GRANDE DO SUL, Tribunal de Justiça do Estado. Agravo de Instrumento Nº 70044312452, Décima Oitava Câmara Cível, Tribunal de Justiça do RS, Relator: Cláudio Augusto Rosa Lopes Nunes, Julgado em 29/11/2011. (grifo nosso)

56 Nesse sentido, decisões do Tribunal de Justiça do Estado do Rio Grande do Sul: Agravo de Instrumento Nº 70037735099, Primeira Câmara Especial Cível, Tribunal de Justiça do RS, Relator: Breno Beutler Junior, Julgado em 24/08/2010; Apelação Cível Nº 70029334695, Sexta Câmara Cível, Tribunal de Justiça do RS, Relator: Martin Schulze, Julgado em 30/09/2010; Agravo de Instrumento Nº 70043365337, Décima Quarta Câmara Cível, Tribunal de Justiça do RS, Relator: Judith dos Santos Mottecy, Julgado em 24/11/2011; Agravo de Instrumento Nº 70039075254, Oitava Câmara Cível, Tribunal de Justiça do RS, Relator: Luiz Felipe Brasil Santos, Julgado em 18/11/2010.

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