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Sumário. Texto Integral. Supremo Tribunal de Justiça Processo nº 1710/10.0TTPNF.P1.S1

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Supremo Tribunal de Justiça

Processo nº 1710/10.0TTPNF.P1.S1 Relator: SAMPAIO GOMES

Sessão: 25 Janeiro 2012 Votação: UNANIMIDADE Meio Processual: REVISTA Decisão: NEGADA A REVISTA

COMPETÊNCIA INTERNACIONAL SEGURADORA

Sumário

Os tribunais portugueses são internacionalmente incompetentes para

conhecer do litígio em que um sinistrado português demanda companhia de seguros francesa pelos danos emergentes de acidente de trabalho ocorrido em Andorra não se aplicando o artigo 9.º nº1, alínea b) do Regulamento (CE) n.º

44/2001, do Conselho de 22 de Dezembro de 2001.

Texto Integral

Acordam no Supremo Tribunal de Justiça I )

1.

AA deduziu, em 2010-09-22 incidente de revisão da incapacidade, nos termos do Art.° 145.° do Cód. Proc. do Trabalho, contra BB, S.A., com sede em

França, pedindo que seja submetido a exame médico.

Alegou, para tanto e em síntese, que no dia 20 de Março de 2007, em Andorra, quando, sendo "plaquista" (tectos falsos) e auferindo a retribuição anual de € 1.695,00 por 14 meses, trabalhava sob as ordens, direcção e fiscalização da referida empregadora, cuja responsabilidade infortunística estava totalmente transferida para a mencionada seguradora, sofreu um acidente de trabalho que consistiu numa queda no gelo.

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Mais alegou que foi tratado pelos serviços clínicos da seguradora, que não lhe atribuiu qualquer incapacidade permanente parcial e que se agravaram as lesões resultantes do acidente, pelo que requer a revisão da sua incapacidade.

Efectuado o requerido exame, promoveu o Exm.° Procurador da República, junto do Tribunal a quo, que se declarasse a excepção dilatória da

incompetência internacional do Tribunal do Trabalho de Penafiel com

fundamento em que o acidente ocorreu em Andorra e a empregadora tem a sua sede neste país.

O sinistrado pronunciou-se de seguida, em sentido oposto, entendendo que o Tribunal a quo é competente em razão da nacionalidade e da matéria.

Proferida decisão, o Tribunal julgou procedente a excepção da sua incompetência em razão da nacionalidade e determinou a absolvição da instância da entidade responsável do acidente.

Inconformado com o assim decidido, o sinistrado interpôs recurso para o Tribunal da Relação do Porto, tendo este negado provimento à apelação, e assim declarando os tribunais portugueses incompetentes em razão da nacionalidade e absolvendo da instância a entidade responsável do acidente de trabalho dos autos.

2.

De novo inconformado, o Autor recorreu para este Supremo Tribunal de Justiça e, alegando, formulou as seguintes conclusões:

1. Apesar do expendido no douto acórdão proferido pelos Venerandos Juízes Desembargadores do Tribunal da Relação do Porto, o aqui Recorrente continua a entender que os tribunais portugueses (no caso concreto, o

Tribunal do Trabalho de Penafiel) possuem competência em razão da nacionalidade, para conhecer do objecto da presente acção, isto é, para

conhecer do Incidente de Revisão de Incapacidade (na sequência de acidente de trabalho) intentado pelo aqui Recorrente enquanto Segurado contra a Companhia de Seguros BB, S.A., enquanto Entidade Responsável pelo Sinistro ocorrido com o Recorrente. Senão vejamos:

2. O Recorrente requereu a revisão da sua incapacidade, interpondo o respectivo incidente no Tribunal do Trabalho de Penafiel, na sequência de um agravamento de lesões resultantes de um acidente ocorrido em Andorra, a 20

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ordens, direcção e fiscalização da sua Entidade Patronal CC, S.L., com sede em Andorra, e cuja responsabilidade civil por acidentes de trabalho estava transferida para a Companhia de Seguros BB, S.A., com sede em França, sofreu um acidente de trabalho que consistiu numa queda no gelo.

Assim,

3. É um facto que, o litígio em causa nos presentes autos, assenta numa relação jurídica plurilocalizada: O Recorrente/Sinistrado tem domicílio em Portugal; a Entidade Patronal para a qual prestava o seu trabalho aquando do acidente de trabalho, tem sede em Andorra; o sinistro ocorreu em Andorra, e por fim; a Companhia de Seguros BB, S.A. tem a sua sede em França.

4. Relativamente à competência internacional dos tribunais

portugueses para conhecer deste tipo de acções, dispõe o Artigo 10.° do

Código de Processo do Trabalho (de 2010) que: "Na competência internacional dos tribunais do trabalho estão incluídos os casos em que a acção pode ser proposta em Portugal, segundo as regras de competência territorial

estabelecidas neste Código, ou de terem sido praticados em território

português, no todo ou em parte, os factos que integram a causa de pedir na acção."

5. Por outro lado, dispõe o Artigo 15.° do Código de Processo do Trabalho (de 2010):

"2. Se o acidente ocorrer no estrangeiro, a acção deve ser proposta em Portugal, no tribunal do domicílio do sinistrado.

(...)

4. E também competente o tribunal do domicílio do sinistrado, doente ou beneficiário se a participação aí for apresentada ou se ele o requerer até à fase contenciosa do processo."

No entanto,

6. Com a entrada em vigor para Portugal, do Regulamento (CE) n.°

44/2001 do Conselho, de 22/12/2000, e por força da aplicação do seu Artigo 3.

°, n.°2, Anexo I ("Contra elas não podem ser invocadas, nomeadamente, as regras de competência nacionais constantes do Anexo I. Anexo I - Regras de competência nacionais referidas no n. °2 do artigo 3.°... -em Portugal; os artigos 65. ° e 65. °-A do Código de Processo Civil e o artigo 11° do Código de Processo do Trabalho"), ficam desde logo afastadas as regras de competência

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territorial das normas dos Artigos 10.° e 15.° do Código de Processo do Trabalho.

7. Cabe ponderar e analisar se, à luz das regras do Regulamento n.°

44/2011, do Conselho, de 22/12/2000, são os tribunais portugueses

competentes em razão da nacionalidade, para conhecer deste incidente de revisão de incapacidade intentado pelo Recorrente.

8. Entenderam os Venerandos Juízes Desembargadores que, no caso em apreço, prevalecem apenas dois factores de conexão:

- o forum rei, isto é, o foro da Seguradora, o qual se situa em França, presente no Artigo 2.° do Regulamento e que dispõe o seguinte: "Sem prejuízo do

disposto no presente regulamento, as pessoas domiciliadas no território de um Estado-Membro devem ser demandadas, independentemente da sua

nacionalidade, perante os tribunais desse Estado ";

- o forum delicti o qual se situa em Andorra, presente no Artigo 5.°, n.° 3 do Regulamento n.°44/2001 do Conselho, o qual refere que: "Uma pessoa com domicílio no território de um Estado-Membro pode ser demandada noutro Estado-Membro, em matéria extracontratual, perante o tribunal do lugar onde ocorreu ou poderá ocorrer o facto danoso ".

8. Muito embora reconhecendo que o objecto da presente acção é um Incidente de Revisão de Incapacidade (na sequência de acidente de trabalho) intentado pelo Recorrente enquanto Segurado, contra a Companhia de

Seguros BB, S.A., enquanto Entidade Responsável pelo Sinistro ocorrido com o Recorrente, entenderam os Venerandos Juízes Desembargadores que não

estamos perante matéria relacionada com seguros, pelo que concluem pela não aplicação ao caso concreto da norma do Artigo 9.°, n.°l, alínea b) do Regulamento n.°44/2011 do Conselho que dispõe: "O segurador domiciliado no território de um estado-membro pode ser demandado: (...) b) noutro Estado-Membro, em caso de acções intentadas pelo tomador do seguro, o segurado ou um beneficiário, perante o tribunal do lugar em que o requerente tiver o seu domicilio".

9. No entanto, entende o aqui Recorrente que os Venerandos Juízes Desembargadores, não fizeram uma correcta e completa subsunção do Regulamento (CE) n.°44/2001, de 22 de Dezembro, ao caso que aqui se encontra em discussão, olvidando desde logo factores de conexão de

competência dos tribunais que no caso em concreto têm aplicação, sendo que

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10. O Recorrente continua a entender que os tribunais portugueses são competentes em razão da nacionalidade para conhecer do referido incidente de revisão de incapacidade.

11. Desde logo, no que diz respeito à tese defendida pelos Venerandos Juízes Desembargadores, quanto à aplicação ao caso concreto, da disposição geral (forum rei) - Artigo 2.° do Regulamento, não vislumbra o Recorrente da necessidade de aplicação desta norma, quando há lugar à aplicação de regras especiais de competência, como entende o Recorrente ser o caso e que vai passar a expor:

12. O que aqui se encontra em discussão é única e simplesmente um incidente de revisão de incapacidade na sequência de acidente de trabalho, o qual foi intentado pelo Recorrente contra uma Companhia de Seguros, no caso concreto, a Companhia de Seguros BB, S.A., dado que a Entidade Patronal do aqui Recorrente para ela havia transferido a sua responsabilidade civil por acidentes de trabalho dos seus trabalhadores, entre os quais se encontrava o Recorrente, através da celebração de um contrato de seguro para o efeito.

13. É precisamente com base na existência deste contrato de seguro de responsabilidade civil por acidentes de trabalho, o qual foi accionado pelo Recorrente por ocorrência de sinistro laboral e consequente agravamento das lesões por ele sofridas, que o Recorrente intentou o mencionado incidente de revisão de incapacidade contra a Companhia de Seguros BB, S.A..

14. A este respeito, refere o Artigo 9.°, n.°l, alínea b) da Secção 3 (Competência em matéria de seguros) do Regulamento n.°44/2001 do Conselho, o seguinte:

"Artigo 9.°

2. O segurador domiciliado no território de um Estado-Membro pode ser demandado:

(...)

b) Noutro Estado-Membro, em caso de acções intentadas pelo tomador de seguro, o segurado ou um beneficiário, perante o tribunal do lugar em que o requerente tiver o seu domicílio (...)

15. Tendo em consideração o que ficou dito, e à luz do disposto no Artigo 9.°, n.°l, alínea b) do Regulamento n.°44/2001 do Conselho, não parecem

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restar quaisquer dúvidas de que o factor de conexão previsto nesta norma tem pleno cabimento no caso concreto, sendo por essa razão, os tribunais

portugueses competentes para conhecer do incidente de revisão de

incapacidade interposto pelo Recorrente no Tribunal do Trabalho de Penafiel.

16. A Companhia de Seguros BB, S.A., tal como já se referiu, tem sede em França, Estado-Membro da União Europeia, pelo que

17. A referida Companhia de Seguros pode ser accionada pelo

beneficiário do seguro (o aqui Recorrente) perante o tribunal do lugar em que o Requerente tenha o seu domicílio, neste caso, o Tribunal do Trabalho de Penafiel.

18. Veja-se a este respeito o Acórdão do STJ de 28-10-2009 (Processo n.°

1067/07.6TBBNV.Ll.Sl), cujo sumário refere o seguinte:

"I — Os tribunais portugueses são internacionalmente competentes para conhecer do litígio e que uma empresa portuguesa demanda companhia de seguros francesa, pelos danos emergentes de acidente de viação ocorrido em França com veículo segurado nesta última, conforme resulta do disposto nos arts. 9.°, n.°l, al.b) do Regulamento (CE) n.°44/2011, do Conselho, de

22-12-2000 (...)".

19. Veja-se igualmente a este propósito o Acórdão do Tribunal de Justiça (Segunda Secção), de 13 de Dezembro de 2007 (Processo C-436/06). Acresce que,

20. O décimo terceiro considerando do Regulamento n.°44/2001, refere que, em matéria de contratos de seguro, o Regulamento visa garantir uma protecção mais favorável à parte mais fraca do que a permitida pelas regras gerais de competência, pelo que

21. Negar ao Recorrente, vítima do acidente de trabalho, o direito de agir judicialmente no tribunal do lugar do seu próprio domicílio, seria privá-lo da protecção conferida pelo Regulamento n.°44/2001 às partes consideradas fracas nos litígios em matéria de seguros.

22. Mesmo que se possa defender a tese de que existem outros factores de conexão para além do acabado de referir, nomeadamente o constante do Artigo 5.°, n.°3 do Regulamento -forum delicti, também defendido pelos Venerandos Juízes Desembargadores.

(7)

23. E que a presente acção poderá ser da competência exclusiva de vários tribunais.

24. Sempre o aqui Recorrente poderia optar livremente por qualquer um desses tribunais o que fez, optando pelo Tribunal do Trabalho de Penafiel.

25. O que, de resto, se pode concluir pelo disposto no Artigo 29.°do Regulamento (CE) n.°44/2001, de 22 de Dezembro, que refere:

"Artigo 29.° Sempre que as acções forem da competência exclusiva de vários tribunais, qualquer tribunal a que a acção tenha sido submetida

posteriormente deve declarar-se incompetente em favor daquele a que a acção tenha sido submetida em primeiro lugar".

26. Tendo em consideração o que supra se expôs, está o Tribunal do Trabalho de Penafiel em condições de, especificamente, quer quanto à

competência internacional, quer quanto à competência especializada, julgar o presente incidente de revisão de incapacidade do aqui Recorrente.

Pelo que,

27. Não subsiste qualquer fundamento jurídico-legal para julgar os tribunais portugueses incompetentes em razão da nacionalidade, no caso concreto o Tribunal do Trabalho de Penafiel, para conhecer do presente incidente de revisão de incapacidade.

Termina protestando a revogação do Acórdão da Relação e a competência dos tribunais portugueses.

Não foram apresentadas contra-alegações

Não foi produzido parecer pelo MºPº junto deste Supremo Tribunal,

porquanto, enquanto parte acessória, apresentou resposta à motivação do recurso interposto na 1ª Instância.

3.

Sabido que o objecto do recurso é delimitado pelas respectivas conclusões, ressalvadas as questões de conhecimento oficioso (arts. 684º, nº 3 e 690º nº 1 do Código de Processo Civil), daí resulta ser apenas uma a questão suscitada e a apreciar:

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- saber se os tribunais do trabalho portugueses são ou não competentes, em razão das regras de competência internacional, para conhecer do pedido deduzido na presente acção.

Corridos os «vistos», há que decidir.

I I ) Fundamentação

1. De facto

É a seguinte a factualidade relevante para apreciação:

1. No dia 20 de Março de 2007, em Andorra, quando, sendo "plaquista"

(tectos falsos) e auferindo a retribuição anual de € 1.695,00 por 14 meses, o A./recorrente sofreu um acidente de trabalho que consistiu numa queda no gelo;

2. Nesse momento trabalhava sob as ordens, direcção e fiscalização da referida empregadora, CC, S.L, com sede em Andorra;

3. Esta tinha a responsabilidade infortunística por acidentes de trabalho transferida para a seguradora, BB, S.A., com sede em França;

4. Foi tratado pelos serviços clínicos da seguradora, que não lhe atribuiu qualquer incapacidade permanente parcial, tendo o A. requerido a revisão da sua incapacidade;

6. Para tal, deduziu no Tribunal Judicial de Penafiel, em 2010-09-22, incidente de revisão da incapacidade, nos termos do Art.° 145.° do Cód. Proc. do

Trabalho, contra BB, S.A., com sede em França, pedindo que seja submetido a exame médico.

2. De Direito

Importa definir se os tribunais portugueses são ou não competentes em razão da nacionalidade para conhecer o litígio objecto dos autos.

A questão surge porquanto o sinistrado tem domicílio em Portugal, a

empregadora tem sede em Andorra, a seguradora tem sede em França e o acidente ocorreu em Andorra.

(9)

O Recorrente entende que os tribunais portugueses são competentes em razão da nacionalidade para conhecer do referido incidente de revisão de

incapacidade.

As instâncias tiveram posições convergentes, no sentido de considerarem os tribunais portugueses incompetentes em razão da nacionalidade.

Em 22 de Setembro de 2010, data de instauração do processo em apreço, pedido de revisão de incapacidade nos termos do art.º 145º do CPT, vigorava já o Código de Processo do Trabalho, aprovado pelo Decreto-Lei n.º 295/2009, de 13 de Outubro, sendo que, nos termos do n.º 1 do artigo 24.º da Lei n.º 3/99 de 13 de Janeiro, que aprovou a Lei de Organização e Funcionamento dos Tribunais Judiciais, “[a] competência fixa-se no momento em que a acção se propõe, sendo irrelevantes as modificações de facto que ocorram

posteriormente”.

No tocante às regras em matéria de competência internacional, mantêm-se as modificações introduzidas pelo anterior CPT (aprovado pelo Decreto-Lei n.º 480/99), que visaram, conforme decorre do respectivo preâmbulo, “a

adaptação das normas do Código de Processo do Trabalho às regras

dimanadas de diversos instrumentos de direito internacional vinculantes para o Estado Português, designadamente ao nível da União Europeia, mantendo- se, no entanto, o princípio básico de definição dessa competência segundo as regras da competência territorial no próprio Código estabelecidas” e pelo presente CPT (2010) a competência internacional (como decorre do respectivo preâmbulo) é alargada “às situações de destacamento de trabalhadores para outros Estados regulada no CT, entendendo-se adequado proceder,

simultaneamente, à transferência, para o processo laboral e com as

necessárias adaptações, das normas de competência internacional relativas a conselhos de empresa europeus e a procedimentos de informação e consulta em que exista uma conexão relevante com o território nacional”.

E, em conformidade, determina-se no nº 1 do artigo 10.º do actual CPT, que

“[n]a competência internacional dos tribunais do trabalho estão incluídos os casos em que a acção pode ser proposta em Portugal, segundo as regras de competência territorial estabelecidas neste Código, ou de terem sido

praticados em território português, no todo ou em parte, os factos que integram a causa de pedir na acção”.

Por sua vez o artigo 15.º rege sobre as acções emergentes de acidentes de trabalho e de doença profissional.

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Conforme constituem doutrina e jurisprudência pacíficas, a competência do tribunal é apreciada em função dos termos em que a acção é proposta,

determinando-se pela forma como o autor estrutura o pedido e os respectivos fundamentos, independentemente da apreciação da questão substancial.

No caso em apreço, a pretensão do recorrente consubstancia-se no pedido de revisão da incapacidade decorrente da verificação de um acidente de trabalho e funda-se em normas que prevêem a reparação das consequências

infortunísticas dele resultantes, recaindo a responsabilidade sobre a empregadora e a seguradora, para quem aquela tivesse transferido a respectiva responsabilidade.

Ora, atendendo apenas ao regime que emerge do direito processual interno, os tribunais do trabalho portugueses seriam internacionalmente competentes para a resolução do litígio, na medida em que se verifica o principal factor de atribuição da competência internacional: o da coincidência entre esta e a competência territorial interna (artigos 10.º e 15.º, n.º 2, do Código de Processo do Trabalho).

Na verdade, tendo o alegado acidente ocorrido no estrangeiro e situando-se o domicílio do sinistrado na área de jurisdição do Tribunal do Trabalho de

Penafiel, este teria competência territorial para a apreciação do litígio face ao disposto no n.º 2 do artigo 15.º do Código de Processo do Trabalho, o que, só por si, conferia competência internacional aos tribunais do trabalho

portugueses (artigo 10.º citado).

Porém, o pedido em causa, dirigido à ré seguradora, inscreve-se no âmbito temporal, material e espacial de aplicação do Regulamento (CE) n.º 44/2001 do Conselho, de 22 de Dezembro de 200, relativo à competência judiciária, ao reconhecimento e à execução de decisões em matéria civil e comercial (Jornal Oficial, n.º L 12, de 16.1.2001, com a última redacção dada pelo Regulamento (CE) n.º 2245/2004 da Comissão, de 27.12.2004, Jornal Oficial, n.º L 381, de 28.12.2004) que, nos termos do n.º 1 do seu artigo 68.º, substituiu entre os Estados-Membros da Comunidade Europeia, excepto nas relações com a Dinamarca (artigo 1.º, n.º 3), a denominada Convenção de Bruxelas

igualmente relativa à competência judiciária e à execução de decisões em matéria civil e comercial, e que se aplica na nossa ordem interna, por força do disposto no n.º 4 do artigo 8.º da Constituição.

É, assim, aplicável o Regulamento referido ao caso concreto.

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Na verdade, a efectivação da responsabilidade pela reparação dos danos emergentes de acidentes de trabalho não foi expressamente excluída do âmbito de aplicação do Regulamento, e configura-se como um litígio entre particulares fundado em regras de Direito privado, especificamente, do

domínio da responsabilidade civil (vide Pedro Romano Martinez, in Direito do Trabalho, Coimbra, 2002, p. 735)..

Ora, deduzindo-se, no caso presente, uma pretensão que tem como escopo final a reparação de danos emergentes de alegado acidente de trabalho contra uma ré domiciliada num Estado-Membro da Comunidade Europeia vinculado pelo Regulamento, está submetida à disciplina deste acto comunitário, não lhe sendo aplicáveis os artigos 10.º e 15.º, n.º 2, do Código de Processo do

Trabalho.

Mas a questão a apreciar, no caso sub judice, coloca-se,

precisamente, pela introdução, no Regulamento n.º 44/2001, de uma norma relativa a “Competência em matéria de seguros”.

A este respeito, refere o Artigo 9.°, n.°l, alínea b) da Secção 3 (Competência em matéria de seguros) do Regulamento n.°44/2001 do Conselho, o seguinte:

"Artigo 9.°

2. O segurador domiciliado no território de um Estado-Membro pode ser demandado:

(...)

b) Noutro Estado-Membro, em caso de acções intentadas pelo tomador de seguro, o segurado ou um beneficiário, perante o tribunal do lugar em que o requerente tiver o seu domicílio (...)”.

É nesta norma que o recorrente alicerça o seu entendimento, no

sentido de que o tribunal português, neste caso o da área da sua residência, é competente para a apreciação da sua pretensão, já que o pedido é formulado contra a seguradora.

Ajuizando, o acórdão recorrido ancorou a declaração da incompetência internacional dos tribunais portugueses, essencialmente, nas seguintes razões:

“ […] Em 1992-07-01 entrou em vigor, para Portugal, quer a

Convenção Relativa à Competência Judiciária e à Execução de Decisões

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em Matéria Civil e Comercial, concluída em Lugano, em 1988-09-16, quer a Convenção Relativa à Adesão do Reino de Espanha e da

República Portuguesa à Convenção Relativa à Competência Judiciária e à Execução de Decisões em Matéria Civil e Comercial.

Porém, a partir de 2002-03-01, tais instrumentos encontram-se

substituídos, entre os Estados-‑Membros, pelo Regulamento (CE) N.°

44/2001 do Conselho, de 2000-12-22, relativo à competência judiciária, ao reconhecimento e à execução de decisões em matéria civil e

comercial, que dispõe, na parte que ora interessa considerar, o seguinte:

Artigo 1º. 1. O presente regulamento aplica-se em matéria civil e

comercial e independentemente da natureza da jurisdição. O presente regulamento não abrange, nomeadamente, as matérias fiscais,

aduaneiras e administrativas.

Artigo 2º . 1. Sem prejuízo do disposto no presente regulamento, as pessoas domiciliadas no território de um Estado-Membro devem ser demandadas, independentemente da sua nacionalidade, perante os tribunais desse Estado.

Artigo 3º .

1. As pessoas domiciliadas no território de um Estado-Membro só podem ser demandadas perante os tribunais de um outro Estado- Membro por força das regras enunciadas nas secções 2 a 7 do presente capítulo.

2. Contra elas não podem ser invocadas, nomeadamente, as regras de competência nacionais constantes do anexo I.

Anexo I - Regras de competência nacionais referidas no n.° 2 do artigo 3.° — em Portugal: os artigos 65.° e 65.°-A do Código de Processo Civil e o artigo 11.° do Código de Processo do Trabalho".

Artigo 5.° O requerido com domicílio no território de um Estado- Membro pode ser demandado num outro Estado-Membro:

3. Em matéria extracontratual, perante o tribunal do lugar onde ocorreu o facto danoso.

(13)

Ora, do transcrito Art.º 3.° e Anexo I resulta que fica afastada a

disposição constante do Art.° 10.° do Cód. Proc. do Trabalho [de 2010], que estabelece:

1. Na competência internacional dos tribunais do trabalho estão incluídos os casos em que a acção pode ser proposta em Portugal,

segundo as regras de competência territorial estabelecidas neste Código, ou de terem sido praticados em território português, no todo ou em parte, os factos que integram a causa de pedir da acção.

Por seu turno, dispõe o mesmo Cód. Proc. do Trabalho [de 2010], no seu Art.° 15.°:

2. Se o acidente ocorrer no estrangeiro, a acção deve ser proposta em Portugal, no tribunal do domicílio do sinistrado.

4. É também competente o tribunal do domicilio do sinistrado, doente ou beneficiário se ele o requerer até à fase contenciosa do processo ou se aí tiver apresentado a participação.

Ora, in casu, tendo sido usado o foro do domicílio do sinistrado, em aplicação destas regras de competência territorial, as quais estão suportadas por aquela no plano da competência internacional dos tribunais portugueses, parece que o seu procedimento foi conforme a lei. No entanto, estando o Regulamento, então, em vigor, para

Portugal, as normas do Cód. Proc. do Trabalho, porque em conflito com as daquele, não podem ser aplicadas.

Assim, atento o Art.° 2.° do Regulamento, prevalece o foro da R., da seguradora, que é em França ou até o forum delicti, que é em Andorra nos termos do Art.° 5.°, n.° 3 do mesmo diploma, assim afastando a competência internacional do tribunal do trabalho português. Na verdade, qualquer uma das conexões não conduz à competência internacional dos tribunais portugueses.

Verifica-se, destarte, a incompetência do tribunal em razão da

nacionalidade, o que determina a incompetência absoluta do mesmo e integra excepção dilatória, a implicar a absolvição da instância da

seguradora, atento o disposto nos Art.°s 101.°, 102.°, n.° 1, 105.°, n.° 1, 288.°, n.° 1, alínea a), 494.°, alínea a) e 495.° do Cód. Proc. Civil.

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Nem se diga, como o apelante, na conclusão 17ª do recurso que "17.

... há lugar à aplicação do factor de conexão previsto no Artigo 9.° nº1, al. b), Secção 3 (Competência em Matéria de Seguros) do regulamento (CE) n.° 44/2001, de 22 de Dezembro, refere o seguinte:

"O segurador domiciliado no território de um estado-membro pode ser demandado: (...)

b) noutro Estado-Membro, em caso de acções intentadas pelo tomador do seguro, o segurado ou um beneficiário, perante o tribunal do lugar em que o requerente tiver o seu domicilio.

Na verdade, pretendendo o sinistrado efectivar a revisão da sua

incapacidade por acidente de trabalho contra a seguradora para a qual se encontra transferida a responsabilidade infortunística da

empregadora, certo é que nenhum litígio existe quanto ao contrato de seguro. Pois, como se vê do relatório que antecede, a seguradora

assumiu a sua responsabilidade, tendo tratado o sinistrado, pelo que a única responsabilidade aqui em causa é a derivada do acidente de trabalho. Daí que a matéria em discussão não seja de seguros, mas infortunístico-laboral, não sendo aplicável, por isso, a norma do invocado Art.° 9.°, n. 1, alínea b) do Regulamento referido.

Também não se vê que deva ser aplicado o disposto no Art.° 29.° do Regulamento (CE) n.° 44/2001, como o apelante também pretende.

Vejamos o que ele dispõe:

“Sempre que as acções forem da competência exclusiva de vários tribunais, qualquer tribunal a que a acção tenha sido submetida

posteriormente deve declarar-se incompetente em favor daquele a que a acção tenha sido submetida em primeiro lugar."

Ora, pretende o sinistrado que o tribunal português também é competente, juntamente com outro ou outros pelo que, tendo o processo sido intentado primeiramente em Portugal, estava

determinada a competência internacional dos tribunais portugueses.

Não podemos concordar.

Por força do Regulamento, a competência internacional radicou-se nos tribunais franceses ou, eventualmente, de Andorra, respectivamente,

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tribunais portugueses, pelo que a pretensão do apelante, também por este lado, deverá soçobrar. Aliás, o sinistrado nem sequer alega que o processo tenha sido intentado, ou não, perante tribunal de outro país.

Em síntese, a decisão recorrida deve ser confirmada, embora seja de corrigir que a incompetência dos tribunais portugueses é em razão da nacionalidade e, não, em razão do território”.

Sufraga-se, inteiramente, o expendido no acórdão da Relação, concluindo-se pela incompetência do tribunal em razão da nacionalidade, o que determina a incompetência absoluta do mesmo.

Importa dizer que a doutrina vertida nos Acórdãos deste STJ citados nas conclusões do recurso (18ª e 19ª) não tem aplicação no caso concreto.

Na verdade, a situação ali apreciada dizia respeito a responsabilidade civil decorrente de acidente de viação ocorrido em França e em que intervinha condutor português.

Neste caso, face aos fundamentos da acção e ao pedido, os direitos que o recorrente pretende fazer valer decorrem de um acidente de trabalho e fundam-se em normas que prevêem a reparação das consequências infortunísticas dele resultantes, recaindo a responsabilidade sobre o empregador ou sobre a seguradora, para quem haja sido transferida a respectiva responsabilidade.

E acresce que tal pretensão pressupõe uma relação de trabalho, tendo a

empregadora sede em Andorra, ocorrendo o sinistro em Andorra, e tendo sede em França a Companhia de Seguros BB, S.A..

Aqui, a causa de pedir é específica, e assentando o litígio em causa numa relação jurídica plurilocalizada, há outros ordenamentos jurídicos a ter em conta e que, no caso concreto, assumem, do ponto de vista substancial, uma natureza e dimensão diferentes.

Importa ainda referir que também não colhe a invocação que o recorrente faz nas suas conclusões relativas ao artº 29º do Regulamento citado, assim como também não funciona aqui a chamada extensão de competência a que se refere o artº 24º do mesmo Regulamento.

Dizem aquelas normas:

“Artigo 24º

(16)

Para além dos casos em que a competência resulte de outras disposições do presente regulamento, é competente o tribunal de um Estado-Membro perante o qual o requerido compareça.

Artigo 29º

Sempre que as acções forem da competência exclusiva de vários tribunais, qualquer tribunal a que a acção tenha sido submetida posteriormente deve declarar-se incompetente em favor daquele a que a acção tenha sido

submetida em primeiro lugar”.

Como é bom de ver, não só não está demonstrado que o processo tenha sido intentado perante tribunal de outro país, nem sequer tal vem alegado (artº 29º), como não se demonstra que noutro tribunal tenha a requerida

(Seguradora) comparecido (artº 24º) de forma a poder falar-se em extensão de competência a que se referem aqueles normativos.

Improcedem, assim, as conclusões do recurso.

I I I )

Nos termos expostos, nega-se a revista.

Custas pelo recorrente, sem prejuízo do apoio judiciário concedido.

Lisboa, 25 de Janeiro de 2012 Sampaio Gomes (Relator) Pereira Rodrigues

Pinto Hespanhol

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