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Vista do Políticas públicas prisionais geridas por uma associação: o caso de uma penitenciária no Sul de Minas Gerais

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Políticas públicas prisionais geridas

por uma associação: o caso de uma

penitenciária no Sul de Minas Gerais

João Francisco Sarno Carvalho

Universidade Federal de Itajubá – jfsarcar@gmail.com

Carlos Alberto Máximo Pimenta

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RESUMO

O presente trabalho é um recorde de uma dissertação de mestrado pelo programa de pós-graduação em Desenvolvimento, Tecnologias e Sociedade da Universidade Federal de Itajubá. Aborda-se a gestão de políticas públicas prisionais pela ótica do trabalho reali-zado pela Associação de Proteção e Assistência aos Condenados (APAC). Impulsionados pelos novos arranjos sociais e buscando solucionar os problemas que o desenvolvimento econômico não solucionou, sugere-se a necessidade de se pensar num novo conceito de desenvolvimento, que permita a participação popular por meio da Gestão Social. Expõe-se, com dados obtidos em pesquisa documental, o panorama geral do sistema carcerário brasileiro e faz-se um enfoque na APAC. Aborda-se, com dados institucio-nais resultados de coleta de dados na unidade, o trabalho realizado na APAC de Pouso Alegre, MG. Conclui-se com a reflexão da necessidade de se pensar em políticas públicas para além das prisionais, buscando atender as demandas sociais que são entrave para o desenvolvimento do Brasil nas vertentes econômicas, sociais, políticas e ambientais.

PALAVRAS-CHAVE:

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ABSTRACT

This paper is a record of an essay of master degree for the postgraduate program on De-velopment, Technologies and Society of the Itajubá Federal University. It is approached the management of public policies of penitentiary by the view of the work performed by the Association of Protection and Assistance to Convicts (as known as APAC in Portu-guese). Driven by the new social arrangements and seeking to solve the issues that the economic development has not solved, it suggests the need to think in a new concept of development, which allows the community participation by means of Social Manage-ment. It is exhibited, using data obtained from documentary research, the overview of the Brazilian penitentiary system and it is done a focus on APAC. It is discussed, with institutional data, results of data collection at the unit, the work done at APAC in Pouso Alegre – MG. It is concluded by means of reflection the need to think about public policy beyond the prison, searching to meet the social demands, which are an obstacle to Brazil development in economic, social, political and environmental aspects.

KEY-WORDS:

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INTRODUÇÃO

O presente trabalho delimita o seu enfoque a partir de uma Política Pública representada pelo trabalho de ressocialização de detentos realizado pela Associação de Proteção e Assistência aos Condenados (APAC) da cidade de Pouso Alegre, MG.

Trata-se de um recorte de uma dissertação de mestrado em elaboração, pelo programa de pós-graduação em Desenvolvimento, Tecnologias e Sociedade da Universidade Federal de Itajubá, MG. Justifica-se esta discussão, tendo em vista que a gestão de políticas públicas prisionais, pela iniciativa privada, emerge no contexto pós-moderno no qual o Estado sofre influências da globalização e do modo de produção capitalista e tem suas funções reajustadas. Ademais, a discussão aqui proposta pode auxiliar na reflexão para a solução dos problemas inerentes à gestão do sistema prisional brasileiro podendo-se fomentar práticas gerenciais com novas metodologias que busquem aplicar os conceitos gerenciais de eficiência, eficácia e efetividade e também que busquem humanizar as prisões, sem perder de vista a finalidade punitiva das penas impostas.

Aqui realizou- um enfoque nos dados coletados pela pesquisa de campo realizada na APAC de Pouso Alegre com um aporte teórico feito a partir da revisão de literatura realizada no trabalho, com o bojo de sustentação circunscrito a partir das discussões de: Desenvolvimento, Estado e Políticas Públicas, Sistema Carcerário Brasileiro e Associação de Proteção e Assistência aos Condenados (APAC).

Tem-se como objetivo, demonstrar o trabalho realizado pela APAC de Pouso Alegre e evidenciar o seu caráter público, mesmo que seja gerido pela iniciativa privada. Dentro deste objetivo, espera-se tensionar a discussão que pretende fomentar o incentivo à elaboração de políticas públicas no Brasil, buscando sustentar o desenvolvimento do país sob as óticas que transcendem o desenvolvimento no prisma econômico.

1.1. O DESENVOLVIMENTO E SUAS NOVAS PERSPECTIVAS

Na contemporaneidade a discussão acerca do desenvolvimento vinculado ao crescimento econômico começa a perder o enfoque. Esse movimento acontece pelo fato de o desenvolvimento econômico não conseguir solucionar as diversas problemáticas sociais e ambientais geradas pelo capitalismo1.

Diante desta nova perspectiva, se faz pertinente utilizar o pensamento de Sen (2000, p. 28):

Uma concepção adequada do desenvolvimento deve ir muito além da acumulação de riqueza e do crescimento do Produto Nacional Bruto e de outras variáveis

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relacionadas à renda. Sem desconsiderar a importância do crescimento econômico, precisamos enxergar muito além dele. (SEN, 2000, p. 28)

Deste modo, cabe a reflexão acerca do que precisamos enxergar além do desenvolvimento econômico, para a pluralização do desenvolvimento em suas égides econômicas, sociais, locais e ambientais.

Neste caso, fica pertinente pensar no desenvolvimento social que pode ser gerado pela implementação de uma política pública eficaz.

Contudo, é necessário o entendimento de que para se chegar ao desenvolvimento social “necessitamos de um Estado e uma sociedade que sejam amplos no fortalecimento e na proteção das capacidades humanas” (SEN, 2000, p. 77).

No que tange à sociedade, esta participação pode-se dar a partir da Gestão Social, que será abordada posteriormente. Mas cabe ressalva, ao pensamento de que

Uma abordagem adequada ao desenvolvimento não pode realmente concentrar-se tanto apenas nos detentores do poder. É preciso mais abrangência, e a necessidade de participação popular não é uma bobagem farisaica. A ideia de desenvolvimento não pode, com efeito, ser dissociada desta participação (SEN, 2000, p. 317).

Neste caso, a participação popular pode ser exercida através do trabalho de associações e organizações não-governamentais (ONGs).

1.2. O ESTADO E AS POLÍTICAS PÚBLICAS

Da Costa e Pimenta (2006) nos brindam com reflexões sobre o Estado moderno que indicam que para que o monopólio da violência fosse exercido, o Estado criou os contratos sociais e os sujeitos agora transferiram ao Estado suas liberdades para que a vida em sociedade seja orientada. Em contrapartida, o Estado, de maneira ideológica, ofereceu a liberdade material, prometendo habitação, educação, saúde, lazer, trabalho, segurança e outros direitos sociais. Contudo, o Estado a partir de uma dimensão desorganizada não consegue atender todas as demandas da sociedade e permeia abertura de dois fatos: a ação do homem a partir da chamada sociedade civil organizada para o preenchimento das lacunas existentes em que o Estado não consegue atuar e a disseminação da violência por parte dos indivíduos e grupos não atendidos pelas promessas do Estado.

Tempos depois, com o advento do capitalismo e da globalização a sociedade passou a se adotar novas configurações. Bauman (1999, 2001, 2007) enriquece esta discussão com a sua metáfora da liquidez. Para ele, as relações sociais na atualidade são afetadas pelas velocidades que fazem com que a sociedade deixe de ter seus rumos e parâmetros. A partir dessa liquidez das relações, as relações rápidas nos fazem repensar os conceitos

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anteriormente definidos de Estado, governo, família, instituições e outros.

Da Costa e Pimenta (2006) também fortalecem este ponto de vista ao mostrarem que a globalização modificou o papel do Estado e suas atribuições.

Ao trazermos esse panorama para a realidade brasileira, o Estado passou por uma reforma executada no governo do Presidente Fernando Henrique Cardoso. Esse movimento ocorreu pela necessidade de se obter uma administração pública gerencial que redefina as funções do Estado inerentes às novas necessidades criadas pelo capitalismo e pela globalização (BRESSER-PEREIRA; SPINK, 1998).

Neste panorama de um “novo Estado” deve-se ter como objetivo não, mais o controle rígido e a detenção dos contratos sociais, mas sim a instrumentalização da criação e da organização de políticas públicas nas áreas social, científica e tecnológica (BRESSER-PEREIRA; SPINK, 1998).

Dentro deste cenário, as políticas públicas, em geral, assumem o conceito de que o todo é mais importante que o indivíduo e a soma das partes, mesmo que existam diferenças inerentes à importância desses fatores (SOUZA, 2006).

Desta maneira, a partir da nova reconfiguração de Estado, na qual a sociedade civil tem voz para atuar, a formulação de agendas das políticas públicas pode estar sob a cooperação da sociedade civil organizada. Secchi (2013, p. 3) chama as políticas públicas que tem a participação de “organizações privadas, organizações não governamentais e organismos multilaterais de Políticas Públicas Multicêntricas”. Para ele, se o problema a ser enfrentado é público, a política é pública independente da natureza jurídica de quem as formula.

Ainda para Secchi (2013, p. 5) “se o problema a ser enfrentado é público, a política que propõe a solução ou a remediação deste problema é pública”. De fato, a problemática do sistema carcerário brasileiro é um problema público a ser enfrentado. Pimenta e Alves (2010, p. 13) apontam que independente das políticas públicas, em alguns casos, serem conduzidas pela esfera privada, o interesse geral das ações das políticas públicas é público. E a ação da sociedade civil por meio da constituição da Associação de Proteção e Assistência aos Condenados (APAC) se caracteriza como política pública gerida pela iniciativa privada. No decorrer desta discussão, aprofundaremos estes conceitos.

1.3. SISTEMA CARCERÁRIO BRASILEIRO: PANORAMA GERAL

A discussão acerca dos problemas do sistema carcerário brasileiro é antiga. A primeira prisão instalada no país é mencionada na Carta Régia de 1769 e foi denominada Casa de Correção, no Rio de Janeiro (SILVA MATOS, 1885). Desde então, há registrada a existência de superlotação e de maus tratos (FAZENDA, 1921).

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Contudo, a discussão acerca da possibilidade de melhorias nas prisões já era realizada neste período. Trindade (2012) em seu estudo evidenciou que a partir da Lei de 23 de maio de 1821 – assinada por Dom Pedro I -, era proibida a manutenção dos presos em masmorras e era vedado o tormento aos mesmos.

No século XX, os problemas do sistema carcerário brasileiro persistem e são evidenciados por obras acadêmicas e literárias como as oriundas do “Massacre do Carandiru” ocorrido em 1992 na Casa de Detenção de São Paulo.

Ao visualizarmos o panorama do sistema carcerário brasileiro desde o Brasil-Império ao Brasil-República, podemos notar que a problemática que envolve superlotação, torturas, maus-tratos, corrupção, abuso e outros inúmeros problemas é histórica e recorrente. À procura de soluções para estes problemas o governo se movimentou a partir da Comissão Parlamentar de Inquérito (CPI) do Sistema Carcerário Brasileiro em 2008 e do panorama do sistema carcerário brasileiro, traçado pelo Ministério da Justiça que em 2014 evidenciou no Brasil uma população carcerária de 711.463 presos para apenas 357.219 vagas em todo o país (MINISTÉRIO DA JUSTIÇA, 2014).

1.4. A ASSOCIAÇÃO DE PROTEÇÃO E ASSISTÊNCIA AOS

CONDENADOS (APAC)

Diante de inúmeros problemas do sistema carcerário brasileiro, surgiu a Associação de Proteção e Assistência aos Condenados (APAC) que foi idealizada e estruturada por Mário Ottoboni e uma equipe de voluntários em 1972 na cidade de São José dos Campos, São Paulo. O trabalho foi despertado para propor soluções para as constantes rebeliões existentes na cadeia pública de Humaitá (OTTOBONI, 2001). A APAC consiste em uma entidade civil de direito privado, com personalidade jurídica própria, dedicada à recuperação e reintegração social dos indivíduos condenados a penas privativas de liberdade. Amparada pela Constituição Federal para atuar nos presídios, possui estatuto resguardado pelo Código Civil e pela Lei de Execução Penal. Tem como finalidade promover a humanização das prisões, sem perder de vista a finalidade punitiva da pena. Seu propósito é evitar a reincidência no crime e oferecer alternativas para o condenado2 se recuperar.

A APAC se sustenta em uma metodologia de ressocialização de condenados composta por 12 elementos (OTTOBONI, 2001): Participação da comunidade; Recuperando ajudando o recuperando; Trabalho; Religião; Assistência jurídica; Assistência à saúde; Valorização humana; A família; O serviço voluntário; Centro de Reintegração Social (CSR); O mérito e a Jornada de libertação com Cristo;

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Na atualidade, a APAC está distribuída por 17 estados brasileiros, com 147 APACs juridicamente formadas. Contudo, desse total, apenas 40 estão em funcionamento atendendo cerca de 2.500 recuperandos em todo o Brasil (APAC, 2014). Há também a expansão do método em outros países: Antigua e Barbuda, Austrália, Belarus, Bulgária, Canadá, Chile, Colômbia, Costa Rica, Estados Unidos, Equador, Kirzquistão, Lativia, Lituânia, México, Moldova, Nigéria, Nova Zelândia, Paquistão, Paraguai, Rússia, Senegal, Uganda, Ucrânia, Uruguai e Zimbábue (OLIVEIRA, 2012).

1.5. A APAC DE POUSO ALEGRE (MG)

Em Minas Gerais, a APAC foi instaurada a partir da lei nº 15.299 de 9 de agosto de 2004 que acrescentou o inciso VIII à lei nº 11. 404 de 25 de janeiro de 1994 que rege sobre as normas de execução penal no Estado. A partir de então, é autorizado o convênio entre as entidades de direito privado sem fins lucrativos para a administração de unidades prisionais destinadas ao cumprimento de pena privativa de liberdade. Atualmente são 33 unidades da APAC em funcionamento pelo Estado e outras 70 estão em processo de formação e implantação (MINAS GERAIS, 2013).

Entre as APACs em atuação no estado de Minas Gerais, a que servirá como objeto de estudo deste trabalho está inserida na cidade de Pouso Alegre, sul de Minas Gerais e atende toda sua comarca3. Com uma população de 140.223 habitantes, a cidade é a segunda

mais populosa da mesorregião do Sul e Sudoeste de Minas. Destaca-se também o seu Índice de Desenvolvimento Humano (IDH) 0,774 considerado alto. E em sua economia o setor de serviços e a indústria ganham destaque pela grande diversidade, fator que faz a cidade ter o terceiro maior Produto Interno Bruto (PIB) da região com o valor de R$ 3, 408 bilhões (IBGE, 2014).

Segundo dados institucionais, a APAC foi fundada na comarca de Pouso Alegre no ano de 2003. Entre 2004 e 2007, a instituição cooperou com a Polícia Civil, auxiliando-a na administração da casa do albergado. E já em 2008 iniciou a suas atividades como APAC, com gestão própria, e sem intervenção da polícia. A APAC-PA vem exercendo suas atividades em parceria com a Vara de Execuções Penais da Comarca de Pouso Alegre e pela Lei Municipal nº 4.262/2004 foi declarada de utilidade pública municipal. Atualmente, a APAC-PA conta com colaboradores e voluntários, trabalhando em sua sede denominada: Centro de Reintegração Social (CSR) Dr. Mário Ottoboni, que está inserida em um imóvel rural em Pouso Alegre, às margens da rodovia MG 290 (APAC, 2013).

Toda esta estrutura abriga, atualmente, 176 recuperandos, sendo 102 no regime fechado, 53 no regime semiaberto e 21 no regime aberto de condenação. Para a formação profissional destes recuperandos, existem oficinas profissionalizantes em diversas áreas:

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Sítio Escola (Agricultura), Serralheria, Cozinha, Funilaria e Pintura, Padaria e Confeitaria, Marcenaria e Torrefação de Café. Além de oficinas profissionalizantes, a estrutura também conta com escola regular, atendimento médico e psicológico e oficina de laborterapia para a elaboração de artesanatos diversos (APAC, 2013).

1.6. A EXPERIÊNCIA EM UM MÉTODO APAC

Durante os dias 21, 22, 23 e 24 de agosto de 2014 participamos da Jornada de Libertação com Cristo, realizada no Centro de Reintegração Social (CRS) Doutor Mário Ottoboni, sede da APAC de Pouso Alegre (MG). Um dos pilares do método ressocializador, a jornada é inspirada no Movimento de Cursilhos de Cristandade4 da Igreja Católica e

consiste em uma reflexão espiritual, moral e civil para os recuperandos do regime fechado. Pautamos nossa pesquisa de campo nos conceitos de Bourdieu (1997) com a intensão de evitar a violência simbólica entre pesquisador e pesquisado, sobretudo em um ambiente de dissimetria social como um ambiente carcerário. Munidos de caderno de campo e máquina fotográfica para alguns registros de imagens que fizemos da estrutura do local, nos preocupamos em deixar os recuperandos falarem.

Nosso ideal era dar voz também aos demais atores sociais envolvidos com a Jornada, como voluntários, funcionários da associação, representantes do poder público, familiares dos recuperandos e outros.

Nos aproximamos da pesquisa etnográfica para a realização deste trabalho, mas não nos apropriamos totalmente desta técnica de pesquisa por entendermos que a etnografia demanda uma pesquisa mais exaustiva, novas visitas e constantes contatos com o objeto de pesquisa (MARCONI; PRESOTTO, p. 6, 2001), fato que não pode ser feito com propriedade porque a Jornada acontece apenas uma vez por ano na unidade e por falta de voluntários disponíveis para compor a sua estrutura, a unidade teve um hiato de dois anos sem o evento.

A Jornada é composta por uma sequência de palestras durante os quatro dias e pudemos acompanhar todas elas junto com os recuperandos. Após as falas, nos dirigíamos com eles para as celas, onde os voluntários e os recuperandos discutiam sobre os temas abordados nas palestras. Durante esse momento nós acompanhávamos as falas e as expressões passadas por todos. Mas, pudemos perceber, durante as primeiras anotações, que nosso trabalho chamava mais a atenção deles do que os temas a serem debatidos, fato que nos fez modificar a nossa estratégia de pesquisa, deixando o caderno de campo de lado, e nos concentrando em observar o que acontecia para depois anotar o que era visto.

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Sem pormenores, a maioria dos recuperandos relatou o envolvimento com o tráfico de drogas, hora como usuário e hora como traficante, fato confirmado por Andrade (2014, p. 36) que traz que “86% dos detentos em Minas Gerais tem envolvimento com as questões das drogas”. Outro ponto a ser notado foi a alta percentagem de recuperandos mulatos ou negros. Dos 96 que fizeram a Jornada, cerca de 80% eram das etnias mencionadas anteriormente.

Muitos deles, relatam a diferença entre a penitenciária APAC e a penitenciária chamada “comum”, administrada pelo Estado.

- Aqui estamos no céu, mais que no paraíso...

Relatou-nos um dos recuperandos, comparando os dois presídios em que ele esteve recluso.

O juiz da vara de execuções penais da comarca de Pouso Alegre fez uma palestra durante a Jornada e uma das suas falas, mostrou que a diferença entre a APAC e o sistema prisional comum também é notada pelo magistrado:

- A APAC tem mais a oferecer do que o sistema prisional comum...

Entretanto, quando pudemos ter o contato com os voluntários, funcionários e demais membros envolvidos não pudemos notar que é claro para todos que o trabalho realizado pela APAC é de interesse público e que se caracteriza como política pública.

CONSIDERAÇÕES FINAIS

Salientar que o trabalho realizado por uma associação privada, mesmo que sem fins lucrativos, é público e não é tarefa fácil. Embora o problema a ser enfrentado pelo trabalho realizado pelas APACs seja público, há a distinção entre o trabalho feito pelas APACs dos demais presídios espalhados pelo Brasil. Aqui entende-se que a diferença de metodologias de ressocialização é de fato algo a ser diferenciado entre as APACs e a maioria dos presídios do país, que na atualidade, se encontram insalubres e incapacitados de operar nas égides da constituição federal e da lei de execução penal. Porém, despertar a consciência de que as políticas públicas na atual configuração do mundo globalizado demandam sinergia entre Estado, governo e sociedade e a cidadania participativa é um desafio a ser aceito para a construção de uma sociedade mais justa, igualitária e que transcenda o desenvolvimento para além dos conceitos tradicionais da economia, pautados no acúmulo de capital, que não resolveram os entraves da sociedade na contemporaneidade.

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NOTAS

1. No contexto capitalista, as obras “O Manifesto Comunista” e “O Capital” de Marx e Engels tecem críticas ao modelo de sociedade estruturada através das influências do capitalismo e seu modo de produção.

2. O condenado no sistema APAC é chamado de Recuperando. A partir daqui esta denominação será utilizada.

3. A Comarca de Pouso Alegre abrange as cidades de Congonhal, Estiva, Senador José Bento e os distritos de Pântano das Rosas e São José do Pântano.

4. Trata-se de um curso que envolve palestras, debates e orações. Originou-se na Espanha durante a Guerra Civil e na atualidade é realizado por todo o mundo.

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