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A dimensão pragmática da tradução no ensino-aprendizagem da língua estrangeira especializada

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Academic year: 2021

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(1)A dimensão pragmática da tradução no ensino-aprendizagem da língua estrangeira especializada Vivina Almeida Carreira de Campos Figueiredo Doutorada em Tradução pela Universidade de Vigo e Professora de Inglês Técnico na Escola Superior Agrária de Coimbra.. Resumo. Abstract. O recurso à tradução no ensino-aprendizagem de línguas estrangeiras, como método pedagógico complementar, tem sido alvo, nos últimos tempos, de uma espécie de reabilitação – um facto a que não é certamente alheio o desenvolvimento dos estudos sobre a tradução. Este estudo tem como objectivo apresentar o estado da questão, nomeadamente, a fundamentação teórica em que se apoiam os pólos opostos da sua evolução, com especial ênfase para a exposição da prática didáctica actual, em que são detectáveis várias correntes metodológicas de orientação comunicativa. Tendo como pano de fundo uma experiência de didáctica de Inglês científico-técnico, propõe-se e fundamenta-se uma apologia ainda mais veemente do uso da tradução neste subsistema linguístico – o das línguas científico-técnicas. Concomitantemente à referida reabilitação da tradução pedagógica (interpretativa e explicativa), ocorreu uma outra reabilitação que convém sublinhar: a recolocação da língua materna no lugar que lhe cabe na aprendizagem de outras línguas, um lugar de onde, afinal, ela nunca chegou a sair, já que parece inquestionável a sua omnipresença em qualquer acto cognitivo, mas especialmente bem patente na tradução automatizada, que ocorre no processo de aquisição de uma língua estrangeira, pela qual o aprendente estabelece relações de contrastividade entre os dois sistemas linguísticos de uma forma espontânea e inevitável.. The use of translation as an auxiliary pedagogical method in the teaching and learning of foreign languages has recently suffered a kind of rehabilitation, a fact to which the development of Translation Studies must have contributed a great deal. This article aims at presenting the state of the art, particularly the theoretical foundations which support the opposing poles of its evolution, with special emphasis to the present day teaching practices wherein several communicative methodological approaches can be detected. Against the background of a continued experience in teaching scientific and technical English, the author strongly proposes and justifies the use of translation in the teaching of the linguistic subsystems of specialised languages. At the same time that pedagogical translation (both interpretative and explanatory) was regaining respectability, another issue was also coming to the fore: the repositioning of the mother tongue in its righteous place in what concerns its role in the foreign languages teaching/learning process. A place from where it never really left because one cannot deny its omnipresence in any cognitive act, particularly well instanced in the automated translation which occurs in the process of learning a foreign language by way of which the learner establishes spontaneous and unavoidable contrastive relations between the two linguistic systems. Keywords: translation, specialised languages, pedagogical translation, mother tongue.. Palavras-chave: tradução, línguas especializadas, tradução pedagógica, língua materna.. 101.

(2) Introdução Este estudo pretende retomar, confirmar e corroborar algumas conclusões apresentadas num trabalho anterior (cf. Figueiredo, 2005: 93-100), tendo como suporte uma continuada experiência didáctica de Inglês científico-técnico. Nesse trabalho anterior desenhou-se uma breve visão diacrónica da clássica argumentação contra o recurso à tradução no ensino de línguas bem como da argumentação favorável à utilização desse método, em particular, no âmbito concreto da didáctica das línguas científico-técnicas. É, portanto, neste plano que este trabalho se situa, pretendendo demonstrar que aí a utilização da tradução e o recurso à língua materna constituem estratégias que se configuram como um método – complementar de outros, certamente – de elevada e comprovada eficácia, quando baseado numa concepção de tradução adequada às condições específicas do ensino-aprendizagem, atendendo ao perfil dos alunos e aos objectivos que se querem perseguir. Reabilitação da tradução pedagógica e da língua materna Depois do ensaio fundacional dos Estudos de Tradução como disciplina autónoma – “The Name and Nature of Translation Studies” – da autoria de James Holmes e datado de 1972, a tradução passa a conhecer um desenvolvimento imparável nos três ramos preconizados no seu mapa, cabendo a tradução pedagógica no âmbito dos estudos aplicados (cf. Holmes, 1994). A tradução passa a ser entendida como um fenómeno dinâmico e complexo, dotado de três faces – função, processo e produto – e a actividade tradutora uma actividade que convoca múltiplas competências, sendo a principal, talvez, a que tem por base a consciência de que a produção tradutiva de um texto tem de ter em conta a sua função específica, a cultura receptora e a sua localização espácio-temporal em determinados contextos pragmáticos e sócio-culturais. Daí que importa sublinhar que para traduzir não basta deter conhecimentos linguísticos; a competência tradutora requer também amplos conhecimentos extra-linguísticos, capacidade para procurar e gerir fontes de documentação e capacidade para convocar, sempre que necessário, dados extra-textuais (literários, culturais, sociológicos, políticos, académicos, institucionais, científico-técnicos, etc.) que facultem estabelecer as necessárias relações semânticas entre os vários elementos do texto. Assim sendo, o recurso à tradução no ensino da 102. língua estrangeira especializada não visa certamente ensinar a traduzir, embora se possa, desde já, desenhar uma analogia: a língua não é para o tradutor um objecto de estudo, mas sim um instrumento. O mesmo acontece com o técnico/engenheiro que aprende uma língua especializada: para ele esta não é mais do que um instrumento que lhe permite a prossecução de determinados fins. É isso que afirma Ruiz Moneva: “ESP [English for Special Purposes] students will not be interested in knowing the structure of the language, or learning its grammar, but in actually understanding the texts they have to cope with in their studies”. (Ruiz Moneva, 2000: 50) Nalguns períodos da história da didáctica das línguas, a tradução foi banida da sala de aula e, consequentemente, a língua materna supostamente desapareceu do processo de aprendizagem de uma língua estrangeira. O que nunca verdadeiramente acontece, dada a sua omnipresença em todos os actos cognitivos e pensar que é possível erradicar a língua materna do processo é irracional e absurdo. Como afirma Kurt Süss, “la sombra de la lengua materna es alargada” (Süss, 1997: 59) e Hurtado Albir explica porquê: […] la lengua materna está presente porque es el punto de referencia del alumno con el mundo del lenguaje; por esto, sobretodo al principio del aprendizaje, descubre y construye la lengua extranjera a partir de la experiencia de su lengua materna, aplicando un mecanismo que podríamos calificar de ‘traducción interiorizada’. (Hurtado Albir, 1988: 42). Na aprendizagem de uma língua estrangeira fazse, de forma automática e inconsciente, um exercício de contrastividade espontânea com a língua materna, que consiste em comparar elementos lexicais ou estruturas sintácticas para confirmar, compreender melhor ou mesmo para consolidar a sua aquisição. É, pois, impossível evitar a presença da língua materna, que se faz sentir, nas palavras de E. Lavault, de forma “silenciosa”. A mesma autora afirma ainda: “[…] on considère maintenant que vouloir écarter la langue maternelle de l’enseignement d’une langue étrangère est une gageure proche de l’absurdité.” (Lavault, 1985: 86) Também A. Duff, numa obra de 1989, lembra que: We all have a mother tongue, or first language. This shapes our way of thinking, and to some extent our use of the foreign language (pronunciation, choice of words, tone, word order, etc.). Translation helps us to understand better the influence of the one language on the other, and to correct errors.

(3) of habit that creep in unnoticed (such as the misuse of particular words or structures). And, because translation involves contrast it enables us to explore the potential of both languages – their strengths and weaknesses. (Duff, 1989: 6). Por certo, não se defende uma utilização geral e aleatória da tradução como um fim em si mesma, mas como um recurso pedagógico que pode ser muito útil e proveitoso. Por tradução pedagógica entende-se a utilização da tradução de textos em didáctica de línguas, sendo seus principais objectivos: 1) aprender a evitar as interferências através do exercício de contrastividade – o confronto entre as duas línguas permite reconhecer e identificar analogias e diferenças entre os dois sistemas linguísticos em jogo, o que pode ajudar a acautelar o perigo de interferência da língua materna na expressão em língua estrangeira, uma vez que alerta o aluno para esse mesmo perigo, 2) alcançar um aperfeiçoamento linguístico através do aproveitamento de estratégias cognitivas e comunicativas já desenvolvidas na língua materna e ainda 3) perceber as diferenças históricas e sócio-culturais. Já a tradução interpretativa e explicativa – aquela que melhor aproveita à didáctica da língua estrangeira especializada – consiste na utilização deliberada e consciente da tradução como mecanismo ou atalho pontual para aceder ao significado de um vocábulo desconhecido, permitindo a construção do sentido pela compreensão linguística e extra-linguística da mensagem. Aprendizagem para a autonomia É preciso, então, sublinhar a dimensão utilitária e instrumental da tradução na didáctica das línguas científico-técnicas – elas próprias também um instrumento para os seus utilizadores –, sendo portanto conveniente saber rentabilizá-la o melhor possível, aprendendo determinadas estratégias. A actual prática didáctica de línguas para fins específicos tende a conjugar vários métodos, sendo os mais profícuos, do meu ponto de vista, o da tradução pedagógica e/ou interpretativa/explicativa e o da análise textual, a que adiante se voltará. A combinação destes dois métodos configura um tipo de abordagem – cognitivista, comunicativa – que sintoniza com um paradigma do ensino-aprendizagem em que o aluno se torna o centro activo, criativo e reflectivo em torno do qual e em função do qual giram todas as componentes do processo: traçado de objectivos, conteúdos, planificação, metodologia, avaliação, etc.. No processo de ensino-aprendizagem, os alunos tornam-se conscientes e reflectem sobre as divergências e as similaridades entre a língua materna e aquela que aprendem, ficando motivados para desenvolver estratégias conducentes à auto-aprendizagem e à autonomia. Vem a propósito afirmar que estas orientações metodológicas convergem no sentido do paradigma de ensino-aprendizagem que a reforma do ensino superior português visa implementar, motorizada pela Declaração de Bolonha, e que pretende dotar os diplomados de competências para aprender ao longo da vida, com elevado grau de autonomia e capacidade de autoaprendizagem. Sendo que, neste novo formato, o tempo de formação formal fica reduzido, é preciso apetrechar os alunos com estratégias e instrumentos que 1) os ajudem a desenvolver estratégias de aprendizagem ao longo da vida num paradigma em que o professor cessa de ter o tradicional protagonismo e passa a ser apenas mais um agente ou facilitador do conhecimento e 2) os alertem para a natureza da aprendizagem e concomitante responsabilização no processo. Tratando-se de um processo pessoal, a aprendizagem é tanto mais eficaz quanto mais voluntária e o reconhecimento, por parte dos alunos, da responsabilização que eles detêm na sua aprendizagem é o primeiro passo em direcção à autonomia. O exercício dessa responsabilização deve ter expressão no seu envolvimento nas fases do processo acima aludidas. O contexto de ensino-aprendizagem A situação de ensino-aprendizagem a que este estudo se reporta é a didáctica da língua especializada ou Inglês Técnico, já que é um facto universalmente aceite e comprovado que o Inglês é a “língua franca” da comunicação científico-técnica. Essa leccionação decorre em dois semestres lectivos e é dirigida a estudantes do primeiro ano de vários cursos de engenharia. São, em geral, alunos pouco vocacionados para a aprendizagem de línguas, que apresentam baixos níveis de desempenho linguístico ainda que variáveis, mas que detêm já uma qualidade que os coloca no grupo dos alunos que querem ‘aprender a aprender’: têm uma percepção muito nítida da necessidade de aprenderem a língua especializada, no caso, o Inglês especializado. Detêm também algum grau de especialização num determinado campo científico-técnico com algum domínio da respectiva terminologia. Em suma, trata-se de estudantes que têm perfis, estilos de aprendizagem e níveis de desempenho muito heterogéneos, com objectivos de aprendizagem 103.

(4) muito concretos e muito pouco tempo para os atingir. Objectivos da aprendizagem Se os principais objectivos de aprendizagem, de acordo com a situação acima descrita, forem atingidos, o aprendente terá adquirido capacidade para: • Identificar o discurso científico e técnico, i.e., a estrutura retórica geral bem como a construção sintáctica que melhor caracterizam estes textos. • Compreender textos científico-técnicos. • Compreender, assimilar e interpretar a terminologia usada nestes textos. • Identificar e caracterizar diferentes subgéneros textuais. • Recorrer com êxito a fontes de documentação bibliográfica, ou seja, ser capaz de aplicar as técnicas e estratégias básicas de documentação localizar e utilizar diversas fontes de informação de tipo textual, terminológico e temático, manusear manuais, enciclopédias e textos didácticos. • Exprimir, quer na forma escrita quer na forma oral, idênticos enunciados. É, pois, uma tarefa muito árdua, dada a preparação deficitária da maior parte dos alunos na língua estrangeira e o limitado tempo de aprendizagem formal. Por isso, é necessário lançar mão a todos os recursos ao dispor do estudante, em particular, a língua materna. Para lograr algum sucesso nas situações apresentadas, julga-se essencial que o estudante tenha, antes de mais, uma noção muito clara do que é uma língua especializada. A língua especializada As línguas especializadas são subsistemas ou extensões da língua geral que utilizam o seu sistema gramatical, acrescentando-lhe um léxico adicional, a sua principal característica, que constitui a terminologia de um determinado campo do saber. Apresentam também características sintácticas próprias ou, melhor dizendo, os mecanismos sintácticos da língua geral são redesenhados para exercerem outras funções.1 A diferença entre a língua geral e a especializada é sobretudo uma diferença de grau: o grau no qual as características da língua geral são mais ou menos potenciadas. Dentre os mecanismos sintácticos disponíveis no sistema linguístico, o discurso científicotécnico escolhe aqueles que comunicam com maior economia, maior objectividade e menor complexidade. Daí que estes tipos de discurso apresentem uma 104. frequente ocorrência de determinadas estruturas linguísticas e opções sintácticas em detrimento de outras potencialidades igualmente presentes no sistema linguístico. Os usuários de uma língua especializada são especialistas e as situações de comunicação são de tipo formal, reguladas normalmente por critérios profissionais e/ou científicos. Como afirma Sager: Special languages are semi-autonomous, complex semiotic systems based on and derived from general language; their use pressuposes special education and is restricted to communication among specialists in the same or closely related fields. (Sager; Dungworth; McDonald, 1980: 69). Na língua geral, a referencialidade é aceite com naturalidade, sem muita reflexão e a atribuição de sentidos novos é gradual. Ao contrário, na língua especializada, o processo é mais consciente, existe maior preocupação em determinar e fixar, com exactidão, um referente: Certain regular preponderances of use arising from pragmatic requirements result in the establishment of subsystems which variously exploit the potential of the language. The situations which lead to the development of special languages heavily exploit the communicative and classificatory use which in turn makes heavy demands on the referential, the systemic and voluntary nature of language. (Sager; Dungworth; McDonald, 1980: 65). Comunicar e classificar são, então, os dois usos principais de uma língua especializada, pelo que a natureza referencial e sistemática da língua é intensificada e maximizada, mas é preciso atender ainda a outras características dos textos científico-técnicos. Características dos textos científico-técnicos A comunicação entre especialistas desenvolve uma retórica própria, i. e., a construção de padrões textuais altamente especializados, que lhes permite comunicar, disseminar e desenvolver o conhecimento científico. Ou seja, os textos produzidos por esses especialistas têm finalidades e objectivos concretos: informar com precisão, clareza e economia um receptor que, dotado de conhecimentos na mesma área, não terá dificuldades na descodificação da mensagem. Para além da temática a que se restringe um texto e que lhe confere o carácter de texto especializado, há ainda outro factor que determina a especialização de um texto: as circunstâncias específicas relacionadas com a.

(5) produção e via de divulgação dos textos. As suas características variam segundo se trate de artigos para revistas de especialidade, capítulos de um manual, comunicações a congressos, resumos, etc. Ao mesmo tempo, variam também as funções secundárias que se adicionam à sua função principal que é a informativa: segundo o objectivo traçado, podem ser textos descritivos, divulgativos, didácticos, instrutivos, etc. Detendo-nos por agora nas características gerais dos textos científico-técnicos, julga-se produtivo que o professor da língua especializada faça o seu levantamento, o analise e o discuta com os alunos com vista a agilizar a sua apreensão desses padrões. Resumindo, pode-se afirmar que • são textos concisos, objectivos e impessoais, onde as funções emotiva, expressiva e fática são neutralizadas e a ambiguidade reduzida ao máximo; • são textos que maximizam os usos comunicativos, informativos e classificatórios da língua; • são textos que privilegiam a forma escrita e recorrem, por razões de economia, simplificação e precisão, ao Latim e ao Grego bem como a símbolos e a códigos pertencentes a outros sistemas semióticos como, por exemplo, os símbolos da Química, da Física e da Matemática; • são textos em que o principal elemento de composição da frase é o léxico, especializado em cada área científica e tecnológica, em que a formação de palavras se faz primordialmente por derivação, por afixos, sendo também frequente o recurso a empréstimos (estrangeirismos) e a cunhagem de neologismos. Também por imperativos de precisão e objectividade, nestes textos há um maior predomínio da nominalização em detrimento das formas verbais ou adjectivas; • são textos que apresentam características discursivas facilmente identificáveis como, por exemplo, definições, descrições, classificações, comparações, analogias, instruções, etc. • são textos que apresentam uma baixa densidade sintáctica, em que se verifica o predomínio da frase declarativa, exprimindo frequentemente relações de causa-efeito, de finalidade ou resultado e sequencialidade, razões pelas quais são muito utilizados os elementos conectivos com efeito catafórico e a repetição de estruturas e palavraschave, com efeito anafórico. Abundam as formas passivas por conferirem impessoalidade e fluidez ao discurso e por colocarem mais ênfase nos resultados verificados do que no sujeito agente. da investigação. Na posse destas características, comprovadas através da análise de alguns textos, o aprendente da língua especializada compreenderá e identificará os padrões de funcionamento deste tipo de textos, o que se revela muito eficaz enquanto procedimento preparatório para a posterior construção dos sentidos de um texto particular. Estratégias de ensino-aprendizagem da língua especializada No ensino da língua especializada é produtivo utilizar textos especializados que correspondam às necessidades e conhecimentos específicos dos aprendentes. Encontrando-se em vias de se especializar num determinado campo científico-técnico, os alunos detêm já alguns conhecimentos técnicos e terminológicos que lhes possibilitam oferecerem contributos valiosos ao grupo, incluindo o professor, que tem geralmente uma formação linguística e apenas alguns conhecimentos básicos e gerais da área científico-técnica em causa. São, portanto, duas situações interligadas – por um lado, a utilização de textos reais que activam no aprendente o sentido pragmático de estarem a trabalhar com algo útil e, por outro, a colaboração que pode estabelecer-se entre o professor e os elementos do grupo de aprendizagem – que podem funcionar como factores de motivação. As estratégias de aproximação aos textos deverão evitar o bloqueio susceptível de ser provocado pelas deficiências linguísticas do aluno. Isso consegue-se através de uma apreensão do sentido lato do texto, cabendo ao professor orientar o aprendente para uma gradual compreensão global, recorrendo aos seus conhecimentos anteriormente adquiridos, à língua materna, ao conhecimento prévio dos padrões de funcionamento do discurso científico-técnico, a dados extra-textuais e à própria dinâmica do grupo. Le «sens» d’un texte est perçu au travers de son organisation linguistique, et les articulateurs, les mots-clés, les anaphores, sont autant de repères pour le lecteur, repères qui surgissent du contexte linguistique, mais que viendront éclairer le savoir antérieur du lecteur ainsi que ses connaissances extralinguistiques. (Sophie Moirand, Apud Lavault, 1985 : 90). 105.

(6) Aproximação ao texto especializado Primeiro momento - análise textual A aproximação ao texto científico-técnico tem, portanto, subjacente uma aprendizagem prévia das principais características destes textos e decorrerá em vários momentos. Antes de mais, numa primeira fase, é necessário reconhecer o subgénero a que pertence, para o que se deverá atender às informações de carácter paratextual. Título, notas sobre a origem, tipo de texto, ícones, fotos, desenhos, gravuras, gráficos, efeitos tipográficos, etc. são elementos certamente esclarecedores a esse nível. Antes da realização da leitura propriamente dita, e com o objectivo de a orientar, é útil a pré-colocação de perguntas de carácter geral sobre os conteúdos do texto. Após a leitura integral do texto procede-se à exploração do vocabulário novo, explicando-o ou, preferencialmente, treinando os alunos no exercício da inferência, i.e., aprender a inferir o significado de vocábulos novos pelo contexto em que aparecem. Extraem-se, então, as principais ideias dos diferentes blocos conceptuais – i. e., um ou mais parágrafos gráficos, onde se encontram as informações respeitantes a uma ideia principal. Graças às perguntas colocadas antes da leitura, é agora possível detectar as palavras e afirmaçõeschave que conduzirão às grandes ideias-chave expressas no texto (que podem ser reexpressas pelos alunos e anotadas à margem). Aqui, pode ser útil a convocação de dados extra-textuais (sociológicos, académicos, políticos, culturais, institucionais, etc.) que possam fazer luz sobre as relações semânticas entre os vários elementos do texto. Em seguida, proceder-se-á ao reconhecimento dos modos de construção discursiva e sintáctica do texto, ou seja, procede-se à identificação de procedimentos discursivos como definições, classificações, instruções, etc. e dos recursos gramaticais mais frequentes como, por exemplo, os conectores, a voz passiva, etc. Segundo momento - o lugar da tradução É neste momento do processo lectivo, após uma fase de análise textual, que o recurso à tradução se pode constituir como método complementar de elevada potencialidade. Identificados os parágrafos ou blocos textuais, procede-se à sua tradução, que inevitavelmente leva ao estabelecimento de relações de similaridade e contrastividade entre os mecanismos envolvidos no funcionamento do texto nas duas línguas. Traduz-se também todo o vocabulário novo, aproveitando o 106. exercício para construir glossários bilingues. Pode ainda instaurar-se um debate entre os alunos, na língua materna, sobre os vários sentidos atribuídos ao texto. Terceiro momento - consolidação No terceiro e último momento de aproximação ao texto em língua estrangeira especializada, há um conjunto de vários exercícios que se podem ou não combinar visando uma consolidação da aprendizagem. Revelam-se muito úteis os exercícios de aplicação do novo léxico em frases novas, o treino de definições, quer definindo conceitos ou objectos quer em exercícios de associação entre o conceito e a sua definição. Também é importante a revisão das estruturas sintácticas, a sua reprodução bem como uma reflexão sobre a utilização das mesmas. Uma síntese do texto ou perguntas adicionais, desta feita mais complexas, sobre os conteúdos do texto pode constituir um exercício de recapitulação e de fechamento do círculo. Conclusão Não se pode perder de vista o principal objectivo do ensino-aprendizagem da língua estrangeira especializada, que consiste em apetrechar os aprendentes com um conjunto de estratégias de leitura, em sentido amplo, que os habilitem a lidar com o texto científicotécnico por forma a poderem recorrer a bibliografia especializada nos seus estudos e manejar informações e conteúdos na sua vida profissional. Aprender a ler e a compreender os textos, reconhecer os seus padrões de funcionamento, resumi-los, exprimir ideias e opiniões sobre os temas do respectivo campo de estudos, no cada vez mais curto tempo de contacto de dois semestres lectivos, é uma tarefa que, para ter algum êxito, tem necessariamente que congregar esforços da parte de todos os elementos envolvidos no processo. O recurso ao exercício da tradução, na segunda fase do processo, tem como primeira e mais óbvia vantagem representar uma economia de tempo. A tradução serve para esclarecer conceitos, ideias, terminologia e para confirmar os sentidos do texto que foram sendo construídos durante as actividades da primeira fase, servindo ao mesmo tempo para avaliar a pertinência e o sucesso dessas mesmas actividades. A tradução, utilizada como uma espécie de atalho para o significado desconhecido, constitui-se como um método complementar da análise textual - confirmandoa ou corrigindo-a - , que funciona como factor de motivação e estratégia de desinibição, aumentando a.

(7) autonomia e tornando a aprendizagem mais eficaz. Convém sublinhar que os esforços, acima aludidos, congregados na prossecução deste grande objectivo, traduzem uma concepção de aprendizagem colaborativa que envolve os docentes de outras disciplinas, quer as científico-técnicas propriamente ditas quer a disciplina de Comunicação, no que respeita sobretudo à vertente da escrita académica. Referências CUÉLLAR LÁZARO, Carmen. Un Nuevo Enfoque de la Traducción en la Enseñanza Comunicativa de las Lenguas. Hermeneus, TI, 6, p. 41-57, 2004. DUFF, A. Translation. Oxford : Oxford University Press, 1989. FIGUEIREDO, Vivina Almeida Carreira C. A Tradução como Recurso no Ensino do Inglês Técnico-científico. Specific. Revista de Inglês para Fins Específico. S. Mamede de Infesta,, nº 2, p. 93-100, 2005. GALLARDO, Natividad. Aspectos Metodológicos de la Traducción Científica. In HURTADO ALBIR, A. (ed.), La Enseñanza de la Traducción. Castelló de la Plana: Publicaciones de la Universitat Jaume I, 1996, p. 141159. GAMERO PÉREZ, Silvia. La enseñanza de la traducción científico-técnica. In HURTADO ALBIR, A. (ed.), La Enseñanza de la traducción. Castelló de la Plana: Publicaciones de la Universitat Jaume I, 1996, p. 195199. HOLMES, James S. Translated! Papers on Literary Translation and Translation Studies. Amsterdam: Rodopi, 1994. HURTADO ALBIR, Amparo. La traducción en la enseñanza comunicativa. Cable, nº 1, p. 42-45, 1988. HURTADO ALBIR, Amparo. Traducción y Traductología. Madrid: Cátedra, 2001. HURTADO ALBIR, Amparo (ed.), La Enseñanza de la Traducción. Castellón: Universitat Jaume I, 1996. KIRALRY, Donald. A Social Constructivist Approach to Translator Education. Manchester: St. Jerome, 2000. LAVAULT, E. Fonctions de la traduction en didactique des langues : apprendre une langue en apprenant à traduire. Paris : Didier Érudition, 1985. LÓPES ARROYO, Belén ; FERNANDEZ ANTOLÍN, Martin J. Teaching Scientific English to Translation Students. Specific. Revista de Inglês para Fins Específicos, nº 2, p. 79-91, 2005. MALMKJAER, Kirsten (ed.), Translation and Language Teaching. Language Teaching and Translation. Manchester: St. Jerome Publishing, 1998. MAYORAL ASENSIO, R. Aspectos Epistemológicos de la Traducción. Castellón de la Plana: Universitat Jaume I, 2001.. MOIRAND, Sophie. Approche globale de textes écrits. ELA 23, Juillet 1976, p. 89. RUIZ MONEVA, Maria Angeles. Towards Bridging the Gap: Direct-Textual and Translational Methods in the Teaching of Agricultural ESP Texts. Op. Cit., nº 3: 2000, p. 45-64, 2000. SAGER, Juan C.; DUNGWORTH, David; MCDONALD, Peter F. English Special Languages. Principles and Practice in Science and Technonogy. Wiesbaden: Oscar Brandstetter Verlag, 1980. SÜSS, K. La traducción en la enseñanza de idiomas. In VEGA, M.A. & MARTÍN-GAITERO, R. (eds.), La palabra vertida. Investigaciones en torno a la traducción. Actas de los VI Encuentros en torno a la traducción. Madrid: Universidad Complutense, 1997, p. 57-67. TRIMBLE, Louis, English for Science and Technology. A discourse approach. Cambridge: C.U.P., 1990. Notas De acordo com Sager, “The dependence of special languages on general language is more marked at the syntactic level than at the lexical level since the relatively few special syntactic features do not constitute an independent grammatical system.” (Sager; Dungword; McDonald, 1980: 185) 1. 107.

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