Sistema Financeiro Internacional:
de Bre3on Woods ao Não-
Sistema
Prof. Dr. Diego Araujo Azzi 2017.2
A crise de 2008
• Contexto 1996-2006: rela=va prosperidade nos
EUA
– Imprudente expansão do crédito imobiliário
– Desenvolvimento de um mercado subprime
– Emprés=mos ninja: “no income, no job, no
assets”
• Critérios prudenciais mínimos ou nulos
Contexto de Inovações financeiras liberalizantes
Direct Financing (figura do homebroker classe
média, cartões crédito)
Structured Investment Vehicles –
“empacotamento de Qtulos”
“Originate and Distribute” (risks; entailed risks)
Shadow Banking – altos riscos; pouca
supervisão; desintermediação bancária
• 6 explicações sobre a crise (Y. Varoufakis)
1. incompreensão sobre a cadeia de riscos do sistema como um todo
2. captura regulatória 3. cobiça irreprimível 4. origens culturais 5. teoria tóxica
6. falha sistêmica
1. incompreensão sobre a cadeia de riscos do sistema como um todo – tail risks
• dívida do setor financeiro = 117% do PIB em 2008
• dívida agregada EUA = 350% do PIB em 2008
• Retórica matemá=ca e falsa crença de que a inovação financeira havia eliminado os riscos (correlação não é causalidade)
• Emprés=mos eram gerados, fa=ados, empacotados e distribuídos pelo mundo
• Nenhum agente teria que encarar sozinho o risco de prejuízo caso devedores falissem
• Gerentes de risco dos bancos não fizeram o seu trabalho
2. Captura regulatória
• Papel central das agências de classificação de risco e autoridades regulatórias do governo, que deveriam ser imparciais e incorrupQveis
• CDOs classificados como triplo A pelas agências = Qtulos do Tesouro dos EUA
• Poderiam ser contabilizados como moeda fiduciária pelos bancos, mul=plicando os lucros
• Liberdade de usar depósitos dos clientes para
comprar CDOs triplo A e ainda assim con=nuar a fazer emprés=mos a outros bancos e clientes
2. Captura regulatória
• CDOs eram instrumentos para burlar as normas que deveriam salvar os bancos deles mesmos
• CDOs foram usados como garan=a a emprés=mos dos bancos junto ao FED e outros bancos centrais. Bancos lucravam com o spread das taxas de juros
• Agências de classificação de risco eram pagas pelos próprios bancos e davam nota triplo A aos CDOs.
• Essas classificações eram tomadas como legí=mas e corretas pela autoridade regulatória (e pelo FED)
2. Captura regulatória
• Portas giratórias (revolving doors)
– jovens que estavam nas agências regulatórias do setor público passam a cobiçar carreiras nos bancos de
inves=mento e agências de classificação
– seus supervisores (secretários do tesouro e ministros de finanças) ou eram ex-execu=vos dessas ins=tuições privadas, ou desejavam “entrar para o clube” quando deixassem o setor público
– contexto geral de cumplicidade que não favorecia alertas quanto aos riscos envolvidos
3. Cobiça irreprimível
• Progressiva liberalização do setor financeiro a par=r dos anos 1970
• Discurso neoliberal de que a natureza humana é
gananciosa. A culpa pela crise é da natureza humana (de todos os humanos) (A. Greenspan)
• Portanto, as crises não podem ser evitadas e são um mal necessário ao funcionamento da economia
(recuo ao fatalismo)
• Tenta=vas de controle e regulação por parte do Estado apenas limitavam o crescimento e a
prosperidade
4. Origens culturais
• Neoliberalismo anglo-celta x Estado de bem-estar social europeu x Prudência asiá=ca
• Cultura da agressividade nos negócios financeiros
• Cultura dos povos ingleses de valorização excessiva da casa própria como status social
• É melhor ser um proprietário de men=ra (endividado) do que um inquilino de verdade
• Asiá=cos chamam a crise de 2008 de Crise do Atlân=co Norte
5. Teoria tóxica
• Premissa: é possível avaliar as probabilidades de
acontecimentos que o próprio modelo assume como impossíveis de serem teorizados
• Teoria construída com base numa suposição logicamente
incoerente. Riscos de probabilidade muito baixa, mas que se ocorrem trazem prejuízos muito grandes
• Ignorância passa a ser tomada como “conhecimento provisório”
• A ignorância sobre os riscos alimentou a criação no novas formas de dívida e pirâmides de risco
• Os altos lucros alimentavam a tendência a con=nuar ignorando os riscos
5. Teoria tóxica
• Finanças tóxicas e teorização econômica tóxica se
retroalimentavam
• Teorias econômicas como fraudes intelectuais
– Hipótese do Mercado Eficiente (HME)
– Hipótese das Expecta=vas Racionais (HER) – Teoria dos Ciclos Reais de Negócios (TCRN)
6. Falha sistêmica
- sociedades capitalistas financeirizadas são
invitavelmente subme=das a crises periódicas
- que vão piorando na medida em que re=ram o
trabalho humano do processo de produção e o
pensamento crí=co do debate público
- o segredo do capitalismo é a sua tendência à
contradição consigo mesmo
- cobiça, desregulamentação, moral frouxa
6. Falha sistêmica
- incerteza radical
- prolongada estagnação
- elevada insegurança
Não-sistema
- Resultado do abandono do acordo de Breson
Woods em 1971: em vez tratar o problema dos
seus déficits gêmeos (déficit orçamentário e
déficit comercial), os EUA resolveram
propositalmente aumentá-los
- Desequilíbrio equilibrado: déficit gêmeos dos EUA
financiados pelo resto do mundo
- Um arranjo instável demais para sobreviver no
longo prazo
• Crise diferente a=nge a Zona do Euro
(Grécia, Espanha, Portugal, Itália, Irlanda, Islândia)
– Interdependência forte: grandes bancos e
fundos europeus alavancados em Qtulos
“tóxicos” nos EUA (25% do total)
– Assimetria de informações: pouco
conhecimento sobre o que de fato havia dentro
dos pacotes de deriva=vos considerados prime
– Confiança nos modelos da avaliação das
Agências de Risco
Crise da zona do euro
O problema dos bancos
Cenário pós-crise de 2008
– Criação do G20 (G7 não desaparece) – Criação do Financial Stability Board – Reforma de Cotas do FMI
– BRICS CRA
– Polí=cas monetárias agressivas de Quan=ta=ve Easing
• Modelo monopolista financeiro aplicado ao setor bancário.
• o balanço total dos 28 bancos do oligopólio bancário (50,341 trilhões de dólares) é superior (2012) à dívida pública global (48,957 trilhões de dólares)!
• os bancos muito grandes para falir se entenderam entre si de forma fraudulenta a parYr de meados dos anos 2000
• Estes 28 bancos foram declarados “sistêmicos” pela reunião do G20 de Cannes, em 2011.
• DerivaYvos são produtos que visam oferecer garan=as a seus possuidores, em caso de dificuldades econômicas – e alguns deles têm caráter muito especulaYvo.
• Apenas 14 bancos com importância sistêmica “fabricam” estes produtos, cujo valor imaginário (o montante dos valores
segurados) chega a 710 trilhões de dólares — ou seja, mais de 10 vezes o PIB mundial
• Análises demonstraram que esses bancos ocupam posições dominantes sobre vários grandes mercados (de câmbio, de Qtulos de dívida e de produtos derivados). É caracterís=co de um oligopólio.
• Sobretudo onze entre eles (Bank of America, BNP-Paribas, Barclays, CiYgroup, Crédit Suisse, Deutsche Bank, Goldman Sachs, HSBC, JP Morgan Chase, Royal Bank of Scotland, UBS)
• A bolha da dívida pública aYngiu todas as grandes economias. As dívidas privadas tóxicas do oligopólio bancário foram
maciçamente transferidas para os Estados, na úl=ma crise financeira. QuanYtaYve Easing.
• Este superendividamento público, devido exclusivamente à crise e a esses bancos, explica as políYcas de “rigor” e
“austeridade” pra=cadas em cada vez mais países.
• O “sistema bancário sombra”, ou seja, o sistema financeiro não regulamentado, não para de crescer – sobretudo através do
oligopólio bancário – para escapar das normas de supervisão e, em primeiro lugar, para negociar com deriva=vos.
• Não há uma verdadeira separação “patrimonial” das a=vidades bancárias. O lobby bancário tem sido eficaz, e o oligopólio pode conYnuar na mesma lógica financeira deletéria que praYcava antes da crise.
• Depois dos anos 1970, os Estados perderam toda a soberania monetária. Eles são responsáveis.
• A moeda agora é criada pelos bancos, na proporção de cerca de 90%, e pelos bancos centrais (em muitos países, independentes dos Estados) para os restantes 10%.
• Os Estados não são apenas disciplinados pelos mercados, mas sõ sobretudo reféns do oligopólio mundial.
• Há portanto uma relação quase destruYva desses bancos com relação aos Estados
• Nossas democracias esvaziam-se progressivamente, em razão da
redução (ou da ausência) de margem de manobra para a ação pública (Joaquim Levy, p. ex.).
• Além disso, o oligopólio bancário deseja instrumentalizar os poderes dos Estados, para evitar eventuais regulações financeiras, ou limitar o peso das multas às quais deve fazer face quando é pego com a boca na bo=ja.
• Gestores dos bancos de inves=mentos olham para os Estados como para qualquer outro ator econômico endividado.
• Medem os riscos e a rentabilidade de um
inves=mento financeiro. As dívidas do Estado são vistas por eles como um aYvo financeiro, tal como qualquer outro e sobre o qual é igualmente
permi=do especular.
• Um primeiro passo de reforma real seria dado, contudo, se um novo Bre3on Woods fosse
convocado para criar uma moeda comum em escala internacional
• Quando um oligopólio superpoderoso administra o dinheiro como um bem privado, não podemos ser surpreendidos pela lógica financeira que resulta daí.
• Os bancos buscam metas de lucro, não devemos esperar que os bancos privados defendam interesses sociais
• O confronto de poderes, entre bancos avassaladores e
poderes políYcos enfraquecidos, parece agora inevitável.
• Um resultado posi=vo desta luta – a priori desigual – só pode ocorrer por meio mobilização de cidadãos que
estejam plenamente conscientes do que está em jogo.
• Necessidade de resgatar a moeda para a esfera pública