• Nenhum resultado encontrado

CAPÍTULO 5. DISCUSSÃO DOS RESULTADOS

N/A
N/A
Protected

Academic year: 2021

Share "CAPÍTULO 5. DISCUSSÃO DOS RESULTADOS"

Copied!
30
0
0

Texto

(1)

CAPÍTULO 5. DISCUSSÃO DOS RESULTADOS

Sumário

Neste capítulo discutem-se os resultados obtidos na dissertação.

1. Micoflora das uvas ...269

2. Espécies de Aspergillus da secção Nigri produtoras de OTA ...285

3. Aspergillus ibericus...291

4. Concentração de OTA nas uvas portuguesas ...293

5. Avaliação do potencial ocratoxigénico das estirpes em meio de uva...294

(2)

1. Micoflora das uvas

Nesta secção discutem-se os resultados obtidos quanto à composição da micoflora das: i) uvas “normais”, sem podridão visível; ii) uvas “normais” após desinfecção superficial; iii) fungos causadores de podridão visível nos bagos; iv) mosto de uvas.

1.1. Micoflora de uvas normais

Os géneros isolados nas uvas refletem as fontes de contaminação a que estas se encontram sujeitas. As referências quanto aos habitats comuns dos géneros detectados nas uvas está indicada na Tabela 5.1, bem como a indicação se foram detectados noutros rastreios ao micobiota de folhas Portuguesas e de uvas noutros países.

A maior parte dos géneros detectados são de distribuição ubíqua, comuns no ar, superfície de plantas, materiais em decomposição e solo. Os organismos que estão associados à parte aérea das plantas (filoplano), como caules, folhas pétalas e frutos, chegam a estas superfícies arrastadas pelo vento, chuva e/ou animais, e conseguem-se fixar de alguma forma ao substrato e sobreviver às condições adversas, como de radiação solar, variações de temperatura e variações de humidade, durante o dia e durante o ano, bem como à exposição a compostos tóxicos, como pesticidas e fungicidas. Alguns dos fungos detectados nas uvas compreendem espécies saprófitas e patogénicas de plantas comummente detectadas em alimentos, como Aspergillus,

Botrytis, Penicillium e Rhizopus, que têm capacidade demonstrada de produzir

(3)

Tabela 5.1. Origens referidas na bibliografia para os fungos detectados nas uvas portuguesas quanto ao solo, alimentos, patogénicos e saprófitas de frutos, e fungos da folha da videira e uvas

Fungo 1 2 3 4 5 Acremoniella X Acremonium X X X X X Alternaria X X X* X X Arthrinium X X X X Aspergillus X X X* X X Aureobasidium X X X X Beauveria bassiana X X X Botrytis cinerea X X X* X X Chaetomium X X X X Chrysonilia sitophila X X Cladosporium X X X* X X Cunninghamella X X X Curvularia X X X X Dendryphiella X Drechslera X X X Emericella X X X Epicoccum nigrum X X X X X Eurotium X X Fusarium X X X X X Geotrichum X X X X X Gliocladium X X X X Histoplasma X Mucor X X X X X Neurospora tetrasperma Nigrospora X X X X X Paecilomyces X X X X Penicilium X X X* X X Periconia X X Pestalotiopsis X X X X Phoma X X X X X Pithomyces chartarum X Rhizopus X X X* X X Scytalidium X Stemphylium X X X X X Syncephalastrum racemosum X X Trichoderma X X X X X Trichotecium roseum X X X X Truncatella X X Ulocladium X X X X X

1- Solo (Barron , 1968; Domsch et al., 1993); 2- Alimentos (Pitt & Hocking, 1997); 3- Fungos patogénicos de frutos (Snowdon, 1990); * = descrito como causador de podridão em uvas; 4- Folha de videira (Lopes, 2002); 5- Uvas francesas (Sage et al., 2002, 2004)

(4)

Todos os géneros detectados nas uvas com a excepção de 4 (35 géneros) já foram isolados do solo. O solo é o reservatório dos fungos por excelência, por isso este facto não é surpreendente. A riqueza de géneros encontrados nas uvas portuguesas é semelhante à referida nas folhas de videira por Lopes (2002) e uvas francesas por Sage e colaboradores (2002, 2004), em que também foram isolados estirpes de 39 e 40 géneros, respectivamente. Dos fungos detectados nas uvas portuguesas, 26 e 27 são comuns aos mencionados por estes investigadores, respectivamente.

Os 5 géneros mais frequentes detectados nas uvas portuguesas foram por ordem decrescente Cladosporium, Alternaria, Botrytis, Penicillium e Aspergillus.

Cladosporium e Alternaria são géneros muito frequentes na natureza, frequentemente

dominantes em estudos de micoflora em condições de campo. Compreendem espécies saprófitas muito comuns, como C. cladosporioides e C. herbarum, e A. alternata. As espécies de Cladosporium e Alternaria podem viver como saprófitas, epífitas na superfície de folhas vivas ou comportar-se como parasitas fracos. Alternaria e

Cladosporium são capazes de completar o seu ciclo de vida nas folhas mortas e

detritos vegetais e possuem características que os adaptam à vida na superfície das plantas. Estes géneros podem alimentar-se de reservas endógenas e conteúdos de hifas velhas, que são autolizadas e recicladas para as extremidades das hifas em crescimento. Alternativamente, os esporos podem germinar para produzir esporos secundários ou sofrer conidiação microcíclica (figura 4.1, capítulo 4). A presença de melanina nas paredes das hifas e esporos é uma vantagem para a protecção da radiação solar (Peberdy, 1990), e pensa-se que é por isso que os fungos do filoplano são na sua maioria dematiáceos (Ellis & Ellis, 1997).

Como foi mencionado na introdução, Botrytis, Aspergillus e Penicillium compreendem várias espécies saprófitas e parasitas oportunistas e patogénicas de plantas. B. cinerea é por excelência o principal fungo patogénico da videira e principal causa de podridão das uvas. Por esse motivo, a presença de propágulos destes fungos nas vinhas é esperada. Na Tabela 5.2 e Tabela 5.3 estão indicadas as espécies detectadas de Aspergillus e Penicillium nas uvas portuguesas bem como informações quanto à sua presença noutros habitats e noutros rastreios à micoflora normal das uvas.

(5)

Tabela 5.2. Espécies de Aspergillus e seus teleomorfos detectadas nas uvas portuguesas e informações quanto à sua presença noutros habitats

Espécie 1 2 3 4 5 6 A. auricomus X A. candidus X X X A. carbonarius X X X A. carneus X A. clavatus X X A. flavipes X X X A. flavus X X X X A. fumigatus X X X X A. japonicus X X X* X X A. niger (agregado) X X X* X X X A. ochraceus X X X A. ostianus A. terreus X X X X

A. terreus var. africanus

A. ustus X X X X X A. versicolor X X X X X A. wentii X X Emericella nidulans X X X Eurotium amstelodami X X Eurotium chevalieri X X Pet. alliaceus X X

1- Solo (Klich et al., 1992); 2- Alimentos (Pitt & Hocking, 1997); 3- Fungos

patogénicos de frutos (Snowdon, 1990) * = causador de podridão em uvas; 4- Folha de videira (Lopes, 2002); 5- Uvas francesas (Sage et al., 2002, 2004); 6- Uvas espanholas (Bau et al., 2005)

(6)

Tabela 5.3. Espécies de Penicillium e seus teleomorfos detectadas nas uvas portuguesas e informações quanto à sua presença noutros habitats (1, 2, 3, 4, 5, e 6 = o mesmo que na tabela 5.2)

Espécie 1 2 3 4 5 6 P. aurantiogriseum X X* X P. bilaiae P. brevicompactum X X X X P. canescens X X* X X P. chermesinum P. chrysogenum X X X X X X P. citrinum X X X* X X X P. corylophilum X X X X P. crustosum X X X P. echinulatum X P. expansum X X X* X X P. fellutanum X X P. funiculosum X X X X P. glabrum/spinulosum X X X X X X P. griseofulvum X X X X P. implicatum X X X P. janczewskii X X X P. miczynskii X P. minioluteum X P. novae-zelandiae X P. olsonii X P. oxalicum X X X X X P. pinophilum X X P. purpurogenum X X X X P. raistrickii X X P. restrictum X X X P. roqueforti X P. rugulosum X X X P. sclerotiorum X P. simplicissimum X X X P. solitum X P. thomii X X X X X P. variabile X X X X P. verruculosum P. waksmannii X

(7)

Quanto às espécies de Aspergillus detectadas, todas à excepção de A. ostianus foram descritas previamente em estudos do solo. Das 20 espécies isoladas nas uvas, 14 foram referidas em uvas de Espanha (Bau et al., 2005) e/ou França (Sage et al., 2002, 2004), e muitas das espécies detectadas são de ocorrência comum em alimentos.

A espécie mais frequente nas uvas portuguesas foi de longe o agregado A.

niger, que representou 76% das estirpes de Aspergillus isoladas. Esta espécie é vista

como um dos fungos mais comuns em alimentos, e apesar de estar presente no solo, considera-se que não é habitante do solo, mas sim uma espécie invasora (Domsch et al., 1993). A. niger é considerada a principal espécie de Aspergillus responsável pela podridão de frutos, incluindo uvas (Pitt & Hocking, 1997; Snowdon, 1990; Zahavi et al., 2000).

A segunda espécie de Aspergillus isolada com maior frequência foi A.

carbonarius (9%), outra espécie da secção Nigri. Esta espécie não é comummente

referida de outras fontes, tendo sido isolada de lama, solos pantanosos, solo e água poluída na Índia e Iraque (Klich & Pitt, 1988). Recorda-se ainda que, tal como mencionado na introdução, foi também na Índia que esta espécie foi referida como causadora de podridão nas uvas (Raper & Fennell, 1965). As restantes espécies de

Aspergillus foram isoladas das uvas com pouca frequência. A terceira espécie mais

frequentemente isolada das uvas portuguesas, A. flavus, compreendeu 3% das estirpes de Aspergillus isoladas. A. flavus é uma espécie produtora de aflatoxinas, e dado que possui uma fisiologia semelhante a A. niger, pensa-se que compete com A. niger no ambiente natural em muitas situações (Pitt & Hocking, 1997). No caso concreto das uvas, dada a frequência destas espécies, A. niger venceu esta competição. Os

Aspergillus da secção Nigri tem esporos muito melanizados, o que lhes confere uma

vantagem adaptativa em ambientes expostos a radiação solar, e são xerófilos, capazes de crescer com baixas actividades de água e temperaturas elevadas.

Quanto às espécies de Penicillium isoladas das uvas, das 35 espécies detectadas, 26 foram isoladas de uvas na Espanha e/ou França. As espécies mais frequentes foram P. brevicompactum, P. glabrum/spinulosum e P. thomii, que são espécies xerófilas, comuns em materiais em decomposição e solo. P. brevicompactum é das espécies mais xerófilas do género. Estas espécies já foram isoladas de uvas podres, e a sua capacidade de causar podridão nas uvas é reconhecida (Sage et al., 2002, 2004). A micoflora das uvas portuguesas de Aspergillus e Penicillium é pois

(8)

dominada por espécies xerófilas, capazes de crescer até 45 ºC e 30 ºC, respectivamente, e com capacidade para causar podridão nas uvas caso hajam condições propícias à infecção dos bagos.

1.1.1. Variação da micoflora com a maturação

As uvas portuguesas estiveram expostas sensivelmente ao mesmo número de propágulos fúngicos ao longo do período de maturação estudado, entre o bago ervilha e a vindima: a média de propágulos fúngicos por bago foi sempre igual a 2.

No entanto, em termos de composição da micoflora, observaram-se diferenças. No início da maturação, a micoflora do bago ervilha é dominada por fungos típicos do filoplano de angiospérmicas, como Alternaria, Aureobasidium, Botrytis,

Cladosporium, Epiccocum e Stemphylium, e foi neste estado que se verificou a

incidência mais elevada de Arthrynium, Drechslera, e Fusarium. Com o avanço da maturação, verificou-se um decréscimo nos fungos do filoplano e um aumento significativo de agentes saprófitas e parasitas oportunistas causadoras de podridão nas uvas, nomeadamente Aspergillus, Botrytis, Penicillium e Rhizopus. Na passagem do bago ervilha para o pintor, observou-se um decréscimo significativo de Stemphylium e um aumento significativo de Botrytis e Penicillium. Mas o maior número de alterações significativas na incidência dos fungos deu-se na passagem do pintor para a vindima, quando decrescem significativamente várias espécies comuns do filoplano, entre as quais Alternaria, e aumenta a incidência de Aspergillus, Penicillium e

Rhizopus. No final da maturação, os bagos estão mais ricos em nutrientes e açúcares,

a película é fina e sujeita a fissuras. Do ponto de vista morfológico, o bago encontra-se mais vulnerável ao ataque de agentes patogénicos com o avanço da maturação. Além disso, a partir do momento em que o cacho fecha, proporciona-se no interior do cacho um ambiente pouco arejado, abrigado dos agentes atmosféricos, que pode facilitar a permanência de esporos de agentes saprófitas secundários, com dificuldade em colonizar a superfície dos bagos. Se houver danos nos bagos, podem-se criar condições favoráveis à podridão. É precisamente no momento mais vulnerável para os bagos que os fungos descritos como causadores de podridão nas uvas estão presentes com maior incidência.

(9)

As únicas espécies de Aspergillus que aumentaram significativamente com a maturação foram o agregado A. niger e A. carbonarius. Estirpes do agregado A. niger são detectadas desde o início, mas nenhuma de A. carbonarius foi detectada neste estado. No entanto, foram detectadas no bago ervilha 9 das 15 espécies de Aspergillus detectadas na vindima. A. carbonarius só aumenta significativamente do pintor para a vindima, quando se dá o aumento significativo na incidência de Aspergillus e dos restantes fungos capazes de causar podridão nas uvas. O facto de praticamente não ser detectado nos estados antes da vindima, quando os bagos não estão tão susceptíveis ao ataque de fungos, juntamente com a informação de que a frequência desta espécie é rara noutros materiais, parece indicar que A. carbonarius está dependente da infecção das uvas para completar o seu ciclo de vida.

Relativamente a Penicillium, as únicas espécies que aumentaram signifi-cativamente a sua incidência nos bagos com o avanço da maturação foram P.

brevicompactum e P. glabrum/spinulosum. P. thomii por sua vez aumentou

significativamente a incidência nas uvas exclusivamente na região do Douro. Todas as espécies de Penicillium que estão presentes em mais de 1% dos bagos na vindima já foram isoladas no bago ervilha. O facto de apenas 3 espécies de Penicillium aumentarem significativamente com a maturação leva-nos a postular que estas espécies poderão estar ligadas directamente à vinha e às uvas, enquanto as restantes espécies de Penicillium detectadas parecem não depender exclusivamente das uvas para variar os seus efectivos. No entanto, se existirem condições favoráveis à infecção dos bagos, especialmente em fases de sobrematuração, é possível que espécies como

P. expansum, possam causar podridão nas uvas (V. secção 6.3 deste capítulo).

Rastreios a uvas em diferentes estados de maturação permitiram retirar conclusões semelhantes noutros países. Bau e colaboradores (2005) verificaram um aumento significativo de Aspergillus e Penicillium com o avanço da maturação e um decréscimo significativo na incidência de Alternaria e Cladosporium nos bagos. Bellí e colaboradores (2004b) reportaram um aumento de Aspergillus da secção Nigri nas uvas com a maturação. Sage e colaboradores (2004) reportaram um decréscimo de

Cladosporium e um aumento de A. niger e de P. expansum do final do pintor para a

vindima. Nas uvas portuguesas, não se verificou um decréscimo de Cladosporium com o avanço da maturação. As diferenças no método de detecção usado podem estar na base desta observação: Bau e colaboradores (ob. cit.) referem que a inspecção dos bagos foi feita apenas no final do tempo de incubação de 7 dias. As colónias de

(10)

Cladosporium têm um crescimento mais lento que outros fungos, nomeadamente Aspergillus, que aumentam com a maturação e que mascaram com frequência a

presença de Cladosporium nas amostras, levando a subestimar a incidência do género nos bagos.

1.1.2. Variação da micoflora com a origem geográfica

Na vindima, observou-se que a população fúngica a que as uvas estão expostas não difere significativamente entre regiões com a excepção de 3 géneros: Aspergillus,

Botrytis e Ulocladium. Observou-se que Aspergillus e Botrytis têm distribuições

inversas, isto é, as regiões onde se detectaram em média mais Botrytis foram aquelas onde se detectaram em média menos Aspergillus nos bagos. As diferenças na incidência de Aspergillus e Botrytis podem estar relacionadas com o clima das regiões, em particular com o regime de precipitação e humidade. Por ordem decrescente, as regiões em média com mais Botrytis e menos Aspergillus foram: Vinhos Verdes, Ribatejo, Douro e Alentejo (as duas últimas regiões tiveram uma média igual de Aspergillus nas amostras). A região mais húmida das estudadas é sem dúvida a dos Vinhos Verdes, devido ao seu clima sofrer influências atlânticas e ser Submediterrânico. Das regiões de clima Mediterrânico, a mais húmida é o Ribatejo, seguida do Douro e Alentejo (tabela 3.4, capítulo 3, p. 135). Como foi mencionado na introdução no capítulo 2, Botrytis é um patogénio da videira que requer humidade para poder infectar as uvas, e é favorecido em ambientes húmidos e desfavorecido em climas secos, como Douro e Alentejo. Por sua vez, os Aspergillus, em particular os

Aspergillus secção Nigri, as espécies dominantes na vinha, têm uma vantagem

adaptativa nestes climas, pois são capazes de crescer a temperaturas mais elevadas e com menos humidade, e chegam a ser dominantes nas amostras.

Foi interessante verificar que apesar de não se verificarem diferenças significativas quanto à incidência de Penicillium nas amostras, existiram diferenças quanto à frequência das suas espécies. No caso dos Penicillium, as principais diferenças não parecem estar relacionadas com o clima, mas sim com uma distribuição geográfica Norte/Sul. Duas das espécies mais frequentemente detectadas nas uvas, P. brevicompactum e P. thomii, têm uma distribuição inversa, isto é, P.

(11)

brevicompactum é mais frequente nas uvas do Sul de Portugal e P. thomii mais

abundante no Norte de Portugal.

Os locais estudados dentro das regiões tiveram uma micoflora bastante semelhante no que diz respeito aos géneros de fungos mais frequentemente detectados na vindima. As principais excepções foram um local no Douro e outro no Ribatejo.

No Douro, o local Do3 diferiu dos restantes dois locais quanto à incidência de

Alternaria e Aspergillus. Neste local, a incidência de Aspergillus foi

significativamente menor que nos outros locais, enquanto a incidência de Alternaria nas amostras foi significativamente maior. A vinha do local Do3 situa-se no Douro Superior, num espaço bem ventilado. Foi-nos indicado que devido ao bom arejamento do local, que a vinha analisada é pouco susceptível à podridão. O ambiente circundante é dominado por 408 hectares de vinha, não sendo observada outra cultura relevante. Parece-nos possível que devido à ventilação e condições excepcionais do local, que existam piores condições para o estabelecimento de Aspergillus saprófitas nos bagos e melhores condições para Alternaria, um fungo típico de campo que pode completar o seu ciclo de vida nas folhas mortas.

No Ribatejo, no local R1, a presença mais elevada de Rhizopus na placa de isolamento causa problemas na detecção de outros fungos de crescimento mais lento, como Cladosporium e Alternaria, ou de identificação mais tardia, como Botrytis. Por isso, é provável que as diferenças observadas digam respeito ao método de detecção usado, e que a frequência destas espécies tenha sido subestimada.

Na Tabela 5.4 estão indicados os fungos descritos como os mais frequentes nas uvas nos rastreios feitos com o propósito de estabelecer a micoflora ocratoxigénica.

Sage e colaboradores (2004) obtiveram resultados semelhantes aos das uvas portuguesas em uvas de diversas províncias francesas, tendo verificado que

Alternaria, Cladosporium, Botrytis, Aspergillus e Penicillium foram os géneros mais

frequentes nas amostras. Por outro lado, Magnoli et al. (2003), Bellí et al. (2004b) e Bau et al. (2005) não reportaram Botrytis como um dos géneros mais frequentes nas uvas. Aliás, na Argentina, Magnoli et al. (ob. cit.) enfatizam que não foi detectada a presença de estirpes de B. cinerea durante a vindima de 2001 em 50 amostras de uvas na província de Mendoza. No entanto, Rosa et al. (2002) verificaram que em uvas originárias da Argentina da província de Mendonza e do Brasil (Rio Grande do Sul), no ano de 1997-1998, os géneros mais frequentes foram Aspergillus, Penicillium e

(12)

não se detectou Botrytis ou em que a sua frequência foi baixa, o género dominante foi

Alternaria, presente em cerca de 80% das amostras. Cladosporium e Penicillium

foram sempre descritos entre os fungos mais frequentemente isolados, mas Bau et al. (2005) reportaram uma incidência de Penicillium mais baixa nas amostras que os restantes investigadores.

A baixa incidência de Botrytis referida nas uvas da costa Mediterrânica espanhola e na Argentina na província de Mendonza poderá estar relacionada com as condições climáticas, visto que o clima é bastante seco. Nestes locais, o género

Alternaria foi dominante. No entanto, nas regiões portuguesas, não se verificou um

aumento significativo de Alternaria a par da baixa incidência de Botrytis.

Quanto às espécies de Aspergillus identificadas, os Aspergillus da secção

Nigri foram referidos por todos os investigadores como as espécies de Aspergillus

mais frequentes nas uvas, e são discutidos com mais detalhe no ponto 2.

Quanto às espécies de Penicillium, os investigadores referiram entre as espécies mais frequentemente isoladas P. brevicompactum e P. expansum (Sage et al., 2004), P. glabrum/spinulosum, P. funiculosum e P. thomii (Battilani et al., 2003), P.

chrysogenum (Magnoli et al., 2003) e P. glabrum, P. citrinum e P. decumbens (Rosa

et al., 2002), P. citrinum, P. glabrum e P. chrysogenum (Bau et al., 2005). Todas estas espécies são agentes de deterioração comuns. Nenhum dos investigadores referidos detectou a presença de P. verrucosum ou de P. nordicum.

(13)

Tabela 5.4. Géneros mais frequentes indicados nos rastreios a uvas publicados para estabelecer a micoflora toxigénica nas uvas de diversos países

Espanhab França a Argentina a Brasil a

Bellí et al. (2004b) Bau et al. (2005) Sage et al. (2002, 2004)c Magnoli et al. (2003) Rosa et al. (2002) Rosa et al. (2002) Absidia X Acremonium <1 10 Alternaria 80 76 55 80 <5 8 Aspergillus 0-15 17 55 70 35 42 Botrytis <1 53 20 20 Cladosporium X 22 38 40 <5 <5 Epiccoccum X 27 Eurotium 20 Fusarium X 3 15 5 Geotrichum 9 (2002) 5 Monilia <1 Moniliella <5 8 Mucorales 8 Penicillium X 2 50 30 10 20 Phytophtora <5 10 Rhizopus X 12 Trichoderma <1 22 Ulocladium X 32 10 Total amostras 1600 280 60 50 100

Bagos por amostra 5 5 100 g 100 100 g

Método 1 1 2 3 4

a

% de amostras; b % de bagos; c a frequência de amostras diz respeito aos resultados publicados em Sage et al. (2004) excepto quando indicado o ano 2002; 1-Plaqueamento directo dos bagos em DRBC; 2-Lavagem das uvas com solução estéril de SDS 0,05% e plaqueamento de 1ml de solução em MEA e placas de solo; 3-Plaqueamento de uvas em DG18 após desinfecção superficial com hipoclorito de sódio; 4-Homogeneização das uvas no stomacher com uma solução de 0,1% peptona e plaqueamento da solução em DRBC e DG18

(14)

1.1.3. Classificação das amostras de uvas portuguesas de acordo com a origem geográfica com base na micoflora

Com as árvores de decisão, explorou-se a possibilidade de classificar a região de origem das uvas com base em diferenças na composição da micoflora das amostras. Caso essa tarefa fosse possível, significava que cada área geográfica podia estar exposta a uma micoflora mais ou menos constante, dependente da região de origem, o que poderia ter relevância para o estabelecimento de mapas de risco e de identificação de perigos locais. Caso não fosse possível, seria interpretado como reflexo de independência entre a micoflora das uvas e a região de origem.

Com base na micoflora total das uvas, criou-se um modelo de classificação em que através das diferenças observadas na incidência de A. niger, Botrytis, P.

corylophilum e P.thomii nas amostras foi possível identificar a origem geográfica das

amostras no momento da vindima. A região dos Vinhos Verdes e do Douro surgem definidas por apenas uma folha, o que significa que a micoflora dessas regiões pode ser definida com base num critério. Mas para o Ribatejo e Alentejo temos duas folhas, o que significa que não foi possível definir cada uma destas regiões apenas com um critério. As amostras da região dos Vinhos Verdes foram identificadas com base na sua baixa incidência de A. niger e incidência relativamente elevada de Botrytis. As amostras do Douro foram distinguidas das dos Vinhos Verdes com base na sua incidência mais elevada de A. niger, e as amostras do Norte de Portugal foram distinguidas das do Sul com base na incidência de P. thomii nas amostras. Mas a distinção entre as duas regiões do Sul, Alentejo e Ribatejo, foi principalmente feita com base na incidência de Botrytis nas amostras destas regiões, mais elevada no Ribatejo que no Alentejo. No entanto, a capacidade preditiva deste modelo foi baixa, sendo o Alentejo a região com mais insucesso de classificação, onde 50% das amostras foram classificadas erroneamente como sendo do Ribatejo, pelos critérios deste modelo. Com a selecção dos melhores atributos, o modelo continuou a usar os dois critérios que permitiam a distinção das amostras dos Vinhos Verdes e do Douro e entre Norte/Sul (agregado A. niger e P. thomii, respectivamente). Por sua vez, as regiões do Alentejo e Ribatejo foram distinguidas com base na frequência de

(15)

classificada como Ribatejo em 50% dos casos. Tornou-se claro que a distinção de amostras do Ribatejo e Alentejo era complexa. Como tal, testou-se o modelo com redefinição das classes: Douro, Sul e Vinhos Verdes.

O modelo com base apenas na frequência de A. niger e P. thomii nas amostras revelou-se capaz de classificar correctamente 82% das amostras num estudo de validação cruzada. Isto mostra que, aparentemente, as uvas das regiões dos Vinhos Verdes, Douro e Sul estão expostas de forma diferente a estas espécies duma forma bastante consistente, independentemente do local, casta ou ano estudados. As regiões do Sul de Portugal- Ribatejo e Alentejo- surgem como uma região exposta à mesma população fúngica e, consequentemente, aos mesmos riscos potenciais. Estas diferenças na distribuição geográfica dos fungos, se provarem ser consistentes, podem eventualmente ter aplicações na micologia forense, quanto à identificação da proveniência da região das uvas pela sua composição micológica com base na frequência de algumas espécies chave. Adicionalmente, a variação na micoflora que se verificou nas regiões portuguesas reforça a ideia de que as diferenças na micoflora das uvas referidas pelos investigadores de diferentes países podem não ser exclusivamente devidas a diferenças no método usado ou ao clima, mas depender da distribuição geográfica das espécies.

1.2. Micoflora das uvas após desinfecção superficial dos

bagos

Após desinfecção superficial, detectou-se uma menor diversidade de fungos nas uvas, o que indica que muitos dos géneros estão apenas presentes na superfície dos bagos. Foram detectados essencialmente fungos descritos como potenciais causadores de podridão nos bagos, como Alternaria, Aspergillus, Botrytis,

Cladosporium, Penicillium, Stemphylium e Rhizopus (Lopes, 2002), incluindo fungos

saprófitas comuns em folhas verdes que em certas condições podem tornar-se patogénicos para plantas, como Aureobasidium, Fusarium e Phoma (Lopes, ob. cit.). Seis das 9 das espécies de Penicillium e estirpes do género Rhizopus só foram detectadas na vindima, enquanto que outros fungos, como Alternaria, Aureobasidium,

(16)

foram detectados em todos os estados de maturação, indicando que a colonização do bago com alguns fungos se dá desde os estados de maturação iniciais. Bau et al. (2005) estudaram a composição micológica de sementes de uva, e não detectaram qualquer fungo, o que leva crer que a contaminação fúngica com as espécies saprófitas e patogénicos oportunistas advém essencialmente da superfície do bago.

1.3. Podridão detectada nos bagos

Nas vinhas estudadas raras vezes se observou podridão. Em algumas das ocasiões em que se observou podridão, associado a Botrytis, foram detectados A.

carbonarius (uma única vez) e T. roseum. T. roseum não é um fungo muito

frequentemente referido como causador de podridão nas uvas. A única referência que conhecemos a este respeito foi em uvas provenientes da Alemanha (Schwenk et al., 1989). A podridão de T. roseum associada a Botrytis pode passar despercebida à primeira vista. Nas adegas, o aspecto róseo por cima da podridão cinzenta de Botrytis foi considerado descoloração do fungo pelos engenheiros agrónomos e, como tal, é possível que seja mais frequente que o referido. T. roseum foi descrito como um micoparasita dos esclerócios de B. cinerea (Domsch et al., 1993). As nossas observações não são suficientes para afirmar se T. roseum estava de facto a parasitar as hifas de B. cinerea, visto que não foram detectadas ao microscópio estruturas de penetração nas hifas de Botrytis por T. roseum. Aparentemente, T. roseum apenas cresce sobre Botrytis. Na placa de isolamento, T. roseum foi detectado muitas vezes a crescer sobre Botrytis, sendo detectado frequentemente no final do tempo de vida da placa de isolamento.

Durante os anos do nosso estudo, não se observou podridão por P. expansum nas vinhas estudadas ou de que tivéssemos conhecimento, mas Abrunhosa (2001) detectou uvas podres com esta espécie na vinha Do4 no ano de 1999.

Apesar de a podridão por Aspergillus negros ser considerada em alguns países (v.g., Israel) de igual importância económica que a por B. cinerea e de ser o fungo predominante em uvas destinadas ao fabrico de vinho (Zahavi et al., 2000), durante o nosso estudo a podridão com Aspergillus foi observada uma única vez num cacho (A.

(17)

1.4. Micoflora do mosto

A detecção e isolamento de fungos filamentosos no mosto de uvas antes e após a primeira adição de sulfuroso foi dificultada pelo grande número de colónias de leveduras presentes. Os principais fungos detectados no mosto foram Aspergillus,

Penicillium e Rhizopus. Foram detectadas duas espécies de Aspergillus da secção Nigri, A. carbonarius e agregado A. niger. A presença de A. carbonarius só foi

detectada numa amostra, antes da adição de sulfuroso no mosto da casta alvarinho proveniente da sub-região de Monção, onde nunca foi detectado este fungo nas uvas da vinha estudada da mesma sub-região. Em todas as amostras foram detectadas estirpes do agregado A. niger e do género Penicillium. Uma das espécies mais frequentemente detectadas foi P. crustosum. Esta espécie é capaz de crescer em condições bastante ácidas, a pH inferior a 2,2. Após a adição de sulfuroso, ainda encontrámos propágulos viáveis de agregado A. niger, Mucor, Penicillium e Rhizopus. O sulfuroso é um composto químico que tem acção fungistática, não fungicida. O seu propósito é desinfectar o mosto e prevenir a proliferação de microrganismos indesejáveis até ao arranque da fermentação, quando em condições industriais se adicionam leveduras seleccionadas. Nas duas amostras de mosto em início de fermentação da região dos Vinhos Verdes, não se detectaram colónias de fungos filamentosos, apenas leveduras. Dada a dificuldade de detectar propágulos viáveis de fungos filamentosos no mosto no início da fermentação devido ao grande número de colónias de leveduras presentes nas placas, não se pode excluir que não possam existir. No entanto, considera-se que mesmo que estivessem presentes propágulos de fungos filamentosos viáveis no mosto nesta fase, estes não teriam condições para crescer, dada a competição feroz com as leveduras.

(18)

2. Espécies de Aspergillus da secção Nigri produtoras de

OTA

A. carbonarius foi sem dúvida a principal espécie responsável pela produção

de OTA detectada nas uvas portuguesas, compreendendo 73% das estirpes produtoras de OTA isoladas. Apesar das estirpes do agregado A. niger serem muito mais frequentes, a produção pelas estirpes foi muito mais rara que por A. carbonarius. No agregado A. niger, foi detectada produção de OTA por 4% das estirpes, enquanto que 100% das estirpes de A. carbonarius foram capazes de produzir a micotoxina. Nenhuma das 3 estirpes de A. japonicus foi capaz de produzir OTA em níveis detectáveis pelo método usado.

Os dados europeus são concordantes quanto ao facto de que a principal espécie produtora de OTA isolada das uvas é A. carbonarius. No entanto, a proporção de estirpes OTA+ referida variou consideravelmente. Nem todos os investigadores referem 100% de produção de OTA pelas estirpes de A. carbonarius (Tabela 5.6). Estes resultados são contrários aos obtidos no nosso estudo, bem como nos estudos espanhóis e franceses, em que não se detectou uma única estirpe não produtora de OTA desta espécie. Na literatura, outros estudos também não mencionaram 100% de capacidade das estirpes de A. carbonarius produzirem a micotoxina (Abarca et al., 2003; Joosten et al., 2001; Taniwaki et al., 2003; Téren et al., 1996). Este facto pode ser devido a diferentes causas: 1) diferenças nos métodos e limites de detecção usados em cada laboratório; 2) identificação errada dos metabolitos, visto que não é prática corrente a confirmação dos metabolitos nas análises de ELISA e HPLC; 3) identificação errada da estirpe; 4) diferenças locais quanto à proporção de estirpes OTA+; 5) Algumas das estirpes verdadeiramente negativas poderão tratar-se de A.

ibericus, o taxon proposto que se pode confundir com A. carbonarius. Esta última

hipótese está na base da não detecção de OTA nas estirpes identificadas previamente como A. carbonarius por Abarca et al. (2003).

Quanto às estirpes do agregado A. niger, a proporção de estirpes produtoras nas uvas descrita na literatura também varia consideravelmente, entre 0 a 77%. As causas para esta variação podem ser semelhantes às indicadas acima para A.

(19)

carbonarius. Tjamos et al. (2004) reportaram que 77% de estirpes do agregado A. niger produziram OTA em níveis detectáveis, mas mencionam que apenas 6% das

estirpes são fortemente positivas. Rosa et al. (2002) e Magnoli et al. (2003) referiram uma proporção elevada de estirpes OTA+ do agregado A. niger nas uvas, tornando esta espécie a principal produtora de OTA nas uvas da Argentina. Dalcero e colaboradores (2002) obtiveram resultados semelhantes em rações animais, onde A.

carbonarius não foi detectado e 46% das estirpes do agregado A. niger produziram a

micotoxina em níveis detectáveis por HPLC. No entanto, A. carbonarius existe na Argentina, tendo sido detectado em uvas passas recentemente (Magnoli et al., 2004). A proporção de estirpes OTA+ no agregado A. niger nas uvas portuguesas está de acordo com os estudos de Battilani et al. (2003), Téren et al. (1996) e Taniwaki et al. (2003), que detectaram estirpes OTA+ entre 3 a 5% das estirpes do agregado.

Os únicos investigadores que reportaram produção de OTA por estirpes de A.

japonicus foram Battilani et al. (2003) e Dalcero et al. (2002). No entanto, outros

investigadores, como Bau et al. (no prelo), defendem que as únicas espécies da secção

Nigri capazes de produzir a micotoxina são A. carbonarius e A. niger.

Considerando a percentagem de estirpes produtoras de OTA face ao número total de estirpes de Aspergillus secção Nigri isoladas, as uvas portuguesas apresentam uma proporção de estirpes semelhante à referida por Bau et al. (2005) e Battilani et al. (2003) na Europa. Os investigadores que referiram a incidência mais baixa de estirpes OTA+ na secção Nigri foram Bellí et al. (2004b). Na Europa, os investigadores que registaram a proporção de estirpes OTA+ mais elevada na secção Nigri foram Tjamos et al. (2004), na Grécia, e Sage et al. (2002), na França.

(20)

Tabela 5.5. Espécies de Aspergillus da secção Nigri e seu potencial ocratoxigénico referido nos rastreios à micoflora ocratoxigénica das uvas publicados até ao momento de escrita desta dissertação

Referência Nº de estirpes isoladas (% de estirpes OTA+) agregado

A. niger

A. carbonarius A. japonicus Aspergillus

negros

Portugal 622 (4) 69 (100) 3 (0) 702 (13) Bellí et al. (2004b) n.i. n.i. n.i. 386 (5) Bau et al. (2005) 474 (0) 101 (100) 5 (0) 575 (18) Magnoli et al (2003) 63 (45e) 0 0 63 (45e) Rosa et al. 2002 (Argentina) 48 (17c) 0 0 48 (17c) Rosa et al., 2002 (Brasil) 53 (30d) 32 (25) 0 85 (28) Battilani et al., 2003 270 (5) 86 (60) 108 (3) 464 (15) Tjamos et al., 2004 159 (77a) 60 (97b) 0 219 (82f) Sage et al., 2004 n.i. (0) n.i. (100) n.i. n.i.

Sage et al., 2002 1 (0) 14 (100) 0 15 (93)

n.i. = não indicado; a apenas 6% acima de 25 ppb; b 78% acima de 25 ppb; c entre 32-77 ppb; d entre 26-96 ppb; e 11% entre 18-25 ppb (gama máxima); f 26% acima de 25 ppb

2.1. Estirpes OTA

+

e maturação das uvas

As estirpes OTA+ não foram detectadas no estado mais inicial de maturação, no bago ervilha. Foram detectadas estirpes OTA+ pela primeira vez no pintor, tanto de

A. carbonarius como do agregado A. niger, mas é na vindima que a maioria das

estirpes produtoras de OTA são detectadas. Foram detectadas estirpes do agregado A.

niger em todos os estados de maturação, mas a sua abundância aumentou

significativamente com o avanço da maturação. No entanto, a proporção de estirpes OTA+ no agregado A. niger no pintor e na vindima é semelhante, correspondendo a 3 e 5%, respectivamente. O facto de não se terem detectado estirpes OTA+ do agregado

A. niger no bago ervilha pode por isso ser devido somente a uma questão de

amostragem, visto a espécie ser menos frequente. Por outro lado, Leong et al. (no prelo) mostraram com experiências de campo que a dinâmica de A. carbonarius na vinha é complexa. Os autores citados inocularam cachos antes do fecho com esporos de A. carbonarius, e verificaram que o número de esporos viáveis diminuiu muito

(21)

detectados 0,001% dos esporos inoculados. A partir do pintor, observou-se um aumento do número de esporos e podridão. Os autores atribuiram a diminuição do número de colónias viáveis à morte dos esporos de A. carbonarius por exposição à radiação UV. No entanto, não exploraram até à data outra possibilidade que nos parece viável: que os esporos de A. carbonarius tenham problemas em aderir e manter-se na superfície da uva em estádios iniciais de desenvolvimento do bago. Esta hipótese é suportada pela observação ao SEM de esporos de A. carbonarius, em que se vê que as equinulações dos esporos se quebram facilmente, podendo prejudicar a adesão. Quando o cacho fecha, é possível que se este comporte como uma armadilha de esporos, aprisionando-os no seu interior, de forma que estes possam infectar os bagos caso haja danos nas películas.

A contaminação dos bagos de uvas portuguesas com estirpes OTA+ é essencialmente superficial em uvas aparentemente saudáveis. Após desinfecção superficial de uvas normais, detectou-se A. carbonarius no momento da vindima em apenas 3 dos 1200 bagos analisados (0,25%).

2.2. Variação da incidência de estirpes OTA

+

com a região

de origem

Foram detectadas estirpes OTA+ em todas as regiões estudadas à excepção do Dão, e em todas as vinhas das regiões do Douro, Ribatejo e Alentejo, mostrando que todas as uvas de locais de clima Mediterrânico estão expostas a estes contaminantes. Na região dos Vinhos Verdes foi detectada a presença de A. carbonarius numa amostra de uvas e em mosto proveniente da sub-região de Monção, mostrando que estes contaminantes também estão presentes na região dos Vinhos Verdes, mas com menor frequência.

Verificou-se que A. carbonarius foi mais frequente nas vinhas do Sul do país que no Douro, apesar de também ser detectado nesta região. No entanto, A.

carbonarius só foi detectado após desinfecção superficial no Alentejo e Ribatejo. Na

vinha 5 registou-se a incidência mais elevada de estirpes OTA+ do agregado A. niger, e este foi o único local onde estas estirpes foram isoladas consistentemente na vindima todos os anos. Este facto parece indicar que a população de estirpes OTA+ do

(22)

agregado A. niger é residente nesta vinha. Por outro lado, a presença de estirpes OTA+ do agregado A. niger noutras vinhas foi ocasional. O mesmo se pode dizer da incidência de A. carbonarius nas uvas, que variou consideravelmente, e só foi detectado nos três anos na vinha 8.

A. carbonarius foi detectado a causar podridão no interior dum cacho podre da

vinha 5, e nesse ano, na vindima, não foi detectado em nenhum dos 50 bagos da amostra. Este facto sugere que a capacidade de permanência de A. carbonarius na superfície dos bagos é baixa, e só consegue manter-se no interior dos cachos mais compactos, onde causa podridão quando as condições lhe são favoráveis. Sendo assim, independentemente da sua incidência nos bagos, a presença de A. carbonarius, principalmente nas vinhas de clima Mediterrânico, revela potencial para a ocorrência de podridão mediante condições propícias, especialmente no interior dos cachos.

Battilani et al. (2003) não reportaram diferenças conspícuas na micoflora ocratoxigénica do Norte e Sul da Itália, sendo a percentagem média de estirpes de

Aspergillus produtoras de OTA de 6 e 8% no Norte e Sul da Itália, respectivamente.

Por sua vez, Bau et al. (2005) e Bellí et al. (2004b) não reportaram diferenças na incidência de Aspergillus negros na costa Mediterrânica de Espanha entre as regiões de Barcelona, Tarragona, Valência, Múrcia e Cádiz, e entre Costers del Segre, Penedés, Conca de Barberà e Utiel-Requena, respectivamente. No entanto, Sage et al. (2002, 2004), no seu estudo de 6 regiões de França, só detectaram a presença de A.

carbonarius nas amostras nas regiões mais a sul (nomeadamente Aude e Languedoc).

Tjamos et al. (2004) reportaram diferenças entre a incidência de espécies de

Aspergillus negros nas castas Cabernet Sauvignon e Grenache Rouge na ilha de

Rhodes. A casta Grenache Rouge teve uma incidência muito maior de A. carbonarius nas uvas que a casta Cabernet Sauvignon. Na Grenache Rouge, mais de 80% dos bagos estavam colonizados com A. carbonarius, e menos de 10% dos bagos com estirpes do agregado A. niger, enquanto na casta Cabernet Sauvignon, a contaminação com A. carbonarius foi de 10 a 20%, e a contaminação com estirpes do agregado A.

niger mais de 80%. Desta forma, é na Grécia que foi referida a incidência mais

elevada de A. carbonarius numa vinha.

Em termos do conhecimento que se tem da distribuição geográfica das principais espécies produtoras de OTA, do clima e da OTA detectada em vinhos, verifica-se que foi referida a presença de A. carbonarius em todas as áreas onde foi detectada OTA

(23)

2.3. Relação entre estirpes OTA

+

e a restante micoflora das

uvas

Considera-se que a presença de microrganismos epífitos na superfície dos diferentes órgãos das plantas pode influenciar o crescimento de fungos parasitas (Lopes, 2002). A possibilidade de se usarem alguns microrganismos como antagonistas de patogénicos fúngicos nas uvas tem sido investigada (Zahavi et al., 2000). Os microrganismos seleccionados para testar as potencialidades em termos de luta biológica foram principalmente leveduras e o fungo dimórfico Aureobasidium

pullulans, apesar de alguns fungos filamentosos exibirem capacidade como

antagonistas, como Acremonium cephalosporium. Estirpes destas espécies, em particular de Aureobasidium pullulans, têm efeito antagonista quanto à infecção por

Aspergillus (Zahavi et al., 2000), e fazem parte da micoflora das uvas portuguesas.

Por outro lado, como foi referido na introdução, o uso de estirpes não toxigénicas no controlo de micotoxinas em culturas tem sido proposto como luta biológica, visto que estas estirpes deverão ocupar o mesmo nicho ecológico em campo. Observou-se que a proporção de estirpes toxigénicas para não toxigénicas de

Aspergillus negros variou nas vinhas estudadas na vindima variou entre 1:1 até 0, mas

os baixos níveis de OTA nas uvas e vinhos portugueses em geral não permitem tirar conclusões quanto à influência da micoflora no teor de OTA das uvas.

Em termos de frequência nas amostras de uvas, as únicas correlações que parecem relevantes quanto à relação entre espécies OTA+ e a restante micoflora são entre A. carbonarius e o agregado A. niger e entre A. carbonarius e P.

brevicompactum. As estirpes do agregado A. niger estão significativamente

correlacionadas de forma positiva com a incidência de estirpes OTA+ nas uvas, pois reflectem as preferências climáticas dos Aspergillus negros no geral. A correlação positiva entre A. carbonarius e P. brevicompactum pode ser devida ao facto de que ambas as espécies foram mais frequentes nas amostras do Sul de Portugal.

Quanto à situação nacional estudada, visto que as uvas estiveram em bom estado fitossanitário e a concentração de OTA detectada nas uvas foi sempre baixa, não se podem tirar conclusões quanto à influência da micoflora OTA- nestes

(24)

parâmetros. Salienta-se apenas que de acordo com os nossos dados e com os estudos previamente publicados sobre a micoflora ocratoxigénica das uvas, a presença de

Aspergillus negros nas uvas parece ser boa indicadora da possibilidade da presença de

estirpes OTA+, independentemente das espécies em questão.

3. Aspergillus ibericus

Visto que as diferentes espécies da secção Nigri possuem diferentes capacidades de produzir OTA, e dada a proximidade morfológica das espécies, a necessidade de identificar correctamente as estirpes desta secção é imperativa a fim de evitar a confusão entre as espécies que produzem a micotoxina nesta secção.

As estirpes inicialmente identificadas como A. carbonarius que não produziram OTA possuem um perfil molecular distinto das outras espécies da secção, que se revelou por análise RAPD, análise da sequência do rDNA ITS-5.8S e por análise de sequências do gene da calmodulina (Cabañes et al. (2004); Bau e colaboradores (no prelo)). Considerou-se que estas estirpes poderiam representar uma nova espécie da secção Nigri, designado provisoriamente de A. ibericus. A. ibericus foi isolado raramente das uvas de climas Mediterrânicos, mas em estados de maturação e regiões geográficas distintas, o que indica que está bem estabelecida nas vinhas portuguesas. O nome A. ibericus foi por nós proposto por dois motivos: até à data, estas estirpes só foram isoladas em Portugal e Espanha; por outro lado, não há nenhum aspecto qualitativo a nível morfológico que lhe confira individualidade face às outras espécies descritas na secção Nigri. A ausência de capacidade de produção de OTA pelas estirpes de A. ibericus distingue-as das estirpes de A. carbonarius, mas não das estirpes de A. niger. Por isso, apesar de diferenças quanto à produção da micotoxina, a distinção destas estirpes tem de ser feita numa base molecular e/ou morfológica.

O estudo da morfologia dos esporos ao SEM permitiu verificar que não há uma relação directa entre a ornamentação dos esporos, a taxinomia e a produção de OTA quanto às duas classes definidas por Kozakiewicz (1989): verrucosos e equinulados. Estes dois tipos de ornamentação foram detectados em estirpes do agregado A. niger e A. carbonarius, por vezes na mesma estirpe. Por outro lado,

(25)

confirmou-se que o tamanho dos esporos é uma característica valiosa na distinção dos 3 taxa bisseriados isolados das uvas: agregado A. niger, A. carbonarius e A. ibericus.

Detectaram-se diferenças significativas entre o tamanho médio dos esporos dos 3 taxa mencionados. Não há sobreposição quanto ao tamanho dos esporos das estirpes do agregado A. niger e de A. carbonarius, mas verificou-se sobreposição do tamanho de esporos de A. ibericus com o limite superior do tamanho dos esporos do agregado A. niger e com o limite inferior do tamanho dos esporos de A. carbonarius. Apesar disso, foi possível classificar as estirpes negras bisseriadas isoladas das uvas com 100% de exactidão nestas 3 espécies com base no modelo de classificação produzido com o tamanho médio dos esporos: < 5 µm, agregado A. niger; entre 5 e 6µm, A. ibericus; > 6µm: A. carbonarius. Segundo este critério, as estirpes da espécie

A. ibericus foram correctamente classificadas, mas com base num intervalo de apenas

1 micrómetro. Este critério força a uma capacidade de medição exacta dos esporos, e juntamente com a sobreposição do tamanho dos esporos individuais com as outras espécies, enfatiza a necessidade de se classificar as estirpes com base no tamanho médio dos esporos. A produção de OTA é uma característica que facilita a distinção entre as estirpes de A. ibericus e A. carbonarius, mas a distinção entre as estirpes de

A. ibericus e agregado A. niger reside no tamanho dos esporos.

As estirpes de A. ibericus revelaram-se muito uniformes quanto ao tamanho médio dos esporos, ao contrário das estirpes do agregado A. niger e A. carbonarius, em que o tamanho médio dos esporos varia significativamente com a estirpe.

As estirpes de A. niger e A. tubingensis mostraram diferenças significativas quanto ao tamanho médio dos esporos, com A. tubingensis a exibir esporos mais pequenos que A. niger. Adicionalmente, verificou-se que os esporos de A. tubingensis eram menos ornamentados. Estas observações vão de encontro às verificadas por Accensi (2000) num estudo de 92 estirpes do agregado A. niger. O investigador verificou que os esporos de A. tubingensis tem em média 3,6 µm de diâmetro enquanto os de A. niger têm 4,0 µm de diâmetro. Tal como Accensi (ob. cit.), consideramos que as diferenças morfológicas observadas são muito subtis e não permitem uma distinção fidedigna entre as duas espécies.

Por outro lado, considera-se que a identificação morfológica do taxa A.

ibericus é possível, e que essa tarefa é facilitada quando aliada à avaliação da

(26)

de produção de OTA por estas estirpes. Considera-se adicionalmente que este taxa não complica a taxinomia das espécies bisseriadas da secção Nigri, mas ao invés disso, estreita a relação entre a taxinomia e a produção de OTA das espécies, em particular para A. carbonarius.

4. Concentração de OTA nas uvas portuguesas

As análises às uvas produziram resultados surpreendentes, na medida em que se detectou OTA no bago ervilha, quando não foram isoladas estirpes OTA nesta fase da maturação das uvas. Investigadores italianos também verificaram este fenómeno, se bem que raramente (Battilani, comunicação pessoal). Adicionalmente, os níveis de OTA detectados no bago ervilha e no pintor foram superiores aos detectados em uvas normais na vindima. Apesar de a OTA ser detectada nas uvas desde os estados iniciais de maturação, as implicações deste facto quanto aos níveis de OTA detectados na vindima não são conhecidas. Visto que se detectaram níveis inferiores de OTA no bagos maduro comparativamente aos estádios anteriores de maturação, é impossível especular se este facto se deve a uma questão de amostragem ou se está relacionado com outros fenómenos, como diluição com o aumento de volume do bago ou degradação por fungos (Abrunhosa et al., 2002) ou pela própria planta. No entanto, nenhum dos valores de OTA detectados em uvas normais excedeu o limite máximo de 2 µg/l de OTA proposto no vinho.

Em uvas aparentemente saudáveis, detectou-se OTA na vindima em 3 regiões e uma sub-região: Dão, Madeira, Ribatejo e sub-região de Monção (região dos Vinhos Verdes), respectivamente. Só foram detectadas diferenças significativas entre a concentração de OTA nas uvas das regiões no momento da vindima. As amostras oriundas do Ribatejo estiveram em média mais contaminadas que as provenientes das restantes regiões. No entanto, a concentração média de OTA nas amostras do Ribatejo não excedeu os 0,1 µg/kg.

Foi interessante verificar que na vindima, a OTA foi detectada nas regiões mais húmidas de bioclima Mediterrânico Pluvio-estacional Oceânico, e de menor continentalidade (mais oceânicas) (V. capítulo 3, Tabela 3.7, p. 138). Estes resultados estão de acordo com a distribuição de OTA nos vinhos europeus, em que os vinhos

(27)

mais contaminados são originários da bacia Mediterrânica, em particular, do Sul da Itália e ilhas Gregas (V. capítulo 2). A presença de A. carbonarius foi detectada em todas as regiões (e sub-região) mencionadas em amostras de uvas ou de mosto.

No entanto, a única situação em que se excedeu o limite de 2 µg/l nas uvas foi num cacho em que foi detectada podridão com A. carbonarius numa vinha do Douro. Estes resultados enfatizam a necessidade de se usarem uvas em bom estado fitossanitário para vinificação em todas as regiões onde as uvas estão expostas a A.

carbonarius, visto que nenhuma das amostras de uvas sem sintomas de infecção

fúngica excedeu a concentração de 2 µg/l de OTA nos bagos.

5. Avaliação do potencial ocratoxigénico das estirpes em

meio de uva

A produção de OTA por estirpes da secção Nigri entre CYA e GJ50 foi consistente, significando que o CYA é um bom meio para avaliar a capacidade de produção de OTA pelas estirpes em meio de uva. Confirma também que todas as estirpes ocratoxigénicas têm um comportamento semelhante quanto à capacidade de produzir a micotoxina em meio de uva. Para estudar a influência das diferenças na composição nutricional das uvas quanto à maturação e à casta, seleccionou-se uma estirpe de A. carbonarius. Os resultados revelaram que a composição nutricional das uvas permite a produção da micotoxina em todos os estados de maturação e castas, sendo favorecida por concentrações de ácidos orgânicos elevadas e baixos teores de açúcares redutores que se verificaram em estados de maturação mais precoces e na vindima em castas mais ácidas, como Vinhão. Em uvas no estado de bago ervilha, a estirpe seleccionada produziu cerca de 100 vezes mais OTA que nas uvas maduras.

Esta observação suporta os dados obtidos respeitantes à concentração de OTA das amostras, no sentido em que confirma que o bago ervilha tem condições nutricionalmente adequadas para que haja produção da micotoxina, e em quantidades superiores que no bago maduro. Parece-nos possível que casos pontuais de infecção por A. carbonarius em bagos danificados nesta fase (v.g., bagos rachados por oídio) possam levar à contaminação dos bagos com a micotoxina nos níveis observados em campo.

(28)

6. Outros perigos micotoxigénicos nas uvas

Nesta secção discutem-se os principais perigos micotoxigénicos que apresentam outros fungos filamentosos presentes nas uvas além dos Aspergillus.

6.1. T. roseum e seus metabolitos

O facto de se ter detectado podridão com T. roseum em uvas portuguesas destinadas à vinificação, conjuntamente com o facto de se terem detectado previamente metabolitos tóxicos produzidos por este fungo em vinhos, suscita preocupação. A preocupação é particularmente acrescida na região dos Vinhos Verdes, onde se observou podridão por este fungo num grande número dos cachos que chegaram a adegas para serem vinificados, apesar de também ter sido detectada a presença do fungo em cachos podres da região do Douro durante este estudo e em 1999 por Abrunhosa (2001). Apesar de não existir legislação sobre o assunto, e de se considerar que o risco para a saúde dos metabolitos de T. roseum deva ser mínimo, visto que a podridão por este fungo em alimentos é rara (Pitt & Hocking, 1997), trata-se de compostos da família dos tricotecenos, compostos de reconhecida toxicidade para animais. Adicionalmente, verificou-se que um dos metabolitos, a tricotecina, apresenta toxicidade para leveduras, e que confere um gosto amargo ao vinho quando em grandes quantidades, afectando as características organolépticas do vinho.

A podridão por este fungo só foi detectada associada a B. cinerea. A podridão cinzenta de B. cinerea nos cachos causa um decréscimo enorme na qualidade das uvas, dificultando o processo de vinificação. Visto ser a podridão cinzenta ser fenómeno frequente na região dos Vinhos Verdes, algumas adegas possuem uma avaliação da qualidade nas uvas pela quantificação da actividade de lacase, enzima produzida por Botrytis e outros fungos, de forma a melhor avaliar a qualidade das uvas. Por isso, especula-se que os metabolitos de T. roseum serão particularmente importantes em vinhos de menor qualidade, feitos a partir de uvas com alguma podridão cinzenta, e que é possível que a determinação da lacase esteja relacionada

(29)

susceptíveis à podridão. A presença de T. roseum nos cachos podres leva-nos a chamar a atenção de que vinificar uvas podres, além de ser uma má prática agrícola e levar a vinhos de pior qualidade, pode conduzir à presença de compostos potencialmente nocivos para a saúde.

6.2. Alternaria e alternariol

A presença de metabolitos produzidos por alternaria é particularmente relevante em alimentos em que se detecta podridão visível por este fungo. Durante este estudo nunca foi observada podridão nas uvas por Alternaria, mas existem registos de algumas ocorrências associadas a Botrytis (Lopes, 2002). A autora considera que só é provável que ocorram metabolitos de Alternaria, em particular o alternariol, caso se vinifiquem cachos podres, e por isso, subscreve-se o que foi dito para T. roseum. Apesar de a presença destes compostos não estar legislada em nenhum produto, a sua presença é indicadora de má qualidade das matérias-primas (Scott, 2001).

6.3. Penicillium e patulina

As espécies do género Penicillium são capazes da produção de várias micotoxinas, sendo as mais relevantes a OTA e a patulina. Como foi indicado na secção dos resultados, não foram detectadas espécies OTA+ de Penicillium nas uvas portuguesas. As espécies mais frequentemente detectadas nas uvas portuguesas, P.

brevicompactum, P. glabrum/spinulosum e P. thomii não produzem micotoxinas

consideradas relevantes para a saúde humana. No entanto, foram isoladas nas uvas várias espécies capazes de produzir patulina, das quais a mais frequente foi P.

expansum.

Em 1999, Abrunhosa (2001) fez um rastreio a uvas das regiões demarcadas dos Vinhos Verdes e Douro. As uvas da região dos Vinhos Verdes foram vindimadas em meados de Setembro, cerca de mês e meio antes das da região do Douro, onde a vindima se deu no início de Novembro. Apesar de Abrunhosa ter verificado que

Botrytis e Cladosporium foram dominantes nas uvas de ambas as regiões estudadas, a

(30)

expansum, particularmente nas amostras de colheita mais tardia, no início de Outubro

e Novembro. Foi postulado que a maior incidência de Penicillium nas amostras do Douro se deveu ao estado de sobrematuração das uvas nesta região, mas a ausência de

P. expansum na região dos Vinhos Verdes requeria investigações futuras para se

determinar se a maturação foi de facto o factor justificativo das diferenças observadas entre as regiões ou se poderiam estar envolvidos factores ambientais na distribuição da espécie (Abrunhosa et al., 2001).

Durante este estudo verificou-se que a espécie P. expansum existe tanto na região dos Vinhos Verdes como na região do Douro, e que nos anos e locais estudados, foi inclusive mais frequente nas uvas da região dos Vinhos Verdes. Em 2003 foram analisadas uvas do mesmo local do Douro que foi estudado em 1999 (Do4) numa vindima corrente, e apesar de P. expansum ter sido detectado na amostra, não foi detectada podridão e a sua frequência foi muito baixa. Com base nestes dados, conclui-se que P. expansum só causa risco de podridão das uvas em estados de sobrematuração ou em situações pós-colheita, e que, como tal, à semelhança do que se passa com as maçãs e com as situações referidas atrás, a sua presença em uvas e sumos é indicadora de má qualidade da matéria-prima. No entanto, este contaminante não deverá estar presente no vinho, visto que é destruído com a fermentação, como foi mencionado no capítulo 1.

Referências

Documentos relacionados

Sendo assim, o presente estudo visa quantificar a atividade das proteases alcalinas totais do trato digestório do neon gobi Elacatinus figaro em diferentes idades e dietas que compõem

O enfermeiro, como integrante da equipe multidisciplinar em saúde, possui respaldo ético legal e técnico cientifico para atuar junto ao paciente portador de feridas, da avaliação

Ainda que das carnes mais consumidas nesta altura em Portugal, tanto os caprinos como os galináceos estão re- presentados apenas por um elemento, o que nos pode dar a indicação que

Segundo Favareto (2007), muitos teóricos divergem sobre a relação entre o meio urbano e o rural, visto que enquanto uns acreditavam que o meio urbano em sua

Assim procedemos a fim de clarear certas reflexões e buscar possíveis respostas ou, quem sabe, novas pistas que poderão configurar outros objetos de estudo, a exemplo de: *

Corroborando com o objetivo deste estudo, e considerando a metodologia aplicada, entende-se que a educação ambiental, sua comunicação e sua prática nas atividades

Nossos parâmetros de rating levam em consideração o potencial de valorização da ação, do mercado, aqui refletido pelo Índice Bovespa, e um prêmio, adotado neste caso como a taxa

•   O  material  a  seguir  consiste  de  adaptações  e  extensões  dos  originais  gentilmente  cedidos  pelo