• Nenhum resultado encontrado

Conectando-se com a História

N/A
N/A
Protected

Academic year: 2020

Share "Conectando-se com a História"

Copied!
16
0
0

Texto

(1)

diálogo com as NTICs e com o mundo virtual: o saber, o

fazer e o ensinar histórico”

Connecting to History: seminar “The History dialoguing with New

Information and Communication Technologies and virtual world:

knowing, doing and teaching History”

Marcella Albaine Farias da Costa1

Resumo: Pensar a relação entre

História e linguagens midiáticas, hoje, requer problematizar como as novas tecnologias da informação e da comunicação ampliam a noção de fonte histórica, modificam as concepções de tempo e espaço, alteram o conceito de arquivo, patrimônio e memória e abrem novas possibilidades à pesquisa e ao ensino de História. O objetivo deste artigo é mostrar, a partir da análise dos questionários respondidos pela turma de Didática de História II / FE-UFRJ, na oficina “A História em diálogo com as NTICs e com o mundo virtual: o saber, o fazer e o ensinar histórico”, alguns dos desafios trazidos por tais temáticas sob a ótica específica de professores de História em formação inicial.

Palavras-chave: pesquisa histórica, ensino de História, novas tecnologias.

Abstract: Think the relationship between History and languages media nowadays requires to consider how New Information and Communication Technologies (NICT) works as historical information and change the concept of time and space, archive, heritage and memory, also unfolding new possibilities of research and the teaching of History. The aim of this paper is to show, based on questionnaire filled by students of “Didática de História II” at FE-UFRJ, during the seminar “The History dialoguing with New Information and Communication Technologies and virtual world: knowing, doing and teaching History” such challenges by young history teachers.

Keywords: History research, History

teach, new technologies.

1

Mestranda do Programa de Pós-Graduação em Educação (PPGE) da Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ). E-mail: [marcellaalbaine@gmail.com]

(2)

Reflexões iniciais: algumas inquietações

Estamos no século XXI, no terceiro milênio, numa sociedade em mutação, onde o novo já nasce precocemente envelhecido. Estamos no momento das novas tecnologias, do processo de globalização, da qualidade total, do colapso das utopias, da crise dos paradigmas, do desenvolvimento da ciência, da pós-modernidade, na era da informação (...). Dessa maneira, o atual momento tem se caracterizado por intensas e rápidas transformações que vêm dando à sociedade uma nova configuração, naturalmente refletida na pesquisa científica [e no ensino] de todas as áreas do conhecimento humano2.

Frequentemente recorre-se a Bloch3 para dizer que a História é “a ciência dos homens, no tempo”.

Na ocasião deste trabalho, interessa-se pensar em um tempo muito específico, peculiar, alvo de muitas discussões no campo historiográfico4, qual seja, o tempo presente de nosso próprio presente, tendo como cerne a questão dos avanços e dos impactos das chamadas novas tecnologias da informação e da comunicação (NTICs)5 e das linguagens midiáticas nas duas esferas que compõem o ofício do historiador: pesquisa e ensino.

2

BONATO, Nailda Marinho da Costa. O Uso das Fontes Documentais na Pesquisa em História da Educação e as Novas Tecnologias. Revista do Arquivo Nacional, Rio de Janeiro, v. 17, n. 2, jul./dez. 2004, p. 85-86.

3

BLOCH, Marc. Apologia da história ou o ofício de historiador. Rio de Janeiro: Zahar, 2001, p. 55.

4

A esse respeito, ver DOSSE, François. História do Tempo presente e Historiografia.

Revista Tempo e Argumento, Florianópolis, v. 4, n. 1, jan./ jun. 2012, p. 5-22.

5

Também representadas pela sigla TICs ou TDIC (tecnologias digitais de informação e comunicação).

(3)

Ferreira6 afirma que “a despeito da expansão e da legitimação dos estudos do tempo presente, ainda permanecem muitas resistências à sua incorporação como objeto da história”.

De igual forma, há ainda certa resistência e “estranhamento” na relação entre o historiador e as novas tecnologias, suscitando – nas expressões de Roger Chartier7 – “lamentações nostálgicas” ou “entusiasmos ingênuos”.

É preciso ter em mente alguns aspectos relevantes. O primeiro deles é que na contemporaneidade há um forte vínculo entre tecnologia e “novidade”8

– considerando-se, sobretudo, as rápidas transformações da informática e da Internet. O segundo ponto é que:

A História não ficou de fora desse processo de informatização das últimas décadas. Os computadores foram muito úteis às pesquisas quantitativas, como a demografia histórica. Por meio deles, tornou-se possível manipular um grande número de fontes, sistematizá-las em bancos de dados e, a partir disso, produzir gráficos, tabelas, percentuais que passaram a se constituir numa metodologia a mais para as interpretações historiográficas. Os computadores revelavam-se úteis ao historiador9.

Entretanto, segundo Silva10, “estamos no limiar de um mundo no qual nosso ofício deverá se modificar profundamente e que a informatização de nossa cultura deverá influir profundamente na nossa maneira de pensar [ensinar] e produzir história”.

6

FERREIRA, Marieta de Moraes. História do tempo presente: desafios. Cultura Vozes, Petrópolis, v. 94, nº 3, mai. / jun. 2000, p. 120.

7

CHARTIER, Roger. Os desafios da escrita. São Paulo: Editora UNESP, 2002, p. 9.

8

ARRUDA, Eucidio. Relações entre tecnologias digitais e educação: perspectivas para a compreensão da aprendizagem escolar contemporânea. In: FREITAS, Maria Teresa de Assunção (org.). Cibercultura e formação de professores. Belo Horizonte: Autêntica Editora, 2009, p. 17.

9

FERREIRA, Marieta de Moraes; FRANCO, Renato. Aprendendo História: reflexão e ensino. São Paulo: Editora do Brasil, 2009, p. 133.

10

SILVA, Edson Armando. Impactos das novas tecnologias no ofício do historiador: reflexões (sempre) preliminares. In: LIMA, Carlos Augusto Ferreira. Ensino de História: reflexões e novas perspectivas. Salvador: Quarteto, 2004, p. 54.

(4)

Sendo assim, as NTICs apresentam novos desafios ao métier do historiador (profissional que deve estar sempre atento aos fenômenos que o cercam), tanto na órbita do político-cultural, como também – e principalmente – no âmbito da epistemologia/gnosiologia histórica.

O movimento dos Annales, como se sabe, trouxe uma grande contribuição no sentido de ressignificar a noção de fonte histórica. Hoje, com a Internet e as potencialidades das diversas linguagens midiáticas, somos convidados a ampliar ainda mais nossos espectros sobre o que é uma fonte histórica.

Vejamos um exemplo: o diário de um viajante de séculos precedentes. Para consultá-lo, vamos às instituições de pesquisa ou, quem sabe, podemos encontrá-lo digitalizado. Por definição, os blogs são diários virtuais; já pensamos na possibilidade de considerá-los como uma fonte histórica?

Segundo Carvalho11, “a história social do futuro não se debruçará mais sobre diários de papel, e sim sobre diários virtuais, como Twitter ou

Orkut 12”; tal fato, “invariavelmente exige do historiador um domínio de

manipulação de ferramentas digitais comuns à contemporaneidade”.

Robert Darnton13 comenta que “hoje as pessoas sentem o chão se movendo sob seus pés, tomando o rumo de uma nova era que será determinada por inovações tecnológicas”. Ginzburg14, por sua vez, afirma que “a revolução tecnológica que está ocorrendo perante nossos olhos, e que modificou profundamente nossa existência, (...) deve ser analisada em suas implicações”.

11

CARVALHO, Diogo Trindade Alves de. História ponto a ponto: o uso de ferramentas digitais para o acesso a fontes históricas. Revista O Olho da História, Salvador, n.14, jun. 2010, p. 5. Disponível em: http://oolhodahistoria.org/n14/artigos/diogo.pdf. Acesso em 27 ago. 2013.

12

O uso dessa rede social está cada vez menos frequente, tendo sido superada em número de usuários pelo Facebook, o que em nada altera o sentido da elucidação que foi feita.

13

DARNTON, Robert. A questão dos livros: passado, presente e futuro. São Paulo: Companhia de Letras, 2010, p. 13.

14

GINZBURG, Carlo. História na Era Google. Disponível em:

(5)

Que implicações há na semântica atribuída às categorias de passado-presente-futuro, tendo em conta o sentimento partilhado de aceleração temporal que ora vivemos?

Parece-nos relevante problematizar também a respeito dos próprios conceitos de arquivo, patrimônio e memória.

Sobre o primeiro (arquivo), não é preciso falar no ganho que a pesquisa histórica teve a partir dos arquivos digitais.

Sobre o segundo (patrimônio), Dodebei15 afirma que “se a sociedade deseja preservar bens patrimoniais para as gerações futuras, é necessário considerar que objetos do cotidiano têm sido, em ritmo exponencial, produzidos em meio digital”.

Por fim, vive-se um verdadeiro “boom memorialístico” potencializado pelas novas mídias. O que guardar, como guardar?

Diante das reflexões e inquietações colocadas – para as quais se tem mais indagações e questionamentos do que respostas fechadas – vimos a riqueza (ainda pouco explorada) e a relevância que a temática traz ao campo do saber, do fazer e do ensinar histórico.

Sobre este último, Salgado Guimarães16 indaga: “Como pensar em nossa atualidade o ensino de história desconsiderando o arsenal de inovações tecnológicas disponíveis que exercem forte atrativo sobre o público escolar?”. Nesse mesmo sentido, Saliba17 questiona: “como ensinar história num mundo marcado pela internet e pela „googleficação‟ geral?”.

15

DODEBEI, Vera. Digital virtual: o patrimônio no século XXI. In: ABREU, Regina; DODEBEI, Vera. E o patrimônio? Rio de Janeiro: Contra Capa / Programa de Pós Graduação em Memória Social da Universidade Federal do Estado do Rio de Janeiro, 2008, p. 12.

16

GUIMARÃES, Manoel Luís Salgado. Escrita da história e ensino de história: tensões e paradoxos. In: GONTIJO, Rebeca; MAGALHÃES, Marcelo de Souza; ROCHA, Helenice Aparecida Bastos. A escrita da História escolar: memória e historiografia. Rio de Janeiro: Editora FGV, 2009, p. 37.

17

SALIBA, Elias Thomé. Na guinada subjetiva, a memória tem futuro? In: GONTIJO, Rebeca; MAGALHÃES, Marcelo de Souza; ROCHA, Helenice Aparecida Bastos. A escrita

(6)

Isto posto, e tendo em mente que “a informática e os computadores (...) revolucionaram ou estão revolucionando (...) as formas de conhecimento escolar, por sua capacidade e poder de estabelecer comunicações mais pessoais e interativas” e que “as mudanças culturais provocadas (...) pelos computadores [e pelas novas mídias] são inevitáveis, pois geram sujeitos com novas habilidades e diferentes capacidades de entender o mundo”18

, propõe-se a apresentar agora alguns resultados da oficina “A História em diálogo com as NTICs e com o mundo virtual: o

saber, o fazer e o ensinar histórico”, desenvolvida com professores de

História em formação inicial na Faculdade de Educação (FE) da Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ).

A oficina “A História em diálogo com as NTICs e com o mundo

virtual: o saber, o fazer e o ensinar histórico”: desafios e

desdobramentos

De que forma os cursos superiores, sobretudo aqueles voltados para a formação inicial de professores (de História), têm dialogado com as temáticas trazidas acima?

Evidentemente não há uma resposta única para isso, contudo, procurar-se-á demonstrar uma possibilidade a partir do relato de experiência de montagem e execução da oficina “A História em diálogo com as NTICs e

com o mundo virtual: o saber, o fazer e o ensinar histórico”.

A mesma foi realizada por mim19 na turma de Didática de História II, 2011.02, da Faculdade de Educação (FE) da Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ).

A sua ideia de criação deu-se a partir da discussão sobre “sala de aula e espaço virtual”, como parte do conteúdo programático da disciplina de Didática de História II, ministrada pela Prof.ª Warley da Costa.

18

BITTENCOURT, Circe Maria Fernandes. Ensino de História: fundamentos e métodos. São Paulo: Cortez, 2009, p. 107-108.

(7)

Um dos desafios foi, certamente, a “transposição didática das inovações tecnológicas”. Schmidt20 afirma que esta “é, atualmente, uma outra questão fundamental e imprescindível no ensino de História, trazendo consequências imediatas e complexas tanto para a formação de professores como para a prática de sala de aula”.

A posição de aluna-professora-investigadora também foi outra situação peculiar. O objetivo da oficina era refletir acerca da importância do mundo virtual e das NTICs na prática do historiador e do professor de História, sendo composta por cinco momentos distintos.

O primeiro deles foi a apresentação do vídeo “História na Era

Google”, do historiador Carlo Ginzburg (15 min), seguido de uma breve

discussão sobre pontos apresentados no mesmo (05 min).

Dando-se prosseguimento, foi apresentado o trabalho “Ensino de

História e novas tecnologias: o estado da arte no contexto brasileiro”21 (15 min) e, posteriormente, houve a divisão da turma em grupos para discutir diferentes temáticas (35 min). A última parte foi dedicada à elaboração do questionário de avaliação (05 min).

As temáticas discutidas foram: jogos virtuais (a partir da reportagem “Brincando de Deus”, de Eucídio Pimenta Arruda, publicada na Revista de História da Biblioteca Nacional, 2009), as diretrizes proibitivas de tecnologias na sala de aula (a Lei Nº 5222/2008 e a Lei Nº 5453/2009), a relação professor-tecnologia (charge), as Webquests (texto “O que são as

WebQuests?”, de Anita Almeida e Keila Grinberg, publicado no livro “A escrita da história escolar: memória e historiografia”, 2009) e a ferramenta Wiki (relato da experiência desenvolvida em uma escola pública de Belo

Horizonte extraído do artigo “Web 2.0 e o ensino de História: trabalhando

com Wiki”, de Andréia Ferreira, Bento Duarte e Lana de Castro).

20

SCHMIDT, Maria Auxiliadora. A formação do professor de História e o cotidiano da sala de aula. In: BITTENCOURT, Circe (org.). O saber histórico na sala de aula. São Paulo: Contexto, 2009, p. 63.

21

COSTA, Marcella Albaine Farias da. Ensino de História e novas tecnologias: estado da arte no contexto brasileiro. In: XXXII Jornada Giulio Massarani de Iniciação Científica, Artística e Cultural, 2011, Rio de Janeiro. Livro de Resumos da XXXII Jornada Giulio Massarani de Iniciação Científica, Artística e Cultural, 2011.

(8)

A atividade teve 22 alunos participantes, além da professora e do monitor da disciplina. Entre os tópicos levantados pela turma na discussão oral, destacou-se:

1º) A relação professor-aluno-tecnologia. 2º) Tecnologia e “profetismos”.

3º) O uso de máquinas digitais por alunos para tirar foto da matéria no quadro.

4º) O aspecto mercadológico dos jogos virtuais.

5º) “Jogos tendenciosos” e capacidade de aproveitamento do aspecto didático dos mesmos.

6º) O papel do professor como mediador ou orientador.

7º) A capacitação dos docentes para trabalhar com a tecnologia. 8º) O professor como aquele que deve problematizar a integração da tecnologia na sala de aula, não excluí-la.

9º) Laboratório de informática significa interesse dos alunos? 10º) Preconceitos no uso de alguns recursos tecnológicos: “não é aula, é filme” ou “não é aula, é jogo”.

11º) A Internet e a perda do hábito de frequentar a biblioteca por parte dos alunos.

12º) A utilização do datashow como “antigas fichas” pelos professores.

13º) Internet e confiabilidade das informações. 14º) O aluno como construtor de conhecimento.

15º) A questão estrutural dos laboratórios de informática das escolas.

A partir da análise dos questionários respondidos (um total de 17), algumas impressões e resultados foram possíveis:

– 17 participantes afirmaram que a oficina realizada acrescentou algo a sua formação como profissional de História.

Sobre a pergunta “Como você compreende o diálogo da Universidade com as temáticas abordadas?”, as respostas foram as seguintes:

1º) Tímido. 2º) Atual.

3º) Pouco explorado. 4º) Pouco discutido.

(9)

5º) Limitado. 6º) Conservador. 7º) Cambaleante. 8º) Mal feito. 9º) Incipiente. 10º) Pequeno. 11º) Muito pequeno.

Em relação à avaliação da sua própria prática docente no que tange ao uso de recursos tecnológicos e da opinião se as NTICs e as ferramentas digitais podem dinamizar o ensino da disciplina de História: 3 declararam apenas não atuar como docente (Grupo A); 5 não atuam como docente, mas acreditam que as NTICs e as ferramentas digitais podem dinamizar o ensino da disciplina de História (Grupo B); 7 não fizeram referência à sua atuação ou não como professores, mas declararam que as NTICs e as ferramentas digitais podem dinamizar o ensino da disciplina de História (Grupo C); 1 declarou não ser aplicável (Grupo D); 1 declarou não utilizar recursos tecnológicos (a não ser quando quer exibir imagens, filmes ou músicas), fazendo uso, de modo geral, apenas do diálogo, do quadro e da interrelação com os alunos (Grupo E).

Dentre os que afirmaram que as NTICs e as ferramentas digitais podem dinamizar o ensino da disciplina de História (Grupos B e C), foram destacados os seguintes aspectos:

1º) Proximidade à realidade do aluno.

2º) Incentivo e envolvimento do aluno no aprendizado. 3º) Necessidade de preparação dos professores.

4º) Necessidade de se ter cautela e de se traçar objetivos e metodologias bem definidos.

5º) Importância da ação mediadora do professor.

6º) Caráter “interessante” de tais ferramentas, dependendo, porém, da forma com que o professor faz uso das mesmas.

7º) Sentimento de despreparo para utilização desses recursos. 8º) Falta de reflexões teóricas e práticas sobre seu uso.

9º) Necessidade de se estimular nos alunos a pesquisa em livros e o desenvolvimento da escrita.

10º) Familiaridade dos discentes com os meios tecnológicos. 11º) Utilidade limitada de tais recursos.

(10)

para se trabalhar com as tecnologias e existência de certo preconceito, por parte de docentes e discentes, em relação ao assunto.

Há uma infinidade de conexões entre os tópicos levantados, as leituras especializadas e as reflexões teóricas que têm sido propostas por autores-pesquisadores. Destacar-se-á três.

Em primeiro lugar, a questão que os docentes devem ser mediadores da aprendizagem, guias ou orientadores dos discentes nesse novo panorama da cultura digital (ou cibercultura) e tecnológica.

Behrens, Masetto & Moran22 colocam essa orientação como sendo não apenas de ordem intelectual propriamente dita, mas também, emocional, gerencial, comunicacional e ética.

Em segundo lugar, o tópico sobre o uso do datashow como “antigas fichas” também chama a atenção. Este ato remete a uma prática que Cysneiros23 classifica como “inovação conservadora”, ou seja, o reforço de antigos hábitos através de recursos “modernos”, sem haver a exploração dos potenciais que são exclusivos daquele determinado recurso.

Aliás, é preciso lembrar que “as mutações na ordem das práticas são geralmente mais lentas do que as revoluções das técnicas e sempre em defasagem em relação a elas”24

.

Por último, e não menos importante, fica a questão da Internet e da confiabilidade das informações. Frequentemente dizemos que a nossa sociedade é caracterizada como a “sociedade da informação”. Contudo, para Darnton25, “todas as eras foram uma era da informação, cada uma a seu modo” e “a informação sempre foi instável”.

Daí advém a importância do conceito de escola como “espaço de síntese”:

22

BEHRENS, Marilda Aparecida, MASETTO, Marcos T.; MORAN, José Manuel. Novas

tecnologias e mediação pedagógica. São Paulo: Papirus, 2000, p. 30-31.

23

CYSNEIROS, Paulo Gileno. Novas Tecnologias na sala de aula: melhoria do ensino ou inovação conservadora? Informática Educativa, Los Andes, v. 12, n. 1, p. 15-18.

24

CHARTIER, Roger. Os desafios da escrita. São Paulo: Editora UNESP, 2002, p. 112.

25

DARNTON, Robert. A questão dos livros: passado, presente e futuro. Tradução de Daniel Pellizzari. São Paulo: Companhia de Letras, 2010, p. 41.

(11)

(...) um espaço onde seja possível, em uma sociedade culturalizada pela informação das multimídias e pela intervenção educativa urbana, realizar a necessária síntese doadora de sentido e de razão crítica de todas as mensagens-informação acumuladas de forma diversa e autônoma através dos meios tecnológicos. Síntese e significado enquanto reordenação e reestruturação da cultura recebida em mosaico. Desta forma, conceber a escola como espaço de síntese é acreditar nela como estrutura possibilitadora de significado mais do que como estrutura possibilitadora de informação26.

Uma questão que não foi levantada, ao menos não de forma explícita, mas que é extremamente relevante e nos demanda certa acuidade analítica, é a relação das mídias tecnológicas com o currículo.

O professor e pesquisador José Armando Valente, na comunicação intitulada “Tecnologias e currículo – do lápis e papel para o currículo da era digital”, proferida no evento “Conecta 2011 – Tecnologias Educacionais”27

, defende que as TDIC não são mais ferramentas ou recursos, mas linguagens para representação do conhecimento e, portanto, são determinantes do currículo.

Há, segundo o pesquisador, uma separação entre duas dimensões: o ensino dos conteúdos das respectivas disciplinas e o ensino específico sobre as tecnologias e seus aplicativos, assim como o diálogo deficitário entre a sala de aula e os laboratórios de informática das escolas.

Seja como ferramenta ou como linguagem, uma vez que a tecnologia pode servir de extensão da capacidade intelectual do educando, é necessário repensar as práticas curriculares, elaboradas para a lógica do lápis e papel.

26

COLOM CAÑELLAS, 1994 apud LIBÂNEO, José Carlos. Adeus professor, adeus

professora?: novas exigências educacionais e profissão docente. São Paulo: Cortez, 2010, p.

29.

27

Evento promovido pelo SESI e SENAI no Centro de Convenções SulAmérica da cidade do Rio de Janeiro, em novembro de 2011. Disponível em: http://conecta2011.firjan.org.br/. Acesso em: 27 ago. de 2013.

(12)

Sendo assim, dentro da ótica dos desafios e desmembramentos suscitados pela execução da referida oficina em um curso de formação inicial de professores de História e tendo como pano de fundo a problematização da relação entre História, ensino de História e mídias tecnológicas, pensa-se ser interessante discutir o conceito de web currículo, cunhado por Maria Elizabeth Bianconcini de Almeida, pesquisadora da linha “Novas Tecnologias na Educação” do Programa de Pós-Graduação em Educação: Currículo, da Pontifícia Universidade Católica de São Paulo (PUC-SP).

Do que está se falando ao juntarmos Web28, expressão associada à rede mundial de computadores, e Currículo, este campo estudado na área educacional e reconhecidamente um espaço de disputas e embates?

Em que pese a reduzida literatura específica sobre esta temática, alguns caminhos são possíveis para se desenhar uma definição. Almeida29 diz que este:

É o currículo que se desenvolve por meio das tecnologias digitais de informação e comunicação, especialmente mediado pela internet. Uma forma de trabalhá-lo é informatizar o ensino ao colocar o material didático na rede. Mas o web currículo vai além disso: ele implica a incorporação das principais características desse meio digital no desenvolvimento do currículo. Isto é, implica apropriar-se dessas tecnologias em prol da interação, do trabalho colaborativo e do protagonismo entre todas as pessoas para o desenvolvimento do currículo. É uma integração entre o que está no documento prescrito e previsto com uma intencionalidade de propiciar o aprendizado de conhecimentos científicos com base naquilo que o estudante já traz de sua experiência. O web currículo está a favor do projeto pedagógico. Não se trata mais

28

É importante ressaltar a distinção entre a chamada Web 1.0, a “primeira geração da Internet”, caracterizada por ser estática, onde o usuário era um mero consumidor de informações, a Web 2.0, conceito proposto por O‟Reilly (2005), definida por ser uma rede colaborativa, na qual o usuário (entre eles, alunos e professores) é um construtor de conhecimento em potencial, e não um mero espectador como no modelo 1.0 e a Web 3.0, também intitulada de Web semântica.

29

http://revistaescola.abril.com.br/planejamento-e-avaliacao/avaliacao/entrevista pesquisadora-puc-sp-tecnologia-sala-aula-568012.shtml. Acesso em 29 ago. 2013.

(13)

do uso eventual da tecnologia, mas de uma forma integrada com as atividades em sala de aula.

No artigo “Currículo, tecnologia e cultura digital: espaços e tempos de web currículo”, estas ideias são corroboradas, pois:

Integrar as TDIC30 com o currículo significa que essas tecnologias passam a compor o currículo, que as engloba aos seus demais componentes e assim não se trata de ter as tecnologias como um apêndice ou algo tangencial ao currículo e sim de buscar a integração transversal das competências no domínio das TDIC com o currículo, pois este é o orientador das ações de uso das tecnologias31

Em “Web currículo: integração de mídias nas escolas com base na investigação de fatos científicos para o fazer científico”, Almeida & Valente32 reafirmam que o web currículo “envolve distintas linguagens e sistemas de signos configurados de acordo com as características intrínsecas das tecnologias e mídias digitais que suportam os modos de produção do currículo, sendo este o orientador do uso das TDIC”.

O seu desenvolvimento, prosseguem os autores, “evidencia possibilidades de superação da abordagem pedagógica alicerçada na transmissão de informações e aponta para a prevalência de um currículo construído na prática social”.

Esse ideia, qual seja, a proposta do desenvolvimento do web currículo, é particularmente fecunda para a área de História (mas não apenas), na qual há uma tendência ainda forte da abordagem tradicional do processo de ensino-aprendizagem materializada em aulas expositivas com

30

Tecnologias digitais de informação e comunicação.

31

ALMEIDA, Maria Elizabeth Bianconcini de. Currículo, tecnologia e cultura digital: espaços e tempos de web currículo. Revista e-curriculum, São Paulo, v.7, n.1, abr. 2011, p. 8. Disponível em: http://revistas.pucsp.br/index.php/curriculum/article/view/5676 Acesso em 29 ago. 2013.

32

ALMEIDA, Maria Elizabeth Bianconcini de; VALENTE, José Armando. Web Currículo: integração de mídias nas escolas com base na investigação de fatos científicos para o fazer científico. In: SANTOS, Edméa Oliveira dos. Currículos – teorias e práticas. Rio de Janeiro: LTC, 2012, p. 127.

(14)

uma quantidade gigantesca de conteúdos – datas, fatos e personagens – que devem ser memorizados e reproduzidos pelos discentes.

Na concepção tradicional do processo de ensino-aprendizagem, o professor é o grande detentor do saber, aquele que irá transmitir o conhecimento ao aluno, que, por sua vez, deve armazená-lo/acumulá-lo. Segundo Mizukami33, “os alunos são „instruídos‟ e „ensinados‟ pelo professor”, sendo a escola, então, o local onde o conhecimento será apropriado (e não construído) pelo aluno.

Assim, fica prejudicada a dimensão da autonomia de pensamento do aluno e, acredita-se, a própria formação da sua consciência histórica. Estamos em um novo cenário, o cenário em rede que, potencializado pelas novas linguagens midiáticas, faz tanto dos professores quanto dos estudantes construtores de conhecimento.

Ou seja, aposta-se aqui nesta ideia do web currículo com a real e efetiva utilização da tecnologia na educação como forma de dar um novo sentido à História enquanto objeto de ensino e à própria dimensão da História enquanto ciência.

Em entrevista concedida ao Portal EducaRede34, Maria Elizabeth Bianconcini destaca, conforme foi dito, que “as tecnologias ainda não entraram no núcleo de desenvolvimento do currículo”, sendo este um processo complexo. Faz-se necessário ter frequência no contato com essa tecnologia, e não que o mesmo se dê de forma eventual nos laboratórios de informática.

Daí decorre a importância, por exemplo, das chamadas “tecnologias móveis”, vendo-se o mobile learning, ou seja, o aprendizado através de dispositivos móveis35 (laptops, tablets, celulares, smartphones etc.) como

33

MIZUKAMI, Maria da Graça Nicoletti. Ensino: as abordagens do processo. São Paulo: EPU, 1996, p. 13.

34

Disponível em formato de arquivo de áudio digital (podcast) no seguinte endereço: http://www.educared.org/global/canal-multimidia/web-curriculo. Acesso em 29 ago. 2013.

35

Esses dispositivos também são conhecidos pela expressão gadget, que significa “geringonça”. São equipamentos que têm um propósito e uma função específica, prática e útil no dia-a-dia. A esse respeito, ver PEREIRA, Cláudia & ROCHA, Everardo. Os gadgets e a experiência adolescente. In: PEREIRA, Cláudia & ROCHA, Everardo. Juventude e

consumo: um estudo sobre a comunicação na cultura contemporânea. Rio de Janeiro: Mauad

(15)

uma temática riquíssima e ainda pouco explorada pelos pesquisadores da área de História e de Educação36.

E será que nós, historiadores e professores de História, estamos a par dessas discussões? Em que medida nosso ofício de pesquisador e nossa prática enquanto docentes podem ser ressignificados neste século XXI?

Tendo como panorama as discussões dos chamados “tempos pós”, isto é, “tempos de uma nova lógica cultural”, “da centralidade da linguagem na produção do mundo „em significados‟”, “de escola sob suspeita”, “tempos de desigualdades”, “de ambivalência, de múltiplos sentidos em movimento, de decisões na incerteza, de subversões, de hegemonias contingenciais”37

, explicita-se a defesa – evidentemente que a partir de uma análise crítica – da articulação entre currículo, mídias tecnológicas, História e ensino de História como forma de (re) construir o sentido do ensino e da pesquisa histórica na atualidade, de forma a torná-los ações mais significativas e afinadas com os avanços que se vislumbram no nosso tempo presente.

Conclusão

Relacionou-se pesquisa e ensino, visando mostrar alguns desafios trazidos por professores de História em locus privilegiado de formação em caráter inicial.

A oficina relatada, apesar de realizada no âmbito de uma Faculdade de Educação, teve como objetivo discutir não apenas questões ligadas ao ensino, como também procurou abordar a dimensão do próprio saber e do fazer histórico, problematizando a dimensão epistêmica da interface entre a ciência histórica e as demandas das novas mídias que emergem em nosso tempo.

36

O III Congresso Internacional de Tecnologia Educacional da Associação Brasileira de Tecnologia Educacional (ABT), realizado na cidade do Rio de Janeiro em novembro de 2011, abriu espaço para discutir essa temática através da palestra “Mobile Learning: contexto, experiência e cocriação”, do colombiano Martin Restrepo. Entretanto, considero que essa é uma temática ainda pouco explorada. Disponível em: http://www.abt-br.org.br/blog/?p=322 Acesso em: 29 ago. de 2013.

37

GABRIEL, Carmen Teresa. Conhecimento escolar, cultura e poder: desafio para pensar o campo do currículo em "tempos pós". In: MOREIRA, Antonio Flavio Barbosa; CANDAU, Vera Maria. Multiculturalismo. Petrópolis: Vozes, 2008.

(16)

É interessante lembrar da seguinte colocação do grande educador Paulo Freire38: “Minha [nossa] presença no mundo não é a de quem a ele se adapta, mas a de quem nele se insere. É posição de quem luta para não ser apenas objeto, mas sujeito também da História”.

Se nós, educadores em constante formação, desejamos “agir” na nossa sociedade, faz-se urgente a busca pela real compreensão sobre o que é/está sendo/será essa (nova) sociedade, ou essa sociedade do tempo presente.

Isso envolve os mais diversos campos de conhecimento, a História não é a única privilegiada. Mas a educação – e por que não a educação através da História e do ensino de História? – tem papel fundamental.

Ou seja, precisamos entender o aluno que chegará até nós, precisamos entender as mudanças epistemológicas que estão ocorrendo no nosso campo, precisamos nos atualizar – caso contrário, estaremos fadados a sermos apenas objeto da História.

Artigo enviado em julho de 2013; aprovado em novembro de 2013.

38

Referências

Documentos relacionados

Assim sendo, o espaço da estrada é determinante como facilitador de um exercício de uma sexualidade mais plena, aberta e satisfatória, pelo menos para Thelma, e ao

Dentre as principais conclusões tiradas deste trabalho, destacam-se: a seqüência de mobilidade obtida para os metais pesados estudados: Mn2+>Zn2+>Cd2+>Cu2+>Pb2+>Cr3+; apesar dos

Conforme vimos na seção anterior, o PNAIC está estruturado “em quatro eixos de sustentação: formação continuada presencial; material didático; avaliações; gestão, mobilização

O “tempo necessário” para as atividades complementares foi definido no tópico “Objetivos e Metas”, no qual apresentou duas metas referentes ao eixo da jornada de

Desse modo, tomando como base a estrutura organizacional implantada nas SREs do Estado de Minas Gerais, com a criação da Diretoria de Pessoal, esta pesquisa permitirá

(2009) sobre motivação e reconhecimento do trabalho docente. A fim de tratarmos de todas as questões que surgiram ao longo do trabalho, sintetizamos, a seguir, os objetivos de cada

Declaro que fiz a correção linguística de Português da dissertação de Romualdo Portella Neto, intitulada A Percepção dos Gestores sobre a Gestão de Resíduos da Suinocultura:

(2008), o cuidado está intimamente ligado ao conforto e este não está apenas ligado ao ambiente externo, mas também ao interior das pessoas envolvidas, seus