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COMISSÃO DE SEGURANÇA PÚBLICA E COMBATE AO CRIME ORGANIZADO

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Academic year: 2021

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PROJETO DE LEI N

o

7.135, DE 2006

Tipifica o porte de arma de qualquer tipo em presídio.

Autor: Deputado Moroni Torgan Relator: Deputado Ary Kara

I - RELATÓRIO

O projeto de lei em epígrafe, do ilustre Deputado Moroni Torgan, inserindo um art. 354-A, no Decreto-lei nº 2.848, de 7 de dezembro de 1940 – Código Penal, tipifica como crime, passível de pena de reclusão de quatro a oito anos e multa, a posse ou uso por um preso de qualquer tipo de arma.

Em sua justificativa, o Parlamentar afirma que, nos termos hoje definidos na legislação pertinente, a posse ou utilização de arma no interior da prisão implica, tão-somente, infração de ordem disciplinar, o que não intimidaria o infrator. Em conseqüência, far-se-ia necessário considerar-se a posse de arma como crime autônomo, com pena suficientemente grave e intimidante, que atue como elemento inibitório à prática desse tipo de conduta. Conclui sustentando que a “sociedade clama por uma política de ‘tolerância zero’ nas prisões” e que se fossem apenados “gravemente cada ato que geraria futuramente as ações das facções criminosas como o PCC” não precisaríamos “nos preocupar depois com o agravamento da situação”.

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II - VOTO DO RELATOR

A matéria objeto do projeto de lei sob análise, em face dos recentes acontecimentos no Estado de São Paulo, exige, antes de tudo, ponderação na reflexão do seu alcance e da sua eficácia.

Em um primeiro momento, de forma compatível com a condição humana que nos é própria, com todas as suas grandiosidades e defeitos, a tendência é aprovar-se com louvor a iniciativa, na esperança de que uma lei, com regras mais rígidas, possa transformar a realidade fática e impor regras de conduta mínimas entre os apenados recolhidos a estabelecimentos prisionais.

Porém, mesmo reconhecendo a elevada intenção do Autor, de impor ordem a uma situação caótica, somos obrigados a nos manifestarmos contrariamente à aprovação da proposição sob análise, pelas razões que a seguir passo a expor.

Dentro do campo da política criminal, vamos nos valer de conceitos apresentados em bem elaborado parecer do Dr. César Barros Leal1, titular do Conselho Nacional de Política Criminal e Penitenciária, sobre a questão de aumento de pena e novas tipificações penais, que reforçam nosso entendimento de que a proposição não atingirá o objetivo pretendido.

O Dr. César Barros Leal transcreve do livro de Paulo de Souza Queiroz “Funções do Direito Penal: Legitimação versus Deslegitimação do Sistema Penal” o seguinte trecho2:

[...] a intervenção penal, por encerrar as mais contundentes e lesivas manifestações sobre liberdade das pessoas, não pode ter lugar senão em situações de absoluta necessidade e adequação. Não pode, enfim, o direito penal fundar-se num simbolismo que, iludindo os seus destinatários por meio de uma fantasia de segurança jurídica, encubra, por meio de uma solução barata e, não raro, demagógica (a edição de leis penais ou o aumento do seu rigor), as raízes dos problemas sociais subjacentes a toda manifestação delituosa, sobretudo

1

Texto na íntegra disponível na página

http://www.mj.gov.br/cnpcp/legislacao/pareceres/Parecer%20sobre%20mudan%C3%A7as%20no%20CP %20e%20na%20Lei%20dos%20Crimes%20Hediondos%E2%80%A6.pdf. Acessado em 13 de julho de 2006

2

QUEIROZ, Paulo de Sousa. Funções do Direito Penal: Legitimação versus Deslegitimação do Sistema Penal. Belo Horizonte: Del Rey, 2001, pp. 56-57.

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quando se sabe que a intervenção penal é uma intervenção sintomatológica e não etiológica, pois atinge os problemas sociais em suas conseqüências e não em suas causas [...].

Fazendo-se a adaptação dessa análise para o objeto da proposição, pergunta-se: deve ser combatida com tipificação penal sancionada com penas severas a posse de arma ou devem ser adotados procedimentos administrativos eficientes para eliminar o ingresso ou a fabricação de armas e a sua posse no interior do presídio?

Evidentemente, a apenação é a solução mais fácil e mais visível. Porém, sua eficiência é restrita. Todos os que têm noção mínima do funcionamento dos estabelecimentos prisionais brasileiros sabem que, na vida real, não na ficção das normas legais, existe um sistema hierárquico interno nos estabelecimentos penais que geram cadeias de comando mais rigorosas que as existentes em organizações militares, porque o seu descumprimento não gera uma medida disciplinar, mas a morte do preso indisciplinado pelos seus “colegas” de prisão.

Em conseqüência, jamais um preso que ocupe uma posição relevante na hierarquia do presídio será responsabilizado pela posse de arma. Assim como acontece nos casos de homicídios entre apenados, serão previamente escalados entre os presos não integrantes das gangues prisionais os que assumirão a posse do armamento, os quais serão apenados com mais quatro a oito anos de reclusão. E eles irão preferir assumir a culpa de outros porque a opção à negativa de assumir a culpa é a condenação à morte pelo comando interno dos criminosos.

Também muito interessante para a análise desse tema é um artigo publicado por César Costa Alves de Mattos, Doutor em Economia, no jornal Valor, de 13 de julho de 2006, página A-10.

Este artigo analisa a declaração do Ministro da Justiça, Márcio Thomaz Bastos, de que a redução dos crimes no Brasil passaria mais pelo aumento da probabilidade de punição do criminoso do que pelo tamanho da pena imposta. Posicionando-se de forma contrária à afirmação do Ministro Thomaz Bastos, à luz de conceitos da ciência econômica do direito, o Autor afirma:

O ministro da Justiça, Márcio Thomaz Bastos, tem reiterado que não caberia uma revisão das penas inscritas no Código Penal brasileiro para fins de redução da criminalidade no país. Conforme o ministro, a desejada redução dos crimes no Brasil

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passaria mais pelo aumento da probabilidade de punição do criminoso, ou seja, da certeza da pena, do que pelo tamanho da pena imposta.

Consideramos essa avaliação interessante, dado que ministro utilizou uma típica análise do ramo da ciência econômica do direito, a qual se guia pelas conseqüências das regras do sistema criminal sobre o comportamento futuro dos potenciais criminosos e não por fatores de ordem ética e moral muitas vezes levantados nessa discussão. Considerações relativas a calibrar as penas com o objetivo de "fazer justiça" ou "vingança" não têm lugar neste tipo de análise que se baseia na idéia do "crime racional" consagrado por seminal artigo de Gary Becker ("Crime and Punishment: An Economic Approach". Journal of Political Economy 76, 1968).

A premissa fundamental é que os criminosos, de forma

similar aos agentes da teoria econômica, realizam uma análise custo-benefício sobre se vale a pena ou não cometer a infração. A variável-chave, do ponto de vista do

criminoso, é naturalmente o "valor esperado da punição", representado pela multiplicação da probabilidade de punição com o tamanho da pena.

[...]

A análise econômica do direito destaca que o efeito relativo do tamanho e da probabilidade de punição sobre a criminalidade depende fundamentalmente das atitudes do infrator em relação ao risco. Diz-se que o criminoso é neutro ao risco quando ele responder de forma proporcionalmente equivalente a essas duas variáveis. Ele será propenso ao risco quando responder mais que proporcionalmente à probabilidade do que ao tamanho da punição, e avesso ao risco no caso oposto.

[...]

Em suma, a afirmação do ministro da Justiça ilustra uma forma de raciocínio que deveria servir de parâmetro para se rediscutir o sistema criminal no Brasil. Nesse contexto, o instrumental da análise econômica do direito, com base em dados concretos sobre o comportamento criminoso no Brasil, pode ser de grande valia. E, acreditamos, ser razoável postular que um incremento das penas efetivas para crimes violentos poderá ser um dos ingredientes fundamentais de eventual reforma. (colocamos em negrito)

Os elementos de análise apresentados no artigo são extremamente relevantes para a avaliação da proposição ora sob análise. Destacaram-se do corpo do texto duas partes que consideramos pertinentes para a análise da proposição sob comento.

A primeira parte sustenta que “criminosos, de forma similar aos agentes da teoria econômica, realizam uma análise custo-benefício sobre se vale a pena ou não cometer a infração”. A segunda, a de que o criminoso será propenso à

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prática do delito se a probabilidade de vir a ser punido for inferior ao risco oferecido pela quantidade de pena aumentada.

Ora, com base nesses elementos, podemos concluir que uma nova tipificação penal só terá efeito inibidor de prática de delito se houver a certeza de que o novo tipo penal será aplicado ao autor efetivo do delito e não a um prisioneiro escalado para ser responsabilizado pelo crime se ele for descoberto. Isso, no entanto, não ocorre no caso sob análise.

Considerar a nova tipificação penal e a sanção grave a ela cominada como fatores de inibição de prática de delito – observada a análise econômica da relação custo-benefício aplicada ao direito penal – é incidir em um erro que, na Estatística, em teste de hipóteses, é denominado de “erro do tipo II”. Esse tipo de erro consiste em falhar na rejeição de uma hipótese nula, isto é, falsamente aceitar uma hipótese inválida.

E exatamente isso que ocorre no caso presente. A idéia motivadora do projeto parte da hipótese de que o detentor físico da arma agiu com liberdade para a tomada de decisão, portanto deveria responder pelo seu ato. Essa hipótese é nula, uma vez que ela não é válida para cem por cento dos casos em que um detento porta uma arma ou em que o detento acusado de portar a arma seja realmente quem a estava utilizando. Ou seja, o autor físico ou intelectual da posse ou uso da arma não está atingido pelo novo tipo penal. Portanto, o aumento de sua probabilidade de punição por esse delito é de zero por cento. Nesse caso, observados os parâmetros anteriormente indicados para a análise econômica do direito, o fator de inibição – aumento da probabilidade de punição – não está incrementado, portanto a medida é absolutamente inócua.

Poder-se-ia alegar que o detento acusado de portar a arma negaria a sua posse com medo do aumento de pena e indicaria quem seria o verdadeiro responsável. Também essa premissa é inválida, porque a pena, nesse caso, é uma variável inelástica. Se o acusado de portar uma arma indicar quem verdadeiramente era o responsável pela sua posse ou uso, ele estará morto no dia seguinte. Portanto, entre o aumento da pena e a conservação da própria vida, o detento inocente do delito sempre preferirá a primeira hipótese. Por essa razão, o aumento da pena é denominado de variável inelástica, na relação. A pena pode ser aumentada em dez vezes, mas seu valor será sempre infinitamente menor que o da vida do detento.

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Embora convicto de que a iniciativa teve a melhor das motivações, constituindo-se na materialização da indignação que assola a toda a sociedade brasileira, tenho que, pelos argumentos anteriormente deduzidos, que ela não se mostra eficaz e não contribuirá para a redução do uso de armas no interior de presídios ou para a responsabilização dos verdadeiros culpados desses delitos.

Em conseqüência, VOTO pela REJEIÇÃO deste Projeto de Lei nº 7.135, de 2006.

Sala da Comissão, em de de 2006.

DEPUTADO ARY KARA

RELATOR

Referências

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