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TRÊS LINHAS CINCO LINHAS SETE LINHAS

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Academic year: 2021

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TRÊS LINHAS

CINCO LINHAS

SETE LINHAS

Carlos

Rodrigues

Brandão

(2)

Pequenos poemas, por que?

Peço a você que abriu este livro e talvez leia todos ou alguns escritos dele, que me acompanhe por um momento.

Os “pequenos poemas” devem ser entendidos como isto mesmo: escritos de poesia três a cinco linhas. Outros, um pouco maiores, escritos de seis e sete linhas. Outros, os . do final do livro, um pouco ou um tanto mais longos até. Logo você verá que em um lugar bem longe daqui alguns deles têm os seus nomes e até uma longa história.

O “outro lado”, que está também escrito no título deste livro, deve ser entendido aqui como "o lado de lá do nosso mundo”. Se quisermos dar um nome a este "outro lado", ele pode ser... o “Japão”.

Neste país distante, e há muitos e muitos anos atrás, quando o Brasil mal acabara de ser descoberto, alguns japoneses começaram a criar uma poesia com poucas palavras e muito poucas linhas: três linhas, cinco linhas.

O haikai é um brevíssimo poema. Nas suas três linhas ele quer apenas traduzir o ver, o sentir, o viver de um momento.

(3)

O grande poeta do haikai, chamado Matsuo Bashô, disse que: "Haikai (ou Jaiku) é simplesmente o que está sucedendo neste lugar, neste momento".

Vou deixar escrito logo abaixo um HAIKAI, primeiro em japonês, mas escrito já com as nossas letras. Depois, a tradução dele para o Português.

tôyama wa yuki furu kumo no

taema kana Montes distantes onde as nuvens nevam

com traços claros.

Este belo HAIKAI é de um poeta antigo, com este nome: Senyun1.

Muitos anos mais tarde, vários escritores daqui do Ocidente (onde fica o Brasil no mundo, não esquecer!) começaram a conhecer, ler e mesmo traduzir o HAIKAI japonês.

1. Este e outros muitos HAIKAS estão em um livro em Espanhol: Jaikus inmortales. Eles foram traduzidos por Antonio Cabezas. O livro foi publkicado em Mdri, na Espanha, pela Editora Hiperión. Eu traduzi para o Português este HAIKAI de uma terceira edição, de 1997.

(4)

Hoje em dia vários poetas com livros publicados ou não gostam de "traduzir" o que eles vivem e sentem em HAIKAIS. Cada um em sua língua.

Claro, em cada língua e em cada poeta o HAIKAI "ocidental" é escrito de um modo. É muito difícil em uma língua como o Português, você escrever um HAIKAI como os japoneses do passado faziam seguindo as mesmas regras de poesia e de gramática.

Até porque o alfabeto, as letras e a lógica da construção de palavras e de ideias lá é bem diferente daqui.

Vocês verão que meus HAIKAIS são uns mais longos, outros mais curtos e breves. alguns são rimados. Outros não.

Se de repente você quiser colocar por escrito o que viu, sentiu ou vivem em um momento, faça como eu. Faça como tantas pessoas. Escreva em três linhas o seu HAIKAI!

Aqui neste livro os poemas começam como HAIKAIS, com três linhas. Depois eles vão crescendo. Poemas de quatro linhas. De cinco linhas, uma outra invenção japonesa. De seis, de sete e, entre os últimos, poemas de oito e mais linhas.

Em algumas páginas os pequenos poemas estão acompanhados de algumas imagens em preto-e-branco. Elas se repetem e são parecidas. São pequenas esculturas que acabamos chamando de “bonsais de pedra”. Foram feitos de maneira muito simples e você também pode

(5)

tentar fazer os seus bonsais de pedra. Basta encontrar algumas pedras que possam acolher cada uma as outras. Depois é só ir colocando uma em cima da outra, sem cimento ou cola alguma. Elas se equilibram umas em cima das outras, sozinhas. a um ocupa uma página.

E agora pronto! Podemos seguir juntos a aventura de percorrer este livro.

Boa viagem!

Carlos Rodrigues

(6)

Poemas

de

três linhas

(7)

Névoa. A nuvem nada

na neve.

Clareia devagar. O sol tinge de ouro

(8)

Embala o vento a folha que o vento

embala?

Vaga o vento à toa, e quem viaja nele,

(9)

Hoje a noite veio.

E nela veio a luz da lua cheia.

Gota d’água de abril o que fez você cair

(10)

Sombra, quem te aclara quando o dia acaba?

Vinda do sul canta na Araucária

(11)

Livre é a gota d’água quando cai. Agora é noite. Ouço no lago o coaxar do sapo.

(12)

No ar de maio a folha ao vento vai

enquanto cai.

Na poeira veio com o vento a folha seca da figueira.

(13)

Cena marinha.

Aqui nesta manhã de maio O mar me vinha.

Antes de cair na areia baila no vento a folha da aroeira.

(14)

E veio então a hora quando o antes de hoje

já era agora.

Antes de agora um tempo houve. Ele passou e foi embora.

(15)

O que havia

no que antes de haver já existia?

Para onde vai além daqui quem nem chegou

(16)

Artista do céu a primavera chega com paleta e pincel.

Saiu no céu a lua cheia e clareou de luz um grão de areia.

(17)

Choveu aqui. Uma gota na folha, cria um universo ali.

Qual rara joia brilha como esta gota de água

(18)

Gotas de chuva na bruma o sol engole todas

uma a uma.

Um raio de sol na folha do capim. Sua luz clareia em mim.

(19)

Demora a borboleta

no mel da flor de amora.

Ontem saltou no lago a rã. Quando ela tocar n'água

(20)

O passar da aranha ao passar

arranha a teia.

Voltam as garças mansas. A árvore floresce

(21)

Do outro lado do rio na nuvem cinza chovia. Ladeira abaixo o menino corre e rola a bola.

(22)

Por um instante a luz da lua

aclara a alma errante

Surpresa! Já é novembro lá e canta aqui um sabiá.

(23)

Florem de amarelo os pés de ipê. É primavera, vê!

Alguém passou aqui, Quem?

(24)

Há horas em que a noite tarda um tanto até. Espero a Lua Cheia em pé.

Saudade é isto?

Ficou em mim até agora quem veio ontem e foi embora.

(25)

Veio com a nuvem cinza a chuvarada.

Mil espelhos na estrada.

Da praia olhava o mar. "Quem há", ele pensava,

(26)

Do lado de cá ele pergunta: "existe alguém lá,

além do mar?"

O que há

além do que havia? A noite acaso engole o dia?

(27)

Tece a noite o pano escuro com o fio de luz e lã que a mão do dia fia.

A maré cheia apaga os passos

(28)

Passou o fogo na floresta. Entre chamas um azul

tinge a cor da flor que ainda resta.

Chove a chuva de março. O rio Vermelho

(29)

Viaja no vento O seu voar.

A gaivota flutua no ar.

Toca de leve o vento a pena da arara. O vento sente... e para.

(30)

Lenta a lesma atravessa o deserto

de uma folha seca.

A velha varreu a casa e agora dorme.

(31)

Vela a noite o sono. Viaja enquanto dorme

quem no sono sonha.

É agora o dia. O galo acorda o sol que dormia.

(32)

Onde nada não havia guarda no bolso o menino

o que sobrou do dia.

Saltou no lago o sapo. O salto faz a onda. A onda aonde toca?

(33)

Não corre o rio. Corro eu... pra onde? Quando corro contra o rio.

Por uma noite esconde o escuro

(34)

Sorrio e leva o rio o meu rosto fugidio.

Choveu e a água passou. Deixou a lama

(35)

Cai a noite agora. Apaga a luz da flor

um pé de ipê rosa

Sobrou da noite a cortina feita à luz de uma estrela

(36)

oemas

de

quatro

(37)

Com o vento

voa a folha da figueira. Caída no chão ela sonha ser estrela.

Era a noite

quando a noite veio agora. Será ainda a noite

(38)

Vê! Assiste! No fim do inverno

a folha aqui é só o que existe.

É primavera, eu acho. pois a cada traço

de um passo nasce um riacho!

(39)

Sobre o branco da paisagem quieta colore de um tom de neve

a cor azul do céu.

No findar da primavera. o voo sem pressa de um pássaro sem cor.

(40)

Viaja no vento quem tem asa.

E é voando

que se sente em casa.

Quando for a hora e te fores,

lembra-te que é melhor se entre as flores.

(41)

Navegava na noite do seu sono. Quando acordou viajava um rio de sonho.

Quem acorda acaba o sonho? Ou saindo do sonho

(42)

Escondido, há um dia adormecido

na noite que no fio do dia havia.

Um pingo d’água em minha mão pousou. Carrego um lago inteiro

(43)

Quando eu vivo cada momento, agora,

esqueço o que era e foi-se embora.

(44)

Havia antes? Havia já

o que houve um dia e ainda há?

Venta e chove agora. Longe e aqui um trovão troveja

(45)

Lá vem o vento de-va-ga-ri-nho

abrindo no ar o seu caminho.

(46)

Uma ilha eu procuro no mar sem fim. O que eu busco no mar se a ilha existe em mim?

Venta, vento do sul! Vem e venta bem ligeiro

que eu pinto de azul o teu corpo inteiro.

(47)

Quando quem piava pausa o pio, no silêncio se ouve

a voz do rio.

Não vejo a hora de chegar o momento

que não existe... e é o agora.

(48)

Da espera de ontem veio a hora

em que o antes de hoje foi agora.

Um rio um dia aqui nascia. Agora ele nasce

(49)

Acaso sabe o grão de areia que ele é o mar

e é tudo o mais que há na luz que sol clareia?

(50)

Oito

poemas

como se

fossem

Tanka

TANKA também é uma outra palavra japonesa.

E TANKA também é uma invenção da poesia japonesa.

O que não quer dizer que outras gentes, de outros lugares, tenham praticado poemas semelhantes.

A TANKA, também originalmente chamada WAKA é talvez mais antiga do que o HAIKAI. E é um pouco maior, pois tem em geral cinco linhas.

Assim como o grande poeta sempre lembrado do HAIKAI é Bashô, com quem já nos encontramos aqui, o mais lembrado escritor de TANKA foi Saigyô.

Em Português um seu livro foi traduzido com este nome: poemas

da cabana da montanhesa2.

2 Este belo livro foi traduzido para o Português por Nassin Cohen. Ele antecede os poemas de um longo e primoroso estudo sobre a cultura japonesa dos tempos de Saigyô e sobre a sua vida. o livro foi

(51)

Vejam abaixo um dos poemas-de-cinco linhas dele. E vejam que antes está escrito algo para lembrar em que situação a TANKA foi escrita e sobre quem... ou o que.

Durante uma jornada; concernente à lua:

Como sempre, a lua Noite após noite Permanecerá ela aqui

Nesta choça de capim que construí - E agora mesmo eu devo partir.

Do mesmo modo como acontece com os HAIKAI, não podemos em uma outra língua escrever TANKAS assim como elas são escritas e com a mesma métrica e tudo o mais, tal como poetas do Japão criavam os seus poemas. Ainda mais se lembrarmos de novo que a poesia japonesa era "caligrafada", com aquelas belas letras, que são símbolos gráficos bem mais do que as nossas, como as que estão escritas aqui, os japoneses ao mesmo tempo escreviam e desenhavam os seus pequenos poemas.

(52)
(53)

Porque partiu se é cedo ainda? Se de cor cobria a tela

e tinha as mãos sujas de tinta?

quando a noite vai e outro dia vem,

o que se finda, se eu penso que o dia

(54)

Como lençol, alva a noite vai E apaga a lua. Voa uma pomba

e acorda a rua.

Não era eu ontem o que hoje eu sou. E quem será aquele

que hoje eu era e já passou?

(55)

Verão em agosto. O mais claro clarão da lua no lado escuro

de meu rosto

Aqui neste jardim secaram séculos de folhas mortas. Mas se elas estão aqui...

(56)

Um sino toca ao longe, pequenino.

Ao longe um sino toca. Até que estrela chega

o som do sino? De vez em quando o que acontece e vai haver já aconteceu antes de ser.

(57)

Sonha a menina um sonhozinho.

Ela sonha e não está mais

sozinha.

Aqui eu paro! Até aqui cheguei. Não fui a parte alguma,

e sem ter ido lá, de lá voltei!

(58)

Tudo o que se cria é apenas a frase

de um poema escrito à tarde e esquecido ao dia.

Uma coisa vale pela outra, assim como

a lua no céu erguida ou a sua clara face

(59)

Morreu. Morreu e foi-se embora. E quando morto ele viu que a eternidade

(60)

sete

poemas

de

seis

6

linhas

(61)

Passou a noite e veio do dia. Se de novo a noite veio... passou a noite e veio o dia? Sonho o esquecido, e em mim viaja o voar do vento. Sonho o que não sei

e não sabendo, o sonho inventa.

(62)

Acordo e esqueço o que sonhei.

E me pergunto agora, aqui se eu sou quando acordado,

ou quando sonho o sonho que esqueci.

(63)

Eu me escondo no que falo. Mas os silêncios de quando eu calo

escrevem de mim o meu outro lado.

(64)

Morei numa casa e fui embora.

Hoje, por onde eu ando carrego comigo a casa onde morei

(65)

Saberá o sábado que o dia de ontem

passou?

Assim como ele também no domingo...

(66)

A vida ainda ou já o fim? Se morre a flor para haver o fruto o que haverá de mim

(67)

poemas

de

sete

linhas

e mais

de

sete

(68)

Veja o vento! Ele veio de viagem de um lugar longe daqui.

Mas, o que é “longe”

(o vento se pergunta)

quando quem veio já está aqui?

Sempre há!

Ela dizia:

Quando o que houve, e o que houver haverão de ser

de novo o que havia!

(69)

Belas no galho as flores cor de rosa

que do alto o sol clareia. Mas quem para

na estrada

e por um momento olha o tapete das folhas caídas da paineira?

(70)

Miudinha, aquela estrelinha que quase não brilha com uma luz de nada

dizia pra outras: Tudo é tão um e o mundo é tão nós, que se eu me apagar o mundo se acaba!

(71)

Caminhei

pisando folhas secas pelas trilhas do mundo.

Caminhei

esquecido de saber que seca, cada folha

é, ali no chão

um universo que não vejo e um mundo que eu não sei.

(72)

Na lagoa o rio demora o seu caminho. A lagoa acolhe o rio

como em um ninho. Depois, do outro lado

o rio deixa a lagoa e embora

lá se vai... sozinho. E a lagoa serena

se pergunta:

onde estará o meu rio agora?

(73)

Taciturno, tristonho o infinito se lamenta, chora

e pensa assim: “ah! como é triste

não ter começo... e não ter fim!”

(74)

Esqueci o que ontem

eu vivi.

E amanhã, talvez, será que vou esquecer também o que eu vivo agora

de novo uma outra vez?

(75)

“Passou o que passou?” Dizia no chão caída a branca flor de ipê. “Mas o que passou?

Quando e o quê? Se o inverno ainda

(76)

quando ninguém diz a palavra alguma e nada se escuta do que se cala, é quando acontece este milagre: de dentro do nada o silêncio fala.

Referências

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