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Guerrilha na educação: a ação pedagógica do Movimento Negro na escola pública

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Academic year: 2018

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EDUCAÇÃO EM DEBATE

Amauri Mendes Pereira'

JIHGFEDCBA

G u e r r i l h a n a e d u c a ç ã o :

a a ç ã o

p e d a g ó g i c a

d o M o v i m e n t o N e g r o

n a E s c o l a P ú b l i c a

ResumogfedcbaZYXWVUTSRQPONMLKJIHGFEDCBA

E s t e t r a b a l h o a n a l i s a o i m p a c t o d a l u t a c o n t r a o r a c i s m o n o â m b i t o d a E d u c a ç ã o . Op o n t o d e p a r t i d a éu m m a p e a m e n t o d o s e v e n t o s d e C o n s c i ê n c i a N e g r a q u e s ã o r e a l i za d o s em e s c o l a s p ú b l i c a s , e s t a d u a i s e m u n i c i p a i s d o

Rio d e J a n e i r o , com o o b j e t i v o d e a v a l i a r s u a s c o n c e p ç õ e s a r e s p e i t o d a C u l t u r a eC o n s c i ê n c i a N e g r a , b e m c o m o p a r a s a b e r d e i n t e r v e n ç õ e s j u n t o à r e d e , ses o l i c i t a m / o r i e n t a m / a n a l i s a m o s e v e n t o s , s e u a l c a n c e ed e s d o b r a m e n t o s . O b s e r -v o u - s e q u e o s e -v e n t o s d e C o n s c i ê n c i a N e g r a em e s c o l a s p ú b l i c a s a p r e s e n t a m v a r i a d a s c a r a c t e r í s t i c a s e l i d a m com

t e m a s p r a t i c a m e n t e i n e x i s t e n t e s emp r o g r a m a s c u r r i c u l a r e s e em l i v r o s a d o t a d o s p a r a a s d i s c i p l i n a s emg e r a l . C o m o e s s e s e v e n t o s n ã o p a r e c e m r e s p o n d e r a s d e m a n d a s d o s i s t e m a e d u c a c i o n a l , a h i p ó t e s e éd e q u e s e j a m r e s p o s t a s a d e m a n d a s g e r a d a s p e l a a ç ã o d o M o v i m e n t o N e g r o ed a í viriam o s s u b s í d i o s e i n c e n t i v o s . C o n c l u i - s e , e n t ã o , q u e a a ç ã o d o M o v i m e n t o N e g r o , n a s o c i e d a d e en a e s c o l a , v e m g e r a n d o o d e s e q u i l í b r i o d a s c e r t e za s ei m p o n d o m u i t a s r e c o m p o s i ç õ e s d e idéias, l u g a r e s sociais ee s p a ç o s d e p o d e r .

P a l a v r a s - c h a v e : M o v i m e n t o n e g r o , r a c i s m o , e d u c a ç ã o , c u l t u r a , c o n s c i ê n c i a n e g r a .

Abstract

Guerrilla in Education: the Pedagogical Practice of the Black Movement in Public Schools

T h i s s t u d y a n a l y s e s t h e i m p a c t o f t h e s t r u g g l e a g a i n s t r a c i s m i n B r a zi l i a n e d u c a t i o n . I t s s t a t i n g p o i n t isa s t u d y o f e v e n t s i n t h e B l a c k C o n s c i o u s n e s s m o v e m e n t w h i c h a r e c a r r i e d o u t i n p u b l i c , s t a t e a n d m u n i c i p a l s c h o o l s

i n Rio d e J a n e i r o , w i t h t h e o b j e c t i v e o f a s s e s s i n g t h e i r c o n c e p t i o n s c o n c e r n i n g t h e b l a c k c u l t u r e a n d c o n s c i o u s n e s s a s w e l l a s t r y i n g t o u n d e r s t a n d w h a t h a p p e n s w h e n o n e a s k s B l a c k C o n s c i o u s n e s s M o v e m e n t fo r o r i e n t a t i o n o r

a n a l y s i s o f e v e n t s i n t h e i r s p e c i fi c fi e l d . I t w a s n o t e d t h a t t h e e v e n t s o r g a n i ze d b y B l a c k C o n s c i o u s n e s s i n p u b l i c

s c h o o l s s h o w e d a v a r i e t y o f c h a r a c t e r i s t i c s a n d d e a l t w i t h t o p i c s n e v e r fo u n d i n s c h o o l p r o g r a m s o r t h e s c h o o l

t e x t b o o k s . A s t h e s e e v e n t s a p p e a r n o t t o c o m e fr o m t h e e d u c a t i o n a l s y s t e m , t h e p r o b a b i l i t y is t h a t t h e y a r e g e n e r -a t e d b y t h e B l -a c k M o v e m e n t fr o m w h i c h c o m e s s u b s i d i e s a n d i n c e n t i v e s . T h e s t u d y c o n c l u d e s t h a t t h e a c t i o n o f t h e

B l a c k M o v e m e n t b o t h i n s o c i e t y a n d i n t h e s c h o o l s is o b l i g i n g p e o p l e t o c h a n g e t h e i r i d e a s c o n c e r n i n g s o c i a l a n d p o w e r s p a c e s .

K e y - w o r d s : B l a c k m o v e m e n t , r a c i s m , e d u c a t i o n , b l a c k c o n s c i o u s n e s s .

IPesquisador do Centro de Estudos Afro-Brasileiros-VCAM. Especialista em História da África. Mestre em Educação. VER). Doutorando em Ciências Sociais, PPCIS-VER].

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" F a l a - s e m u i t o n a d i v e r s i d a d ezyxwvutsrqponmlkjihgfedcbaZYXWVUTSRQPONMLKJIHGFEDCBAe em a c e i t á - I a , s e m q u e se d i s c u t a a l o n g a h i s t ó r i a q u e d e u o r i g e m à

c o n s t r u ç ã o d a d i fe r e n ç a , n o p a í s en a e s c o l a p ú b l i c a .

Ém a i s fá c i l e s c r e v e r s o b r e a d i v e r s i d a d e do q u e d e -s e n v o l v e r p o l í t i c a s j u s t a s q u e l e v e m à e q u i d a d e ,à b u s c a d a u n i d a d e deu m a a ç ã o e d u c a t i v a deq u a l i -d a -d e n a -d i v e r s i -d a -d e ."

Multieducação, p. 67

"É i m p r e s c i n d í v e l a d o t a r u m a p o s i ç ã o c r í t i c a , em

r e l a ç ã o a o s v a l o r e s q u e a e s c o l a t r a n s m i t e e x p l í c i t a

ei m p l i c i t a m e n t e m e d i a n t e a t i t u d e s c o t i d i a n a s ."

Parâmetros Curriculares Nacionais

Tenho observado que, de uma maneira ge-, os sistemas educacionais têm sido pródigos em criar e desenvolver mecanismos de monito-ramento do cotidiano escolar. Há muita ênfase na

ecessidade de mensuração e avaliação do cum-primento das diretrizes emanadas de instâncias

periores do sistema educacional. Mesmo que não se consiga efetivá-Ias, isso tem constituído o reme da lógica hegemônica quando se fala em alidade da Educação, embora do discurso ao cumpra-se muitas vezes haja percalços e

obstácu-os e, muitas vezes, tudo fica pelo caminho. Este trabalho pretende abordar um proces-so que se desenvolve, ao que parece subterranea-mente, invertendo as equações referidas: inicia-tivas de educadores trabalhando com a cultura e/ ou consciência negra e temas correlatos a despeito da ausência de incentivos e orientações oficiais.

Desde o centenário da abolição da escravi-dão venho observando o crescimento da realiza-ção de palestras e outros eventos sobre cultura e consciência negra em escolas públicas do estado do Rio de Janeiro e da rede municipal da capital. As fontes de informação dessa progressão, além de minha própria vivência, são os amigos mili-tantes do Movimento Negro e professores nas áreas de História da África, Estudos Afro-Brasi-leiros e de Relações Raciais.

Aos poucos foi se instalando a curiosida-de: que tipos de eventos são realizados? Quais as motivações alegadas pelos que os organizam? Seguem algum modelo, alguma influência prin-cipal? Estariam respondendo a alguma solicita-ção/orientação do órgão central ou das Coorde-nadorias? De que tipo?

2Ampla proposta filosófica e pedagógica da Secretaria Municipal de Educação do Rio de Janeiro para a rede pública de ensino enunciada a partir de 1994 por meio de um livro-texto.

Como parte de uma investigação para a minha tese de doutorado, estou iniciando urna pesquisa junto às Secretarias Estadual e Munici-pal de Educação do Rio de Janeiro, para avaliar suas concepções a respeito das temáticas referi-das - Cultura e Consciência Negra - bem como para saber de suas intervenções junto à rede, se solicitam/orientam/analisam os eventos que ocorrem, como orientam, seu alcance e desdo-bramentos. Por outro lado, pretendo também mapear as ocorrências nas escolas de atividades referentes à temática.

Além de interrogar sobre o que teria leva-do educaleva-dores à iniciativa de discutir tais temas, pretendo identificar espaços de autonomia dos realizadores na produção dos eventos nos senti-dos induzisenti-dos, nas caracterizações, nas formas de mobilização e sensibilização, nos conteúdos veiculados. Teoricamente, tenho clareza de que, por mais influências e acúmulos diversos que efetivamente expressem, todo conhecimento/

ação, toda p r á x i s é construção, é criação.JIHGFEDCBA

o

t e r r e n o d o s c o m b a t e s

Tanto no livro daM u l t i e d u c a ç ã o2 , como nos

P a r â m e t r o s C u r r i c u l a r e s N a c i o n a i s há trechos que

demonstram a incorporação de um discurso atualizado em termos dos problemas de relações raciais na sociedade e na escola. O que teria ori-ginado esse fato? Como tais formulações são traduzidas na prática pelos educadores?

I

Gostaria, então, de introduzir uma discus-são sobre os motivos do surgimento da temática "Questão Racial e Educação" nos dois documen-tos nos meados da década, já que até o início dos anos 1990 esteve ausente das formulações ofici-ais dos órgãos centrofici-ais do sistema educacional.

Por um lado pode-se alegar de início a pro-eminência que os estudos sobre o multicul-turalismo adquiriu na década de 1990, em vasta bibliografia nas Ciências Humanas, em uma Eu-ropa às voltas com a intensificação de problemas com imigrantes africanos, árabes e asiáticos, além da agudização dos conflitos étnicos na antiga Iu-goslávia e na ex-União Soviética. Como de praxe,

2 7

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essa "onda" euro-norte-americana acabaria de-saguando entre nós. Mas é verdade também, que importantes autores, como Charles Taylor e Michel Apple, por exemplo, já falavam disso an-tes e mereceram pouca audiência dos nossos te-óricos da educação. Por outro lado, apesar de os chamados Estudos Culturais terem, nos anos 80, alcançado grande notoriedade na Inglaterra, primeiro, e, logo depois, nos EUA, isso não foi incentivo suficiente para que se desse atenção, no Brasil, às nossas "multiculturalidades". Ou seja, é preciso procurar, além de referências ex-ternas, outras razões capazes de levar cientistas sociais e pesquisadores em Educação a se debru-çarem sobre essa questão.

Sobre os cientistas sociais penso que é bas-tante me referir às posições manifestadas pelo próprio reitor da Universidade Cândido Mendes em revista de comemoração dos 25 anos de exis-tência do seu Centro de Estudos Afro-Asiáticos, instituição acadêmica pioneira, de reconhecida excelência no tema em nosso país e com visibili-dade internacional:

É hoje impossível dissociar - como reco-nheceu a Fundação Ford e outras

organi-zações internacionais - o recado do Afro,

do Movimento Negro na nossa cidade. In-clusive no diapasão dos problemas de res-gate da cidadania e da conquista de tantos lances da ação afirmativa.

Também Antônio Sérgio Alfredo

Guima-rães, em seu livrogfedcbaZYXWVUTSRQPONMLKJIHGFEDCBAR a c i s m o e A n t i - r a c i s m o n o B r a s i l ,

faz alusões à importância das demandas geradas pela atuação do Movimento Negro Brasileiro in-centivando a sociedade e a academia a discuti-rem a temática. Tal reconhecimento é diversas vezes reiterado por Ricardo Henriques(UFF-IPEA), ao longo de seu texto D e s i g u a l d a d e s r a c i

-a i s n o B r -a s i l : e v o l u ç ã o d a s c o n d i ç õ e s d e v i d a n o a n o s

90, cujas análises têm servido de referência fun-damental no amplo debate sobre a necessidade de Ação Afirmativa para a população negra, incre-mentado recentemente a partir da adoção de co-tas raciais em universidades públicas. Ou seja, em que pese eventuais dificuldades de aproxi-mação, há o reconhecimento do protagonismo do Movimento Negro Brasileiro na composição dos discursos mais difundidos sobre a questão racial na atual conjuntura.

Na educação, minha hipótese é que: o q u e

e s t á e m c i m a éc o m o o q u e e s t á e m b a i x o ! Da mesma

forma que Educadores "na base" são influencia-dos pelas demandas sociais que estão à volta de sua práxis docente, também os formuladores so-bre Educação são sensíveis à "voz das ruas". Des-se ponto de vista, a intensificação das discussões sobre o racismo na sociedade brasileira - da qual o Movimento Negro tem sido o motor e a ponta-de-lança - seria a principal responsável pelas re-centes abordagens da D i v e r s i d a d e C u l t u r a l nos PCNs e pelas incursões da Multieducação to-cando de diferentes maneiras a presença do pre-conceito e da discriminação racial na escola.

Tenho como exemplo o Seminário "O Ne-gro e a Educação" realizado em São Paulo em dezembro de 1986, cuja organização envolveu o Conselho de Participação Política e Desenvol-vimento da Comunidade Negra do Estado de São Paulo, a Fundação Carlos Chagas e a Fun-dação Ford.

Foi como um rito de passagem. As inter-venções já eram manifestamente engajadas na denúncia das desigualdades raciais na Educação, fato até então incomum em eventos com essa temática. Mas ainda mesclaram-se: o velho paradigma da questão racial como "no fundo" uma questão de classe e abordagens que preten-diam romper com ele. Na visão de Fúlvia Rosemberg, por exemplo, tais desigualdades eram remetidas a aspectos estruturais externos à es-cola - a causa estaria na segregação da população negra nos bairros mais pobres ou nas classes mais atrasadas das escolas daqueles bairros; outras intervenções traziam uma visão teoricamente ino-vadora: as causas das desigualdades raciais na escola não seriam apenas externas. Com clareza, apresentavam a concepção de que nos currícu-los, equipamentos e procedimentos didáticos se encontrariam fatores fundamentais de reprodu-ção do racismo, potencializando os elevados Ín-dices de repetência e evasão escolar entre a po-pulação negra. Foram os casos, por exemplo, de Luiz Alberto Oliveira Gonçalves:

" S e a p r o d u ç ã o e a t r a n s m i s s ã o d o s a b e r n a e s

-c o l a n ã o fo r e m m e d i a d o s p e l a p a r t i c u l a r i d a d e c u l t u r a l

( e n q u a n t o e x i g ê n c i a t o t a l i za d o r a ) d a p o p u l a ç ã o n e g r a ,

a s p r á t i c a s p e d a g ó g i c a s c o n t i n u a r ã o p u n i n d o a s c r i a n

-ç a s n e g r a s q u e o s i s t e m a d e e n s i n o n ã o c o n s e g u i u a i n d a

e x c l u i r " (Oliveira Gonçalves, 1987: 29); e a de João

Batista Borges Pereira: " A d e s e s t i g m a t i za ç ã o d a i m a

-g e m d o n e -g r o , p r o c e s s o q u e s e s i t u a a m b i g u a m e n t e n o s

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, i o s d a c l a s s e e d a r a ç a , j á a p r e s e n t a a l g u m a d i

-' D t l i ú u i e . , p o i s d e p e n d e d e u m p r o j e t o , e m l a r g a m e d i

-. s i s t e m á t i c o d e c r í t i c a d a e s c o l a s o b r ezyxwvutsrqponmlkjihgfedcbaZYXWVUTSRQPONMLKJIHGFEDCBA

si

m e s m a " .

rges Pereira, 1987: 44).

É

claro que essa nova visão merece um co-entário a respeito das perspectivas teóricas que propicia, embora não seja este o espaço ade-ado para isto. Quero apenas registrar que essa rrilha foi sendo cada vez mais alargada ao longo década de 1990 mobilizando muitas

pesqui-na área da Educação. Importante registrar que Lniz Alberto Oliveira Gonçalves, Doutor em Edu-ção, foi convidado também na condição de embro da Comissão de Educação dos Movimen-os NegrMovimen-os de Belo Horizonte.'JIHGFEDCBA

o d u z i n d o a r m a s e t r i l h a s

A concepção da Educação como um apare-o reprapare-odutapare-or das ideologias dominantes sofreu duro revés a partir dos finais das décadas de 1970 e 1980.4 Foi o momento de os educadores pro-gressistas abandonarem os "subterrâneos" das propostas e práticas de Educação alternativa, para a luz do sol das disputas por espaço nos sistemas oficiais - um pouco em consonância com o novo momento dos Movimentos Sociais que medra-vam por dentro dos a n o s de c h u m b o da ditadura militar - na "abertura lenta e gradual" - e emer-giam, pós políticas vanguardistas e clandestini-dade para, de novo, "entrarem em cena".

O Movimento Negro se beneficiara do re-fluxo das práticas políticas tradicionais até qua-se o final dos anos 70. Constituíra-qua-se numa prá-tica possível (não era tão claro para a repressão o seu conteúdo/potencial político) para alguns negros militantes de esquerda, temporariamente "recuados"; ao mesmo tempo que o "campo mais livre" lhe permitira um desenvolvimento sem tutelas e sem açodamento. Talvez tivesse encontrado mais problemas se em seus momen-tos iniciais fosse obrigado a enfrentar a

ortodo-xia da militância de esquerda, que p o s t u l a a exclusividade de um problema "de classe", c o m o

se este se opusesse a um problema, também, de caráter racial.

Na efervescência de idéias do início dos anos 1980 não foi difícil para o Movimento Ne-gro, que já conquistara certa força e vinha pro-cessando um discurso autônomo e consistente, ocupar espaços no âmbito da esquerda.! Outros setores do Movimento Social, de uma maneira geral, também ressurgiam com características nada ortodoxas. 6

Tanto pelo formidável impulso dos grupos e militantes negros (brandindo sua legitimidade histórica), quanto pela maleabilidade dos Movi-mentos Sociais e da oposição política convencio-nal (precisando de "massa", articulando o mais amplamente possível, e - quem sabe um pouco por isso? ~ admitindo todas as demandas anti-sistema); a mensagem de valorização do negro e das matrizes africanas e da luta contra o racismo conquistava cada vez mais espaços e adeptos. Na Escola (principalmente a pública, mas também fora dela) as tensões que a envolviam poten-cializavam os conflitos? , e a questão racial entrou forte como um deles. A esse respeito seria impor-tante investigar as referências empíricas do cres-cimento do percentual de mulheres negras (e ho-mens negros também) na categoria do magis-tério a partir daquele período. Era recorrente, na época, a alusão à desvalorização da profissão, sua perda de s t a t u s , como uma razão para afastar

setores das classes médias, o que estaria abrindo espaços para negros e negras. Não é aqui o lugar de comentar um certo viés discriminatório: negros seriam então menos capazes? Talvez não seja pos-sível medir o quanto os concursos públicos, que nas grandes cidades de todo o país se tornaram a única forma de acesso a partir dos anos 70, ajuda-ram a colorir a categoria dos professores públicos. Mas pode-se afirmar que eles se constituíram num poderoso fator de sua democratização.

3É assim que consta na apresentação do seu texto, na publicação R a ç a N e g r a e E d u c a ç ã o , nos Cadernos de Pesquisa n° 63, Nov/1987, da Fundação Carlos Chagas, que foi voltado exclusivamente para os textos e discussões daquele evento que se tornou um marco nos debates contemporâneos sobre raça e Educação no Brasil.

4Importante a esse respeito a discussão pioneira de jarnil Cury, C. RE d u c a ç ã o e C o n tr a d iç ã o . Cortez editora-Editores associados. SP. 1985 5Até os meados da década de 1980, quase toda ação do Movimento Negro se dava pelo viés de uma crítica contundente ao sistema

de poder e valores, visto como o gerador e o garante do racismo e das desigualdades raciais. Vide a formação do MNU em Pereira, A. M.T r ê s I m p u ls o s p a r a u m s a lto : tr a je tó r ia s e p e r s p e c tiv a s d o M o v im e n to N e g r o B r a s ile ir o . Mimeo. CEAA. 1998. E mais: Gonzáles, Lélia e Hasenbalg. Carlos A ..L u g a r d e N e g r o . Marco Zero. RJ. 1981

6Ver a tese de Éder Sader sobre os Movimentos Sociais em São Paulo, na década de 1970.Q u a n d o n o v o s p e r s o n a g e n s e n tr a r a m e m c e n a . Paz e Terra. RJ. 2" ed. 1995.

7A primeira greve do magistério público do Rio de Janeiro foi em 1979. O alto grau de mobilização alcançado e sua longevidade (quase dois meses), ainda sob a ditadura militar, dizem bem do estado de insatisfação - não apenas salarial - da categoria.

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Esse quadro merece um olhar mais apu-rado, dada a abrangência e capilaridade possível para novas idéias no sistema educacional, no qual já avultam estudos sobre a crucialidade da ques-tão racial. Não é possível ser extenso sobre a pro-dução de militantes negros especialistas em Edu-cação. Cito, ligeiramente, como exemplos: as dis-sertações de mestrado de Cavalleiro (2000) e Trindade (1993) são reveladoras das maneiras sutis e, no entanto, ostensivas, naturalizadas, da reprodução do racismo no cotidiano escolar; Oliveira Gonçalves (1985) foi um dos pioneiros

na identificação dogfedcbaZYXWVUTSRQPONMLKJIHGFEDCBAs ilê n c io como uma fala pode-rosa na mistificação do preconcei to e da

discrimi-nação racial no espaço escolar; Gonçalves e Bar-bosa (1997); Ana Célia Silva (2001) procedeu exaustiva análise do racialismo e racismo no li-vro didático, um dos principais suportes da edu-cação pública; Cunha (1992) e Pereira (1997) identificam as dificuldades que a ausência de in-formações e referências positivas sobre África, além da carga, já de si imensamente depreciati-vas, que trazem as memórias do tráfico e da es-cravidão (quando não as profundas distorções de que são objeto), causam à auto-estima das crianças negras; Jeruse Romão e Gevanilda San-tos (1998) mostram como a história da educa-ção está encharcada de racialização e de estig-mas àpopulação negra e como isso está longe de maior reflexividade nessa área da produção do conhecimento.

É

possível que o discurso da valorização étnica e da luta contra o racismo penetrando o cotidiano escolar tenha municiado o avanço do Movimento Negro, a longo prazo, por intermé-dio da conquista de corações e mentes para um projeto de educação não racializada - é isto que estou querendo investigar em iniciativas de edu-cadores que ousam enfrentar o lugar-comum da mistificação dos problemas de relações raciais na escola. Esse Movimento Negro que recebe tal impulso, pois ele mesmo, e é isso que reitero, tem sido - com a criação difusa e complexa da consciência negra - um elemento primordial na produção de sentidos capazes de romper o ab-solutismo do mito da democracia racial, na es-cola e na sociedade.

Serve para ilustrar o caso da zona oeste do Rio de Janeiro. No final dos anos 1980 foi muito

intensa a difusão de idéias anti-racistas, graças à formação de um Comitê do Movimento Negro" que articulou a ação de grupos já existentes. Ha-via muitos professores da rede pública entre esses militantes e eles "puxavam" eventos de Consci-ência Negra em suas escolas. Os dois Encontros de Negros da Zona Oeste (1988-1989) foram re-alizados em escolas públicas e tendo professores à frente. Por vários anos a 9a CRE, por injunção

desse grupo de professores, realizou atividades oficiais em novembro, mês em que se comemora o Dia Nacional da Consciência Negra.JIHGFEDCBA

A s e s c o l h a s e a s p o s s i b i l i d a d e s d a a ç ã o

É

uma questão instigante a de saber os ca-minhos por onde foi sendo feita a ligação da Cons-ciência Negra - assim tenho designado o conjun-to de idéias que giravam em conjun-torno das identida-des e ideologias originadas no seio da militância - com a Educação. Porque mais remotamente houvera sempre a demanda de mais Educação para a população negra, mas apenas a partir da década de 1960 se pode dizer que começa, de fato, a ficar mais fácil o acesso àeducação pública, pelo menos nas maiores cidades brasileiras, com a construção de mais escolas, e em 1971 (lei 5692) com a extensão do ensino fundamental de qua-tro para oito anos. Durante todo esse tempo, o simples fato de se manter na escola e de avançar nos estudos já era considerado um êxito, dada a dificuldade do acesso (sempre era menor o nú-mero de vagas do que a procura) e as altas taxas de repetência e evasão.

A partir do início dos anos 80, partilhan-do a insatisfação geral com a educação pública e as intensas discussões teóricas sobre novas pers-pectivas pedagógicas, começaram a aparecer os primeiros questionamentos específicos também quanto

à

qualidade da Educação - vista como racialista, reprodutora de estereótipos, de pre-conceitos e discriminação racial. Então, contrari-ando a tese de Carlos Roberto Jamil Cury, argu-mentavam os pesquisadores/educadores/militan-tes, no caldo de cultura do mito da democracia racial, continuava valendo o caráter reprodutivo de uma ideologia racial dominante.

No Rio de Janeiro, esse era um dos temas mais candentes e com maior participação nos

8Núcleos de militantes criados inicialmente para a mobilização da Marcha do Movimento Negro contra a farsa da Abolição, realizada em 11 de maio de 1988, no centro do Rio de Janeiro.

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contros do CENIER] - Conselho de Entidades egras do Interior; também nos quatro Encon-os Estaduais de Entidades Negras-1983/86/89/ 91, era um tema obrigatório, tendo-se criado, inclusive, um GT de Educação, que se mantinha atuante nos intervalos entre os Encontros.

Em outros estados foi o momento de cria-ção de organizações negras voltadas especial-mente para a Educação, como o Núcleo de Estu-dos Negros-NEN, de Florianópolis-SC, que vem

publicando a sériegfedcbaZYXWVUTSRQPONMLKJIHGFEDCBAP e n s a m e n to N e g r o e E d u c a ç ã o ,

referência fundamental na constituição da abor-dagem que estou fazendo neste texto; ou de ini-ciativas facadas na Educação dentro de organi-zações e manifestações do Movimento Negro, como é o caso das escolas com currículos e for-mulações didáticas alternativas, enfáticas em africanidades, do Ilê Ayê, do Olodum e de ou-uos blocos afro na Bahia; das atividades

desen-'olvidas mais recentemente pelo Centro de Es-tudos da Cultura Negra - CECUN, do ES, com seus cursos de formação de professores a distân-cia; ou as intervenções desenvolvidas pela SACI, em Sergipe, focando Cidadania e Educação; ou ainda como os êxitos do curso de pré-vestibular para negros e carentes do Quilombo, no RN, por meio do qual iniciou-se profícuo diálogo entre aquela organização negra e UFRN; ou ainda a iniciativa de enorme sucesso do CEERT-Sp, de premiar iniciativas de práticas pedagógicas anti-racistas, por intermédio de concurso amplamente difundido, ao qual acorreram educadores de vá-rias regiões do país; ou dos cursos de formação de professores e do curso de pré-vestibular do GRUCON - Grupo de União e Consciência Ne-gra do MT; entre muitos outros.

Há um outro tipo de iniciativa que vem ga-nhando espaço no interior de universidades públi-cas: é a criação de NEABs - Núcleos de Estudos Afro-Brasileiros, por professores que, desde muito longe, são comprometidos com as lutas do Movi-mento Negro. E o caso, entre outros, do NEAB da Universidade Federal de Alagoas, cujo primeiro diretor foi o professor Zezito de Araújo, atual Se-cretário de Proteção e Defesa das Minorias do go-verno de Alagoas e um dos principais articuladores,

nos anos 1980, do Movimento que resgatou o sí-tio histórico do Quilombo dos Palmares, onde está sendo construído o Parque aciona! da Serra Barriga, em Alagoas; e do PENESB - Programa e Educação dos Negros na Sociedade Brasileira, da UFF, ainda hoje dirigido pela professora Iolanda de Oliveira, que vem se tornando um centro de excelência na formação de professores, na temática da História e Cultura Afro-Brasileira.

Não se trata aqui nem mesmo de se esbo-çar essa história (da qual, por sinal, carece a his-tória da Educação), mas apenas de observar que a racialização e o racismo nos livros didáticos, nos currículos e em procedimentos pedagógicos passaram a ser foco de pesquisas e denúncias, e que organizações do Movimento Negro foram os principais agentes de sua divulgação. Não são poucos os militantes do Movimento Negro/edu-cadores que optaram por uma carreira acadêmica, em que ambas as experiências contribuíram para criativa produção de conhecimentos.

Era possível observar efeitos, porque aquelas demandas encontravam receptividade em escolas por parte de educadores que ao mes-mo tempo percebiam/vivenciavam o preconcei-to e discriminação racial no cotidiano escolar, e se sentiam despreparados/desarmados para li-dar com tais situações. Geralmente eram os mi-litantes do Movimento Negro, entre eles alguns também educadores, que eram chamados para informar/discutir essas questões e subsidiar atuações pedagógicas mais consistentes. Deve-se anotar, por outro lado, que assim como ha-via os educadores que se interessavam/convi-davam/discutiam, havia os que rejeitavam tal presença na escola, vista como estranha e "cria-dora de problemas" - eram, portanto, inevitá-veis os conflitos ideológicos."

É

claro que estavam em sintonia esses pro-cessos internos em muitas escolas e o contexto mais amplo nos anos 80, em que sucessivas ma-nifestações do Movimento Negro e outros even-tos abordando a questão racial repercutiam das mais variadas maneiras nos meios de comuni-cação, alcançando setores cada vez mais amplos da sociedade.l? Está por ser investigado o

irn-9Breve abordagem das expectativas daquele momento é feita por Cunha, Henrique. T e x to s p a r a oM o v im e n to N e g r o . Edicon. SP. 1992. Também em: Gonçalves e Silva, Petronilha B. e Barbosa, Lúcia M. A. Op e n s a m e n to N e g r o emE d u c a ç ã o . UFSCAR. SP. 1997 10Programas de grande audiência em emissoras de rádio do Rio de Janeiro, como os de Cidinha Campos na Rádio Tupi e Haroldo de

Andrade na Rádio Globo, expunham de variadas e controvertidas maneiras, questões referentes ao preconceito eàdiscriminação racial, ao longo da década de 1980. De onde viria a motivação desses apresentadores de grande prestígio? Ésabido que por mais que tenham autonomia na condução de seus programas, eles e suas equipes de produção jamais despregam a atenção dos indica-dores de audiência. Os anunciantes são seus patrões.

(7)

pacto da nova estética afro (música, dança, pen-teados, tecidos e vestuário) inaugurada pela onda dos blocos afro de Salvador-Bahia, que veio no bojo da criação da Consciência Negra e alcançou seu apogeu na década de 80 - Ilê Ayê e Olodum na ponta - sobre reivindicações de identidade, o que incentivou os debates sobre a questão ra-cial. O mesmo em relação a Bob Marley e a enor-me influência (também da estética) do reggae no Brasil.11 Resisto à tentação de uma imagem

se-xista para ilustrar esse processo em que na es-cola, como em outros setores conservadores da sociedade e na mídia em geral, é possível (e para alguns necessário/desejável) ceder, sem, porém, perder a característica de tenaz manutenção do racialismo e da reprodução do preconceito e dis-criminação no cotidiano escolar.JIHGFEDCBA

Á r e a s ( q u a s e ) l i b e r t a d a s

I

Em outubro de 2002, a Superintendência de Projetos Especiais da Secretaria Estadual de Educação enviou para as escolas da rede uma fi-cha onde deveriam ser anotados (caso houves-se), dados referentes a organização e realização de eventos sobre cultura negra e/ou consciência negra e temas correlatos. O objetivo era mapear as atividades, identificando seus organizadores e as características mais destacadas.

As respostas não tardaram a chegar. Ao longo dos meses de novembro e dezembro, além das fichas, eram enviadas cópias dos projetos e até mesmo alguns relatórios e fotos sobre os even-tos. Éde se destacar o cuidado no acabamento dos projetos, seu envelopamento, o interesse em acrescentar dados não previstos na ficha e o inte-resse, manifesto por 100% dos organizadores que responderam, de comporem uma Rede de Edu-cadores para desenvolvimento dos estudos afro-brasileiros como parte de sua formação conti-nuada. Foi possível observar o quanto a inicia-tiva do mapeamento das atividades sensibilizou os organizadores, através das falas dos que com-pareceram num seminário organizado, às pres-sas, na Secretaria de Educação, para atender a insistência com que muitos ligavam em busca de mais informações, inclusive, do porquê de, pela primeira vez, aquela atividade merecer atenção da Secretaria ...

11Risérío, Antônio.gfedcbaZYXWVUTSRQPONMLKJIHGFEDCBAC a r n a v a l I j e x á . Editora Corrupio. Salvador. 1981.

Ainda não foi possível catalogar a totali-dade das fichas recebidas. O que tenho em mãos é um catálogo/amostragem de 22 fichas preen-chidas, de 14 diferentes municípios, algo em tor-no de 10% do total estimado.

• Os relatos dão conta da consciência de que eram pioneiros e ousados ao realizar atividades com a temática;

• A maioria dos cerca de setenta educado-res que compareceram ao seminário realizado no dia 27.12.2002, eram negros, mas não eram pou-cos os não negros, e suas posturas e relatos das experiências e dificuldades apresentavam poucas diferenças;

• Constam de todos os relatos referências às emoções vivenciadas pelos organizadores e por participantes - crianças, outros educadores e res-ponsáveis por alunos.

• É

de se notar, também, a variedade de ca-racterísticas na organização e nas formas de di-vulgação e realização dos eventos;

• As mensagens e conceitos veiculados, nos projetos, na divulgação, nos relatórios, apontam um dado interessante: poucas vezes seguiam a linguagem mais comum nos livros didáticos e outros subsídios (raramente) oferecidos por co-ordenadores/orientadores pedagógicos, ou dispo-níveis em publicações como a revista N o v a E s

-c o l a , por exemplo;

• Os títulos e a ênfase desses eventos falam, em sua maioria, de aspectos contemporâneos -"Quem sou eu?", "Mostra de Consciência Negra", "Nossa escola é negra", "Brasil mostra a tua cara", "Consciência sem preconceitos", "Consciência Negra", "Dramatizando a luta negra", "Coragem e Esperança" ...

• Importante, ainda, é o deslocamento que se percebe da incidência maior da realização dos eventos no mês de novembro, quando antes era sempre no mês de maio.

Até onde pude perceber, os eventos do mês da Consciência Negra em escolas públicas apre-sentam variadas características e apontam para um fenômeno mais que significativo que é a pre-sença de temas praticamente inexistentes em pro-gramas curriculares e em livros adotados para as áreas de estudo e disciplinas em geral.

Diferente das ocorrências de eventos como o dia dos pais, das mães, do livro, da árvore, do índio, etc, já incorporados ao calendário escolar

(8)

em quase todo o ensino fundamental. É

questio-nada pela diretoria a professora que não os

rea-liza como incentivo à reflexão dos alunos sobre

a importância dos temas. Todos esses temas

fo-ram sendo assimilados com o tempo, desde

sem-pre incentivada sua realização pelas instâncias

superiores do sistema educacional. Além de

sub-sídios dos livros didáticos, sempre chegavam mais

informações e material alusivos aos temas nas

roximidades das datas. E é comum tais datas

serem a culminância de insistentes programações

as salas de aula, e até de eventos maiores

jun-tando turmas de uma mesma escola e escolas de

uma mesma região.

As informações que obtive até agora dizem

ue a mesma atenção jamais foi dada à temática

a Cultura Negra. Esta, apenas vez ou outra

es-ve presente à volta do 13 de Maio, ou do Dia

o Folclore, geralmente lembrando a escravidão,

vezes com uma apresentação de capoeira de

embros da comunidade, etc.

Como os eventos referentes à Consciência

~ egra não são respostas a demandas do sistema

educacional, minha hipótese é de que sejam

res-postas a demandas geradas pelo Movimento

Ne-o e daí viriam Ne-os subsídiNe-os e incentivNe-os.

E isso é surpreendente - embora haja uma

endência para se naturalizar - porque a produção

desses conhecimentos e de novos significados

so-bre a escravidão, soso-bre os quilombos, Cultura

egra e Consciência Negra, vêm se dando de

for-ma for-marginal e às vezes confrontando concepções

arcaicas, cristalizadas, persistentes, de relações

sociais e raciais em que as referências ainda são a

subalternidade negra e sua "essência" cultural.

A impressão é que esses eventos vêm sendo

mais e mais realizados, cada vez com maior

parti-ipação,

por mais que dê margem a conflitos

en-e profen-essoren-es, en-entren-e alunos, en-em outras

instân-. Agora já são peças teatrais, exposições,

pu-icações, ao ponto de em algumas regiões se

im-oorem como parte do calendário escolar.

Sem dúvida, que a "infiltração" da militância

ti-racista, ainda quase sempre afrodescendentes,

em todo tipo de instituições junto a governos e à

sociedade

civil'?

é um fato social, cujas

dimen-sões estão ainda por ser avaliadas, mas que, com

certeza, alimenta e é retro-alimentado nesse

pro-cesso que estou descrevendo e analisando.

11

Tenho, ainda grosseiramente, dividido em

dois pólos bem diferenciados as práticas

pedagó-gicas a que refere este trabalho:

Os educadores que assumem de uma vez por

todas "a causa", independentemente da cor da pele,

não seguem diretrizes, porque as instâncias

supe-riores não formulam propostas a respeito.

- Quando apareceram/aparecem

recomen-dações são, em geral, formuladas de maneira

im-precisa, incompleta, encerrando um fim em si

mesmas, ou como penduricalho/adereço/ilustra-ção de atividades "verdadeiramente" importantes;

- Não há monitoramento sobre

ocorrên-cias de preconceito e discriminação racial no

co-tidiano escolar, porque se trata de uma temática

espinhosa/delicada, capaz de criar indisposições,

mal-estar, constrangimentos (pode haver

educa-dores, negros ou não, com idéias inconvenientes

a respeito) ...gfedcbaZYXWVUTSRQPONMLKJIHGFEDCBA" e a l é m do m a i s , n ã o h á r a c i s m o n o B r a s i l !! !" .

A investigação que tenho desenvolvido

objetiva discutir principalmente

dois aspectos

daquele processo: a) por meio de que caminhos

(senão por orientações

oficiais), chega essa

temática à escola e quais seus agentes?; b) o que

e como acontecem, além dos tipos de

informa-ção e perspectivas dos organizadores.

Os dados coletados na pesquisa ainda não

permitem conclusões a respeito dos significados

mais amplamente pedagógicos, educativos, da

introdução dessa temática na escola (ainda mais

nas condições difíceis, restritivas, muitas vezes

marginais, sobrecarregando, até estigmatizando,

umas/uns pouc@s abnegados), como têm sido

realizadas. Isso não impede, no entanto, que

se-jam formuladas algumas hipóteses a respeito

dessas iniciativas, quase sempre de educadores,

ão podem passar despercebidas as existências de secretarias (ou outras designações) de negros/afro-brasileiros/afrodescendentes/ anti-racistas nas mais variadas instituições: dos partidos políticos e do sindicalismo às igrejas católicas e protestantes. Também têm sido criados junto a governos municipais e estaduais Conselhos do Negro (ou com diferentes designações), responsáveis por canalizar as insatisfações da militância e de outros segmentos da população negra e, em sentido inverso, levarem adiante políticas ou promoções/programações dos poderes constituídos em relação à questão racial, à cultura negra, etc, Informações recentes obtidas por meio de !lma lista específica dessa temática na internet - d is c r im in a c a o r a c ia /@ y a h o o g r o u p s .c o m .b r -falam em cerca de 50 ddades e 6 estados. E mais ou menos o mesmo número de cidades e estados onde já é feriado o dia 20 de novembro - Dia Nacional da Consciência Negra.

(9)

seja porque é flagrante a sua generalização, a sua

capacidade de ir modificando as propostas, os

jeitos, e ir transformando, acumpliciando os

en-volvidos; ou o contrário, impactando

negativa-mente, criando rejeições, animosidades; jamais,

todavia, passando

emgfedcbaZYXWVUTSRQPONMLKJIHGFEDCBAb r a n c o

pela sensibilidade de

quem o vivencia.

Da parte das instâncias oficiais, se me ativer

aos discursos "oficiais"haverá salvaçãopara quase

todos:

- Educadores que não conseguem se assu-mir como sujeitos e se rendem às dificuldades,

verdadeiras, de lidar com manifestações de

pre-conceito e discriminação, como se elas fossem

se-nhoras absolutas no processo educativo. Écomum

a "profecia" do fracasso dos mais escuros (muitas

vezes estereotipados como os mais tímidos ou o

contrário, espalhafatosos);

- Coordenações pedagógicas e educacionais

e suas desculpas e argumentações profissionais,

bem pesadas e medidas, porque, em geral, são agentes mais bem informad@s, já leram textos e livros a respeito e assimilaram as caracterizações

politicamente corretas da

pluralidade/diversida-de cultural;

- As diretorias das escolas, tão

assober-badas com as tarefas gerenciais que as distanciam da finalidade maior da escola, encaminham o que Ihes chega e "não podem corromper a autonomia dos professores em sala de aula!";

- A Coordenadoria Geral. porque

encami-nha documentos sazonais (13 de Maio, 20 de

Novembro, dia do folclore), produz adequações à sua região, estimula a todos, " ta n to q u e a q u e la E s -c o la , a q u e la p r o fe s s o r a r e a liza m c o is a s tã o b o n ita s ! T o -d o s s a b e m o s q u e p o -d e m o s c o n ta r come la " ... ;

- E os formuladores das Secretarias de

Edu-cação, porque seus textos - como o caso da

Multieducação - são cuidadosos, alertas, politica-mente corretos e deles "partiram todas as inicia-tivas, n a q u e le ano, n a q u e le outro, n a q u e la escola" ...

Frases e circunstâncias vivenciadas em ante-salas e gabinetes percorridos na senda da conquista do direito de pesquisar em escolas públicas do Rio de Janeiro.

Mesmo até onde é possível perceber

uma vontade sincera de enfrentar o preconcei-to e a discriminação racial (infelizmente, ainda não é tão comum) é como se a maioria dos

edu-cadores ainda se sentissem se defendendo das

investidas "desse problema". Afinal havia muito mais estabilidade, um apelo muito mais

singe-lo, no mito da democracia racial! A ação do

Movimento Negro, na sociedade e na escola vem gerando o desequilíbrio das certezas e impondo muitas recomposições: de idéias, de lugares so-ciais, de espaços de poder ...

A instituição da lei 10.639/2003

13

que

alte-rou a Lei de Diretrizes e Bases da Educação

Na-cional, para obrigar a adoção de História e

Cultu-ra Afro-BCultu-rasileiCultu-ra no ensino médio e fundamental

foi uma conquista extraordinária e deve ser

credi-tada, além da vontade política manifesta por um

governo federal em seu nono dia de exercício e de

uma parlamentar hábil e engajada, principalmente

à tenacidade da rnilitância negra que carregou,

quase que solitária, essa bandeira durante longo

tempo. Corresponde, portanto, a um ponto de

chegada para tal demanda, mas a um ponto de

partida para a área da Educação.

Não se pode menosprezar nem

superesti-mar conquistas. Há muitos senões, indiferenças,

displicências, negligências, contrariedades,

recu-sas, entre algumas vitórias - mesmo que ainda

restritas, simbólicas - e a plenitude de sua

assi-milação no corpo e nos hábitos da sociedade.

Revoluções culturais são muito mais trabalhosas

e sensíveis que revoluções políticas. O sistema

educacional conseguirá "sacudir" a naturalização

dos currículos,

conteúdos

e procedimentos

didáticos racializados e racistas?

De qualquer forma, já é possível ver

ima-gens de pessoas negras e mestiças em quadros

murais em salas de aula, pátios, corredores; os

recortes de jornais e revistas, os personagens

re-presentando os temas dos trabalhos já não são

exclusivamente os mais claros... E nas festinhas

sazonais e no dia-a-dia, já há educadoras que

cui-dam/se acautelam em relação aos estigmas

vibra-dos sobre as meninas e meninos mais escuros.

Serão mudanças consistentes, "desde dentro e para

sempre", ou apenas formais e superficiais?

JIHGFEDCBA

B i b l i o g r a f i a

Guimarães, Alfredo S.

R a c is m o

e

a n ti- r a c is m o n o

B r a s il.

Editora 34. SP. 1999 Cavalleiro, Eliane.

13Estou sendo convencido de que o melhor é nos referirmos a essa lei como: artigo 26-A da LOB. Soa mais forte no enfrentamento dos descasos e outros obstáculos àsua implementação.

(10)

s i l ê n c i o d o l a r a o s i l ê n c i o e s c o l a r .zyxwvutsrqponmlkjihgfedcbaZYXWVUTSRQPONMLKJIHGFEDCBAContexto. SP.

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