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UNIVERSIDADE FEDERAL FLUMINENSE FACULDADE DE ECONOMIA PROGRAMA DE PÓS-GRADUAÇÃO EM ECONOMIA

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UNIVERSIDADE FEDERAL FLUMINENSE

FACULDADE DE ECONOMIA

PROGRAMA DE PÓS-GRADUAÇÃO EM ECONOMIA

O CRESCIMENTO COM RESTRIÇÃO EXTERNA E O INVESTIMENTO

DIRETO ESTRANGEIRO (IDE) NA ECONOMIA BRASILEIRA:

UMA ANÁLISE DOS ANOS 90

Daniel Ribeiro de Oliveira

Orientadora: Prof. Dra. Carmem Aparecida Feijó

Niterói-RJ

2007

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UNIVERSIDADE FEDERAL FLUMINENSE FACULDADE DE ECONOMIA

PROGRAMA DE PÓS-GRADUAÇÃO EM ECONOMIA

DANIEL RIBEIRO DE OLIVEIRA

CRESCIMENTO COM RESTRIÇÃO EXTERNA E O INVESTIMENTO DIRETO ESTRANGEIRO (IDE) NA ECONOMIA BRASILEIRA:

UMA ANÁLISE DOS ANOS 90

Dissertação submetida ao Programa de Pós-graduação em Economia da Faculdade de Economia da Universidade Federal Fluminense/UFF, como requisito para a obtenção do Titulo de Mestre em Economia.

Banca Examinadora:

____________________________________________

Prof. Dra. Carmem Aparecida Feijó (Orientadora)

Faculdade de Economia – UFF

____________________________________________ Prof. Dr. Carlos Pinkusfeld Bastos

Faculdade de Economia – UFF

____________________________________________ Prof. Dr. Francisco Eduardo Pires de Souza

Instituto de Economia – UFRJ

Niterói (RJ) 2007

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“O Brasil é uma república federativa cheia de árvores e gente dizendo adeus”.

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Agradecimentos

Primeiramente, agradeço aos meus pais, Valneide e Elianir Zuque, pelos anos de dedicação, carinho e amor incondicional que me deram forças para seguir em frente. Agradeço também à minha irmã, Daniele Ribeiro, pelo companheirismo e lealdade tão importantes para a vida.

Agradeço a Prof.a Carmem Feijó pela orientação dedicada e motivadora que me ajudou a buscar caminhos mais seguros diante às dificuldades iniciais. Seus conselhos, carregados de sabedoria e serenidade, foram indispensáveis para este trabalho. Ter tido a professora Carmem como orientadora foi um privilégio! Aos professores: Helder Mendonça, Célia Kerstenetzky, Renata Del-Vecchio, Viviane Luporini, Carlos Guanziroli, Rosane Mendonça, David Kupfer e José Luiz Fiori, meus sinceros agradecimentos por terem contribuído para minha formação. Agradeço também aos professores Carlos Pinkusfeld e Francisco Eduardo Pires de Souza, que aceitaram participar da banca de defesa. Em especial, agradeço ao grande Professor Antônio Maria da Silveira (in memoriam), não só pelos ensinamentos em sala de aula, mas pelas lições de Vida, além do fato de ter sido o único a comentar minhas poesias. Muito obrigado!

Aos amigos que fiz durante o mestrado na UFF: João Carlos Bragança (grande amigo de todas as horas), José Jorge de Souza Costa (sinônimo de generosidade e sabedoria, além grande amigo), Pedro Paulo Carvalho Teixeira (meu tucano dileto, grande amigo que me apoiou impedindo que eu desistisse. Passamos!), Gustavo Guimarães, Gustavo Abrahão, Viviane Alquimin, Carolina da Almeida, Ana Cláudia Caputo e Marcos Tostes, muito obrigado.

Agradeço especialmente aos grandes amigos: Diogo Fagundes, Alex Lorca e Lidiane Huguinin, por fazerem parte da minha vida!

Por fim, gostaria de agradecer também a todos os funcionários da UFF e ao CNPq pelo apoio financeiro durante todo o mestrado.

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Resumo

O influxo de Investimento Direto Estrangeiro (IDE) para a economia brasileira, durante a década de 1990, foi acompanhado por um intenso debate a respeito dos possíveis benefícios surgidos a partir da entrada desse tipo de capital. De um lado, em uma visão mais “liberal”, estavam aqueles analistas que viam na atuação das Empresas Multinacionais (EMNs) o fator determinante para que a economia brasileira se recuperasse da estagnação da década anterior, amparados na suposição de que o acesso privilegiado por parte das EMNs à tecnologia, ao capital financeiro, e sua maior capacidade de penetração em mercados internacionais, em associação com a contribuição dessas empresas para a geração de saldos comerciais positivos (tanto por meio do aumento da competitividade e da promoção de um

upgrade de pauta de exportação nacional, quanto pela garantia de acesso a mercados

internacionais para a produção doméstica, sobretudo nos países das matrizes e naqueles em que possuíssem filiais), seriam condições suficientes para a retomada do crescimento sustentado. Do outro lado, em uma visão mais “desenvolvimentista” estavam aqueles que criticavam o automatismo pregado pela corrente “liberal”, argumentando questões relacionadas: a fragilidade financeira gerada pela condução de política macroeconômica e a possibilidade de uma piora no saldo comercial, em função das estratégias de atuação adotadas pelas EMNs. Sendo assim, o objetivo desta dissertação é analisar o impacto do IDE para economia brasileira durante a década de 1990, considerando: sua capacidade de indução ao investimento, seu papel no comércio exterior e as possibilidades associadas a esse tipo de capital no que se refere à restrição externa como fator limitante do crescimento econômico brasileiro.

Palavras-Chave: Investimento Direto Estrangeiro; Empresas Multinacionais;

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Lista de Tabelas Pág.

Tabela 3.1 – Países Investidores (selecionados) - 1995/2000... 55

Tabela 3.2 – Programa de Privatização (1991-2002)... 59

Tabela 3.3 – Participação do IDE nas Privatizações... 59

Tabela 3.4 – Relação de Fusões e Aquisições / IDE... 61

Tabela 3.5 – Distribuição do IDE por Atividade Econômica (1995/2000)... 62

Tabela 3.6 – IDE em Proporção da FBCF e do PIB... 63

Tabela 3.7 – Coeficiente de Comércio... 69

Tabela 3.8 – Participação do Comércio Com o Mercosul no Total... 69

Tabela 4.1 – Estimativa das Elastic.-renda das Importações e Exportações (1980-97). 77 Tabela 4.2 – Elastic.-renda das Importações Reais e com restrição no BP (1990-99)... 81

Lista de Gráficos Gráfico 3.1 – Índice de Produtividade da Indústria de Transformação (1999-99)... 51

Gráfico 3.2 – Taxa de Investimento – FBCF/PIB (1980-1999)... 52

Gráfico 3.3 – Participação de Máquinas e Equip. em Proporção da FBCF (1990-99).. 53

Gráfico 3.4 – Participação do Brasil nos Fluxos de IDE (1990-1999)... 54

Gráfico 4.1 – Saldo Comercial e Taxas de Crescimento do PIB Estimado e Observado (1990-1999)... 78

Gráfico 4.2 - Déficit da Balança Comercial e entrada de IDE (1995-1999)... 80

Gráfico 4.3 – Evolução da Balança de Serviços , balança comercial e conta de capital e financeira (saldos) 1990-1999... 82

Gráfico 4.4 – Dívida Externa Registrada em Proporção do PIB (1990-1999)... 83

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Sumário Pág.

Apresentação... 01

Capítulo 1. Comércio Exterior e o Papel das Empresas Multinacionais... 04

1.1. Introdução... 04

1.2. Comércio Exterior e a Teoria das Vantagens Comparativas... 05

1.3. Comércio Exterior e Investimento Estrangeiro: Aspectos de uma Transição... 09

1.4. Os Determinantes do IDE e as EMNs... 10

1.4.1. Os Determinantes do IDE e as EMNs: A Empresa... 11

1.4.2. Os Determinantes do IDE e as EMNs: O Território... 17

1.5. Falhas de Mercado e Custo de Transação... 21

1.6. Resumo... 23

Capítulo 2. Restrições de Financiamento e Capitais Estrangeiros... 24

2.1. Introdução... 24

2.2. Exportações, Investimentos Estrangeiros e Industrialização... 25

2.3. Modelos de Crescimento com Restrição Externa... 29

2.3.1. O Modelo de Dois Hiatos... 29

2.3.2. O Modelo de Thirlwall (original) 38 2.3.3. O Modelo de Thirlwall ampliado pelo Fluxo de Capital... 42

2.3.4. O Modelo de Thirlwall e o Endividamento Externo... 44

2.4. Resumo... 46

Capítulo 3. A Anatomia do IDE no Brasil durante os anos 90... 48

3.1. Introdução... 48

3.2. Características Gerais do Investimento na Economia Brasileira... 50

3.3. Origens, Destinos e Resultados Agregados do IDE na Economia Brasileira... 54

3.4. Fatores Macroeconômicos de Atração do IDE para a Economia Brasileira... 57

3.5. Características do IDE na década de 1990... 61

3.6. A Influência do IDE nas Exportações e Importações Brasileiras... 63

3.7. Resumo... 71

Capítulo 4. Restrição de Divisas e o Crescimento Econômico do Brasil... 73

4.1. Introdução... 73

4.2. Restrição ao Crescimento através da Balança Comercial... 76

4.3. Restrição ao Crescimento e Fluxos de Capitais... 79

4.4. Modelo de Moreno-Brid e Avanços Recentes... 85

4.5. Resumo... 88

Comentários Finais... 90

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Apresentação

O relacionamento entre a economia brasileira e as empresas estrangeiras se imprime na própria configuração do setor produtivo nacional, e surge como o produto de diversas políticas econômicas implantadas ao longo dos anos, que buscavam na internacionalização produtiva o caminho para o desenvolvimento econômico, assim como uma maior inserção internacional. A necessidade de poupança externa, a maior capacidade tecnológica das empresas estrangeiras e a maior participação destas no comércio internacional, frequentemente, eram apontadas como justificativa para a presença do capital externo no país. Até mesmo o processo de industrialização implantado no Brasil tinha em um dos seus pilares as empresas estrangeiras, que conjuntamente como as empresas estatais e de capital nacional formavam o esquema de funcionamento básico da economia.

Com a crise da dívida externa nos anos 80, e sua conseqüente restrição de crédito internacional, o Brasil foi impelido a enfrentar um período de escassez de investimento estrangeiro e de grande estagnação industrial, tanto em termos de produto quando de inovações tecnológicas, o que resultou em uma década caracterizada por baixas taxas de crescimento econômico. Este cenário somente viria a se modificar a partir dos anos 90, em resposta a dois movimentos: no âmbito externo, a volta das condições de liquidez no mercado mundial, proporcionando ao Brasil um novo processo de endividamento externo, utilizado desta vez para a estabilização da economia (grandes somas de capital externo sustentaram, por quase toda década, os crescentes déficits na balança de serviços, a valorização da taxa de câmbio, com o plano Real a partir de 1994, e os déficits da balança comercial a partir de 1995). Já no âmbito interno, as transformações ocorridas no direcionamento da política econômica seguiram as diretrizes internacionais de liberalização comercial e financeira, por meio de um conjunto de mudanças institucionais que visavam favorecer a competitividade (através da abertura comercial e desregulamentação de setores) e redefinir o papel do Estado na economia (através das privatizações).

Embora, a economia já viesse passando por um intenso processo de internacionalização desde o início da década de 1990, em virtude da política de abertura

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comercial, a partir da segunda metade desta mesma década, influenciados pelo processo de privatização, os fluxos de investimentos diretos estrangeiros (IDE) para a economia brasileira passaram a superar a entrada de capitais externos de curto prazo. Essa mudança ensejou um intenso debate a respeito dos efeitos de longo prazo do IDE sobre a economia.

De um lado, uma corrente mais “liberal” via no fechamento da economia, durante os anos 80, a principal causa da crise na indústria brasileira. Essa corrente defendia que através da abertura comercial seria possível dar um “choque de competitividade” na indústria nacional, e que as EMNs, neste contexto, atuariam de forma à complementar este processo. Ainda segundo essa corrente, as EMNs ao trazerem novas tecnologias estariam favorecendo não somente um aumento nos níveis de produtividade doméstica, mas também ajudariam a melhorar a inserção comercial da indústria, na medida em que promoveriam uma melhora na pauta de exportações brasileira.

No outro lado, se encontrava a visão mais “desenvolvimentista” que criticava o automatismo pregado pela visão “liberal”. Para essa corrente, a abertura comercial teria se dado de forma abrupta, sem considerar o tempo necessário para as empresas nacionais se adaptarem ao novo padrão concorrencial que se somava a valorização cambial e ao aperto monetário praticado em virtude do plano Real, aumentando assim a fragilidade financeira das firmas nacionais. Ainda segundo esta corrente, a condução da política econômica gerou um desestímulo ao investimento por parte das empresas nacionais, justamente no momento que os investimentos eram necessários para se fazer frente à concorrência com importados e com as EMNs. Com relação ao comércio exterior, esta corrente argumentava que o aumento do IDE deveria provocar uma piora no saldo comercial, em função das estratégias da maioria das EMNs se voltarem para o atendimento do mercado interno e para a importação de grande parte de seus insumos.

Sendo assim, nosso objetivo nesta dissertação é discutir os impactos dos fluxos de IDE para a economia brasileira, durante a década de 1990, tendo em vista a questão da restrição do balanço de pagamentos. No capitulo 1, apresentaremos uma resenha sobre comércio exterior e atuação das Empresas Multinacionais (EMNs), com destaque para as

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teorias de comércio exterior e determinantes do IDE. No capítulo 2, discutiremos as restrições de financiamento e capitais estrangeiros, considerando: a visão de Prebisch sobre o processo de industrialização de países periféricos e a abordagem dos modelos de crescimento com restrição externa (modelo de dois Hiatos e modelo de Thirlwall, e seus derivados). No capítulo 3, mostraremos as principais características dos fluxos de IDE para a economia brasileira e suas implicações para o nível de investimento global e para as relações de comércio exterior. No capítulo 4, discutiremos os resultados achados pelos modelos de crescimento econômico com restrição no balanço de pagamentos.

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Capítulo 1. Comércio exterior e o papel das empresas multinacionais

1.1. Introdução

A magnitude do comércio exterior e a forma de inserção comercial dos países, pela qual alguns países se inserem como exportadores de produtos mais sofisticados e de maior valor unitário como computadores, por exemplo, e outros se inserem como exportadores de produtos primários e de menor valor agregado, conduziram à elaboração de um rico aparato analítico, tanto no campo teórico a partir da década de 1950 quanto no campo empírico a partir da década de 1980, sobre os fatores determinantes do comércio exterior.

Inicialmente, poderíamos considerar que os países participam do comércio internacional por dois motivos: primeiro, porque são diferentes uns dos outros, ou seja, possuem dotações de fatores diferentes; e, em segundo lugar, através da comercialização os países podem obter ganhos de eficiência na produção. Entretanto, cabe destacar que o comércio internacional surge a partir da interação de uma gama de motivos que levam em consideração não somente a abundância de determinados fatores e as competências associadas às suas utilizações (produtividade), como também refletem as estratégias das Empresas Multinacionais (EMNs) que buscaram, e ainda buscam, através do fracionamento da estrutura produtiva o caminho para atuação em âmbito global.

Nesse capítulo, apresentaremos o desenvolvimento da literatura econômica no que se refere ao comércio e a atuação das Empresas Multinacionais (EMNs). O capítulo está divido em cinco partes, além desta introdução. Na primeira discutiremos o comércio exterior e a teoria das vantagens comparativas. Na segunda, será discutida a relação entre comércio exterior e o investimento externo. Já na terceira seção, serão discutidas as relações entre o Investimento Direto Estrangeiro (IDE) e as EMNs. Na quinta, apresentamos a teoria dos custos de transação. E na sexta, e última, seção faremos um resumo do capítulo.

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1.2. O comércio exterior e a teoria das vantagens comparativas

Na abordagem clássica sobre o comércio exterior, a firma desempenha um papel “passivo” para as relações comerciais entre os países, sendo responsável pela organização eficiente da produção, dada à tecnologia e uma determinada quantidade de fatores. Segundo Ricardo (p.89, 2001) “the same rule which regulates the relative value of commodities in one country, does not regulate the relative value of the commodities exchanged between two or more countries”. Na visão clássica, os fatores de produção carecem de mobilidade do ponto de vista internacional e as relações de troca entre países e/ou regiões e agentes econômicos internos e externos a esses países e/ou regiões se promovem através dos fluxos de comércio internacional tendo por base a formulação das vantagens comparativas, onde:

Under a system of perfectly free commerce, each country naturally devotes its capital and labour to such employments as are most beneficial to each. This pursuit of individual advantage is admirably connected with the universal good of the whole. By stimulating industry, by regarding ingenuity, and by using most efficaciously the peculiar powers bestowed by nature, it distributes labour most effectively and most economically. While, by increasing the general mass of productions, it diffuses general benefits, and binds together by one common tie of interest and intercourse, the universal society of nations throughout the civilized world. (Ricardo, p. 90, 2001).

Em termos simples, a teoria das vantagens comparativas de Ricardo assinala que o comércio internacional levaria à especialização da produção entre os países, de acordo com os custos relativos de mão-de-obra (ou seja, a produtividade do trabalho), e seria capaz de gerar ganhos para as nações que transacionassem entre si. Isto é, um país deveria exportar produtos nos quais tivesse vantagens comparativas relativamente mais elevadas, e importar outros nos quais fosse comparativamente menos produtivo. De modo que através do comércio internacional, ao conduzir à especialização, cada país pudesse deslocar sua mão-de-obra das indústrias relativamente menos eficientes para as indústrias relativamente mais eficientes. Como a mão-de-obra é o único fator de produção e é capaz de mover-se livremente de uma indústria para outra, não há possibilidade de os indivíduos serem prejudicados pelo comércio. De acordo com o modelo, assim como os países, os indivíduos se encontrarão em uma posição melhor do que estavam antes, em virtude do comércio

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internacional. Com essa teoria de vantagens comparativas, Ricardo estabelece os princípios das relações de troca, pelos os quais as nações poderiam obter ganho de eficiência como resultado da racionalidade econômica proposto pela livre escolha. É importante lembrar que o modelo de Ricardo pressupõe que as economias funcionem no pleno emprego.

Em seu modelo, Ricardo considera a mão-de-obra como o único fator explicativo das vantagens comparativas, de forma que as diferenças na produtividade do trabalho entre os países seriam o fator responsável pelo surgimento do comércio entre eles. Contudo, no mundo real, ainda que as trocas sejam parcialmente explicadas pelo diferencial na produtividade da mão-de-obra, elas também refletem diferenças entre as disponibilidades de recursos de cada país. Os primeiros questionamentos teóricos, neste sentido, argumentam que, assim como a produtividade do trabalho é importante para as relações comerciais, outros fatores também devem exercer algum impacto neste aspecto.

Sendo assim, Eli Heckscher e Bertil Ohlin ressaltam que a diferença na produtividade relativa do trabalho (ou dos custos relativos) entre os países se deve ao fato de que estes produzem mercadorias diferentes devido à disponibilidade de diferentes quantidades de fatores1. Esses autores buscaram salientar a importância da disponibilidade de outros fatores, como terra e capital, e do uso proporcional desses fatores na produção de diferentes bens. A teoria das proporções dos fatores2 buscava relacionar: trabalho, capital e terra, na agricultura e na indústria, para avaliar o padrão sistêmico de especialização da produção e do comércio internacional no qual cada país se insere.

Ainda nesta linha, Paul Samuelson, e seus seguidores, elaboraram o modelo Dois-Bens/Dois-Fatores/Dois-Países, ou modelo HOS (Heckscher-Ohlin-Samuelson), que se tornou a pedra fundamental da moderna teoria do comércio internacional. Neste modelo tem-se trabalho e capital, de um lado, e setores exportação e importação-competitiva, por outro. Assim, um país deveria exportar bens intensivos em um fator que fosse relativamente melhor dotado em comparação aos demais países. Por exemplo, sendo trabalho e capital

1

Vale lembrar que a explicação sobre a disponibilidade dos fatores apóia-se na suposição de que cada país tem as mesmas possibilidades tecnológicas de produzir determinada mercadoria.

2

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dois fatores produtivos, poderíamos pensar que um país rico em capital teria em suas exportações bens intensivos em capital, na medida em que esse país rico tenderia a remunerar menos esse fator em relação aos demais, o que provocaria um barateamento na produção de bens intensivos em capital em comparação relativa à produção de bens intensivos em trabalho. Logo, a corrente de comércio de um país rico seria caracterizada pela presença de bens intensivos em capital nas exportações e pela presença de bens intensivos em trabalho nas importações.

Na busca de comprovação empírica sobre a validade do modelo HOS, Leontief (1954)3 encontrou uma relação contraditória, ao postulado pelo modelo, quando calculou a razão das importações e exportações por intensidade capital/trabalho para a economia americana em 1947. O resultado obtido revelou que a razão capital/trabalho para os importados excedia a razão capital/trabalho para os exportados em 60%. Sendo os Estados Unidos considerado o país mais dotado de capital do mundo suas exportações deveriam ter um grau de intensidade capital/trabalho maior do que suas importações. Esse achado ficou conhecido na literatura econômica como o “paradoxo de Leontief”.

Com a descoberta do paradoxo de Leontief, e sua confirmação por outros pesquisadores que repetiram os testes para a economia americana nos anos 1960 e 1970, surgiu uma série de modificações no modelo original de dotação de fatores. Por um lado, buscou-se incluir a hipótese de diferenças na produtividade dos demais fatores, entre os diversos países, como forma de aumentar o poder explicativo da teoria original. E, por outro, surgiram hipóteses de que existem diferenças entre as técnicas de produção dos países, isto é, de que países utilizam funções de produção diferentes. Apesar de todas as modificações, o modelo HOS ainda apresentava limitações em explicar grande parcela dos fluxos de comércio entre os países, sobretudo no que se refere à dinâmica do comércio intra-industrial e o crescente fluxo de comércio entre países com disponibilidade de fatores semelhantes.

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Novos avanços na teoria do comércio internacional passaram a incorporar conceitos microeconômicos, tais como: economias de escala e diferenciação de produto, na análise do padrão de comércio entre os países, principalmente a partir dos anos de 1980. Dentre esses avanços4, destacam-se Helpman (1984), discutindo as relações de comércio internacional a partir das economias de escala, e Krugman (1995), discutindo essas mesmas relações do ponto de vista da diferenciação de produto e da concorrência monopolista. No caso das economias de escala, a idéia principal é que nenhum país consegue produzir toda a variedade de produtos manufaturados de que necessita, e mesmo que pudessem produzir algumas manufaturas, eles estariam produzindo um conjunto de coisas diferentes. Isto é, as economias de escala levam os países a se especializarem em diferentes produtos. Essa explicação ajuda na compreensão do fluxo de comércio entre países com dotações de fatores similares. Nas palavras de Helpman:

“Scale economies drive countries to specialize in different products, which enhances the motives for foreign trade. For this reason they help to explain large trade volumes between similar countries. At the same time economies of scale make it more likely that countries will employ different techniques of production. This is especially so when there are dynamics economies of scale, be they driven by learning-by-doing or investment in research and development” (p. 135, 1999). Já no caso da concorrência monopolista, a idéia básica é que devemos considerar a possibilidade de se estar presente no mercado internacional através de atividades produtivas com rendimentos crescentes de escala. De modo que se o progresso técnico é o principal causador dos rendimentos diferenciados, então devemos atribuí-lo ao fato de que os mercados internacionais são pautados em concorrência imperfeita (na medida em que nos afastamos de uma configuração próxima de concorrência perfeita, a taxa de progresso técnico – inovação, cresce).

Em resumo, o corpo teórico criado pelas diversas teorias do comércio internacional, que buscavam evidências a respeito dos determinantes do comércio entre os países, não apresentam relações excludentes entre si, e sim complementares. Na medida em que existem várias motivações para a existência do comércio internacional, indo desde as

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diferenças entre dotações de fatores (modelo HOS), passando por questões relativas à tecnologia (exógena ou endógena) e aos retornos (constantes ou crescentes) até as estruturas de mercado (monopólio ou oligopólio).

1.3. Comércio Exterior e Investimento Estrangeiro: Aspectos de uma transição

Assim como a teoria do comércio internacional buscava novas explicações para os determinantes do comércio entre os países, a teoria da firma avançava na direção de novas explicações para o comércio e investimento das EMNs. Esse movimento surge, a partir dos anos 50, com objetivo de cobrir as lacunas deixadas pelos modelos de tradição ricardiana que somente consideravam as relações através do comércio. Neste sentido, foram incorporados ao aparato clássico: (i) a idéia do investimento transfronteira com base no diferencial da taxa de juros entre os países e (ii) do investimento externo alternativo às exportações.

Posteriormente, com a introdução de novos elementos, tais como: risco e incerteza, volatilidade de taxas de câmbio, custo de aquisição de informação e transação, entre outras coisas, as explicações do investimento externo baseadas no hiato de juros entre os países começaram a perder espaço. Segundo Horst (1974) a teoria da firma passou a considerar aspectos mais ligados ao livre comportamento do agente econômico firma (EMN); que, por sua vez, passou a assumir papel de destaque na dinâmica do comércio, capaz de “auto-determinar” suas ações com o objetivo de expandir seus lucros. Hymer (1976), já considerava que para uma firma operar internacionalmente era necessário que esta possuísse algum tipo de vantagem especifica, como por exemplo: poder de mercado, tecnologia, etc., de modo a superara as desvantagens de operar em outros países.

Já Vernon (1979), argumentava que o principal determinante para se atuar no exterior é a capacidade “inovativa” da firma. O autor mostra em seu “ciclo do produto” que as vantagens competitivas das firmas norte-americanas está vinculada à capacidade destas em inovar, tanto em produto quanto em processo, que por sua ver, era determinada pela

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estrutura de mercado e pela dotação de fatores da economia norte americana. Ele ainda destaca que a internacionalização da produção surge na fase de amadurecimento e padronização do produto, quando as firmas, em busca de custos menores, optam por produzir no exterior.

Apesar da constatação acima, segundo Markusen e Maskus (2001), somente a partir dos anos de 1980 a concepção de que o IDE era um substituto do comércio internacional começou a ruir. Pesquisas começaram a encontrar evidências que relacionavam este tipo de investimento mais a ativos específicos das firmas do que a medidas de rentabilidade do capital pura e simplesmente.

Vale lembrar que a economia mundial entre 1950 e 1970 foi marcada por dois movimentos importantes para a questão acima: o primeiro se relaciona ao aumento do comércio entre os países, como resultado da recuperação econômica do pós-guerra; já o segundo, surge com o advento da transnacionalização das empresas, que a partir da década de 1970 se coloca como força global e autônoma.

Com isso, a mobilidade de capital ganha tangibilidade através da EMN. A partir deste momento as proposições teóricas que têm por objetivo analisar os determinantes do IDE, realizado por empresas que buscam atuação no exterior, partem de duas fontes de explicação. A primeira, do ponto de vista da empresa, destacando fatores específicos à propriedade e ao licenciamento de produtos. E a segunda, do ponto de vista do território, destacando fatores locacionais, imperfeições de mercado e internalização.

1.4. Os determinantes do IDE e as EMNs

No instante em que uma firma organiza uma estratégia de atuação e passa a atender um determinado mercado externo via instalação de uma subsidiária, esta firma está realizando um investimento direto e se tornando uma empresa multinacional. Definimos, então, uma empresa multinacional como a “firms that engage in direct foreign investment,

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defined as investments in which the firm acquires a substantial controlling interest in a foreign firm or sets up a subsidiary in a foreign country” (Markusen, 1995, p. 170). Esse fato possui diversas implicações, que vão desde alterações no fluxo de comércio até a transferência de conhecimento e alavancagem tecnológica, tanto para o país de origem desse fluxo, quanto para o país hospedeiro. Do ponto de vista dos fluxos de capitais a principal diferença entre os empréstimos estrangeiros e IDE é que o primeiro representa uma transação relativamente simples, na qual a única obrigação do devedor em relação ao credor é o pagamento da dívida. Já o IDE representa não só uma transferência de recursos, mas também a aquisição do controle. Isto é, a filial não tem apenas a obrigação financeira com a empresa matriz; ela é parte de uma mesma estrutura organizacional.

1.4.1. Os determinantes do IDE e as EMNs: A Empresa.

As primeiras teorias a respeito dos determinantes de atuação externa por parte das empresas, como mostram Nonnenberg e Mendonça (2004), estão no trabalho de Ohlin (1933), onde os IDEs eram motivados principalmente pela possibilidade de obtenção de altas taxas de lucro em mercados em crescimento, facilitados pela possibilidade de financiamento a taxas de juros reduzidas no país de origem. Mas também constituíam formas de se transpor barreiras comerciais e garantir fontes de matéria-prima. Essa visão, até então predominante, começou a se mostra inadequada diante das mudanças nos padrões de transações econômicas internacionais provocadas pelo IDE, tanto no que se refere à existência dos IDEs cruzados entre países desenvolvidos quanto as características do comércio externo dos EUA reveladas pelo paradoxo de Leontief.

Era necessária uma nova teoria que fosse capaz de integrar em uma mesma visão o investimento e o comércio internacionais ao novo movimento de expansão das empresas, principalmente das norte americanas, que cada vez mais adquiriam características de multinacionais. Gonçalves (2002) argumenta que a primeira contribuição importante, utilizando o enfoque da organização industrial, foi dada por Edith Penrose em 1956. O argumento básico de Penrose destaca o IDE como conseqüência do processo de crescimento da empresa. A empresa, por excelência, tende a crescer e ao crescer tende a

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diversificar a produção, assim como penetrar em novos mercados internos e externos. Penrose também destaca que empresas bem-sucedidas possuem alguns recursos internos que lhes permitem aproveitar oportunidades de expansão. Ela destaca que capacidade gerencial, conhecimento tecnológico e inovação constituem elementos que criam, em grande medida, as condições para a expansão das empresas. Deste modo, Penrose apresenta a idéia de que uma empresa, a fim de realizar IDE, deve possuir alguma vantagem especial.

Hymer (1976) elabora essa idéia destacando que as empresas estrangeiras engajam-se em operações externas porque têm algumas vantagens que as empresas do país receptor do investimento não têm. Portanto, a “possibilidade de superar a desvantagem que implica sua condição de estrangeira será tanto maior [...] quanto mais rigorosa sejam as condições impostas ao ingresso de outras empresas, quanto mais alto o grau de concentração e maior o privilégio” (Hymer, 1976, p. 20). Esse autor inaugura uma nova tradição no estudo das empresas multinacionais amparado na hipótese de que as empresas tomariam suas decisões de investimento buscando posições competitivas e não necessariamente o lucro de curto prazo. Para ele, o poder de mercado das firmas oligopolistas seria a principal motivação para as firmas investirem no exterior. Seriam ainda necessárias vantagens especiais, encontradas em setores oligopolizados, que proporcionassem barreiras à entrada, dado que empresas locais possuem certas vantagens sobre as empresas estrangeiras, como conhecimento de mercado. Se as EMNs conseguem competir com empresas locais é porque apresentam vantagens especiais como:

(i) Concorrência imperfeita, dada pela diferenciação de produto;

(ii) Concorrência imperfeita no mercado de fatores, por exemplo, acesso a conhecimento patenteado ou próprio, discriminação no acesso a capital ou a diferenças de capacitação;

(iii) Intervenção governamental, como restrições às importações; e

(iv) Economias de escala, internas ou externas, inclusive as dadas por integração vertical.

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Na ocorrência dessas vantagens, as EMNs preferirão atender o mercado externo por meio de investimento externo em vez de exportações. A tese básica de Hymer (das vantagens específicas) foi seguida por outros autores como Vernon, Caves e Kindleberger. Para Vernon (1979) as vantagens competitivas de uma empresa estão amparadas na inovação tecnológica a na busca de redução de custos. Seu argumento realça principalmente “o ritmo do fluxo de inovações, os efeitos das economias de escala e os papéis de ignorância e da incerteza sobre a determinação dos padrões de comércio” (Vernon, 1979, p. 90) que passam a marcar as características do comércio internacional a partir da atuação das empresas multinacionais. Ainda segundo esse autor, qualquer empresa de qualquer país avançado é capaz de ter acesso e de compreender princípios científicos, o que ocorre na verdade é um distanciamento entre o conhecimento de um princípio científico qualquer e sua incorporação em um produto comercializável. Sendo assim, a ligação entre o comércio e o investimento internacionais surge a partir da dinâmica do “ciclo do produto”, que se divide em:

1a fase) Com produtos pouco padronizados. Insumos, processamento e especificações possuem características variadas. Nesta fase os empresários estariam preocupados com a liberdade na escolha de insumos e com a necessidade de comunicação rápida e efetiva com consumidores, fornecedores e mesmos com competidores, com as diferenças nos custos tendo pouca importância;

2a fase) Os produtos já estariam maduros. Nesta fase, a flexibilização se reduziria com a padronização de um conjunto de produtos que possibilitariam alcançar economias de escala através da produção em massa e também permitiria compromissos de longo prazo para alguns processos relacionados a alguns conjuntos fixos de instalações. Os custos de produção começariam a ganhar importância na determinação das características do produto. Dada uma expansão nos mercados internos dos países desenvolvidos, o empresário poderá se arriscar construindo plantas produtivas locais. Em muitos casos, como forma de evitar a perda de mercado, empresas que antes exportavam passam a investir na produção local.

(21)

3a fase) Produtos plenamente padronizados. Nesta fase, países menos desenvolvidos poderiam representar vantagens competitivas, como locais de produção. O baixo custo da mão-de-obra poderia ser um atrativo para o investidor migrar para áreas menos desenvolvidas.

O modelo de Vernon mostra que as inovações são poupadoras de mão-de-obra, por isso surgem em países mais intensivos em capital, em especial os EUA. E gradativamente, a produção vai sendo deslocada para países menos intensivos em capital e, finalmente, para países em desenvolvimento. Ao mesmo tempo, a produção nos países mais ricos vai sendo orientada para novos produtos ligados as últimas inovações de produtos e processos. Assim, as empresas iriam, inicialmente, atender aos mercados pela exportação para, posteriormente, estabelecer representantes comerciais e, finalmente, começar a produzir nos mercados de destino por meio de uma filial. Nesta visão, a internacionalização da produção ocorreria por motivos endógenos à firma5.

Nesta mesma linha, só que modificando ligeiramente a análise de Hymer, ou seja, considerando que a estrutura de mercado determina a conduta das empresas, encontramos Kindleberger (1969), que segundo Calvet (1981), sugere as imperfeições de mercado (concorrência monopolista) como razão para a existência do investimento direto. Nesta mesma linha encontramos Caves e Jones (1973) argumentando que os investimentos diretos irão ocorrer basicamente em setores dominados por oligopólios. E acrescentam ainda que quando houver diferenciação de produtos, poderão ocorrer investimentos horizontais, ou seja, no mesmo setor; e quando não, ocorrerão investimentos verticais, ou seja, de jusante à montante na cadeia produtiva.

“Direct investment is strongly industry-specific. Its economically significant traits arise not so much from the transfer of capital from country A to country B, as from A’s x industry to B’s x industry. Specifically, direct investment flows along two industrial channels. Horizontal investment occurs when a firm producing a product in the source (lending) country establishes a subsidiary to produce the same good in

5

Ver Graham (1998). Neste artigo o autor mostra que as EMNs resultam de interação oligopolista à medida que as firmas crescem, com estratégia de redução de risco.

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the host country. Vertical investment occurs when it establishes a subsidiary to perform the next stage forward, or the next stage backward, in the fabrication and sale of its product. (Caves e Jones, 1973, p. 165).

Se pensarmos que o IDE é somente uma das formas de se explorar vantagens oligo/monopolista em mercados externos, poderíamos ter o seguinte questionamento: por que as empresas que investem no exterior, devido ao fato de possuírem vantagens oligo/monopolistas, não exploram essas mesmas vantagens por meio da exportação ou do licenciamento?

Diante de um questionamento deste tipo, Gonçalves (2002) destaca que o fator mais importante que leva empresas a preferir o IDE, no lugar de conceder licenças, refere-se ao problema da valorização do ativo intangível (tecnologia, por exemplo). Na existência de expectativas diferentes no que se refere ao retorno obtido por meio do uso deste ativo e às imperfeições no mercado de ativos intangíveis, a empresa licenciadora e a empresa licenciada podem avaliar de forma diferente os benefícios futuros. Com isso, existe uma dificuldade em se chegar a um acordo sobre o valor real do ativo, que por sua vez, afeta a decisão da empresa entre usar ela própria o ativo por meio do IDE ou conceder uma licença para o uso deste ativo por parte de uma empresa local.

Uma inovação (por exemplo, um novo produto) pode estar relacionada a um pacote de conhecimento. Não é suficiente ser capaz de produzir um novo produto, mas é necessário saber como servir o mercado. Ou seja, aspectos mercadológicos, tanto em termos de publicidade, mas principalmente de capacidade organizacional especifica ao mercado deste novo produto, podem influenciar no sucesso de mercado deste último. O retorno relativo do pacote como um todo pode ser superior ao somatório dos retornos relacionados a cada um dos seus componentes. Isto é, existem diferenças entre os retornos esperados pelo concessor e pelo concessionário, o primeiro no que se refere ao pacote como um todo e o segundo somente ao que se refere aos componentes que pretende comprar. Neste caso, surgirá a preferência pelo IDE.

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A concessão de licenças também pode acarretar problemas de Risco moral, ou seja, a partir da incapacidade de uma das partes em monitorar de forma eficiente a ação da outra. A transferência de tecnologia, por meio de concessão de licenças, envolve certo risco em termos de controle. Se algum conhecimento é transferido para uma determinada empresa, torna-se necessário proteger o caráter sigiloso e inovador da tecnologia. Espera-se que para proteger o caráter sigiloso, evitando à difusão do conhecimento e a conseqüente perda de uma vantagem monopolistica, as empresas preferiram realizar IDE a conceder licenças. Ainda existe o risco de que um concessionário, usando esta tecnologia, penetre em outros mercados que, de alguma forma, era ocupado pelo concessor.

Outra forma importante de se estimular as empresas a realizarem IDE no lugar de concederem licenças origina-se das políticas governamentais6 orientadas para contrabalançar o poder de barganha das EMNs no processo de negociação dos contratos de transferências de ativos intangíveis. É possível que uma melhor supervisão por parte do governo sobre esses contratos, com o objetivo de reduzir as restrições impostas pelas EMNs, tenda a afetar as decisões dessas empresas na direção do IDE ou, pelo menos, desestimular a concessão de licenças.

Cabe ainda destacar que o tamanho da empresa e seu comportamento gerencial podem influenciar em sua decisão de internacionalização. Empresas podem ser avessas ao risco, seja devido a uma diretoria ou gerência conservadora, seja devido ao seu tamanho (até porque investimentos no exterior demandam certo volume de capital, o que aumenta o risco para uma pequena empresa). Estes aspectos indicam que empresas pequenas e menos agressivas tendem a ter uma propensão a investir no exterior inferior às empresas grandes e dinâmicas.

Para a realização do IDE, as empresas ainda consideram o tamanho do mercado e sua estabilidade. Quando o mercado não demonstra um tamanho satisfatório ou certa instabilidade é razoável supor que conceder licenças a produtores domésticos seja o

6

A respeito do relacionamento entre as EMNs e os países receptores, ver Rugman e Verbeke (1998) – Multinational Enterprises and Public Policy. Neste paper, os autores debatem as relações entre o interesse publico, exercido pelo Estado, e o interesse privado, das EMNs.

(24)

caminho mais apropriado, não somente para se valer de uma margem de lucro advinda de um ativo intangível que é um bem público7 dentro da empresa, como também para testar o mercado para investimentos futuros. Deste modo, é evidente que o território exerce influência sobre o processo de internacionalização da produção e sobre a EMN.

1.4.2. Os determinantes do IDE e as EMNs: O território.

Os avanços mais recentes, ou pelo menos de maior abrangência, têm sido feito no sentido de se integrar em um único corpo teórico a teoria do comércio e do IDE. A idéia central desses desenvolvimentos teóricos é que o comércio, o investimento e o licenciamento são formas de internacionalização da produção, de modo que os fatores determinantes de cada um destes movimentos (por exemplo, dotação de fatores e tecnologia) tendem também a ser os elementos determinantes dos outros movimentos.

Dunning (1993), em seu “paradigma eclético”, propõe explicar os determinantes da internacionalização da produção a partir da integração de diversos condicionantes de atuação das EMNs pela justaposição de três fatores: ownership, locational e internalization. Dunning assume que as EMNS têm vantagens competitivas, derivadas da posse de ativos específicos (vantagens de propriedade), sobre as principais concorrentes, e que elas irão buscar tirar proveitos destas vantagens, estabelecendo unidades produtivas em locais que lhes ofereçam vantagens de localização.

Ainda segundo Dunning, as implicações da atuação das EMNs para o país receptor irão depender da natureza e da magnitude das vantagens específicas de propriedade das firmas e das características do país onde a filial da EMN será instalada. Cabe mencionar, um aspecto interessante do “paradigma eclético” de Dunning é que essas vantagens não operam de forma independente e sofrem, ao longo do tempo, alterações e se influenciam mutuamente. São elas:

7

(25)

(i) Ownership (vantagens de propriedade) - As EMNs possuem ativos que as

diferenciam daqueles possuídos por empresas locais, de modo que o impacto do IDE sobre a economia local irá depender, em parte, da natureza desses ativos. Essas vantagens podem ser existentes (conhecimento a respeito de produtos mais sofisticados, técnicas de produção mais avançadas, acesso vantajoso a fontes de matérias-primas, etc.) ou potenciais (como habilidade de criar novas tecnologias, patentes, design, etc.). É importante lembrar que algumas vantagens estão diretamente ligadas ao fato de essas empresas atuarem em diferentes países, de modo que, quanto maior o número e a diversividade de ambientes econômicos em que elas operam, maiores são as chances dessas firmas tirarem vantagens de diferentes dotações de fatores e situações de mercado. Outros tipos de vantagens de propriedade de uma empresa, diz respeito aos conhecimentos associados à comercialização, como: acesso a rede de distribuidores, garantias de qualidade (marcas, por exemplo), etc. Cabe destacar que o ponto central, comum a todas essas vantagens, é que essas podem ser transferidas rapidamente para as filiais, no momento de sua instalação, o que lhes fornece vantagens competitivas instantâneas sobre suas concorrentes locais.

(ii) Locational (vantagens de localização) - As vantagens de localização de um

determinado país são dadas através de suas características físicas (quantidade e qualidade de matérias-primas, posição geográfica, etc.), do tamanho de mercado em relação a outros países, rede de fornecedores, pelo padrão de competição das firmas dentro da indústria e seus consecutivos impactos sobre as estratégias de inovação e competição da firma doméstica, pela qualidade (e custo) da mão-de-obra, etc. Além de aspectos que levem em consideração os ambientes sociais, políticos, jurídicos e comerciais (estruturas de mercado, legislação e políticas governamentais8); e

(iii) Internalization (vantagens de internalização) - Essas podem surgir das

vantagens de propriedade. E resultam da coordenação o uso de ativos

8

(26)

complementares como “ganhos de transação”, derivados da governança comum de uma rede de ativos localizados em diferentes países. Vale ressaltar que as vantagens de internalização estão diretamente ligadas à existência de falhas de marcado e seus impactos sobre os custos de transação com que as empresas se defrontam.

Para o autor é da relação entre vantagens específicas (relativas à propriedade) e vantagens de localização (relativas ao país receptor) que surge a base das estratégias de investimento das EMNs. Dunning (1993) parte da idéia de integração associativa nas ações das EMNs para sugerir uma classificação do IDE conforme quatro tipos projetos9:

(i) Market-seeking projects: está ligado a projetos de investimentos com o objetivo

de atender o mercado interno dos países receptores de IDE. Este tipo de investimento possui efeito de substituição de importação. Podem ainda resultar em uma dinâmica de comércio, quando as novas subsidiárias instaladas utilizam produtos intermediários do país de origem no seu processo de produção;

(ii) Efficiency-seeking projects: este tipo de investimento busca menores custos de produção. Isto é, esse tipo de IDE busca racionalizar a estrutura produtiva, utilizando economias de escala e escopo através da gestão unificada de atividades produtivas dispersas. O IDE com essa característica é criador de comércio ao nível da firma, pois visa ganhos de produção baseados em uma estratégia de atuação internacional. Podendo atender tanto ao mercado interno quanto ao mercado internacional;

(iii) Resource-seeking projects: esse tipo de IDE busca o acesso de matérias-primas e mão-de-obra a preços mais baixos, relativamente. Esse tipo de IDE, geralmente, está ligado à atividade exportadora de produtos intensivos em recursos naturais ou energia, disponíveis nos países receptores; e

9

Cabe destacar que essas ações não são, necessariamente, exclusivas. Muitas EMNs possuem objetivos plurais que conjugam algumas destas categorias.

(27)

(iv) Asset-seeking projects: esse tipo de IDE está ligado a obtenção de ativos estratégicos por parte das EMNs através da instalação de novas plantas produtivas, fusões, aquisição, ou operações de joint ventures. Essa estratégia busca a iteração entre os ativos já existentes pela lógica da propriedade comum para atuar em mercados regionais ou globais.

Nos desenvolvimentos recentes da literatura as EMNs transformaram-se nos agentes mais importantes na configuração do padrão de comércio entre os países, integrando mercados e promovendo o uso mais eficiente dos recursos. O IDE poderá aumentar ou substituir exportações do país de origem, dependendo da inserção externa de sua filial no país hospedeiro. Isto se esta filial realizar exportações, mesmo em mercados terceiros, poderá deslocar as exportações do país de origem para essa economia. Esta é uma, dentre tantas, possibilidades de atuação das EMNs. No caso dos países em desenvolvimento, entre os principais benefícios possíveis decorrentes da atuação das EMNs, temos: a possibilidade de se transpor barreiras de acesso a recursos e mercados externos, alavancagem tecnológica pelo fato de que o IDE traz consigo um “pacote” tecnológico superior ao encontrado nas empresas domésticas, etc.

Ainda nesta linha, Lall e Mohammad (1993) argumentam que as EMNs podem ser agentes de crescimento das exportações em países em desenvolvimento, na medida em que essas empresas são líderes em inovação e diferenciação de produtos, têm acesso aos maiores mercados do mundo e possuem recursos financeiros e comerciais para explorar comercialmente as bases de produção desses países. Contudo, ainda segundo os autores, dada a natureza dessas vantagens, a contribuição final das EMNs sobre as exportações deverá ser maior, quanto mais avançado (em termos industriais e tecnológicos) for o país. De modo que a propensão a exportar dessas empresas deve variar mesmo entre os países em desenvolvimento.

Vale ressaltar que nessa literatura o principal problema associado à atuação das EMNs diz respeito às divergências de interesses entre os países em desenvolvimento e as

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políticas comerciais específicas dessas empresas, que podem ter efeitos indesejáveis sobre o comércio dos países hospedeiros10.

1.5. Falhas de Mercado e Custos de Transação.

Como ressaltado anteriormente, de acordo com a ótica microeconômica a atuação da EMN é vista como uma resposta às imperfeições de mercado. Essas imperfeições de mercado, sobretudo, as imperfeições relativas a produtos intermediários lavam ao surgimento da EMN por meio do processo de internalização das vantagens específicas à propriedade. Sendo assim, o dilema que se coloca para as empresa é exportar ou realizar IDE por si mesma, ou licenciar sua produção para outra.

A teoria da internalização busca mostrar que algumas atividades transfronteiras são organizadas através de hierarquia, e não por meio de forças de mercado. Esse ramo da literatura baseou-se nos trabalhos11 de Ronald Coase em 1937, intitulado The nature of the

Firm, e de Oliver Williamson em 1985, intitulado The economic institutions of Capitalism.

O núcleo de argumentação dessa linha de pesquisa é que, dada uma determinada dotação de fatores entre os países, a atividade internacional da firma será diretamente relacionada aos custos de organização dos mercados externos de produtos intermediários.

Nonnenberg e Mendonça (2004) mostram que essa linha de pesquisa foi desenvolvida a partir de Buckley e Casson (1976 e 1971) e Buckley e Ghauri (1991) que ao explorarem esta hipótese argumentaram que os custos de transação são maiores quando a administração é feita por empresas diferentes. A teoria da internalização dos custos de transação se baseia na organização de interdependência entre indivíduos, sendo que esses indivíduos podem gerar benefícios comuns, através da conciliação de interesses, possuindo competências similares ou diferentes. Isto é, uma EMN tende a ser mais eficiente do que mercados e contratos na organização de interdependências entre agentes localizados em

10

A esse respeito, ver Dunning e Narula, 1997, pp. [03-04].

11

Ver Fiani, R. (2002), cap. 12, pp. [267-286]. Para uma discussão mais detalhada sobre a teoria dos custos de transação.

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diferentes países. Hennart (2002) mostra o exemplo em que: uma firma A, que possui um sistema de distribuição e uma estrutura produtiva estabelecida em seu próprio país, está em busca de licenças estrangeiras para produzir e distribuir produtos complementares; nesse instante uma firma estrangeira que já tenha desenvolvido tais produtos poderia vender a tecnologia para a firma A a um custo marginal baixo. Ainda que a cooperação seja lucrativa para ambas as partes, os custos advindos do processo de barganha levaram a situações sub-ótimas, de modo que as firmas não extrairão toda lucratividade da cooperação.

Ainda segundo Hennart (2002), essa relação sub-ótima surge pelo fato de os agentes econômicos sofrerem de limitações cognitivas (possuem racionalidade limitada) e agirem de forma oportunista. Sendo assim, a EMN ao integrar mercados seria capaz de reduzir os custos de transação. Contudo, para que essa integração seja mais eficiente do que a organização via forças de mercado, as EMNs devem encontrar uma forma de organizar essas interdependências de modo que os benefícios superem os custos da auto-organização.

Gonçalves (2002) argumenta que existe um esforço em apresentar o enfoque da internalização como uma teoria geral do IDE e da EMNs, embora seu impacto em termos de consolidação de um paradigma seja um tanto limitado. Alguns autores classificam essa abordagem como variante do enfoque da organização industrial ou dos ativos intangíveis, outros mencionam que essa abordagem negligencia os aspectos macroeconômicos do IDE, tanto no país investidor, quanto no país receptor do investimento. E ainda existem aqueles que se quer enfatizam tal conceito (da teoria dos custos de transação). Gonçalves sugere que essa abordagem da internalização é um conceito à procura de uma teoria, visto que permanecem dúvidas importantes referentes à capacidade de síntese em explicar e prever o comportamento da EMN.

(30)

1.6. Resumo

Mostrou-se neste capítulo que as teorias do comércio internacional de inspiração ricardiana, baseadas em dotações de fatores, passaram por diversas modificações ao longo do tempo com a finalidade de comportar as novas características do comércio entre os países. Elementos como: concorrência monopolista, economias de escala, etc. foram incorporados aos modelos da “nova” teoria do comércio internacional. Em paralelo a esse movimento, a teoria da firma avançava na busca dos determinantes dos investimentos e do comércio das EMNs, argumentando que esses eram influenciados pelo hiato de taxa de juros entre os paises ou surgiam como substitutos do comércio exterior.

No entanto, como destacam Markusen e Maskus (2001), a partir dos anos 80 a concepção clássica do IDE como substituto ao comercio internacional ou determinado exclusivamente pelo hiato de juros entre países começou a ruir. Os avanços posteriores foram no sentido de integrar em um único corpo teórico a teoria do comércio e do IDE. Neste sentido, foi possível, através do paradigma eclético de Dunning, entender os fatores motivadores que levam uma empresa a se “aventurar” em atividades no exterior. Isto é, uma empresa buscará atuar no exterior sempre que possuir vantagens de propriedades que se conjuguem com as vantagens de localização do país receptor do IDE. E, a partir da observação destas vantagens, cabe a empresa decidir internalizar os custos de transação do mercado de bens intermediários ou conceder licenças de produção.

Mostrou-se também que as vantagens que determinam a atuação das EMNs: vantagens de propriedade, localização e internalização, não atuam de forma estanque uma das outras, mas sim em conjunto. E que a partir da interação entre essas vantagens, as EMNs decidem suas ações: Market-seeking, Efficiency-seeking, Resource-seeking e

Asset-seeking. Por último, discutimos as falhas de mercado através teoria da internalização do

(31)

Capítulo 2. Restrições de Financiamento e Capitais Estrangeiros

2.1. Introdução

Na visão de Raul Prebish (2000a) sobre o “desenvolvimento periférico, o estudo do ciclo econômico tem que ocupar lugar especialíssimo. Isto porque, se a escassa mobilidade dos fatores produtivos, à medida que se vai propagando o progresso técnico, é suficiente para nos explicar como se vão processando as grandes diferenças entre a renda dos centros e da periferia, essas diferenças se formam, precisamente, durante o movimento cíclico. É como se o ciclo fosse, na realidade, a forma de crescimento das economias capitalistas” (p.157).

Ainda segundo o autor, em fases ascendentes do ciclo, normalmente, é observado um deslocamento das relações de preço em favor dos produtos primários; mas, em geral, nas fases descendentes, é observada uma perda em maior magnitude do que os ganhos proporcionados em fases de expansão. Assim, a relação de preços sofre, a cada depressão, uma queda em nível mais acentuado do que o aumento proporcionado nos períodos de prosperidade, de modo que através das dinâmicas dos ciclos se desenvolve uma tendência contínua ao agravamento dos termos de intercâmbio entre países industrializados e não-industrializados.

Prebisch mostrou que os efeitos do livre comércio, decorrentes da tendência contínua à deterioração nas relações de troca, são adversos para as economias primário-exportadoras. E sugeriu o caminho da industrialização como a forma de reversão a esta tendência. Neste sentido, as exportações são consideradas fatores de financiamento estratégicos para o crescimento econômico sustentado, que seria possibilitado a partir da importação de bens de capital e bens intermediários necessários ao processo de industrialização. Pois, as exportações permitem superar as restrições de divisas impostas pelo “jogo da troca”, entre países industrializados e não-industrializados.

(32)

Neste capítulo, analisaremos a questão da restrição de divisas a partir de modelos de crescimento econômico com restrição no balanço de pagamentos, na tradição keynesiana. O destaque destes modelos, diferentemente dos modelos de corte neoclássico, está na ênfase dada à demanda, que tende a ser um fator determinante para o crescimento econômico. O capítulo está organizado em três seções, além desta introdução. Na primeira seção serão apresentados os argumentos de Prebisch em favor da industrialização, destacando o papel das exportações, assim como do investimento estrangeiro, para este propósito. Na segunda seção apresentaremos os modelos de crescimento com restrição no balanço de pagamentos (modelo de dois hiatos, modelo Thirlwall original, modelo Thirlwall ampliado pelo fluxo de capital e o modelo de Moreno-Brid, que considera o endividamento externo). A terceira, e última, seção é um resumo do capítulo.

2.2. Exportações, Investimentos Estrangeiros e Industrialização

Na análise do processo de crescimento econômico dos países menos desenvolvidos, Prebisch (2000b), destaca que com assimilação de novas formas de produção, vindas de países mais desenvolvidos, surgem também mudanças na demanda dos países menos desenvolvidos no sentido de um comportamento similar. A explicação para esse comportamento se baseia no fato de que com o aumento da renda per capita, a partir de certos níveis mínimos, a demanda por produtos industrializados tende a crescer mais do que a de alimentos e outros produtos primários. Da mesma forma que na relação comercial entre centro e periferia, com o passar do tempo, os países mais desenvolvidos tendem a ter uma taxa de crescimento em suas importações menor do que a de países menos desenvolvidos, dado um aumento na renda interna desses países em igual proporção. Isso, não somente porque existe uma tendência natural, com o progresso técnico, de se substituir produtos naturais por produtos sintéticos e novos materiais, mas também porque produtos primários possuem uma elasticidade-renda da demanda menor do que a de produtos industriais.

(33)

A magnitude desta disparidade dinâmica entre as importações e exportações de países menos desenvolvidos12, conduziu Prebisch à defesa do processo de industrialização, através do qual, países menos desenvolvidos poderiam ter um ritmo de crescimento econômico superior ao ritmo de crescimento de suas exportações (de produtos primários), dado que a demanda por produtos industrializados cresce, pelo menos, em igual proporção ao aumento da renda. Ainda segundo Prebisch:

“ (...) é fato bastante conhecido que, através da industrialização, os países latino-americanos tendem a crescer com um ritmo superior ao de suas exportações. E, como sua capacidade de importar depende fundamentalmente dessas exportações, é evidente que a renda real desses países, de um modo geral, tende a crescer com mais intensidade do que a capacidade de importar. Daí se depreende, é claro, que esse volume considerável de importações, que aumenta com uma intensidade igual ou maior que a da renda real, não poderia realizar-se se outras importações não fossem comprimidas na medida necessária para que o conjunto não ultrapassasse de maneira persistente a capacidade de importar, a menos que o excesso fosse coberto por investimentos estrangeiros” (2000b, p. 186)13.

Com relação aos investimentos estrangeiros, apesar de seu fluxo reduzido como já mencionado por Prebisch (na nota de pé de pagina no 13), podemos deduzir, segundo a visão deste autor, que o investimento estrangeiro poderia gerar dois tipos de impacto: (i) seria um caminho direto de se substituir importações, caso o investimento estrangeiro viesse para a indústria na forma de IDE, inclusive com capacidade de gerar divisas pelas exportações realizadas a partir destas indústrias, e (ii) os investimentos estrangeiros poderiam atuar no relaxamento da restrição de divisas, o que daria a possibilidade de o país

12

Bielschowsky (2000, p. 28) destaca a “tese da tendência à deterioração dos termos de troca (...) afrontava o postulado liberal das virtudes do comércio internacional livre. E que, ao contrário do que prometia a teoria das vantagens comparativas, durante o século XX a maior lentidão no progresso técnico dos produtos primários em relação aos industriais não estava motivando o enriquecimento dos primeiros em relação aos últimos”

13

“Estes [capitais estrangeiros], na verdade foram muitos reduzidos desde a crise mundial. Daí o fato de que o crescimento dos países latino-americanos só ter-se podido realizar na medida em que, de um modo ou de outro, foram-se efetuando as transformações indispensáveis na estrutura das importações.” (Prebisch, op. cit., p. 186)

(34)

seguir no caminho de industrialização através da importação de bens de capital e intermediários.

Os argumentos de Prebisch sugerem, na verdade, que a industrialização seria a forma de se deslocar o eixo dinâmico da economia do setor exportador (externo) para a indústria (interno). O autor, certamente, estava consciente de que o esquema teórico de crescimento econômico (neo) clássico não contemplava a industrialização de novos países e que a industrialização seria o único meio dos países menos desenvolvidos (não industrializados) captarem parte do fruto do progresso técnico e elevarem progressivamente o padrão de vida da população. Prebisch afirmava ainda que o crescimento econômico de países menos desenvolvidos não deveria estar subordinado ao ritmo de suas exportações, o que não significa descartá-las. Ao contrário, as exportações deveriam fornecer os meios para que se pudesse pagar a importação de máquinas e equipamentos, diversificar estrutura produtiva, assimilar novas tecnologias e, de um modo geral, sustentar as mudanças capazes de impulsionar o crescimento econômico.

Contudo, como mencionado no capítulo 1, a partir da metade dos anos 50 ocorreu uma mudança no ritmo e na forma do movimento internacional de capitais e na organização das grandes empresas em busca de atuação no exterior. Com o advento das EMNs houve mudanças significativas no que se refere à intensificação dos investimentos industriais em todo o mundo, distorcendo, de certo modo, a relação centro-periferia vista por Prebisch. Segundo Bielschowsky (2000), frente a este movimento e a “dificuldades crescentes no balanço de pagamentos [de muitos países em desenvolvimento], determinadas pelo final de guerra da Coréia, a idéia do estrangulamento externo reaparece relacionada à discussão sobre a conveniência de estimular a entrada de capitais estrangeiros privados, ou seja, de não restringir-se à busca de capitais provenientes de recursos públicos” (p. 31). Ainda segundo autor, “Prebisch defendia este estimulo, mas chamava a atenção para o perigo de se expandir os passivos externos dos países e submetê-los exageradamente ao peso de seu serviço, pelo que seria mais prudente ampliar o financiamento de agências oficiais” (loc.

(35)

Em relação à idéia do estrangulamento externo, Prebish, mesmo reconhecendo a funcionalidade potencial do capital estrangeiro, via com cautela a contribuição desse tipo de capital. Em seu texto, O desenvolvimento econômico da América Latina e alguns de seus

problemas principais, ele defendia a tese de que se os investimentos estrangeiros fossem

bem encaminhados contribuiriam para o aumento imediato da produtividade por trabalhador, complementando a poupança nos esforços de formação do capital necessário à industrialização e ao progresso técnico da agricultura. Cardoso ao analisar o papel do capital estrangeiro no pensamento de Prebish, conclui que:

“Nas formulações iniciais de sua doutrina, ele aparece como recurso pró-tempore: é necessário aumentar a formação interna de capitais para elevar a produtividade e o Estado é o agente de aceleração deste progresso; como, entretanto, existem distorções (inflação, alta propensão ao consumo, etc.), recorrer-se-á ao capital estrangeiro” (Cardoso, 1995, pp. 57-58).

Logo, reconhecia-se sua importância como indutor de progresso técnico, embora fosse recomendada uma política seletiva de admissão, capaz de impedir a adoção de padrões de consumo incompatíveis com a necessidade de acumulação reprodutiva, e que orientasse um caminho de desenvolvimento envolvido pelo sentimento de autonomia nacional.

Por último, vale lembrar que os fluxos de financiamento externo para países em desenvolvimento mudaram significativamente a partir dos anos 60, quando instituições financeiras privadas passaram a dominar os fluxos de empréstimos internacionais. Da mesma forma que os fluxos de IDE mudaram, quando as EMNs passaram a fragmentar suas estruturas produtivas. Como o aumento do grau de endividamento, em geral, decorrente das crises do petróleo e do aumento da taxa de juros americana, muitos países da América Latina encontraram, no início dos anos 80, grandes dificuldades para garantir o serviço de seus passivos externos. Com está crise da dívida externa, a questão do financiamento do crescimento e o comércio internacional foram inscritos em uma nova perspectiva.

(36)

2.3. Modelos de Crescimento com Restrição Externa

Do financiamento externo, originado por investimentos e/ou por empréstimos externos, decorre a questão da sustentabilidade da trajetória de crescimento com déficit externo, sendo que esta deve se manter em determinadas condições para que o passivo externo da economia esteja relativamente sob controle e não siga um caminho explosivo14. Como é ressaltado por Prebish (2000b) o passivo externo pode gerar problemas para o país receptor na medida em que com o aumento da massa de capital externo, crescem seus serviços financeiros, que passam a demandar proporções cada vez maiores de recursos provenientes das exportações, e quanto mais se amplia à proporção desses serviços, menor será a margem para a importação de bens de capital com esses recursos.

2.3.1. O Modelo de dois Hiatos

A preocupação com a restrição externa ao crescimento econômico de países periféricos foi levantada por Chenery, que desenvolveu e, posteriormente15, formalizou o modelo de dois hiatos durante os anos de 1960. Nos anos 80 esse modelo voltou a ser debatido, por ocasião da escalada dos juros internacionais, aumento do grau de protecionismo por toda a parte e desaceleração do ritmo de crescimento econômico.

Uma versão do modelo de dois Hiatos, baseada em Chenery e Bruno (1962), mostra a existência de dois entraves importantes ao investimento: o hiato de divisas e o hiato de poupança. O modelo de dois hiatos, inspirado no modelo de crescimento de Harrod-Domar16, parte da relação entre crescimento econômico e oferta de poupança, incorporando o conceito de “estrangulamentos externo17” desenvolvido pela CEPAL. Nesse modelo, um país que possui limitações no acesso ao mercado de capitais internacional, por falta de credibilidade quanto sua capacidade de pagamento, pode encontrar restrições ao crescimento de sua economia. Isto porque, ao mesmo tempo em que suas importações são

14

Esse assunto será retomado no capítulo 4.

15

A formalização do modelo de dois hiatos foi apresentada em Chenery e Bruno (1962).

16

Streeten (p. 254, 1974).

17

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