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SUMÁRIO DE UMA EXPOSiÇÃO NA UAL
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SONHOS DE VIDA
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RELATOS DE VIAGEM
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Pessoas e sítios,
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fotografias.
6.
Relatos e registos
de viagem
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Viagens nos sons.
VIAGENS
Des
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e tempos
imemoriais
que as viagens fazem parte da acti
v
idade
humana
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Afaceta nómada manteve-se em deslocações comerciais, nos seus itinerários por terra, via fluvial ou marítima, religiosas, através das peregrinações, político-militares, através dasguerras edas Cruzadas.
Projectos individuais oufinanciados por monarcas ouburgueses com fins diplomáticos ede exploração de novos territórios, dessas
viagens permaneceram registos, sobretudo escritos, raramente desenhados, dos quais se destaca odeMarco Polo, comerciante, embaixador e aventureiro, autor deOlivro deMarco Polo.
Aobra-prima daliteratura portuguesa, expoente daepopeia, Os Lusíadas,étambém oresultado das viagens deLuís de Camões a África e aoOriente.
O século
xv
e o Renascimento trouxeram aviagem por prazer, conhecimento e valorização, equesetornou uma prática comum a alguns escritores, pintores e,mais tarde, aantropólogos, fotógrafos einvestigadores.Aexposição apresenta apenas alguns destes viajantes e uns tantos dosseus registos, reflexões e testemunhos, que assim setornararr partilhas intemporais de conhecimento, mas também de momentos de superação doslimites da condição humana, sobretudo aqueles
que nos são postos pelas barreiras geográficas eculturais, pelo espaço e pelo tempo.
Aviagem éuma oportunidade para viver muitos e diferentes acontecimentos, e desses momentos nascem novasexperiências, novos
horizontes devida, outras vidas até.
Mãosdenoiva pintadas com henna. Bangalare, índia.
Oviajante voluntário encara a viagem com alegria eisso predispõe-no àcuriosidade e receptividade, ampliando oseu universo evivências, que posteriormente comparte com os outros.
Oêxito das chamadas leituras ecinema de viagem, nasformas também de
documentá rio, ilustrações efoto reportagem, acentua o gosto generalizado pela preparação de itinerários evisitas epela expectativa de concretização desonhos
nodecorrer davida, com paragem obrigatória noverbo surpreender.
Noseguinte excerto deAsCidades Invisíveis,ítalo Calvino (1923-1985) usaas
viagens de Marco Polo(1254-1324) como veículo do efeito libertador, que se procura num relato de viagem:
-Viajaspara reviveroteupassado?
Eraagoraa pergunta do Kan, quetambém podia serformulada assim. -Viajaspara achar
o
teu futuro?E a resposta deMarco.
-Oalgures éum espelhoemnegativo. Oviajante reconhece opouco queéseu,
descobrindo o muito quenãotevenem terá.
Kublaipergunta aMarco:
-Quandotornaresaopoente, repetirás àtuagenteasmesmas históriasquemeconta
a mim?
-Eufalo- diz Marco, - masquem meouvesófixaaspérolas que deseja.
Quemcomanda oconto não éa voz.éo ouvido.
Representação deMarco Palo num mapa doseculo XVI
Neste livro, Marco Polo, considerado como o maior viajante desempre, descreve aoimperador KublaiKan asmuitas cidades que conheceu nodecorrer das suas viagens. Osoberano, com muitas outras fontes deinspiração, prefere asdescrições doveneziano com asque mais estimulam o seu imaginário.
No domínio do excêntrico edo surpreendente, esendo Portugal opaísdos Descobrimentos, muitos foram osviajantes e exploradores
que encantaram osseus contemporâneos e sobreviveram aosséculos através das suas narrações.
Fernão Mendes Pinto 1c.1509-1583] foium deles. Viajante eaventureiro partiu para aíndia carregando osonho de fazer fortuna como
lastro. Por vinte anos se perdeu no Oriente, bem longe dos locais onde nascera [Montemor o Velho] ouviria afalecer [AlmadaJ. tendo
sido dos primeiros portugueses a chegar aoJapão, com S. Francisco Xavier e outros Jesuítas.
Após ter regressado a Portugal escreveu aobra Peregrinação, considerada uma obra-prima da literatura de viagens, eque
consubstancia vinte anos da suavidacomo património dahumanidade, nãoobstante suspeitar-se que ooriginal seria ainda mais prodigioso, tendo sofrido cortes para que aInquisição permitisse asua publicação.
A surpresa das suas descrições eradetal forma que se consideravam exageradas esobre ele se criou um ditojocoso, associado aoseu
nome: Fernão,Mentes? Minto.
Sem problemas com as autoridades religiosas, um contemporâneo deFernão Mendes Pinto, quetambém viajou para oOriente, dedicou
asua obra aosoberano português, aquem teveoprivilégio de aler. Diz-se quesó ofuturo podereconhecer umgénio e omundo afirma
que Luís deCamões foi um deles. Quando Vasco da Gama partiu para aíndia sonharia que a sua viagem seria umdos maiores marcos
daHistória da Humanidade?
Porentre ventos, cordas, marés e medos ter-lhe-á ocorrido que alguém usaria asua aventura como panodefundo para escrever um
dos mais belos poemas do mundo?
Desde que viram aluzdo dia, em 1572, perdeu-se a conta às edições de Os Lusíadas, porém, deentre elas, destaca-se acélebre
emonumental edição doMorgado deMateus, cujo trabalho de composição, desenhos e estampas são obras deourivesaria tipográfica,
publicada em Paris em 1817.
Fazendo uso da sua fortuna pessoal reuniu um elevado eímpar nível artístico ao conseguir a colaboração deprestigiados artistas
gravadores como Lignon, Forssell, Massard, Oartman, Henri Laurent, Bovinet, Pigeot, Forster, Richomme eL.Visconti.
Sobadirecção artística doBarão de Gerard, trabalhou também PaoloToschi, cuja missão consistia emverificar aperfeição dasgravuras
eautorizar asuaimpressão.
Os originais foram criados por notáveis pintores, como opróprio Barão de Gerard, pintor real deLuís XVIII,Alexandre-Évariste
Fragonard eAlexandre-Joseph Desenne.
Desta edição excepcionalmente dispendiosa, cerca de 52 mil francos, foram feitos 210 exemplares, dos quais 179 foram oferecidos pelo
Morgado de Mateus às mais ilustres e nobres pessoas, como todos os soberanos da Europa e osmais eminentes políticos do mundo
doinício doséc. XIX.
Éuma edição degénio eestá à altura doautor, patrono daUniversidade Autónoma deLisboa.
Éuma Universidade, nomeadamente adeErlangen, naAlemanha que guarda um auto-retrato deum dos pesos-pesados dapintura
alemã e que transita do século XVpara o XVI,em companhia de merecida fama: AlbertDürer [1471-15281.
Viajante curioso eatento ao carácter depovos e lugares usao desenho e a aguarela noregisto de momentos evisões das suas viagens.
Aguarela deDürer, pormenor deO viajante desenhador
Para Dürer, um humanista, tudo era significativo, tudo eradigno de ser representado: um torrão de-e~", ::~ =.:-=S 5 .=s:-es. um
rosto, uma lebre, uma paisagem. No conjunto dassuas impressões de viagem sobressai, pela represe-:2:3: Ss-=-i::2 25_3 primeira viagem aItália eà Áustria em 1496, asaguarelas nosAlpes, em Innsbruck, oCastelo de rcc. --=-:: = ~-2_-"'-:"'.
Nuremberga, acidade que lhe albergou onascimento e a morte física.
Dürer é um relator de panoramas, espiaabertamente o detalhe como umilustrador científico e a. s:a ::::
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Desenho apastel deW.Turner. Itália
Cerca de dois séculos mais tarde encontramos um viajante
sazonal, caracterizado por particularidades como o facto de viajar sozinho, façanha de relevo na época, e pela sua extrer
precocidade - atingiu a fama com 15anos: opintor inglês
William Turner [1775-18511. nos meses de Verão, realizou difíceis viagens pela Europa continental até à Dinamarca eà Boémia, desenhando e aguarelando diariamente nos SeL
cadernos.
Alguns destes apontamentos de viagem eram posteriormen
desenvolvidos em pinturas a óleo sobre telas na sua oficina
Londres. Registou paisagens na Bélgica, Luxemburgo,
Alemanha, Áustria eItália, sendo o Vale de Aosta um ponto,
da sua produção, cuja beleza deixou marcas indeléveis ao pintor, econtinua a deixar em todos quantos ovisitam, especialmente para esquiar.
Ese Turner elegeu o Vale de Aosta como matéria privilegiada a reproduzir, um expoente da pintura francesa e do Romantismo afim
que Nem sempre apintura precisa de um tema.
Palavras de EugeneDelacroix [1798-18631 que divagou pela Europa eNorte de África, preenchendo os seus cadernos de viagem com apontamentos desenhados e pintados a aguarela e comentários escritos nas terras quentes de Marrocos, Tunísia e da Argélia, send as imagens expostas retiradas do seu Álbum daÁfrica do Norte e de Espanha,editado em 1832 e cujo original está no Museu do Louvt
EugeneDelacroix ÁlbumdaÁlrica do Norteede Espanha.
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Carta dePaul Gauguin enviada a partir doTaiti ao seu
amigo de Paris, George-Daniel deMonfreid. Abril de 1896
121 BOLETIM N.' 9 -A ARTE 00 OFíCIO
Se Delacroix vivesse na actualidade seria considerado um
travelsketcher,designação que se atribui aJoão Pancada Cor cujos cadernos de viagem são um passaporte para qualquer
dos países que já visitou.
o
pintor francês e o arquitecto português mesclam todas aspossibilidades que uma página em branco dá a um artista
e oresultado é invejável, erecorda-nos olivro Um Episódio
naVida do Pintor Viajante,de César Aira, quando dizA viagem
eodesenho entrelaçavam-se como uma corda..
Osviajantes de tempos idos sempre mantiveram um hábito,
urna.tradição, que se materializava em ansiedade para os qt
ficavam: enviar notícias.
Assim, as cartas são veículos imemoriais de registo de impressões e de imagens .
Odesenho ou a aguarela enriquecem-lhes a escrita,
contextualizando as palavras e oseu significado, dando-nos oprivilégio de partilhar a intimidade que uma carta sempre transporta, como no caso da que opintor Paul Signac [1863-19351 escreveu à sua amiga Georgette Agutte, a partir de Saint- Tropez, em 18de Outubro de 1915; a que Paul Gau: enviou do Taiti ao seu amigo de Paris, George-Daniel de
Monfreid, em Abril de 1896; aque o pintor, gravador e ilustro
Norbert Goeneulte [1854-18941 endereçou ao seu colega de
profissão Hyacinthe-Euqene Meunier, escrita
e enviada de Dordrech na Holanda, durante uma viagem pel
Flandres, em17 de Setembro de 1891, ou ainda a carta que
Victor Hugo [1802-18851 escreveu àsua filha Adele Hugo, on
descreve a cidade de Gant, no decurso de uma viagem pela
Bélgica, entre os dias 11 de Agosto e 13de Setembro de 182
eque em a particularidade de, além de estar datada, indica
Para esta mostra elegeram-se dois viajantes japoneses. contemporâneos e pintores: KatsushikaHokusai [1760-1849J e Hiroshigue
[1797-1858]. A obsessão de Hokusai pelo Monte Fuji criou desenhos deslumbrantes.
Este pintor egravador, conhecido por mais de trinta nomes diferentes, usou as suas viagens para produzir muitos dos seus mais de
trinta mil desenhos, que iniciou em 1834 com vista à publicação do livro Trintae seisvistas do Monte Fujie, editado já depois da sua morte,
Cem vistas doMonteFuji,
SawamotoHitoshi realizou em 2003 ofilme Retrato de um génio, sobre a vida mítica do pintor, de quem se dizter sido abandonado aos
três anos eadoptado por uma família de camponeses, trabalhado numa biblioteca, ter sido aprendiz de entalhador de madeira, monge
laico, e que considerava omundo inteiro como a sua morada.
Esta obra onde a viagem é subjacente, revela-nos o Monte Fujia partir de diferentes localizações e pontos de vista, uma espécie de
viagem em círculos concêntricos em torno da montanha que representa a eternidade.
Hiroshigue, por seu lado, éum transformador de paisagens, que metamorfoseou cenários quotidianos em paisagens intimistas.
O álbum de gravuras Ascinquenta e três estações da Tokaidonasceu de uma grande viagem à Corte Imperial, a fim de acompanhar uma
manada de cavalos, oferta do Shogun ao Imperador. As referidas estações são postos de correio, caravancerais, onde se encontrava
alojamento e alimento para os viajantes e para os animais.
Hiroshigue registou pelo desenho e pela gravura estas paisagens sempre habitadas por camponeses, mercadores, funcionários,
barqueiros e pescadores que, para além da sua extraordinária beleza, nos revelam oJapão feudal antes da industrialização do século
XIX eXX.
Dodeslumbre das paisagens japonesas passamos para ocalor das manifestações polinésias, bem patente na obra de Paul Gauguin,
que transformou o sonho em realidade: fez da pintura a sua filosofia de vida num local de eleição.
Pós-impressionista e simbolista francês abandonou uma
carreira promissora [à luzda mentalidade burguesa do seu
tempoJ como funcionário do estado em Paris, para se dedicar
àarte eà pintura.
No Taiti registou os seus dias e pensamentos no caderno Noa
Noa, onde pela escrita, pintura e fotografia revelou à sociedade
europeia as suas sustentação efontes de inspiração artísticas,
no período mais famoso da sua obra.
Identificamos os seus quadros com paisagens de paraísos
perdidos, os seus habitantes, avida quotidiana, os mitos,
e religiosidades, um deles, NafeaFaa/poipo, [em português
Quando te casarás"] éactualmente a mais cara obra de arte
da história, tendo sido vendida em Fevereiro de 2015 por 263 milhões de euros. J~';1:"'·' !...r....,....,i..-.. .~._ ._. •••J\o '..J10••••"- I.J-I.; ••~ •.•••;__ ••.LI
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A sua vida foiuma constante viagem, desde Lima, para onde foiquase recém-nascido, até à Polinésia, onde morreu, passando pelos quatro cantos do mundo durante a sua actividade na marinha mercante, onde poderia ter conhecido Cort Mal ese, marinheiro de
profissão, protagonista de múltiplas aventuras pelo mundo, conhecido pela trindade do boné, argola na orelha ecigarro na boca, euma
das suas criações mais notáveis de Hugo Pratt [1927-1995].
Da Itália onde nasceu, à Etiópia, Argentina e à França onde viveu e à Suíça onde morreu, Pratt prod ZIULn'la 2S:2 ra e ilustrador
apoiada em viagens que olevaram a percorrer todo ocontinente americano ea deslocações a África e ao :::>2:::':'cc, assis iuoessoalmente
a marcantes acontecimentos da história, tendo corrido o risco de ser executado pelas 55 nazis,
Hugo Pratt, cabalista, atraído pelo nevoeiro dovudu, falante de inúmeras línguas, deixava-se possu.r oe.c .2=5 =_2 2S:~2" 2,desenhava,
registava, edeixou um legado onde as personagens se mesclam com a realidade,
OlivroOdesejo deserinútilé uma longa entrevista com este homem-mito, receptáculo da uma vida, ,02'"="'5"'--2:2 :2.'" cré pria mão.
Por seu lado, um dos expoentes máximos da literatura portuguesa, observador exímio, partiu da real C2:::"
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denso eprofundo e que nos leva da seriedade da verdade àgargalhada do ridículo e ao assentir so re 2:",""":~: :2 :- 2, :~: ::::::75::
José Maria de Eça de Queirós [1845-1900J que, entre muitos outros, escreveu A Cidade e as Serras,C,-,.2 "'::~: :"'::-:: S-:-S ::"'-5
e Tormes, fez parceria com José Duarte Ramalho Ortigão [1836-1915J nos dois primeiros anos de":,5 =:=.-:::.:::
VIAGENS
Alegoria às Viagens Filosóficas, pormenor, Manuel Tavares da Fonseca [espólio Casa doRiscol.
Noprimeiro caso um romance, com oinesquecível Jacinto
e a terna e rude Tormes, no segundo caso textos soltos na
forma decrónicas, umas vezes contemplativos e nostálgicos,
frequentemente críticos, carregados deironia e sátira, tendo
em comum osrelatos deviagem oudeviajantes em Portugal,
à medida eà escala do século XIX, por aldeias, cidades, serras
e praias ligadas por estradas difíceis de percorrer e caminhos
pitorescos, por onde passam eternos mitos da literatura como
Calisto ElóideSilos eBenevides deBarbuda [ofidalgo
transmontano queviaja para Lisboa), ao cínico Basílio, que
nos traz mais uma vezopercurso Paris-Lisboa, e ao já referido
Jacinto.
Da sua passagem pelo Próximo Oriente, onde assistiu
à inauguração docanal de Suez, Eçaficou com marcas que
transporia para inúmeras daspersonagens que criou tendo,
nesta perspectiva, atingido oponto alto com OMandarim, onde
nos levaà China, país a que se regressa anos mais tarde, pela
mão deum herói universal, Tintim, sendo OLótusAzul, uma das
obras-primas dobelga Hergé [1907-1983).
Georges Remi, conhecido como Hergé, não foi umviajante excepcional, mas emjovem pertenceu aos escuteiros com os quais percorreu
vários países,deonde se destaca uma viagem de mais de 300 quilómetros pelos Pirenéus. Foio suficiente para a suaimaginação e para
o seu prodigioso lápis, tendo sidotambém fundamental para alealdade que caracteriza osseus heróis, viajantes curiosos e aventureiros,
que viajaram eviajam portrês gerações deleitores nosquatro cantos do mundo, com omesmo encanto
e surpresa doprimeiro dia: Tintim, Milú, o professor Tournesol, Dupont eDupond, Bianca Castafiore, entre outros, como o capitão
Haddock que, não obstante oseu mau feitio, certamente não se oporia acolocar aoombro uma dasaves exóticas que oaguarelista,
desenhador ecartógrafo José Joaquim Freire [1760-18471 desenhou durante aViagemFilosóficapelas Capitaniasdo Grão-Pará.RioNegro,
Mato GrossoeCuiabá, capitaneado pelo naturalista Alexandre Rodrigues Ferreira [1756-18151.
A viagem durou noveanos [1783-17921 eforneceu acuriosidade dopúblico, mas também aciência, das mais distintas novidades.
Mais de duzentos anos depois, oGrupodo RISCO,uma equipa pluridisciplinar que contou com ilustradores, fotógrafos, jornalistas,
professores e médicos, revisitou a mesma viagem e,noperíodo entre 26de Dezembro de 2009e 9de Janeiro de 2010,concretizou uma
expedição àAmazónia. OOorinha, uma pequena embarcação, foi a sua estalagem, porto deabrigo para apernoita erefeições ede onde
saiam diariamente em pirogas ao longo dosrios Negro, Jaú e Unini.
Emmovimento ininterrupto entregaram-se a desenhar, ilustrar, fotografar, filmar, gravar eescrever sobre a viagem liderada por
Alexandre Rodrigues Ferreira.
Asilustrações queaqui figuram, deRodrigues Ferreira, Joaquim José Codina eJoséJoaquim Freire realizadas nodecurso dessa
Viagem Filosófica, foram retiradas dolivro, também ele uma viagem, AImagem Útil,de Miguel Figueira de Faria [1957-).
Aexpedição de 2010, apoiada pela Universidade Autónoma deLisboa, filha daactualidade tecnológica, deixou inúmeros rastos, entre eles, anotável exposição noPavilhão doConhecimento.
Um dos elementos da expedição, obiólogo eilustrador científico Pedro Salgado [1960-
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,
partilha com Nádia Torres [1962-1, para além da docência, a comunhão do pormenor, ele na ilustração científica, ela na ourivesaria. A particularidade de uma vila do Baixo-Alentejoinspirou-os à criação do conceito e do projecto Mértolanos nossoscadernos: desenhos de campo.
Nesta viagem física e imaginária fizeram-se acompanhar por alunos do mestrado em Ilustração [Universidade de Évora/ISECl. Da estadia, deambulações e olhares de dezasseis ilustradores nasceu uma edição defieldsketching
que reúne testemunhos de locais como aAmendoeira da Serra, Pulo do Lobo, Árvore Veado, Ribeira de Oeiras, Moinho dos Canais e Mértola, segredos de grande beleza do Portugal profundo e desconhecido que muitos fotógrafos não se importariam de explorar, como Sebastião Salgado [1944-) ou Henry Cartier-Bresson [1908-20041.
Sebastião Salgado é ímpar a registar átomos do tempo. Vê,convive e regista paisagens e pessoas, momentos que raros humanos têm alguma vez o privilégio de conhecer econtemplar. .,.,,4.•..•• .I. . .
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Filipe Franco, Suzana Lemos, Desenhos dePiranha amarela Marco Correia, Desenho do Dorinha
São instantes intemporais que parecem ter perpassado milhares de anos, captados ao longo de quase meio século nos cinco
continentes. Salgado dá-nos a fome, oêxodo, o trabalho, mas também lugares remotos onde podemos perscrutar o princípio do mundo,
a natureza intocada que as civilizações foram progressivamente destruindo. As fotografias patentes no livro Génesistestemunham avida e a actividade mais recente deste cidadão do mundo e da sua dádiva à humanidade.
Em exposição também está o volume da recente biografia da sua vida e percursos, bem como onotável documentá rio sobre o seu trabalho, realizado porWim Wenders [1945-) e Juliano Ribeiro Salgado [1974-1, seu filho eacompanhante em algumas expedições. Entre as várias agências fotográficas onde trabalhou, por exemplo, através da Sygma fotografou a Revolução dos Cravos, destaca-se a mítica agência fotográfica Magnum, co-fundada por aquele que é considerado o pai do fotojornalismo: Henry Cartier-Bresson. Cartier-Bresson é uma figura mítica e inspiradora: foi fotógrafo, desenhador, pintor e cineasta, viajante de toda uma vida, foi caçador em África, fugiu de um campo de concentração alemão, fez parte da Resistência Francesa.
Filmou e fotografou pelo planeta momentos tão díspares como a Guerra CivilEspanhola, oseunucos da corte imperial chinesa, avida na antiga União Soviética, o movimento hippie ou os últimos dias de Gandhi.
No livro que aqui se apresenta - OsEuropeus[1955) -mostra-nos amuito diferenciada sociedade europeia, numa visão estilística e pessoal. ALeicaque acompanhou sempre Cartier-Bresson, mesmo depois de ter dado primazia ao desenho, é hoje um objecto de museu. Remete-nos para os antigos registos fotográficos de viagem, frequentemente obras anónimas, mas cujo desconhecimento da autoria não lhes retira fascínio.
Asimagens deIstambul, Alpes ouíndia, entre outras aqui patentes,
pressupunham rituais einiciativas de'inclusão: social ecultural do fotógrafo.
VIAGENS
Uma fotografia digital actualmente écaptada emcerca dedez segundos e, nosprimórdios dafotografia analógica, eram necessáric
cerca detrinta minutos para tirar uma única fotografia deviagem, dificuldade acrescida pelo pesoeperformance dos meios técnic:
edemais recursos, tanto na captação daimagem como nasua revelação eimpressão, adversidades deque ninguém se lembra qu:
se participa num desafio como oque foi lançado pelo Instagram: This isHappening [2013).
o
repto lançado aos seguidores doInstagram consistia na partilha emsimultâneo doseu sentimento de beleza noslocais ondeestavam. O resultado proporciona uma viagem visual e virtual, num vasto mundo essencialmente de pormenores e vistas personalizados, captados e enviados nocircuito dos adeptos daaplicação e,para além das mais deduzentas imagens, com
comentários como osseguintes:
Nós somos osutilizadores do Instagramefizemosestelivro.
Quasenãoacreditamos noque vemos. Isto está mesmo aacontecer?
Pegámos nosnossos telemóveis
e
fotografámos.Comunicámos com aspessoas nopiSOinferiorenooutraladodo mundo.
Por entre amescla de experiências que asviagens proporcionam, as invisíveis podem ser verdadeiras tatuagens nanossa rnernóri:
como porexemplo, o contacto com outras sonoridades.
Amúsica, os ecos danatureza, aprópria linguagem que ganha outra vida nas ondas dossotaques na pronúncia das palavras,
acompanham osdias dos viajantes, audíveis nas ruas, nos templos, via meios decomunicação, nos teatros, museus, restaurantes
e hotéis. Ossentidos aguçam-se com estes registos e,mais tarde, estimulam asrecordações, tal como os aromas esabores.
Apresentam-se pois gravações sonoras, nos seus diversos suportes, colecções quereúnem registos deáudio adquiridos entre a dE
de 60do século XX e a actualidade, bem como instrumentos musicais provenientes dequatro continentes.
00 vinil aoOVOprocuram estimular apermanência de viagens musicais, com atenção especial para asgravações quese assumen
como Musical Travelogintegrando amúsica com sonoridades captadas in loco.
Porseuturno, olivro, aquele objecto mágico que, só por siconsubstancia uma viagem nas suas múltiplas facetas, tem acompanhe
adeambulação do Homem em viagem, sendo igualmente usado para as descrever, como relato fidedigno ou como exercício de
imaginação. Muitos foram jáoslivros aqui referidos emuitos poderiam ser acrescentados, tendo em comum opressuposto do pas
e oaviagem, como concretização de sonhos de vida, rituais voluntários dedistanciamento, momentos deaventura edeaprofundar
espri ual, edeentre eles destacamos Mulheres Viajantes,de Sónia Serrano, [Tinta-da-China).
-naoutra mulher que, segundo ela, sefez poeta quando
aorendeu aNauCatrineta,e nosensinou a todos, crentes e não
crentes, porque se iluminam as árvores de Natal, é Sophia de
ello Breyner Andresen [1919-2004).
C morigens dinamarquesas, explica-nos as razões em
...)Cá/a/eira daDinamarca enquanto nos conduz numa viagem
isual, histórica e de sensibilidade pela Europa daIdade Média
a-éàTerra Santa, numa peregrinação que, naaltura, era a
viaqern de uma vida e queseiniciava sem acerteza deum
regresso,
Cavaleiro viajante é simultaneamente um observador e um
aereqrino, que testemunha uma Europa diferenciada nasua
~:'sica geografia, costumes e mentalidades.
Igualmente díspar éotrajar, não só do viajante, mas das diferentes culturas e povos. Ostecidos em exposição são de diferentes
naturezas evão da seda às peles, em têxteis orientais [ladeados por equipamento de tingimentol com exemplos de chapéus recolhidos
em vários locais do mundo.
Qualquer viagem, por mais simples que seja, associa-se sempre ao transporte. Osveículos motorizados da actualidade, em terra, no
mar ou no ar, que nos transportam comodamente com rapidez e em segurança eque parecem transformar omundo numa aldeia,
não nos podem olvidar de cavalos e burros, de camelos ou elefantes, montadas que apoiaram e contribuíram para que viajantes
e aventureiros chegassem aos seus destinos e, igualmente importante, regressassem para contar como foi, incentivando-nos a tomar
olugar de protagonista na viagem. _
Madalena Mira
Directora da Biblioteca da UAL
João Pancada Correia
Professor da UALe Director da CEU
ANOLECTIVO 2015
I
2016r
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Portuguese explorers
I
English AbstractThis article will focus on the Portuguese explorers that wrote novels about there voyages, and made nistory,
Venetian merchant and adventure, Marco Polo, travelled from Europe toAsia from 1271 to 1295. e as e2~: o ofMarco
Pala'
s
book.The Portuguese literature masterpiece, OsLusíadas, isthe result ofLuís de Camões voyages toA' . 22
Voyage is an opportunity to live lots and different events, new experience rises from these momen _, e
also other lives.
From the 15th century to the 18th century, marking the time inwhich extensive overseas explora-i
factor in European culture. Itwas the period inwhich global exploration started with the Portuguese:: 5::
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:=:-e --.2 ic archipelago ofthe Azores, the Western coast ofAfrica, and discovery ofthe ocean route to the E2S-·- •-=;;,3-:::-
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:'?-I'-Atlantic Ocean discovery of the Americas on behalf ofthe Crown of Castle [Spainl in 1492.