Quine e Davidson (e Neurath)
Unidade 4
–
W. v. O. Quine
Tradução radical,
indeterminação da referência e
os dogmas do empirismo
Tradução radical
Interpretado Falante
Intérprete
Linguagem L Enunciados P,
Q, R, S...
Linguagem L’ Enunciados P’,
Q’, R’, S’...
Tradução radical
Interpretado Falante
Intérprete
Linguagem L Enunciados P,
Q, R, S...
Linguagem L’ Enunciados P’,
Q’, R’, S’...
Circunstâncias
Tradução radical
Interpretado Falante
Intérprete
Circunstâncias
{“Gavagai”}L {“Coelho”}
L’
Tradução radical
Interpretado Falante
Intérprete
Circunstâncias
{“Gavagai”}L {“Orelhudo”}
L’
Tradução radical
Interpretado Falante
Intérprete
Circunstâncias
{“Gavagai”}L desconectadas {“Partes não de coelho”}L’
Tradução radical
Interpretado Falante
Intérprete
Circunstâncias
{“Gavagai”}L {“Animal”)
L’
Tradução radical
Interpretado Falante
Intérprete
Circunstâncias
{“...”}L
{“Animal, exceto
este espécime,
nesta situação”)L’
Tradução radical
Interpretado Falante
Intérprete
Circunstâncias
{“Gavagai”}L {“Veloz”)
L’
Indeterminação da tradução
Interpretado Falante Intérprete Circunstâncias Sistema de elocuções L: A, B, C, ..., X, Y,Z, ...
Tradução L2: A2, B2, C2, ..., X2, Y2, Z2, ...
[Correlações]
Tradução L1: A1, B1, C1, ..., X1, Y1, Z1, ...
Referências (A)
•
QUINE
, W. V. [2004] [1960]. “Translation and
meaning”. In: QUINE, W. V.
Quintessence:
Basic readings from the philosophy of W. V.
Quine
, p. 119-168. Ed. por Roger F. Gibson, Jr.
Cambridge, Mass. / London: Belknap Press,
2004.
•
Publicado originalmente em
Word and object
,
Conexões com Neurath a explorar
–
1
De que maneira a discussão quineana da
indeterminação da tradução pode ser
relacionada com a situação discutida por
Neurath
em “
Proposiciones
protocolares” –
•
a saber, a questão da possibilidade de
comunicação e troca de protocolos entre
Robinson Crusoé e Sexta-Feira? (Neurath
[1932], in Ayer [ed] [1959],
El positivismo
Os dois dogmas do empirismo segundo Quine
1
–
Distinção analítico/sintético
A definição tradicional é:
Enunciado analítico =
(a) Aquele que é verdadeiro em virtude do significado dos termos
(b)
Aquele no qual “o predicado está contido no sujeito”
(c) Basta
compreender
o enunciado para saber que ele é verdadeiro
Enunciado sintético =
(a) Aquele que é verdadeiro não apenas em virtude do significado
dos termos
(b)
Aquele no qual “o predicado não está contido no sujeito”
(c) Não basta compreender o enunciado para saber que é
verdadeiro; a aferição da sua verdade constitui uma questão
Os dois dogmas do empirismo segundo Quine
1
–
Distinção analítico/sintético (cont.)
Diferenças importantes a notar:
Enunciado analítico =
(a) Aquele que é verdadeiro em virtude do significado dos
termos
(b) Enunciado verdadeiro por razões
semânticas
Tautologia =
(a) Enunciado verdadeiro em qualquer valoração (atribuição de
valores de verdade), no cálculo proposicional
(b) Enunciado verdadeiro em virtude da forma lógica ou
sintaxe
Verdade lógica =
(a) É o correspondente, no cálculo de predicados, à tautologia
(b) Enunciado verdadeiro em qualquer interpretação (modelo)
Os dois dogmas do empirismo segundo Quine
1
–
Distinção analítico/sintético (cont.)
A reconstrução de Quine
das tentativas de estabelecer a
distinção tradicional:
•
Analiticidade em termos de definições
•
Analiticidade em termos de sinonímia
Sinonímia em termos de
permutabilidade preservadora de
verdade
Os dois dogmas do empirismo segundo Quine
A visão de Quine sobre (1):
Os dois dogmas do empirismo segundo Quine
1
–
Distinção analítico/sintético
Podemos dizer que Quine coloca em questão a
distinção
entre teoria e linguagem.
Hilary Putnam pergunta: “A lógica é empírica?”
Lógica
Geometria
____________
::
_____________
Conexões com Neurath a explorar
–
2
Como a crítica quineana da dicotomia analítico /
sintético relaciona-se com as teses de Neurath de que:
•
os enunciados protocolares fazem parte de um
mesmo sistema juntamente com os demais
enunciados científicos
–
não formando um sistema à
parte,
e que:
•
qualquer enunciado fisicalista pode funcionar como
enunciado protocolar?
Os dois dogmas do empirismo segundo Quine
2
–
O reducionismo de significado
Hume, Carnap, Wittgenstein – Critério de significado e reducionismo de significado
• “Sempre que alimentarmos alguma suspeita de que um termo
esteja sendo empregado sem nenhum significado, precisaremos apenas indagar: de que impressão deriva essa suposta ideia?”
(Hume, Investigação sobre o Entendimento Humano, 3, 2)
• “Um enunciado possui significado cognitivo se possuir uma interpretação empírica.” (Carnap, Hempel, “Problems and changes in the empiricist criterion of meaning”)
• “Entender uma proposição significa saber o que é o caso se ela
for verdadeira. | (Pode-se, pois, entendê-la e não saber se é verdadeira.) | Entende-se a proposição caso se entendam suas
partes constituintes.” (Wittgenstein, Tractatus, 4.024)
• “O significado de um enunciado é o seu método de verificação.”
Os dois dogmas do empirismo segundo Quine
2
–
O reducionismo de significado
A visão de Quine sobre (2):
Quine em espírito neurathiano
(a) “Nossos enunciados sobre o mundo se defrontam com o ‘tribunal da
experiência’ não isoladamente, mas sim em conjunto” (Quine, “Two dogmas of empiricism”, 1953, p. 41).
(b) “A unidade de significado empírico não é o termo nem o enunciado, mas
Quine em espírito neurathiano
«A TOTALIDADE DO NOSSO assim chamado sistema de crenças, desde os assuntos
mais casuais da geografia e da história até as leis mais profundas da física
atômica, e mesmo da matemática pura e da lógica, é uma trama feita pelo ser humano, que toca na experiência somente nas bordas. Ou, para usar uma
imagem diferente, o todo da ciência é como um campo de força cujas condições de contorno estão na experiência. Um conflito com a experiência na periferia ocasiona reajustes no interior do campo. Os valores de verdade precisam ser redistribuídos por alguns dos nossos enunciados. A reavaliação de alguns
enunciados acarreta a reavaliação de outros, devido às suas interconexões lógicas
— com as leis lógicas sendo, por sua vez, nada mais do que outros enunciados do sistema, outros elementos do campo. Tendo reavaliado um enunciado, devemos reavaliar alguns outros, que podem ser enunciados logicamente conectados com o primeiro, ou podem ser, eles próprios, enunciados de conexões lógicas. Porém o campo total é de tal maneira subdeterminado por suas condições de contorno
— a experiência — que existe muita margem de escolha com respeito a quais enunciados cabe reavaliar à luz de uma experiência contrária qualquer. Nenhuma experiência particular está conectada com qualquer enunciado particular no
interior do campo, a não ser de forma indireta, através de considerações de
Quine em espírito neurathiano
Se este ponto de vista está correto, é equivocado falar sobre o conteúdo empírico de um enunciado individual — especialmente se é um enunciado distante da periferia experimental do campo. Além disso, torna-se ocioso buscar uma fronteira entre os enunciados sintéticos — que valem na
dependência (contingente) da experiência — e os enunciados analíticos — que valem haja o que houver. Qualquer enunciado pode ser mantido como verdadeiro haja o que houver, se fizermos ajustes suficientemente drásticos em outras partes do sistema. Mesmo um enunciado muito próximo da
periferia pode ser mantido como verdadeiro em face de um experiência recalcitrante, alegando-se alucinação ou então revisando-se certos
enunciados tais como as leis lógicas. Inversamente, pela mesma perpectiva, nenhum enunciado é imune à revisão. [...]
Quine em espírito neurathiano
[...] Sustento que uma experiência recalcitrante pode ser acomodada por meio de qualquer uma dentre várias reavaliações alternativas em várias regiões diferentes do sistema como um todo; porém, nos casos que agora estamos imaginando, nossa tendência natural a perturbar o mínimo possível o sistema como um todo iria nos levar a concentrar nossas revisões
naqueles enunciados específicos que versam sobre casas de tijolo ou
centauros. Existe a sensação de que esses enunciados possuem, portanto, uma referência empírica mais incisiva do que os enunciados altamente teóricos da física, da lógica ou da ontologia. Estes últimos podem ser pensados como estando localizados de maneira relativamente central dentro da rede total, significando apenas que impõe-se pouca conexão preferencial com quaisquer dados particulares dos sentidos. [...]
Quine em espírito neurathiano
Nesta concepção, as questões ontológicas estão em pé de igualdade com as questões da ciência natural. [...]
A questão sobre se existem as classes parece mais ser uma questão de esquema conceitual conveniente; ao passo que a questão acerca de se existem centauros ou casas de tijolo em Elm Street parece mais ser uma questão factual. Porém tenho insistido que essa diferença é apenas de grau, e que acaba dependendo da nossa inclinação vagamente pragmática se
ajustamos um fio do tecido da ciência em vez de outro para acomodar alguma experiência recalcitrante particular. Em tais escolhas o
conservadorismo marca presença, assim como a busca pela simplicidade. [...] A cada ser humano é dada uma herança científica, além de um bombardeio de estimulação sensorial; e as considerações que o guiam para moldar a sua herança científica de modo a ajustar-se às suas constantes demandas sensoriais são, quando racionais, de tipo pragmático.»
Quine em espírito neurathiano (cont.)
«A ciência não é descontínua nem monolítica. Ela é variadamente
conectada, com conexões que são frouxas em graus variados. Diante de uma observação recalcitrante, temos liberdade para escolher quais enunciados revisar e quais preservar, e essas alternativas irão perturbar diversos
pedaços da teoria científica de diferentes maneiras, e com severidade variável.
[...]
O cientista ocasionalmente revoga até mesmo um enunciado de observação, quando ele conflita com um corpo teórico bem assentado, e também
quando ele tentou em vão reproduzir o experimento. Porém a tese de
Duhem estaria errada se entendida como impondo um estatuto igual sobre todos os enunciados de uma teoria científica, e assim negando um forte pressuposição em favor dos enunciados observacionais. É esse bias que torna a ciência empírica.»