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AS PRÁTICAS FAMILIARES ENTRE OS SANTOS DOS ÚLTIMOS DIAS: UMA ANÁLISE NAS FOTOGRAFIAS DA REVISTA A LIAHONA (1995-2000)

Juliana Sales Rodrigues

Graduada em História – UNEB/Campus XVIII

E-mail: jsr.salesrodrigues@gmail.com

Introdução

A relação entre família e religião tem sido alvo de observações, enfoques e definições, por se tratar de duas instituições que tem grande influência enquanto marcadores sociais. Nos últimos anos por exemplo, tem se visto no Brasil uma grande eloquência no que diz respeito a essa questão, e que por sua vez, vem gerando transtornos por sua influência nos diversos segmentos sociais, à citar a política.

Esta combinação, família, religião e sociedade vão se entrelaçar a partir das preposições apontadas por Peter Berger (1985) de exteriorização, objetivação e interiorização, logo, “[...] o indivíduo é socializado para ser uma determinada pessoa e habitar um determinado mundo” (BERGER, 1985, p.29), desta maneira, o condutor para este intercambio será o grupo social básico que é a família, o principal receptor e comunicador das percepções construídas na sociedade.

Diante disto, os sujeitos são personagens ativos na construção da sua realidade, onde podem produzir os artefatos que respalde suas intenções, neste trabalho, os Santos dos Últimos Dias utiliza a Revista A Liahona, bem como, todo o material que a compõe, destacando as fotografias. É importante salientar que as fotografias são produtos da sociedade, e que por sua vez, deve ser analisada enquanto documento para a construção de uma narrativa historiográfica.

Neste sentido, é preciso considerar as potencialidades da fotografia, pois como aponta Luciana Pinto (2004, p.35) “O historiador como cientista social não pode se manter alheio a influência que a imagem tem na sociedade, pois corre o risco de ficar fora da realidade do processo histórico em curso”, ou seja, o mundo se tornou imagético, portanto, as imagens devem ser explicadas e contadas para que haja uma mediação entre os indivíduos e o mundo.

Partindo deste pressuposto, as fotografias são constituídas por uma teia de significados, logo, é possível notar na Antropologia e na descrição densa construída por Clifford Geertz

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(2008) uma possibilidade de método, pois propõe uma análise dos elementos culturais de modo interpretativo, visando explicar seus significados, e media-las entre suas leis e propósitos, nesse sentido, é possível perceber os objetivos dos Santos dos Últimos Dias na construção, publicação e distribuição da revista A Liahona.

O “Povo do Livro”: a religião na formação norte-americana

Na História dos EUA, o puritanismo enquanto legado, remonta ao século XVII quando em 1630 dissidentes religiosos a bordo do Arabella e de outras embarcações sob liderança de John Winthronp desembarcaram na Baía de Massachusetts, Nova Inglaterra, que segundo Heike Paul (2014, p.138) “[...] lhes foi concedido por Carlos I de Inglaterra o direito de criarem uma nova colônia, na qual fundariam a cidade de Boston”, nesta colônia formaram uma comunidade de caráter puritano que se solidificou.

A população dessa nova comunidade se constituiu de órfãos, mulheres pobres, ladrões, devedores, e, ainda, um grupo ao qual a História consagraria como “peregrinos”, para eles, a América seria um refúgio, tendo em vista, a perseguição religiosa que era constante na Inglaterra dos séculos XVI e XVII.

Para Marta Fernandes da Silva (2018, p. 4) “[...] os motivos que trouxeram os puritanos ingleses para o Novo Mundo, é factual que os puritanos de Massachusetts se assumiam como reformistas, não pretendendo desvincular-se da Igreja Inglesa antes purificá-la”, isto porque, os desígnios da reforma não pudera ser concretizado em solo inglês devido as perseguições as quais foram sujeitas, em especial, aos que se filiavam ao protestantismo de inspiração calvinista, e que vinham acusando a Igreja de Inglaterra.

Os puritanos (protestantes calvinistas) tinham como base religiosa o ideal do povo escolhido para construir a nova Canaã, o novo povo de Israel, assim sendo, eram o grupo escolhido por Deus para criar uma sociedade de eleitos. Dentro dessa perspectiva os Santos dos Últimos Dias defendem enquanto doutrina que a Nova Jerusalém (Sião) será organizada no continente americano.

O fato destes cidadãos puritanos serem leitores contínuos do Velho Testamento, fazia-os crer que o mesmo que ocorrera com Israel quando fugia de Faraó, agora estava se repetindo com eles. Partindo das preposições de Silva (2018, p.7) “A difusão da mensagem através das sagradas escrituras estava bastante facilitada porque na maioria dos casos a Bíblia era o único livro que os colonos possuíam e com o qual aprendiam a ler. Esta comunidade puritana ligada

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à Bíblia considerava-se o povo do Livro”, nesse sentido, toda a cosmovisão, isto é, a forma pela qual os homens organizam sua vida em sociedade, fora constituído a partir dos viés religioso.

Outros fatores que vão influenciar significativamente o surgimento da Igreja de Jesus Cristo dos Santos dos Últimos Dias, se dará nos séculos XVIII e XIX, isto, com a valorização das ideias iluministas e o crescimento das industrias. Neste contexto, a religião passa a perder espaço, situação está que promoveu duas etapas do movimento que ficou conhecido como o Grande Despertar, sendo o primeiro entre 1730 e 1740, que possibilitou o surgimento de diversos grupos religiosos. Este movimento ficou marcado por suas reuniões campais, que cumpriam uma dupla função: social e religiosa, emotivas e organizadas em maioria por Batistas e Metodistas que superaram em adeptos denominações anteriores, como Congregações Anglicanas e Presbiterianas.

No concerne ao Segundo Despertar que ocorreu após o processo de independência das colônias britânicas, o seu efeito fora visto dentro do processo de imigração para o oeste no início do século XIX, momento ao qual os Santos dos Últimos Dias passam a se organizar. Este movimento propagou a retomada do messianismo através das ideias milenianismo, que se refere a Segunda Vida de Cristo a Terra, que era por sua vez, uma doutrina recorrente entre os puritanos do século XVII.

Para Silva (2018, p. 17) a distinção entre o Segundo Despertar do século XIX face ao Grande Despertar do início do século XVIII se assentou em dois aspectos:

“[...] o Segundo Despertar não se confinou geograficamente a Nova Inglaterra abrangendo também o Oeste e o Sul e foi mais política e socialmente consciente do que o primeiro Grande Despertar. O Segundo Grande Despertar não apenas reforçou a fé dos indivíduos como inspirou as comunidades para que estas pudessem estabelecer e transformar as instituições, tendo como dinamizadores os protestantes evangélicos que compreenderam que muitos dos seus projetos só seriam praticáveis com o envolvimento do governo e por isso pugnaram por leis designadamente contra o jogo e consumo de bebidas alcoólicas, contra aquilo que consideravam como vícios na sociedade e dos quais a mesma tinha de ser purgada”.

Assim, como apontado por Peter Berger em O Dossel Sagrado “[...] os homens forjam instituições que o enfrentam como estruturas controladoras e intimidadoras do mundo externo [...]” (BERGER, 1985, p. 23), logo, os indivíduos buscam mecanismos para medir as maneiras

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que suas práticas serão conduzidas com relação ao outro. Ou seja, os objetivos religiosos se vincularam aos valores seculares. Diante disto, pode-se dizer este foi o início do credo civil, e que vem caracterizando a sociedade norte-americana.

A Igreja de Jesus Cristo dos Santos Últimos Dias

A Igreja de Jesus Cristo dos Santos dos Últimos Dias é uma instituição religiosa cristã com “características restauracionista” oriunda do contexto de reformismo religioso do século XIX dos EUA, como foi apontada por Priscila Machado (2013). Foi organizada oficialmente no dia 06 de Abril de 1830, sob direção de Joseph Smith Jr. (1805-1844), norte-americano que viveu no Estado de Nova Iorque, na recém-formada Nova Inglaterra. Ao descrever a história desta Igreja em Alagoas Nádia Amorim escreve:

Joseph Smith Jr., filho de Joseph Smith e Lucy Mack Smith, descendentes de ingleses e escoceses, chegara com os pais e oito irmãos, em 1816 ao Estado de Nova Iorque, procedentes do Estado de Vermont [...] Envolvido pelo clima de dissidência religiosa predominante na “Fronteira Americana” durante a primeira metade do século XIX, insatisfeito com o universo religioso povoado de preceitos metodistas e presbiterianos ao qual se convertera sua família, Joseph Smith encontraria na Bíblia e na oração um referencial para eclosão de sua experiência. (AMORIM, 1981, p.29)

Neste cenário de alvoroço religioso, Joseph Smith teve o que os Santos dos Últimos Dias chama de Primeira Visão. Nesta visão fora revelado a Joseph Smith que a “verdadeira Igreja de Jesus Cristo” havia deixado de existir na terra há 1.400 anos e que o próprio Joseph Smith serviria para restaurá-la novamente nos últimos dias, desta forma “Joseph Smith foi, assim, escolhido por Deus para restaurar a Igreja de Jesus Cristo na Terra” (MACHADO, 2013, p.20). Ancorada a está visão, os adeptos da Igreja de Jesus Cristo, interpretam algumas escrituras bíblicas relacionando-as com a necessidade da Restauração da Igreja de Cristo, por exemplo, Isaías 29:13-14.

Para os Santos dos Últimos Dias está escritura corresponde ao que estava ocorrendo nas colônias inglesas na virada do século XVIII para o XIX que conforme Fernandes e Morais (2011) ocorreram devido ao movimento do “Grande Despertar”, quando o número de igrejas protestantes aumentou. O renascimento religioso foi fincado marcadamente na Nova Inglaterra e na parte ocidental do estado de Nova York, onde residia Joseph Smith. Para Leandro Karnal

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“ao valorizar a experiência pessoal da religião, o ‘Grande Despertar’ estimulou o surgimento de inúmeras seitas protestantes” (KARNAL, 2011, p.55).

Após este processo de consolidação da Igreja de Jesus Cristo, os mesmos passaram a se expandir para outros países, sendo um destes, o Brasil, tendo por objetivo também se aproximar de povos que seriam remanescentes das nações citadas no Livro de mórmon sendo eles os indígenas norte e sul-americanos.

No Brasil os primeiros membros chegaram na condição de colonos alemães, imigrantes que buscavam novas perspectivas de vida. Nos históricos da Igreja encontra-se o seguinte:

O primeiro membro da Igreja conhecido no Brasil foi Max Richard Zapf, que foi batizado na Alemanha em agosto de 1908 e imigrou ao Brasil em 1913. Após muitos anos sem contato com a Igreja, Max Zapf e sua família souberam que Augusta Kuhlmann Lippelt e seus quatro filhos, que também haviam se filiado a Igreja na Alemanha, antes de imigrarem para o Brasil em 1923(...) Essas duas famílias representaram o início da presença permanente da Igreja no Brasil (Church Almanac apud SILVA, 2008, p.74).

Como apontado, a família Lippelt obteve maior destaque na História da Igreja no Brasil, tendo em vista o contato que mantiveram com a sede da instituição em Salt Lake. Ao chegar ao Brasil em 1923 a Sr.ª. Auguste Kuhlmann Lippelt escreveu para a sede da Igreja em Salt Lake City “solicitando literatura e contando sobre as condições favoráveis para início da obra missionária no Brasil” (SILVA, 2008, p.64).

Segundo Silva (2008, p. 66) “[...] o trabalho se desenvolveu, e muitas foram as conversões. Em 1940 um novo momento se iniciou nesta localidade, o estabelecimento da capela de Ipoméia[...]”, seguido de outras unidades, como, Blumenau, Jaraguá, Rio Branco e Novo Hamburgo. Ainda, o número de missionários de tempo integral passou de oito para quatorze, e então, posteriormente, foi construído o Centro de treinamento missionário no Brasil em São Paulo.

Neste cenário, cabe evidenciar as razões que colaboraram para a emigração destas famílias para o Brasil. Silva (2008, p. 69) aponta que a “Alemanha vivia um período de extrema pobreza, devido ao Pós-Guerra, fazendo com que os bens perdessem seu valor”, além disso, o sucesso da Colônia São Leopoldo no Rio Grande do Sul, motivava-os a pertencer a esta localidade.

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Contudo, a partir de 1930 conflitos diversos surgiram devido ao projeto de Estado liderado por Getúlio Vargas, então como todas as palestras eram realizadas em alemão, em 1939 “[...] o presidente Getúlio Vargas proibiu a realização de reuniões públicas em qualquer outro idioma que não fosse o português[...]” (MACHADO, 2013, p.21) houve então a necessidades de novas medidas para a continuidade das atividades da Igreja. Assim, o Presidente da Missão Brasileira Hulon S. Howells ordenou que fossem preparados materiais em Português, “para que os missionários pudessem trabalhar com os brasileiros e não somente com os alemães” (SILVA,2008, p.88).

Um fator que marcou também os primeiros passos da Igreja no Brasil, foi a interrupção dos serviços missionários devido a Segunda Guerra Mundial, em dezembro de 1941, quando os Estados Unidos entram na Guerra. Com este conflito foram “suspensas as vindas de missionários Mórmons para o Brasil, procedentes daquele País. Também foi determinado pela Igreja, que os missionários que estavam no Brasil retornassem para seus países de origem” (SILVA,2008, p.89), por estas razões muitas atividades foram interrompidas, como as reuniões dominicais.

Devido a isto, além dos materiais que já haviam sido traduzidos pelos missionários para o português, houve a necessidade da utilização de periódicos enquanto não havia uma forma de se comunicar com a liderança da Igreja, para isto, a Liahona bem como outros períodos foram utilizados.

A Liahona: uma revista mundial

A utilização de periódicos seja ela em formato de jornal ou revista é recorrente nas instituições religiosas, da mesma maneira os Santos dos Últimos Dias utiliza a Revista A Liahona para divulgação das doutrinas da Igreja e manutenção da fé dos participantes deste segmento.

Ana Luíza Martins em seu trabalho sobre as Revistas em tempos de República aponta que as mesmas cumpriam papéis específicos, ou seja, de acordo com os objetivos de quem a produzia, estas poderiam ser “[..] espaços de representação, configuradora de identidades, lócus de reflexão e, sobretudo, instrumento de construção e veiculação de um modelo nacional” (MARTINS,2008,p.59), assim sendo, as revistas tornam-se importantes para divulgação e reflexão do que é compreendido enquanto realidade social para os segmentos que os desenvolve.

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Desde a organização da Igreja de Jesus Cristo dos Santos dos Últimos Dias, as publicações impressas se tornaram mecanismos essenciais de divulgação das ideias e valores do grupo nascente. A produção de materiais, tais como, livros, folhetos e revistas foram feitas constantemente, para que fosse possível abarcar um espaço religioso maior. Com o crescimento da Igreja houve a necessidade de elaborar uma revista que atingisse aos membros de todo o mundo, no Brasil, por exemplo, houve a criação da revista Gaivota pela Missão Brasil em 1948.

De toda forma, percebendo a dualidade desses trabalhos, o Presidente Howard W. Hunter, organizou todas elas na Revista Internacional, que foi publicada em nove idiomas. A maioria das revistas continuou mantendo seu nome original até o ano de 2000, quando todas se tornaram A Liahona.

A escolha deste nome para a revista se deu, devido sua particularidade entre os membros da Igreja. No Livro de Mórmon a Liahona é uma esfera de latão com dois ponteiros que indicavam a direção a seguir. Leí, um profeta que viveu na época do velho testamento, chamou essa bússola de Liahona, que significa guia e palavras de Cristo. Esta revista estaria se tornando a representante mundial da Igreja de Jesus Cristo.

A publicação da A Liahona é mensal e distribuída por meio eletrônico e aplicativos, bem como, por assinatura, tanto para membros quanto para não membros, as fotografias usadas na revista podem ser encomendadas a profissionais, contudo, os membros da Igreja pode enviar fotografias para compor a revista.

As práticas familiares nas fotografias da Revista A Liahona

A fotografia enquanto um “registro realista e objetivo do mundo visível” (OLIVEIRA, 2017, p. 177) passou a ser mais constantes entre os grupos sociais e instituições de víeis políticos, sistemas educacionais e religioso, neste sentido, é singular nesta pesquisa observar a Igreja de Jesus Cristo dos Santos dos Últimos Dias a partir do seu produto, as fotografias da Revista A Liahona. A principal doutrina para os membros de A Igreja de Jesus Cristo dos Santos dos Últimos Dias se refere a constituição de famílias, e não somente sua ligação terrena, mas para toda a eternidade.

De acordo com a Declaração intitulada: A família: Proclamação ao Mundo, anunciada em 1995 pelo Presidente Gordon B. Hincley, defende que a família “é essencial ao Plano eterno do Pai Celestial”, levando-os a vida eterna. Segundo Bruno Leal

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“Um dos valores que os mórmons mais cultivam é a família. De acordo com a sua doutrina, a família pode continuar existindo mesmo depois da vida terrena. Isso, no entanto, acreditam os mórmons, ‘somente pode acontecer quando a família é selada’ em um dos sagrados templos do senhor em todo mundo e unida pela eternidade [..]” (LEAL, 2017, p.37)

Por certo, é incentivadas que sejam realizadas atividades em família, para que as mesmas se tornem mais próximas no sentido de terem o mesmo objetivo, a vida eterna. Entende-se entre os membros desta Igreja que a salvação é uma questão individual, mas a vida eterna como apontado depende do que é realizado pelas famílias. Tendo em vista a valorização das fotografias para a reafirmação de um modelo exemplar de família, serão analisadas abaixo um aspecto dentre os quais foram apontados no trabalho de conclusão de curso.

Entre essas fotografias as famílias representadas promoviam atividades que legitimava as crenças e valores do conjunto social e religioso que participavam, tornando-se então condutores de práticas e promovendo a construção de novos modos de fazer, ser e se comportar em sociedade.

Desta forma, “[...]toda e qualquer expressão cultural socialmente legitimada pode se transformar em instituição, inclusive ideias e teorias” (OLIVEIRA, 2008, p.44) diante disto, as instituições, como família e religião exercem por meio de suas práticas um controle sobre a conduta humana, determinando então os parâmetros do socialmente aceitável como discorre também Peter Berger (1985). Portanto, a relação família e religião enquanto instituições legitimadoras constroem práticas para os grupos sociais, isto por meio dos seus matérias de divulgação.

Tendo em vista a metodologia aplicada nas fotos, a descrição densa de Geertz (2008), é possível perceber uma fotografia de uma família feliz, isto, por que todos os membros da família estão sorrindo. O plano de fundo da fotografia está em tom lilás que de certa forma se equilibra com os tons das roupas que os membros da família estão usando. Para além disso, o que mais interessa nesta foto é a presença de materiais que define e/ou orienta o modo como uma família deve se organizar financeiramente. Em cima da mesa, encontra-se uma carteira com quatro divisórias para cartões bancários, uma outra extremidade o objeto está com dinheiro e alguns papéis que podem ser notas fiscais. Em cima da fotografia existe um comprovante com números que pode ser o extrato financeiro, ainda uma planilha com um lápis amarelo, e um óculos. Esses materiais indicam um dos princípios entre os Santos dos Últimos Dias que se refere a

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autossuficiência, que é a autonomia financeira, no intuito de prover por si próprio suas necessidades e de seus familiares. Devido a isto, a Igreja promove cursos de autossuficiência, como, Educação para um emprego melhor e Melhorar e iniciar um negócio próprio, além de cursos sobre finanças pessoais.

Figura 01: Finanças familiar. Fonte: Revista A Liahona 2000, p.43.

Esse princípio deve ser ensinando pelos pais a seus filhos, na fotografia que compõe a imagem, o pai está em tamanho maior referente aos demais membros da família, isto, pode ser explicado tendo em vista a configuração patriarcal existente dentro das famílias nucleares entre os Santos dos Últimos Dias. Boris Kossoy atenta para a o fato das imagens religiosas arquitetarem cuidadosamente os elementos das fotografias, assim “[...] o tema é captado através de uma atmosfera cuidadosamente arquitetada; imagens onde a informação se vê registrada dentro de uma preocupação plástica, uma estética de representação[...]” (KOSSOY,2001, p.48), sendo assim, associar os princípios básicos ensinados por esta instituição por meio de imagens está associada ao modos de ensinar. Diante disto, este processo de comunicação passará por um momento de aceitação, isto é, “[...] Aquelas percepções que forem extremamente singulares ou não aceitáveis pelos padrões socialmente estabelecidos permanecerão dentro dos limites da vida familiar, mas, as demais percepções normalizadas pela sociedade passarão a ser compartilhadas com outras famílias” (OLIVEIRA,2008,p.43), desta forma, esses princípios e crenças apresentadas na fotografia poderá gerar práticas a outros grupos que estão além do arranjo familiar.

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Figura 02: Educação religiosa. Fonte: Revista A Liahona 1995, p.13

Uma forma de proliferação de práticas culturais entre os membros deste segmento religioso, como já vimos até o momento, se encontra no uso de gravuras no ensino familiar. Na figura 02 existe a presença quase que discreta da gravura de Jesus Cristo, em perfil, como se tivesse olhando para algo, Para Burke as “Imagens têm sido utilizadas com frequência como um meio de doutrinação, como objetos de culto, como estímulos a meditação e como armas em controvérsias” (BURKE, 2017, p.74-75), assim, essas gravuras são inseridas às fotografias como mecanismo de auxiliar na tarefa de visualização do conteúdo ensinado, além de reforçar a narrativa dos pais, não sendo eles a única fonte de informação. A fotografia é composta por uma família Monoparental, mãe e filha negras, de cabelos curtos vestidas dentro dos padrões de vestuário e aparência promovidos por esta instituição, roupas recatas com camisas que cobre os ombros, sem decotes que reafirmam estes valores, outro fator relevante a analise desta imagem, são as escrituras abertas em cima da mesa, parece o registro de um momento de educação religiosa familiar onde a mãe está dirigindo este ensino. Cabe ressaltar, que está instituição está ligada ao processo de formação dos EUA, que teve enquanto pioneiros religiosos os puritanos calvinistas, conhecidos como povo da Bíblia, logo, é possível observar como a Igreja de Jesus Cristo valoriza a utilização dos livros padrões no ensino religioso.

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Figura 03: Reunião familiar. Fonte: Revista A Liahona 1998, p.21.

Peter Burke ao discorrer sobre as imagens apontou o seguinte “Imagens significavam muito mais do que um simples meio de disseminação do conhecimento religioso” (2017, p.79) concomitantemente, as imagens registram formas de comportamento social, cotidianas e até mesmo festivos. Na imagem acima (Figura 03) é representado um momento de atividade salutar como definem os membros deste segmento. A família encontra-se na cozinha reunidos em torno do balcão preparando biscoitos como é apresentado alguns no prato branco em cima do balcão, o patriarca desta família aparece em pé ao lado da mulher, contudo, através do uso do avental pela mulher indica que ela está responsável por esta atividade, o que condiciona o papel das mulheres. Em A Família: Proclamação ao Mundo o modelo familiar é estabelecido da seguinte maneira:

Segundo o modelo divino, o pai deve presidir a família com amor e retidão, tendo a responsabilidade de atender às necessidades de seus familiares e de protegê-los. A responsabilidade primordial da mãe é cuidar dos filhos. Nessas atribuições sagradas, o pai e a mãe têm a obrigação de ajudar-se mutuamente, como parceiros iguais. Enfermidades, falecimentos ou outras circunstâncias podem exigir adaptações específicas. Outros parentes devem oferecer ajuda quando necessário. (A FAMÍLIA: proclamação ao mundo)

Segundo Adille Rigoni Massimini (2018) por meio deste documento a Igreja reforça o papel que será assumido pelo pai que é prover as necessidades do lar, tanto financeiras como ou espirituais, enquanto a mãe está obrigada a cuidar do lar e dos filhos, neste sentido, homens e mulheres não desempenham tarefas iguais na família. Para Burke (2017, p.156) “[...] limpar

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a casa; sentar para uma refeição; participar de procissões religiosas; visitar mercados e feiras; caçar; patinar; descansar a beira mar; ir ao teatro, ao hipódromo, ao concerto ou a opera; participar das eleições, comparecer a bailes [...]” são práticas que podem ser estabelecidas no meio familiar através das fotografias expostas na revista A Liahona.

Figura 04: Família eterna. Fonte: Revista A Liahona, 2000,

A fotografia acima, apresenta um modelo similar às abordadas anteriormente, isto, pode ser percebido pela presença de retratos em sua mesa que a liga a sua família. Para Peter Burke torna-se necessário examinar “As posturas e os gestos dos modelos e acessórios e objetos representados a sua volta seguem um padrão e estão frequentemente carregadas de sentido simbólico” (BURKE, 2017, p.42), desta forma, uma fotografia é percebida como uma forma simbólica, e como tal está impregnada de sentidos.

Um elemento que compõe a fotografia (figura 04) e aponta a mensagem que quer transmitir é o texto “Lembre-se deles” que indica a doutrina do Batismo vicário, ordenança que é realizada nos Templos em favor dos falecidos que está inserida na disposição dos retratos. Conforme Oliveira (2017) os retratos de família podem ter um papel significativo na construção de memórias coletivas dos portadores deste material, assim, a disposição desses retratos em torno da menina apresenta uma maneira de lembrança individual sobre sua família, além de recriar um ideal de formação familiar, com os porta-retratos na mesa que contém um casal.

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Figura 05: Lembranças familiares. Fonte: Revista A Liahona, 1996, p.07.

Dentro da mesma linha de análise encontra-se outra fotografia da revista A Liahona que respalda a necessidade de lembranças familiares. A encargo do pai nesta foto ficou a de apresentar o álbum familiar. Para Valter Oliveira (2017) as fotografias sempre fizeram parte do domínio das memórias familiares, tornando possível a possibilidade da constituição da História da família a ser fomentada entre o grupo familiar.

Esses modos de ensinar o outro, pode ser visto por meio das fotografias, logo o conhecimento parte dos pais para os filhos, isto de maneira direta ou indireta por meio das gravuras que são utilizadas e por artefatos elaborados pelos próprios sujeitos, desta maneira, “A distribuição social do conhecimento começa assim com o simples fato de não conhecer tudo que é conhecido por seus semelhantes, e vice-versa, e culmina em sistemas de perícia extraordinariamente complexos e esotéricos” (BERGER, 1985, p.68), que é percebido nos elementos que compõe as fotografias, tais quais, álbuns fotográficos, e porta-retratos.

Na figura 06, outro fator que marca as fotografias da revista A Liahona é quantidade de filhos nas imagens representadas. No grupo de filhos sempre há a presença de meninos, mesmo que a quantidade seja inferior no que diz respeito as meninas. De toda forma, em poucas fotografias é evidenciado um número inferior a dois filhos. Na década de 1990 os EUA estava passando por uma queda na taxa de fecundidade, isto, pode ter contribuído para a propagação de fotografias que comportasse um número elevados de filhos no seio familiar. Purdy (2011, p. 265) destaca que “[...] O declínio da taxa de fecundidade e o aumento na expectativa da vida

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produziram uma população relativamente velha com consequência para a economia e os serviços públicos”. Tendo em vista que a Igreja de Jesus Cristo dos Santos dos Últimos Dias tem sua origem nos EUA, e que a produção da revista A Liahona também ocorre neste mesmo local, as mudanças sociais ocorridas neste território influencia o conteúdo a ser publicado.

Figura 06: Uma grande família. Fonte: Revista A Liahona, 1996, p.29.

Assim, nos apropriamos de tais comportamentos “[...] na medida em que isso corresponde a nossa própria observação das pessoas, gestos, rostos e instituições” (BERGER, 1999, p.16), em síntese, pode-se apreender práticas sociais/culturais.

Considerações finais

Construir uma narrativa historiográfica colocando as fotografias como fonte principal é um desafio constante para o historiadores, contudo, por meio delas pode-se compreender os mecanismos de persuasão das instituições que a utilizam, os Santos dos Últimos Dias por exemplo, fazem uso da revista a Liahona e seu material imagético de maneira pedagógica, persuadindo-os a realizar novas práticas de acordo com a cosmovisão da instituição.

Percebe-se que o uso das fotografias contribui para o fortalecimento deste segmento religioso, primeiramente por ser um material de fácil acesso e por proliferar suas doutrinas, neste caminho a família torna-se o mediador entre o que deve ser aprendido e atribui significados através do ensino religioso. Nota-se que as atividades familiares são definidas a partir do papel dos pais atribuídos pela religião, logo, a religiosidade influência nas formas que

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estes sujeitos vão se comportar dentro da própria família. Este trabalho não perpassa pelas discussões de gênero, mas entende-se que a religião trabalha como marcador social, sendo assim, atribui significado a existência dos indivíduos. Por fim, espera-se ter contribuído para a ampliação das potencialidades que as imagens e em especial as fotografias tem para a escrita da História.

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