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JOGOS E BRINQUEDOS TRADICIONAIS NA ILUSTRAÇÃO DAS CARTILHAS ESCOLARES (SÉC. XIX & XX).

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JOGOS E BRINQUEDOS TRADICIONAIS NA ILUSTRAÇÃO DAS

CARTILHAS ESCOLARES (SÉC. XIX & XX)

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TRADITIONAL GAMES AND TOYS IN THE ILLUSTRATION OF SCHOOL READING BOOKS (19TH & 20TH CENTURIES)

JUEGOS Y JUGUETES TRADICIONALES EN LA ILUSTRACIÓN DE CARTILLAS ESCOLARES (SIGLOS 19 Y 20)

João Amado (joaoamado@fpce.uc.pt) *

RESUMO

O texto, depois de um breve enquadramento teórico, assenta na análise de conteúdo centrada nas referências à atividade lúdica (palavras, frases, textos e imagens) de quatro cartilhas escolares usadas em Portugal no primeiro quartel do século XX. O problema central é o de perceber se as atividades lúdicas tradicionais ocupam algum espaço e possuem alguma função nas mensagens destes materiais pedagógicos. Veremos, ao concluir, que o aproveitamento pedagógico da experiência lúdica infantil se revela diminuto, o que pode ser interpretado como alguma desvalorização pelos currículos escolares, à época, dos mundos e culturas da infância.

Palavras chave: cartilha, currículo, brinquedo, jogo tradicional, culturas da infância.

ABSTRACT

The text, after a brief theoretical framework, is based on the content analysis centered on the references to the play activity (words, phrases, texts and images) of four learning to read books used in Portugal in the first quarter of the 20th century. The central problem is to try to understand if traditional play activities occupy a specific space and have some function in the messages of these pedagogical materials. We will see, in conclusion, that the pedagogical use of children's play experience turns out to be diminutive, which can be interpreted as some devaluation by the school curricula, at the time, of the worlds and cultures of childhood. Keywords: playbook, curriculum, toy, traditional game, childhood cultures

RESUMEN

El texto, después de una breve contextualización teórica, se centra en el análisis del contenido referido a la actividad lúdica (palabras, frases, textos e imágenes) de cuatro cartillas escolares usadas en Portugal en el primer cuarto del siglo XX. El problema central es el de comprobar si las actividades lúdicas tradicionales ocupan algún espacio y desempeñan alguna función en los mensajes de estos materiales pedagógicos. Veremos, al concluir, que el aprovechamiento pedagógico de la experiencia lúdica infantil se revela mínimo, lo que puede ser interpretado como una cierta infravaloración por parte de los currículos escolares, en la época, de los mundos y culturas de la infancia.

Palabras clave: cartilla, curriculum, juguete, juego tradicional, culturas de la infancia

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*Professor Associado com agregação, aposentado, da Universidade de Coimbra (Faculdade de Psicologia e de Ciências da Educação – Centro de Estudos Interdisciplinares do Século).

Submitted: 2nd December 2016 Accepted: 14th June 2017

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INTRODUÇÃO

O presente texto assenta na análise de um corpus constituído por quatro cartilhas escolares usadas em Portugal no primeiro quartel do século XX. Constitui-se como parte de um estudo mais amplo, abrangendo cartilhas e livros de leitura para o ensino primário do século XIX e primeira metade do século XX. O problema que nos orienta, desde já, nesta pesquisa, é o de perceber se as atividades lúdicas e, em geral, o modus vivendi da infância ocupam algum espaço nas mensagens desses materiais pedagógicos. Por outras palavras, procuramos saber se os mundos da infância, as suas culturas, teriam alguma legitimidade “na e para a escola”. Do mesmo passo, procuramos saber se as atividades lúdicas, representadas nesses primeiros contactos da criança com a leitura e com o livro, se constituem, também, como fontes importantes para a história do jogo, do brinquedo e da brincadeira no contexto da cultura e das tradições populares.

Começaremos por um pequeno enquadramento teórico procurando situar o nosso estudo no contexto das pesquisas em torno de cartilhas e manuais escolares como fonte para a história da educação; apresentaremos, depois e de forma breve, as quatro cartilhas que constituem o nosso corpus documental; seguidamente será exposto, com recurso à tipologia dos brinquedos proposta por Amado (2002, 2007), o levantamento dos brinquedos, brincadeiras e jogos representados nas 4 cartilhas, ao mesmo tempo que se avança numa interpretação do papel dessas representações (palavras isoladas, pequenas frases, textos e ilustrações) na alfabetização das crianças. Por fim, nas conclusões daremos destaque a alguns aspetos da análise efetuada, com especial relevo para o facto de, no material analisado, o aproveitamento pedagógico da experiência lúdica infantil se revelar diminuto, o que pode ser interpretado como alguma desvalorização, no plano pedagógico, dos mundos e culturas da infância.

1 . ALGUMAS NOTAS DE ENQUADRAMENTO TEÓRICO

O estudo das cartilhas e livros de leitura tem sido, de há umas décadas a esta parte, objeto de muita curiosidade e atenção, uma vez que se reconhece neles a presença de determinadas representações do mundo e das culturas que as produzem e promovem; vê-se neles, também, um instrumento de formação nos valores culturais ajustados àquelas representações através da ação educativa que a eles recorre (Monteiro, 2010; Magalhães, 2006, 2008).

As análises realizadas, quando centradas no século XIX e primeira metade do século XX, sublinham particularmente as intenções ideológicas (geralmente de pendor moralístico e/ou religioso) que estiveram na base da construção e seleção dos textos que se disponibilizavam às crianças. As temáticas que se identificam no seu interior são muito variadas; contudo, de acordo com Pinto (2009) e Pinheiro e Moreira (s/d), a infância e as suas culturas estão entre os temas que, em tais obras, mereceram pouca atenção.

A iconografia que acompanha e ilustra os textos das cartilhas e livros de leitura só recentemente tem vindo a ser, também, objeto de análise; inscrevem-se nessa linha, os trabalhos pioneiros de Escolano-Benito (1997) e sua equipa, em Espanha, com variados olhares sobre o livro escolar; a pesquisa de diversos autores brasileiros de que destaco, para já, o trabalho de Belmiro (2008),

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centrado na relação entre a aprendizagem da leitura/escrita e as imagens visuais. Em Portugal e Brasil, a investigação (Martelo, 1999; Pinheiro e Moreira, s/d), além de identificar nas ilustrações uma função reforçadora da mensagem moralizante dos textos, mostra, também, a pouca relevância dada a temas como o jogo e o brinquedo. Aspeto que não pode deixar de causar alguma estranheza, uma vez que a intuição e a investigação, à semelhança do que se verifica hoje (Feldman, 2004; Brookshire, Scharff & Moses, 2002), há muito defendiam que a exibição de algo relacionado com a experiência infantil, familiar, para mais reforçada com ilustrações, teria efeitos significativos na compreensão e na memória de longo termo e levaria as crianças a interagir mais motivadamente com os textos (cf. Fernandes, 1994, p. 486). E, nesse sentido, cabe perguntar: o que haverá de mais familiar e motivador para as crianças do que o jogo, a brincadeira e o brinquedo? E como é que esse facto foi aproveitado em termos pedagógicos, designadamente para o ensino das primeiras letras? Estas considerações remetem-nos diretamente para a questão dos métodos de ensino da leitura refletidos nas cartilhas do século XIX e inícios do século XX. Em Portugal, à semelhança do que aconteceu noutros países, numa evolução que vinha já dos séculos anteriores, surgiu um grande número de abecedários e cartilhas, de entre as quais se destacam a Leitura Repentina de António Feliciano de Castilho, publicada em 1850, e a Cartilha Maternal de João de Deus, publicada em 1876. Numa e noutra se reflete a grande preocupação pela facilidade, rapidez e prazer do aluno na aprendizagem e, consequentemente, pelos métodos a empregar; estes, ao tempo, identificavam-se nestes termos: sintético, analítico e intuitivo. O método sintético baseava-se nos processos de soletração e era o mais tradicional, fruto de uma longa herança (Magalhães, 1994; Mortatti, 2000; Ruivo, 2009); começava-se pelos elementos da palavra para chegar finalmente a esta, tal como se preconizava no método de Castilho. O método analítico assenta nos processos de palavração e sentenciação, partindo do todo (a palavra ou pequena frase) para chegar aos seus elementos. No método intuitivo prevalece “a lição das coisas” ao preconizar que se parta dos sentidos para o intelecto, da observação para a reflexão, das coisas para os nomes (Valdemarin, 2000). A aprendizagem deve ser feita com base na perceção sensível da realidade, no vocabulário e atividades familiares às crianças, de entre as quais se destaca o que é relativo ao brincar e ao jogar; daí o surgir de uma forte valorização da atividade e da educação física que deve acompanhar uma educação intelectual e moral das crianças assente na sua capacidade de processar a informação (Ruivo, 2009; Boto, 2012).

A ilustração, no entanto, ao longo da história dos materiais escolares, acompanha qualquer um dos métodos. Já no século XVI, aurora dos recursos impressos para o ensino da leitura e da escrita, surgiram as primeiras ilustrações a acompanhar o abecedário e os textos; exemplo disso é a Cartinha para aprender a ler, de João de Barros, associando as letras a imagens sugestivas e publicada em 1539, muito antes, portanto, do Orbis Sensualium Pictus de Coménio, editado em 1658 (Fernandes, 2006). Cedo, porém, as ilustrações foram postas de parte, prevalecendo a pedagogia cartesiana que preconizava um esforço assente, antes de tudo, no raciocínio lógico-dedutivo por parte do aprendiz (Belmiro, 2008). As ilustrações ressurgem com impacto no século XIX sofrendo, a partir daí e graças à “revolução coperniciana da impressão” (Petrus Rotger, 1997, p. 103), um grande desenvolvimento ao longo do período que nos interessa e até aos nossos dias. A presença de imagens, com efeito, podia ser muito positiva no trabalho em sala de aula, favorecendo o diálogo do aluno e do mestre e guiando “a perceção do menino desde as imagens exteriores até às interiores e daí aos juízos abstratos” (Feldman, 2004, p.83). Embora muito importantes no método analítico

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(que a Educação Nova designará por global), será, porém, no método intuitivo, na senda de Pestalozzi, que as ilustrações irão fazer mais sentido enquanto substitutas das “coisas naturais” cuja “lição” se queria aprender, facilitando, portanto, a aproximação necessária à mente da criança. Desde então até aos nossos dias foi-se tornando consensual que as ilustrações dos manuais para aprendizagem da leitura (bem como, em geral, dos livros para crianças) servem muitos objetivos: configurar ou contextualizar o que é dito no texto; definir, desenvolver e tornar atraentes as personagens; ampliar o enredo de uma história; fornecer um ponto de vista diferente da mensagem do texto; oferecer informação complementar; tornar o livro mais bonito e atrativo; e, sobretudo, influenciar positivamente os processo cognitivos de compreensão e memorização (cf. Fang, 1996; Pinkham, 2012; Brookshire et al., 2002; Belmiro, 2008). Ora, nesta ordem de ideias, a que conviria acrescentar toda uma argumentação assente na psicologia (Piaget, 1990; Vygotsky, 1998) e na sociologia da infância (Sarmento, 2003), parece-nos muito plausível a hipótese de que, nas cartilhas em estudo, as referências (palavras, frases, textos e imagens) a jogos, brinquedos e brincadeiras, enquanto elementos estruturantes e fundamentais do conhecimento e das culturas da infância, possuem (ou devem possuir) um lugar de destaque enquanto “andaimes” ou apoios exteriores, culturais e sociais, para as aprendizagens da leitura e da escrita (Kishimoto, 2016). Mas será que essa hipótese esteve presente nos princípios pedagógicos que estiveram na base da elaboração de tais recursos educativos?

É, pois, altura de apresentarmos, de forma mais explícita, a problemática deste estudo. Partimos da análise de conteúdo temática de um corpus constituído por quatro cartilhas escolares usadas em Portugal no primeiro quartel do século XX com os objetivos de encontrar resposta para as seguintes questões: de que modo é representado o património lúdico infantil nas quatro cartilhas em causa? Que jogos, brinquedos e brincadeiras se identificam quer nos textos quer nas ilustrações? Que funções pedagógicas exercem as representações (textuais ou imagéticas) da atividade lúdica no contexto do objetivo central das cartilhas, ou seja, a aprendizagem da leitura? Será que as mesmas representações servem também aos objetivos moralizantes, de formação cívica e, em geral, de formação das subjetividades, habitualmente presentes no género de materiais escolares em análise? Antes de prosseguimos, porém, temos de esclarecer ainda alguns conceitos imprescindíveis para o entendimento da nossa análise, a saber: património lúdico, cultura[s] da infância, brinquedo e jogo

tradicional e, finalmente, universo dos brinquedos populares. O património lúdico é composto por

diversas situações lúdicas tradicionais: jogo, brinquedo, brincadeira, festas, danças, rituais, tradição oral (mitos, contos, adivinhas, lenga-lengas, orações, provérbios…) e música tradicional (infantil, de adultos). Neste texto limitamo-nos aos jogos, brinquedos e brincadeiras. Na esteira de autores como Sarmento (2003), Tomás e Fernandes (2004), Nídio Silva (2011) e Barra (2015) traduzimos por cultura[s] da infância, o pensamento e as emoções das diversas gerações de crianças em torno de assuntos que lhe são próprios, a sua intencionalidade no agir e, por consequência, as suas práticas quotidianas, a que não faltam as nítidas marcas do tempo histórico e dos grupos sociais e culturais em cujo seio decorrem as suas vidas. Designamos como brinquedo aqueles objetos, mais ou menos estruturados, que servem e serviram de suporte material às brincadeiras e jogos infantis de hoje e de sempre, instigando a imaginação das crianças e permitindo-lhes uma inserção, através da fantasia e do faz de conta, no mundo social e cultural que as envolve. A inscrição permanente destes materiais na memória coletiva de um povo dá-lhes o cunho de tradicionais. Tradicionais podem ser também os jogos, enquanto atividades livres, improdutivas mas regulamentadas (Caillois, 1999) e

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veiculadas de geração para geração, anonimamente, no seio de uma determinada comunidade (Kishimoto, 2007; Paco Veiga, 2001). Amado (2002, 2007) distingue entre brinquedos tradicionais e brinquedos modernos. Cingindo-nos aqui aos primeiros, os que se reportam às práticas lúdicas de povos e culturas, avançamos uma distinção que separa os brinquedos tradicionais populares dos

brinquedos tradicionais artesanais e industrializados. É que os brinquedos populares têm, como

característica fundamental, o facto de serem construídos, a partir de elementos naturais e de desperdícios caseiros, pelas próprias crianças ou por adultos familiares e amigos; ao passo que os restantes, realizados por artesãos ou industrialmente, se destinam à comercialização e só depois chegam a quem os vai usar. A grande diferença está, pois, no facto de os populares serem um “projeto” das crianças para as crianças; ao passo que as outras duas categorias se podem considerar como um “projeto“ dos adultos para as crianças (Amado, 2015). Finalmente, entendemos por “Universo dos Brinquedos Populares” um conjunto de 13 “constelações” com que Amado (2002, 2007) tem vindo a arrumar o acervo de informações e de interpretações, colhidas com as mais diversas metodologias e de múltiplas fontes, em torno daquela categoria de brinquedos. A saber:

1-Adornos e adereços; 2-Brinquedos sonoros e musicais; 3-Bonecos, bonecas e acessórios; 4-Representação de animais; 5-Miniaturas de utensílios domésticos; 6-Miniaturas de alfaias e engenhos agrícolas; 7-Construções, artes e ofícios; 8-Transportes; 9-Armas e caça; 10-Quebra-cabeças; 11- Materiais de jogos infantis; 12-Fantasias; 13-Culinária infantil. Utilizaremos esta

mesma “arrumação”, para “trabalhar”, neste texto, os brinquedos artesanais e industrializados que a análise de conteúdo nos revelar.

2 . APRESENTAÇÃO DAS QUATRO CARTILHAS EM ESTUDO

A – Cartilha Maternal ou Arte de Leitura, de João de Deus, teve primeira edição em 1876. Nós usamos a terceira edição, “correta e aumentada”, de 1878, consultada no sítio da Biblioteca Nacional, composta por 24 lições sempre acompanhadas das orientações metodológicas para os professores. Não contém ilustrações, se excetuarmos o retrato do autor; só a partir da 24ª, de 2012, começam a surgir edições ilustradas por iniciativa de diversos artistas (Ruivo, 2009)2. Sabemos que a grande preocupação de João de Deus, ao elaborar o seu método, foi, como é dito nas duas páginas de apresentação, a de evitar “o flagelo da cartilha tradicional”, traduzido em “cansaço e violência”, frequentemente imposto a “cérebros tão tenros e mimosos”. O seu método inspira-se no que fazem as mães em casa na interação com os filhos. As mães ensinam-nos “falando, ensinando-nos palavras vivas, que entretêm o espírito, e não letras e sílabas mortas, como fazem os mestres” (p. 2). Por isso, a alfabetização tem de assentar num método “profundamente prático”, começando por palavras com significado para as crianças, “palavras que se digam, que se ouçam, que se entendam, que se expliquem” (p.7) e onde depois vão aprendendo o alfabeto, por partes. Estamos, pois, diante do

método analítico desenvolvido de forma muito particular, assente na leitura de palavras, silabando

sem recurso à soletração, numa aproximação da fala e da arte de ler (Magalhães, 2015). As palavras,

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segmentadas em sílabas impressas a cinzento e preto, apresentam-se como verdadeiras imagens “cujas sílabas são realçadas por variação tonal, estimulando a visualização do ‘todo’ (palavras) e de suas ‘partes’ (sílabas)” (Carlos, 2015, p. 210); noutros termos, trata-se de “estruturas visuais” em que se integram as letras (Ruivo, 2009, p. 126). Por isso, Carlos (2015, p. 210) ainda considera que um tal recurso gráfico é já um “prenúncio do uso de imagens figurativas em cartilhas de alfabetização”.

B – Cartilha Escolar: ler, escrever e contar, de Domingos Cerqueira, edição de 1912, começa com

uma pequena carta dirigida “aos Snrs. Professores”, afirmando, como intenção primeira, proporcionar um auxiliar para o maior aproveitamento dos alunos com o menor dispêndio de esforço do professor. Segue-se um conjunto de lições, de complexidade crescente, desde as vogais da primeira lição, ao abecedário e aos números na 25ª. Todo o texto é profusamente ilustrado com 205 imagens a cores, figurando as mais diversas temáticas. Todas elas, no entanto, se propõem a ajudar a criança numa aprendizagem intuitiva da leitura através da associação entre a imagem, a letra e a palavra.

C – Cartilha Experimental, de Alfredo Fernandes (1ª Edição de 1919; consultámos a 6ª edição, s/d)

apresenta, logo no início, duas páginas dirigidas “a quem ensina” seguidas de outras duas que transcrevem “apreciações” escritas por utilizadores do livro. Nas orientações o autor começa por dizer que a observação, o concreto, é indispensável para a aprendizagem da criança. E cita estas palavras de Pestalozzi: “Apresentai as coisas antes das palavras; o desenho é a introdução à escrita; concretizai o cálculo com objetos” (p. 3). A sua visão do sincretismo da perceção infantil apoia-se ainda no conhecimento de Claparède, para afirmar que “a criança vê primeiro a palavra, depois a sílaba e finalmente a letra” (p. 3). Finalmente considera que esta cartilha, além de satisfazer a curiosidade da criança (“que ela tem em ler o nome dos objetos em cima desenhados” p. 4), “satisfaz também a sua atividade, visto que se presta ao emprego das letras móveis, das lições de coisas e da modelação” (p. 4).

D – As minhas leituras da 1ª Classe, de Filipe Oliveira e Chagas Franco (s/d). A obra apresenta-se

sem qualquer introdução e talvez não se possa considerar como uma cartilha mas, antes, como o próprio título indica, um livro de leitura da 1ª Classe. Divide-se em 3 partes; a inicial é composta por 7 lições de iniciação. A segunda abrange da oitava à décima nona lição. E a terceira é constituída por um conjunto de 20 textos. As primeiras 7 lições baseiam-se no método intuitivo, incentivando a associação entre a imagem e a palavra que surge decomposta em sílabas. Os textos surgem quer em carateres de imprensa quer em letra cursiva.

3 . AS PEGADAS DA ATIVIDADE LÚDICA NAS 4 CARTILHAS

Como dissemos, as primeiras edições da Cartilha Maternal não apresentam quaisquer ilustrações. Mas vimos já como os cuidados de João de Deus, na apresentação gráfica das palavras (cerca de setecentas) selecionadas para a cartilha como instrumentos de iniciação à leitura, fez delas verdadeiras ilustrações. Haverá, nesse conjunto, alguns vocábulos relacionados com a atividade lúdica infantil? Ruivo (2009, p. 249-251), ao classificá-las e quantificá-las, verificou que os

divertimentos/passatempos e os desportos aparecem no fim da lista de um conjunto de 24 “centros

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vocábulos (bola, correr, andar). Se nos limitássemos ao tema dos jogos, brinquedos e brincadeiras, o número de termos seria, ainda, mais reduzido. Trata-se, portanto de uma percentagem ínfima (1,2%) em relação ao total das palavras.

Podemos dizer que, segundo a nossa própria análise, nas restantes obras do corpus documental que nos ocupa, os centros de interesse inventariados na Cartilha Maternal por Ruivo (2009) também estão presentes, com destaque para os elementos da natureza (flores, frutos, animais), o corpo humano, diversas cenas da vida familiar e da vida rural, elementos da cultura material e aspetos da atividade lúdica infantil. As referências a esta atividade são feitas através de palavras isoladas, de pequenas frases de iniciação à leitura, de textos e, de modo muito especial, através de imagens, como sintetizamos na tabela nº 1:

Tabela nº 1 – Distribuição, por cartilha, das referências a jogos e brinquedos Palavras Frases Textos Imagens J. de Deus 9 de 700 ( 1,2%) Cerqueira 9 de 786 (1,1%) 4 2 22 em 205 (10,7%) Fernandes 9 de 600 (1,5%) 8 0 7 em 100 (7,0 %)

Oliveira & Franco 2 de 33 ( 6,0%)

3 10 13 em 115 (11,3%)

Na cartilha de Cerqueira identificámos 9 palavras isoladas relativas ao tema dos jogos, brinquedos

e brincadeiras, num total de 786 (1,1%), a saber: toca (p.12), jogo (p.23), puxa (p.25), quina (do

baralho de cartas, p.26), guizo (p.32), fisga (p.36), espada (p.36), tambor (p.42) e pião (p.46). Contámos também 4 pequenas frases3 que, no entanto, só têm verdadeiro significado para os nossos propósitos quando completadas com a imagem que se lhes associa. Quanto a textos, demos conta de apenas 2 respeitantes ao tema num conjunto de 5. Por sua vez, as imagens relativas ao tema são 22 num total de 205 (10,7%).

Em Fernandes destacamos 9 (1,5%) num montante de 600 palavras isoladas: péla (p.16), jôgo (p.27), zagaia (p.29), arco (p.35), guizo (p.42), assobio (p.45), piões (p.50), funda (acompanhada do desenho de uma fisga, p.54), dado (p.13 e 66). São em número muito elevado as pequenas frases de iniciação à leitura ao longo de toda a cartilha, mas de acordo com o nosso interesse identificámos apenas 8: bola (p.21), boneca (p.24), joga (p.27), jogo da bola (p.31), zagaia (p.31), boneco (p.44),

pião (p.51), brincam (p.54)4. Por outro lado, contabilizamos 7 imagens relacionadas com atividade lúdica, num total de 100 (7%).

Oliveira e Franco limitam-se a 33 palavras isoladas, mas somente duas (6%) se relacionam com o nosso tema: “pião” (p.3), “tambor” (p.5). O livro regista muitas e variadas pequenas frases de

3 “vai até à mata” (p.12), “o sapato vai roto” (p. 16),”é feliz o pai daquele rapaz” (p.28), “O Paulo leva o capuz na cabeça” (p.30) 4

“vê se êle te dá a bóla” (p.20), “a bonéca da menina é nova” (p.24),”o janota joga e já viajou” (p.27), “Logo vou ao jogo da bola” (p.31), “O rapazote levou a zagaia” (p.31), “A cabeça do boneco é de cêra” (p.44), “O teu pião bateu no cabaz” (p. 51), “Êles comem, bebem, fálam, estudam, fogem, cantam e brincam” (p. 54).

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iniciação à leitura, mas relativas ao tema identificamos apenas 35, em que sublinhamos os termos:

tambor (p.6), brinca (p.7), arco (p.7). Contrariamente às restantes obras em estudo, esta apresenta

grande número de textos, sendo que 10 estão relacionados com o nosso tema. No que toca a imagens do lúdico inventariamos um conjunto de 13 no total de 115 (11,3%).

Observando os dados na sua totalidade, podemos concluir que embora os autores tenham procurado, nas palavras selecionadas, textos e imagens, uma ligação aos contextos culturais e ambientais dos pequenos leitores, não privilegiaram, pelo menos em termos quantitativos, o universo da atividade lúdica infantil. Apesar disso, há pequenas diferenças, entre as cartilhas. A mais notória é a ausência de ilustrações e de textos na Cartilha de J. de Deus. Nota-se ligeira diferença na obra de Oliveira e Franco, devido a percentagens maiores no que respeita a palavras e a textos alusivos ao tema; mas, quanto a ilustrações, as diferenças percentuais entre as três cartilhas não são significativas. Diga-se, no entanto, que as ilustrações de Sequeira são as únicas a cores, emprestando ao livrinho uma grande beleza e encanto.

No seguimento centrar-nos-emos preferencialmente nas ilustrações tendo em conta o facto de elas, em geral, surgirem associadas às palavras isoladas, às frases e aos textos, obrigando, desse modo, a uma interpretação que não dissocie todas estas variantes contextuais. Começaremos por distinguir, na sequência das definições que demos nas notas de enquadramento, as ilustrações que evocam brinquedos populares (3.1.), por um lado, e as que se relacionam com brinquedos artesanais/industrializados (3.2.), por outro; numa fase seguinte, será a vez das representações icónicas dos jogos tradicionais e de manifestações desportivas (3.3.). As representações mais complexas serão decompostas nas várias imagens que possam conter, sejam brinquedos ou jogos.

3.1. O MUNDO MAIS PRÓXIMO DA CRIANÇA: A FIGURAÇÃO DOS

BRINQUEDOS POPULARES

Na tabela nº 2 identificamos e distribuímos os brinquedos populares nas 3 obras, tendo em conta as constelações propostas por Amado (2002, 2007) em Universo dos Brinquedos Populares, e que aqui identificamos pela expressão chave antecedida da numeração que as ordena no conjunto:

Tabela nº 2: Distribuição por cartilha das ilustrações com brinquedos populares

Constelação nº 1 Adornos 6 Alfaias 8 Transportes 9 Armas 11 Material de jogo Totais Cerqueira Chapéu de papel (p.12) Menino com Arco (p.3)

Moça com arco (p.30) Espada à cinta (p.12) Fisga (p36) Pião (p. 46) 6 5

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Fernandes Arco e zagaia 2x (p, 29) Funda ou Fisga (p.54) Piões (3x p.50) e p. 71, 3 séries de 7,8,9 piões 5 Oliveira e Franco Carrinho de mão (p.27) Arco (p.7) Baloiço (p.27) Carrinho de linhas (p. 18) Barquinho (p.9) Pião (p.3) 6 TOTAIS 1 1 6 5 4 17

A constelação mais representada é a dos transportes (nº8, com 6 imagens). No conjunto prevalece o arco (com 3 figuras distribuídas por duas das cartilhas, sendo a brincadeira atribuída a um rapaz (fig.1) e a duas raparigas (fig. 9 e 16). Destaca-se depois o baloiço (fig.21) e um barquinho construído pelo José com a ajuda de seu avô (fig.18); situamos aqui também o carrinho de linhas na mão do irmãozinho de Berta (fig.19) que tanto podia ser, em si mesmo, um brinquedo como um recurso/desperdício caseiro abundante, à época, para a produção de muitos outros brinquedos pela criançada. Em segundo lugar surge a constelação das armas (nº9, com 5 imagens); neste caso, a fisga (ou funda) surge em duas das obras (fig. 12); trata-se de um dado interessante para o estudo da história deste brinquedo tão popular que, na realidade, possui diversas designações e se encontra nas mais variadas partes do mundo. Também nesta constelação inserimos a espada, supostamente de madeira, à cinta de um pequeno corneteiro (imagem que voltaremos a referir – fig. 3). O arco e zagaia surgem duas vezes na mesma página (p.29) na cartilha de Fernandes (fig.2). O pião é o único representante da constelação dos “materiais de jogo” (nº11) e aparece nos 3 autores; acrescente-se que, no entanto, para além das imagens e de algumas palavras isoladas (pião e piões) o jogo, em si mesmo, nunca é mencionado. Mas, num dos casos (Fernandes, p. 50 e 71), como veremos, a imagem dos piões, desdobra-se num conjunto de séries de apoio ao cálculo (fig.16), o que multiplica diversas vezes esta representação. O chapéu de papel (tricórnio, fig.3) que encima, de modo histriónico, a cabeça do pequeno corneteiro já referido, e um carrinho de

mão (fig.21) representam, respetivamente, as constelações dos adornos e adereços

(nº 1) e das miniaturas de alfaias agrícolas (nº6). Um aspeto comum a todas estas representações, para além da “proximidade” da criança com estes objetos (que pode até ser o seu construtor a partir de elementos da natureza e de desperdícios caseiros), é o facto de apontarem para brincadeiras e exercícios de ar livre.

3.2. – O PRIVILÉGIO DAS “PRENDAS”: OS BRINQUEDOS ARTESANAIS E

INDUSTRIALIZADOS

Na tabela nº 3 apresentamos os brinquedos artesanais e industrializados representados nas três cartilhas em estudo, e aqui também agrupados nas constelações referidas e respetiva numeração:

FIG.3 FIG. 2

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Tabela nº 3: Distribuição por cartilha das ilustrações com brinquedos artesanais e industrializados Constelação nº 2 Musicais 3 Bonecas 4 Animais 6 Alfaias 7 Construções 8 Transportes 11Material de jogo 12Fantasias Totais Cerqueira Cornetas, (p.12) e (p.54) Guizos (p.32, 54) Tambor (p.44) Boneca (p.50) Carrinho com diversas alfaias (p.12) Rapaz puxando carrinho (p.28) Casalinho puxando carrinho (p.25) Carrinho com boneca puxado por um carneiro (p.50) Cartas: as 4 quinas (p.26) Às de paus (p.28) Dados p. 62 Balões p. 63 14 Fernandes Dado (p. 13). 1 Oliveira e Franco Tambor (p.5) Bonecas (p.27) Boneca da Berta p. 46 Cavalo de pasta (p.27) Balde e pá da praia (p. 22) 5 6 3 1 2 1 2 4 1 20

Neste caso, a constelação mais representada é a dos brinquedos musicais (nº2). O tambor é referenciado em duas das obras ainda que, como veremos, com funções muito diferentes em cada uma delas. Mas em Cerqueira surgem também vários guizos e cornetas (fig.3). De entre os

materiais de jogo destacam-se os dados, representados nas obras de Cerqueira e Fernandes. Há

também a representação de cartas de um baralho (as 4 quinas e um ás de paus) em Cerqueira. Oliveira e Franco dão-nos as imagens de um cavalo de pasta de papel (fig.21, da constelação nº4, representação de animais) e de uma menina que brinca na areia da praia com um balde e uma pá (fig.4, constelação nº7, construções,

artes e ofícios).

As bonecas (nº3), sempre na posse de meninas, e nada indicando que as classifiquemos como populares, são duas vezes referidas em Oliveira e Franco. Em Cerqueira, a boneca faz parte das prendas que a Vitália recebeu dos pais por ser estudiosa (p.51), e que, na brincadeira, se fazia transportar no carrinho do Celestino

(fig.5). Este carrinho é um dos representantes da constelação dos

transportes (nº6); proveniente de Paris, chegou às mãos do menino

devido ao seu bom aproveitamento na escola. Reza assim o texto:

“Porque o Celestino fez bonito exame, a mãe ofereceu-lhe um

carneirinho, que êle ensinou a puxar a um carrito que o pai lhe trouxe há pouco de Paris. (,,,) Se a Vitália consegue fixar no assento do carrinho, a sua boneca, então é que vê-los alegres, rindo, pulando e batendo palmas. Os pais, que se alegram muito quando têm filhos

FIG.4

(12)

estudiosos e obedientes, já lhes prometêram outros brinquedos, se eles continuassem a ser bons meninos. E eles hão-de ver que eles vão merecer as prendas prometidas (p. 50-51).

O conjunto dos brinquedos representados na cartilha de Cerqueira, parece, pois, corresponder mais ao mundo das crianças ricas ou remediadas do que ao das crianças pobres, meninos de pé descalço6. Estes, mesmo com aproveitamento escolar e bom comportamento, tinham de contentar-se com o carinho dos pais…como acontece em casa de José Violante, que teria “comprado também uma

prenda [para o filho] se fosse mais remediado; mas porque é pobríssimo, vai-lhe manifestando o seu muito agrado com mil carícias, cada vez que o ouve ler” (p.44-45).

Seria interessante cotejarmos estas referências com a história do fabrico deste tipo de artefactos. Em primeiro lugar, trata-se de brinquedos que, na sua generalidade, se produziam na incipiente indústria do brinquedo, à época, em Portugal. De destacar, nesse sentido, é o já referido cavalo de

pasta de papel (fig. 22) que se fabricava em território nacional desde os trabalhos pioneiros de

Poitier (fins do séc. XIX), e teve a divulgação possível considerando as fracas possibilidades económicas da população. Também os outros brinquedos referidos nesta alínea, como guizos, gaitas ou cornetas, carrinhos e baldes, eram já de fabrico nacional (cf. Solano, Anjos e Moreira,1997). Note-se, no entanto, uma exceção a esta possível produção nacional: o carrinho que o pai do Celestino lhe trouxe de Paris; há, neste caso, para além do acentuar das diferenças das classe sociais que se faziam sentir nos jogos e brinquedos das crianças, uma espécie de prenúncio da globalização que a indústria lúdica há de vir a sofrer ao longo de todo o século XX, eliminando as suas raízes locais e étnicas.

Fazendo agora alguma comparação dos dados presentes nas duas tabelas anteriores (nº 2 e nº 3) podemos verificar que os brinquedos artesanais/industrializados são representados de forma mais variada que os populares (8 constelações versus 5), ainda que em número a diferença não seja significativa (respetivamente 20 versus 17). Mas os artesanais/industrializados são significativamente mais referidos por Cerqueira (14 desta categoria, versus 6 da primeira) do que pelos dois outros autores. Os transportes e os materiais de jogo, tendo em conta as duas tabelas, são as constelações a mais representadas.

3.3. - A REPRESENTAÇÃO DE JOGOS TRADICIONAIS E DESPORTOS

Na tabela nº 4 expomos os jogos e desportos referidos e, eventualmente, representados através das imagens.

6 Em Cerqueira, a diferença de classe das crianças representadas é notória a partir do modo como vestem e calçam. Na pág. 6 um pequeno

guardador de rebanhos está descalço recebendo a marrada de um carneiro; na pág. 13, a ilustrar a palavra “dava”, um menino bem trajado e calçado “dá” qualquer coisa a um seu condiscípulo pobremente vestido e de pés descalços; o mesmo acontece com os filhos da Carlota a quem o Joaquim ofereceu os pães do seu lanche e foi, por isso, muito louvado pelo professor (p. 47 e 48).

(13)

Tabela nº 4 Distribuição por cartilha dos jogos tradicionais e desportos Jogos

tradicionais

Desportos

Cerqueira Dança de roda (p.43) Jogo da tração à corda (p.49) Jogos das escondidas (p.49) Canoagem (p. 32) Esgrima (p36) Ginástica (p. 52 e 60)

Fernandes Lá vai alho (p. 23) Jogo da bola (p.31) Oliveira e Franco Arre burrinho ( p.4) Saltar à corda (p.17) Saltar ao eixo (p.67). Tiro ao alvo (p.37) Ginástica (p. 37) Total: 8 Total: 6

A tabela oferece um leque muito limitado de representações. Apenas 8 jogos tradicionais, embora muito comuns e populares desde há séculos e nas mais diversas partes do mundo: dança de roda (fig.11), jogo da tração à corda (fig.6),

escondidas (fig.6), lá vai alho (fig. 12), arre-burrinho (fig. 15), jogo da bola, saltar à corda e saltar ao eixo (fig.7). Lembremos, porém, que, nas tabelas nº 2

e 3, uma das constelações mais representadas foi a dos materiais de jogo, nomeadamente, do pião (4 referências), dos jogos de cartas (2 referências) e dos

jogos de dados (2 referências); sinal de que esses jogos também estavam presentes

no pensamento dos autores das cartilhas.

Olhando para o conjunto destas representações podemos dizer que se trata de jogos predominantemente físicos (com exceção dos jogos de cartas), realizáveis por grupos de crianças (à parte o arre-burrinho, que exigiria um adulto e uma criança) e bem adequados às vivências do antes e depois da escola, por isso, muito presentes nos hábitos das crianças que aprendiam pelas cartilhas. Correr, saltar, puxar, perseguir, apanhar, procurar… são os movimentos e gestos mais destacáveis destes jogos, o que, de algum modo, deve ser intencional no sentido de valorizar a atividade física de meninos e meninas; uma atividade a realizar ao ar livre, no jardim, como muitas vezes é referido e representado. É de notar também que, a par de uma relativa pobreza na quantidade e variedade das representações dos jogos tradicionais, também não se dá conta de qualquer nota ou referência ao valor educativo dos mesmos (a obediência a regras, a partilha, colaboração, etc.) apesar das preocupações moralizantes e ideológicas da época.

FIG. 6

(14)

No que diz respeito a desportos, as cartilhas em estudo também se limitam ao mínimo. Em Cerqueira encontramos uma imagem representando três meninos numa canoa, associados à leitura de “gue” e “gui”, como em “guinada” (p. 32). A propósito de “S” surge, no mesmo autor, uma imagem de dois esgrimistas (p. 36). No final da cartilha, o autor apresenta as letras maiúsculas aproveitando o formato de algumas (C, X, L, T) para evidenciar, através da ilustração, alguns exercícios de ginástica (p.52 e 60).

Em Oliveira e Franco, a apologia da ginástica é direta e clara, ainda que o faça apenas numa pequena lição; com efeito, na pág. 37 o autor apresenta, no formato de letra manuscrita, um texto ilustrado com uma imagem de André a fazer exercícios de ginástica (fig.8) e onde se lê: “André gosta muito de fazer ginástica.

Todas as manhãs, antes de ir para a escola, se exercita sob a direção de seu pai. E tem uma pequena carabina com que nos domingos e quintas feiras faz tiro ao alvo”. Para além do desporto do tiro ao alvo, trata-se, também, de uma referência

à prática da ginástica que, só por si, é já bastante significativa, dadas as condições da população portuguesa em geral, na primeira metade do século XX, em que a luta pela sobrevivência era primordial, o analfabetismo atingia os 75% da população, e em que as reformas do sistema educativo raramente tinham concretização ou a continuidade necessária. E assim, apesar de uma Reforma do Ensino Primário, de 1911, que determinava os exercícios a serem feitos nas escolas (cf. Ferreira & Moreira, 2015) durante a primeira República só uma elite se sentiu sensibilizada e formada para esta necessidade, em que se aliava o desenvolvimento físico ao desenvolvimento moral. E nesse grupo se deveria, por certo, situar o pai do André que todas as manhãs supervisionava a atividade física do filho.

4. O LÚDICO NA ALFABETIZAÇÃO E NA FORMAÇÃO DA

SUBJETIVIDADE

Retomando, ainda, o que dissemos na primeira parte, as imagens passam a assumir nas cartilhas um conjunto de funções pedagógicas e que, desde a época em causa, nunca mais deixaram de evoluir; de facto, como diz Belmiro (2008, p. 56) “as imagens podem e devem ser absorvidas como uma tecnologia mental de que se utiliza o indivíduo para realizar atividades cognitivas e metacognitivas. É a sua ferramenta de perceção”. Nesse sentido, e aliando as imagens já referidas às palavras, frases ou textos que lhes são complementares, podemos atribuir-lhes pelo menos cinco funções psicopedagógicas diferenciadas, a saber:

 Estímulo para que a criança associe o brinquedo representado ao valor fónico de uma

letra ou conjunto de letras.

Esta função está essencialmente presente em Cerqueira, dando sinais de que se aproxima, mais do que os outros autores, do método sintético. O conhecimento experiencial e cultural do objeto representado suscita a associação entre a palavra que o designa e o valor fónico da letra. O exemplo mais direto e impressivo, até pelo valor estético da imagem (p.3), é o do rapaz que impele o arco

FIG. 8 FIG.9

(15)

com um pau na mão, junto a uma árvore onde poisa uma águia (fig. 1); tudo, aqui, invoca o fonema “á”.

É ainda a associação da letra X e o seu valor em várias palavras, tais como “puxa”, que vai dar azo a uma imagem das mais ricas desta mesma cartilha… Um menino puxado em carrinho por um casal de crianças mais velhas (fig.10). Cena certamente vivenciada por muitas das crianças utilizadoras destas cartilhas, nas suas brincadeiras de rua, mesmo quando elas próprias improvisavam um carro a partir de uma caixa (palava igualmente associada ao X, no texto) montada sobre umas rodas. Mas a riqueza da imagem aumenta quando nos leva a pensar sobre a importância do grupo nestas brincadeiras de infância, que incluíam o convívio de ambos os sexos e de idades diferenciadas.

As imagens que o autor oferece dos jogos tradicionais e dos desportos (canoagem e esgrima, anteriormente referidos) vão no mesmo sentido. Assim, pudemos ver (fig.6) a representação dos jogos da tração à corda e das escondidas numa única página (p. 49, Lição 21ª), em torno dos diferentes valores fónicos da letra X. Mas se a esta perspetiva de análise juntarmos a atenção às questões de género na prática destes jogos, vemos que a tração à corda é praticada só por rapazes, ao passo que nas escondidas o grupo é misto. Já a dança de roda (p.43) junto aos sons: “na” “en” “in” “on” “un” (a que associa palavras como “cantam” e “lenço”) é aparentemente praticada, na imagem em causa (fig. 11) só por raparigas.

 Estímulo para associação da imagem à palavra escrita que designa o objeto

representado.

Trata-se de uma função caraterística da obra de Fernandes, na sequência do que ele preconizava na sua proposta pedagógica inspirada, como vimos, em Pestalozzi. Segundo o autor, “na criança, a primeira aquisição de conhecimentos é feita pela vista” (Fernandes, p. 3); ou seja, o conhecimento experiencial e cultural do brinquedo representado suscita a associação entre a oralidade que o designa e a leitura da palavra escrita no seu todo. É o caso das imagens da zagaia (fig.2), de um conjunto de três piões (p.50) e da funda (na realidade uma fisga, p.54), onde, logo a seguir à imagem surge a decomposição fónica da palavra, como se vê na figura 12.

Em Oliveira e Franco, esta função é desempenhada pelas imagens de um pião (fig.13) e de um tambor, sempre associadas à leitura da respetiva palavra escrita.

Mas uma das associações mais interessantes destes autores é a que dispõe em paralelo a expressão “O pai” e a representação do jogo do “arre burrinho”, em que uma criança se senta na perna traçada de um adulto (fig.14) e este a faz cavalgar provavelmente ao ritmo de umas rimas, muito variáveis de região para região7. Tudo parece querer dizer, numa mensagem subliminar, diríamos de currículo oculto, que

7

Como: "Arre burrinho / pr’Azeitinho/ Que os outros/ já lá vão! Pr’á Senhora do capuz! Truz... Truz...”. Ao dizer estas últimas palavras, o adulto imprime mais força ao movimento e levanta a criança mais alto. Cf. Costa, 1992, p.83.

FIG. 10

FIG.11

FIG.12

(16)

é ao pai que compete este tipo de relacionamento com os filhos, já que a mãe tem de se empenhar noutras tarefas (como sugerido numa imagem imediatamente a seguir, na mesma página).

 Estímulo aos primeiros ensaios de leitura/interpretação do texto

Não se trata já de associar o significado da imagem ao fonema ou à palavra escrita, mas de levar a criança leitora a avançar um segundo passo na leitura e interpretação do texto. Esta função é concretizada pelas pequenas frases que aparecem ao longo das três cartilhas como vimos na tabela nº 1. Oliveira e Franco oferecem-nos a terceira representação de um arco, de novo na mão de uma menina e associada à frase: “Elisa recebe um arco” (fig.15). Fica-nos a curiosidade de saber: porque é que Elisa recebe um arco? Por parte de quem? Trata-se de uma prenda? Veremos que as prendas estão especialmente relacionadas com os brinquedos artesanais e industrializados e que tinham quase sempre um alto preço para as crianças.

 Apoio à aprendizagem do cálculo.

Esta função, em Fernandes (p.71), cumpre-se nas três séries de piões (fig.16) desenhadas para apoiar a criança a fazer as somas: 6+1=7, 6+2=8, 6+3=9, multiplicando diversas vezes esta representação. E assim, o autor dava cumprimento, também neste aspeto, às propostas de Pestalozzi, concretizando o cálculo com objetos fortemente associados à experiência lúdica das crianças. Mas isso mesmo é, também, concretizada em Cerqueira, por

uma série de representações de dados (p.62) e por um conjunto de 7 balões empunhados por uma menina que parece chorar (p. 63; fig.17) por ver subtraírem-se-lhe dois deles que agora voam ao vento, ficando, assim, com 5 apenas!

 Contextualização/ilustração da narrativa visando a formação da subjetividade do leitor Os autores procuram ir muito para além das práticas de leitura e cálculo, passando mensagens, em geral, de teor moralizante e de formação cívica. Por isso, os pequenos textos a ler são, em grande medida, lições de boas maneiras e de civismo. Em Oliveira e Franco, onde estas narrativas surgem em maior número, deparamos logo na quarta lição (p.9) com um exemplo muito significativo para os nossos propósitos. Trata-se da imagem de um menino sentado sobre os calcanhares com um barquinho na mão e diversas ferramentas espalhadas em seu redor (fig.18). Ao mesmo tempo que, no texto, sincopado em sílabas, se descreve a quadro nestes termos: “José brincava com o seu barquinho. Tinha-o feito ele mesmo com o seu avô. O barquinho era muito lindo e tinha uma grande vela branca. José vai pintar de vermelho o seu barquinho” (p.9). Parece haver aqui, claramente, a intenção de oferecer ao pequeno leitor o exemplo de um menino que se sente feliz por fazer os seus próprios brinquedos, com imaginação e

FIG.15

FIG.18 FIG.16

FIG.17 FIG. 14

(17)

habilidade, sem deixar de recorrer ao saber e experiência do avô, num diálogo entre gerações que se faz em contexto familiar.

Não menos interessante é a invocação do carrinho de linhas (fig. 19) que o irmão de Berta “empeçou” quando ela “quis bordar o vestido do seu irmãozinho”… Porém “Berta, em cinco minutos, com toda a sua paciência desempeçou a linha” (p. 19). O carrinho de linhas, uma vez gasto e transformado em algo de pouco préstimo para os adultos, consistia, como já dissemos, num material precioso para a produção, pelas próprias crianças, de muitos brinquedos caseiros (cf. Amado, 2007). Mas saliente-se nesta cena, por um lado, a partilha e colaboração entre crianças de diferentes idades; e, por outro lado, o facto de Berta “bordar” o vestido do irmão. Assim, se na situação anterior temos um menino que constrói brinquedos, agora temos uma menina que borda; e esta é uma tarefa culturalmente atribuída às mulheres, assente em virtudes (como a referida paciência) e em competências (bordar, costurar, cozinhar) em geral adquiridas de forma lúdica (como é o caso), mas importantes na construção social da identidade feminina.

Embora, às vezes, pareça que no conjunto das representações das cartilhas em estudo se procura contrariar estes estereótipos (como, por exemplo no caso do “andar de arco”, que tanto se representa como atividade dos rapazes, fig.1, como das meninas, fig. 9 e 15), nem sempre essa intenção prevalece, como acabamos de ver, ou, ainda, no caso das 3 imagens de bonecas que surgem sempre na mão de meninas (cf. fig. 5 e 21). Esta ambivalência observa-se talvez até mais claramente na representação dos jogos; temos jogos partilhados por ambos os sexos como saltar à corda e jogar às escondidas (fig.6); mas também os há, como a dança de roda (fig.11), em que, pelo menos na representação em causa, não se vê nenhum rapaz; e jogos exclusivamente dos rapazes como a tração à corda (fig.6) e o saltar ao eixo (fig.7).

Destaque-se, ainda, e a propósito das habilidades manuais das crianças, o exemplo de “um bom filho”, o Joaquim (fig.20), que, tendo o pai doente e sem poder trabalhar, “teve uma ideia feliz”: “Foi à margem do ribeiro e colheu grandes braçadas de vime. Depois fez com o vime uma dúzia de cestinhos muito leves, muito bonitos. E foi vender os cestinhos ao mercado da cidade e trouxe muito dinheiro a sua mãe” (p. 61). Há aqui uma situação em que temos de falar mais em trabalho do que em brincadeira. Mas na ação de Joaquim há muitos ingredientes da atividade lúdica infantil: a espontaneidade, a engenhosidade, o entusiasmo, a manipulação de elementos da natureza para deles extrair um produto que, desta vez, não serve para brincar mas para vender e auxiliar economicamente os pais… Foi certamente a brincar, noutras ocasiões, com vimes, giesta, junco e muito mais, que o menino adquiriu a habilidade e a competência que, agora, exibe com eficácia e, supostamente, com orgulho. A este exemplo assentam bem as palavras de Walter Benjamim: “O espírito do qual descendem os produtos, o processo total da sua produção, e não apenas o seu resultado está sempre presente à criança, no brinquedo. É natural que ela compreenda melhor um objeto produzido por técnicas primitivas do que um outro que se origina de um método industrial complicado” (Benjamim, 1984, p. 93). Em Oliveira e Franco encontramos diversas referências ao brincar no jardim, ao ar livre, como que acentuando a importância desses contextos para a atividade lúdica. Destaca-se nesse sentido a

FIG. 20

FIG.21 FIG.19

(18)

representação de um conjunto de crianças utilizando diversos brinquedos (baloiço, carrinho de mão, boneca e cavalo de pasta) num ambiente com árvores ao fundo e onde até as mães dispõem de tempo, enquanto conversam, para vigiar e “contemplar” os filhos (fig.21). No texto assim ilustrado pode ler-se: “De tarde, no jardim há sempre muitas crianças. Algumas suspendem-se no baloiço, outras brincam com as suas bonecas, outras transportam areia nos seus carrinhos. As senhoras passeiam, conversam, contemplam os filhos” (p. 27). Vimos já, também, como este autor faz uma espécie de apologia da ginástica e dos desportos (v.g., tiro ao alvo), e como essa referência pode ser entendida num contexto histórico em que os responsáveis pela educação se começavam a preocupar por essa dimensão educativa que deveria empenhar a escola mas também as famílias.

A propósito das ferramentas dos meninos para a produção dos seus próprios brinquedos, é um pouco inesperado encontrar um texto com grandes preocupações em torno da posse de um canivete, por uma criança (fig.22). Com efeito, aproveitando a presença do amolador podemos ler, em Oliveira e Franco (p.31) que Ernesto pediu ao pai para aguçar o seu pequeno canivete; mas, em vez disso recebeu uma reprimenda considerando-o muito criança para ter um canivete que lhe podia fazer mal. Sabemos, pela literatura, como esta pequena “ferramenta” era usada, sonhada e preferida das crianças da época, motivo de orgulho e sinal de alguma confiança dos adultos; mas, pelos vistos, ainda não era a situação deste menino e a lição chamava a atenção para a perigosidade do artefacto.

Contrariamente ao que pudemos ver em Oliveira e Franco, agora em Cerqueira esta função de ilustração das narrativas e de moralização das crianças é feita, essencialmente, com base na representação de brinquedos artesanais e industrializados. Parece haver aqui o propósito de tocar mais fundo no orgulho infantil, na medida em que estes materiais representam objetos muito apreciados e valorizados pelas crianças, que chegam até elas enquanto “prendas” merecidas pelo seu bom comportamento e desempenho na escola, na condição de pertencerem a meios familiares com condições económicas para tanto. Foi esse o caso do carrinho do Celestino (fig. 5) e da boneca da Vitália, cujo texto transcrevemos na alínea anterior. Iguais condições relacionadas com o desempenho escolar estiveram por trás do “tambor” que fez pular “de contentes”, o Vitorino, a Juliêta e o Carlos, e “que os seus páis lhes compraram no dia em que os ouviram lêr êste livrinho até aqui” (p. 44).

Aliás, o conjunto dos brinquedos representados na cartilha de Cerqueira, parece corresponder mais ao mundo das crianças ricas ou remediadas do que ao das crianças pobres, meninos de pé descalço8. Estes, mesmo com aproveitamento escolar e bom comportamento, tinham de contentar-se com o carinho dos pais…como acontece em casa de José Violante, que teria “comprado também uma prenda [para o filho] se fosse mais remediado; mas porque é pobríssimo, vai-lhe manifestando o seu muito agrado com mil carícias, cada vez que o ouve ler” (p.44-45).

8 Em Cerqueira, a diferença de classe das crianças representadas é notória a partir do modo como vestem e calçam. Na pág. 6 um pequeno

guardador de rebanhos está descalço recebendo a marrada de um carneiro; na pág. 13, a ilustrar a palavra “dava”, um menino bem trajado e calçado “dá” qualquer coisa a um seu condiscípulo pobremente vestido e de pés descalços; o mesmo acontece com os filhos da Carlota a quem o Joaquim ofereceu os pães do seu lanche e foi, por isso, muito louvado pelo professor (p. 47 e 48).

.

(19)

Se os pais recompensam o bom comportamento com prendas de brinquedos (os que podem) ou com carinho (os pobres ou remediados), também castigam, se as brincadeiras não encaixam nos planos educativos da família e da sociedade. Encontramos em Oliveira e Franco (p.41) um bom exemplo disso, a propósito do “turbulento João” que trepou a uma cerejeira para apanhar um ninho de pintassilgos (uma brincadeira muito comum, à época) e foi bem castigado quando o ramo se quebrou e o menino caiu “de uma grande altura” e deitou muito sangue do nariz (fig.23); não bastando isso, foi também castigado pelo pai “com grande severidade porque lhe tinha dito muitas vezes que não devia apanhar os ninhos das avesitas” (p. 42), demonstrando aqui uma preocupação pelo que poderíamos chamar, em linguagem de hoje, de educação ambiental e que, de algum modo, foi tendo êxito na mudança dos costumes infantis e juvenis.

CONCLUSÕES

Reiteramos a afirmação de que o texto ora apresentado se constitui como o primeiro ensaio de um projeto mais amplo que, tomando como fontes documentais as cartilhas e os livros de leitura do “ensino primário” em Portugal, nos finais do século XIX e primeira metade do século XX, possa contribuir, por um lado, para a história dos brinquedos e dos jogos tradicionais; e, por outro lado, permita compreender que lugar e que papel era atribuído às vivências e práticas lúdicas das crianças no quadro geral das preocupações e intenções pedagógicas.

No que respeita ao primeiro objetivo, este ensaio permite-nos concluir que as cartilhas e manuais escolares se constituem como uma fonte histórica válida para o conhecimento de práticas lúdicas infantis, quer as que assentam na utilização e produção de brinquedos populares pelas próprias crianças, sem excluir a colaboração de familiares, quer as que se socorrem dos brinquedos artesanais e industrializados que chegam até a “alguma” crianças na figura de “prémios” obsequiados pelos seus pais e merecidos pelo bom comportamento escolar; sem esquecer ainda a presença de diversos jogos tradicionais e de algumas menções, ainda que quase reduzidas à apresentação de imagens, a desportos e prática da ginástica.

Tais referências assumem formatos muito diferenciados. Umas vezes limitam-se a meras palavras, embora quase sempre acompanhadas por uma imagem, e cumprindo funções pedagógicas variáveis em função do método de aprendizagem da leitura (analítico, sintético ou intuitivo) preconizado pelos autores da cartilha. Outras vezes inserem-se em pequenas frases de iniciação à leitura, podendo também ser ou não acompanhadas de imagens. Outras referências são feitas em textos mais completos, escritos com propósitos que vão da lição de leitura à transmissão de mensagens que visam inculcar, nos pequenos leitores, princípios e valores de ordem diferente: empenho nas tarefas escolares, bom comportamento, amizade, saber cuidar dos outros, evitar situações perigosas, brincar ao ar livre, contacto e respeito pela natureza, exercício físico, trabalhos manuais… Interessaram-nos nesta pesquisa, sobretudo, as ilustrações que acompanham e completam, quase sempre de forma muito direta e explícita, a palavra, a frase ou o texto. Estas ilustrações, independentemente do seu valor artístico, têm um lugar destacável ao lado de todo o património iconográfico relacionado com o tema da atividade lúdica e que tem vencido os séculos.

(20)

Acrescem a tudo isso, porém, duas notas importantes. Uma delas é a de que estas referências, nas suas quatro modalidades, surgem, na nossa “amostra”, em percentagens muito pequenas, tendo em conta a totalidade das que se referem a outros aspetos do mundo que rodeia (ou não) as vidas das crianças a alfabetizar. Do nosso ponto de vista, e de acordo com investigações referidas no breve enquadramento teórico, esses números tão reduzidos poderão significar uma limitada compreensão e valorização, por parte dos autores das cartilhas, do potencial da experiência lúdica das crianças enquanto fator de motivação para a aprendizagem. Essa conclusão é reforçada pelo facto de os textos, pequenas lições, apesar da forte tendência para moldarem a subjetividade, raramente se servirem das potencialidades formativas, do brinquedo, da brincadeira e do jogo. As referências às práticas lúdicas parecem estar mais ao serviço da mensagem dos adultos (como “tecnologia” da aprendizagem da leitura e do cálculo, ou como prémio do empenho e bom comportamento na escola) do que como genuína expressão do mundo imaginário e da experiência das crianças; talvez porque, para os autores, esse mundo não passe de um mundo de dispersão, de indisciplina, de distúrbio. A corroborar esta interpretação, transcrevemos o que se dizia num artigo sobre “a distração das crianças”, na revista Educação Nacional (16-4-1899, nº 134): “Vejamos agora o aluno que o jogo empolga. Quantas vezes o espírito se ausenta da aula! Pensa no que há de fazer durante o recreio, no divertimento para que convidará os colegas. (…) Esta classe de crianças tem uma imaginação cujos rasgos os levam a praticar o que a boa disciplina lhes proíbe” (citado in Boto, 2012, p. 133).

Apesar de tudo isto, e esta é a segunda nota, lá vamos deparando com situações variadas, de que destacamos um feliz construtor dos seus brinquedos recebendo, para isso, a ajuda do avô! Lá vamos encontrando meninas e meninos, mais e menos crescidos, isolados ou em grupo, a brincar e a jogar nos jardins! E nem falta o exemplo daquele que sabe investir o seu saber fazer, aprendido certamente na brincadeira (isso não é dito), para ajudar financeiramente os seus pais! Lá está, portanto, o verdadeiro mundo das crianças, das suas interações, das suas aprendizagens mútuas, das suas manipulações e experiências, da sua ternura e carinho, mas também das suas transgressões e travessuras … mundo a partir do qual tudo começa, ainda que os adultos o ignorem, ou até, o desprezem e silenciem!

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Tabela nº 1 – Distribuição, por cartilha, das referências a jogos e brinquedos  Palavras  Frases  Textos  Imagens  J
Tabela nº 2: Distribuição por cartilha das ilustrações com brinquedos populares
Tabela nº 3: Distribuição por cartilha das ilustrações com brinquedos artesanais e industrializados  Constelação  nº  2  Musicais  3  Bonecas  4  Animais  6  Alfaias  7  Construções  8  Transportes  11Material de jogo  12Fantasias  Totais  Cerqueira  Corne
Tabela nº 4 Distribuição por cartilha dos jogos tradicionais e desportos  Jogos

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