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Rev. latinoam. psicopatol. fundam. vol.15 número3

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Rev. Latinoam. Psicopat. Fund., São Paulo, v. 15, n. 3, p. 615-617, setembro 2012

Cientistas e feiticeiros: uma abordagem crítica da psiquiatria atual

Claudio Lyra Bastos Rio de Janeiro: Revinter, 2012, 308 págs.

Entre a ciência e a feitiçaria

Luiz Carlos Marques

O que seria o charlatanismo? E a feitiçaria? O que é doença? Questões como essas se tornam cada vez mais presentes numa época em que certas formas das chama-das “medicinas alternativas” chegam a receber status de prática oficial na saúde pública.

O título curioso do livro atrai a atenção para um tex-to em que se compara a visão fragmentada da psiquia-tria atual com a produção gráfica de esquizofrênicos, como Bispo do Rosário, ou o pregador americano Howard Finster. Sua ideia central é a de que a nossa in-capacidade de pensar o todo em diversos níveis de cau-salidade nos impede de escapar das eternas dicotomias e dos apelos maniqueístas.

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R E V I S T A L A T I N O A M E R I C A N A D E P S I C O P A T O L O G I A F U N D A M E N T A L

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conhecimento tem dessa prática. Paradoxalmente, em todas essas áreas do sa-ber, é exatamente dos psiquiatras que surgem os elementos paradigmáticos, os caminhos e as figuras de destaque na produção de conhecimento e de maior re-percussão na sua expressão pública. Da mesma forma, nenhuma outra especia-lidade ou profissão jamais conseguiu atender integral e explicitamente às demandas pessoais, familiares e sociais dos pacientes. São contradições notáveis, às quais não se pode deixar de prestar atenção e tentar compreender.

O autor dedica-se à tarefa de expor essas contradições por meio de um en-foque, por assim dizer, antropológico, na medida em que as busca nos elemen-tos da cultura. Usa também os seus trinta anos de atividade clínica e forense diária para fundamentar uma crítica que não vem do gabinete, mas da prática real.

Mesmo voltado para o âmbito psiquiátrico e universitário em geral, o texto pode ser entendido, sem maiores dificuldades, por qualquer leitor culto que te-nha o seu interesse despertado pelo tema. A clareza de expressão, a ausência de jargões e a intenção do autor em definir objetivamente todo trecho mais comple-xo torna simples a tarefa do leitor. Assim são enfocadas as três vertentes bási-cas da psiquiatria: a biológica, a psicológica e a social.

A falta da perspectiva fenomenológica teve como consequência inevitável a absorção da psicopatologia pelas ideologias específicas de cada momento ou lo-cal. Desta forma surgiram o biologismo, o psicanalismo, o sociologismo etc. Destaca que até mesmo a chamada etnopsiquiatria, cuja proposta era essencial-mente crítica, tornou-se ela própria um baluarte do relativismo exacerbado, es-tritamente acadêmico e desvinculado da realidade prática. As querelas entre as facções baseiam-se, na verdade, em falsas questões, disputas artificiais pouco mais que retóricas, uma vez que seus sectários só discutem mesmo entre si, num campo anteriormente definido e controlado.

Sustenta que a ideia de transdisciplinaridade, conceituada por Piaget em meados do século passado, jamais foi realmente levada a sério, nem na clínica nem na academia. Permaneceu um termo retórico e desprovido de significado prático, que é usado quando se levantam temas como complexidade e redes cau-sais. Tornou-se pouco mais que um bordão, reiterado periodicamente. Meio sé-culo se passou e as disciplinas continuam sem dialogar entre si. Em 1925, Abraham Flexner, o criador do moderno ensino médico acadêmico americano, já se queixava da ausência de uma formação mais adequada dos estudantes. De for-ma inversa ao publish or perish atual, ele prescrevia: “Think much, publish little”. A burocratização da academia hoje em dia criou um frenesi publicatório que bem poderia ser descrito invertendo o conselho de Flexner: Publish much, think little. A antiguidade e a perenidade da psiquiatria, desde a praticada pelos sacer-dotes hindus ou egípcios há dezenas de séculos – utilizando psicofármacos e psi-coterapia – até a dos dias de hoje, é o ponto de partida. Nenhuma alternativa jamais

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vai substituir a visão integrada que a sua prática exige. Se a multiplicidade ideo-lógica a torna fragmentária, ela se reconstrói diariamente na sua ação. Tornar a psiquiatria mais coerente a partir da sua prática é o leitmotiv do texto.

LUIZ CARLOS MARQUES

Psiquiatra, atendo no Hospital Universitário Antonio Pedro e em sua clínica particular (Institu-to Fluminense de Saúde Mental.

Rua Guilherme Briggs, 51 – São Domingos 24210-175 Niterói, RJ

e-mail: luizcarlmarq@uol.com.br

Rev. Latinoam. Psicopat. Fund., São Paulo, v. 15, n. 3, p. 615-617, setembro 2012 RESENHA

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