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Dramaturgia em movimento : motion design e o teatro rodriguiano

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Academic year: 2021

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DRAMATURGIA

EM MOVIMENTO

motion design e o teatro rodriguiano

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Universidade Federal do Rio Grande do Norte

LUIZA SAAD DE MOURA

DRAMATURGIA EM MOVIMENTO:

MOTION DESIGN E O TEATRO RODRIGUIANO

Natal/RN, 2018 Centro de Ciências Humanas, Letras e Artes Departamento de Artes

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LUIZA SAAD DE MOURA

DRAMATURGIA EM MOVIMENTO:

MOTION DESIGN E O TEATRO RODRIGUIANO

Projeto referente ao Trabalho de Conclusão de Curso (TCC 2), apresentado como requerimento final para obtenção do título de bacharel em Design pela Universidade Federal do Rio Grande do Norte Orientadora: Dra. Helena Rugai Bastos

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Gostaria de agradecer primeiramente aos meus pais, que são minha inspiração e porto seguro. Obrigada pelo apoio e com-preensão, durante este projeto e em todos os momentos da minha vida. Agradeço à minha irmã Manoela por seu compa-nheirismo, suporte e por ser minha melhor amiga sempre, não importando o que aconteça. Sem seu apoio, amor, paciência e confiança, eu não estaria aqui.

Um agradecimento especial à profa. Dra. Helena Rugai, que me ensinou desde meu primeiro semestre na universidade e aceitou ser a orientadora deste projeto. Obrigada por sair da sua zona de conforto e me acompanhar nesta jornada, que também me tirou da minha zona de conforto. Só você para ter paciência para ler e corrigir meus textos longos e excessivamente explicadinhos. Agradeço, também, às professoras Dra. Elizabeth Romani e Luiza Falcão, por aceitarem compor a banca deste trabalho e me ajudarem a tornar este projeto melhor e mais completo. Vocês são grandes professoras e meu aprendizado de design não seria o mesmo sem suas orientações.

Aproveito para estender meus agradecimentos à profa. Lorena Torres, que, infelizmente, não fez parte da banca deste projeto, mas foi de suma importância na minha formação como desig-ner e ser humano. Obrigada por me mostrar todas as coisas maravilhosas que o design proporciona.

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Gostaria de agradecer a Rafael Veggi, pela paciência em me en-sinar a mexer em diversos aplicativos e pelo entusiasmo em me ajudar na criação das animações. E a Daniel Cavalcanti, por me ajudar tão prontamente com a edição de som. Sem vocês, este projeto não teria chegado ao nível de qualidade que chegou. Obrigada às duas outras partes do Ministério do Amor, Bia e Andri. Entre brigas e risadas, vocês tornaram minha experiência na universidade única, e sei que vamos brigar e rir juntas por muito tempo ainda. Agradeço aos meus amigos do curso e aos amigos de CADe, vocês aliviaram a nostalgia chata que vem acompanhada do fim da graduação.

Meu agradecimento, também, aos amigos de fora do curso, em especial aos meus amigos do IFRN. Tenho muito orgulho de tudo que alcançamos desde nossos quatorze anos, e sei que não seria quem sou hoje se não os tivesse conhecido. Espero ansiosamen-te nosso encontro de 15 anos de amizade, que provavelmenansiosamen-te será a próxima que vamos conseguir nos reunir todos.

Enfim, agradeço a todos aqueles que, direta ou indiretamente, me ajudaram neste TCC, seja me aconselhando, seja me chamando pra beber uma cerveja e me fazendo esquecer dele por algumas horas. Por fim, agradeço àqueles trabalhadores que, no auge da Revo-lução Industrial, assumiram papéis diferenciados nas fábricas. Mal sabiam que, por causa deles, uma menina, séculos mais tarde, entraria em um curso de design e descobriria que ali era seu lugar; que, talvez, ela não era tão louca como pensava. Ou talvez fosse, mas pelo menos não era a única.

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RESUMO

Este trabalho visa o desenvolvimento até a fase do animatics de duas vinhetas baseadas em peças do dramaturgo Nelson Rodrigues, Boca de Ouro (1959) e Senhora dos afogados (1947), e posteriormente a finalização de uma dessas vinhetas. Vê-se este projeto como uma exaltação às title sequences e ao motion

design, áreas muitas vezes esquecidas no design e audiovisual.

Ademais, a vinheta resultante deste trabalho pode ser veicula-da em diferentes meios, divulgando a obra de um dos maiores dramaturgos brasileiros e incentivar o consumo do seu trabalho. A metodologia adotada foi uma adaptação do método proposto por Munari (1981) e tem como base a fundamentação teórica de Bonsiepe (2012; 1978). O método desenvolvido para a produção das vinhetas também adota ferramentas propostas por Lupton (2014; 2013), além de técnicas de animação. A primeira fase metodológica analisou aspectos envolvidos no problema. Na segunda fase, houve a etapa criativa, na qual foram exploradas diversas possibilidades de representar as peças em meio gráfico. Na terceira fase foram empregadas as técnicas de animação para criar os storyboards e os animatics. Propôs-se evoluir as duas ani-mações até essa versão inicial da animação para, então, definir uma vinheta a ser concluída. Na quarta e última fase, a vinheta escolhida, referente à peça Senhora dos afogados, foi finalizada.

PALAVRAS-CHAVE

Motion design, title sequence, vinheta, Nelson Rodrigues, Boca de Ouro, Senhora dos afogados

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ABSTRACT

This monography aims to develop up to the animatics phase two vignettes based on plays by the dramaturgist Nelson Rodrigues,

Boca de Ouro (1959) and Senhora dos afogados (1947), and after

that, to finalize one of those vignettes. This project is an exaltation to title sequences and motion design, subjects often forgotten in design and audiovisual. Besides, the resulting vignette can be carried in different means, publicizing the production of one of the greatest brazilian authors and encouraging the assimilation of his work. The adopted methodology is an adaptation of the method created by Munari (1981) and has its base upon the theoretical fundamentation of Bonsiepe (2012; 1978). The method used for the production of the vignettes also adopts tools proposed by Lupton (2014; 2013), as well as animation techniques. The first me-thodological phase analysed the aspects involved in the problem. In the second phase began the creative part, in which lots of possi-bilities of representing the plays in a graphical way were explored. In the third phase were employed the animation techniques to create the storyboards and the animatics. The idea was to develop both animations until this animatics phase – a sketch version of the animation – so that, it could be decided which vignette would be finalized. In the fourth and last phase, the chosen vignette, about

Senhora dos afogados, was finalized.

KEYWORDS

Motion design, title sequence, vignette, Nelson Rodrigues, Boca

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SUMÁRIO

INTRODUÇÃO 21

1 AUDIOVISUAL E RAMIFICAÇÕES 25

1.1 O SURGIMENTO DO AUDIOVISUAL 25

1.2 A ÉPOCA DE OURO DA ANIMAÇÃO 30

1.3 TITLE SEQUENCES 31 2 NELSON E SUAS OBRAS 39

2.1 A VIDA DE NELSON RODRIGUES 39

2.2 BOCA DE OURO 45

2.2.1 Elementos relevantes em Boca de Ouro 49

2.3 SENHORA DOS AFOGADOS 55

2.3.1 Elementos relevantes em Senhora dos Afogados 60 3 DESENVOLVIMENTO DE PROJETO 71

3.1 METODOLOGIA 71

3.2 PROBLEMATIZAÇÃO 75

3.2.1 Mapas mentais e de conceito 75

3.2.2 Painéis semânticos 80

3.2.3 Pesquisa visual e style frames 82

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3.4 PRODUÇÃO 97 3.4.1 Storyboards 97 3.4.2 Animatics 101 3.4.3 Escolha 104 3.5 IMPLEMENTAÇÃO 105 3.5.1 O produto final 108 CONSIDERAÇÕES FINAIS 111 REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS 113

APÊNDICE A - Painel semântico da peça Boca de Ouro 119 APÊNDICE B - Painel semântico sobre a personagem Boca de Ouro 120

APÊNDICE C - Painel semântico da peça Senhora dos

afoga-dos 121

APÊNDICE D - Painel semântico sobre a personagem Moema 122 APÊNDICE E - Painel semântico sobre a personagem D. Eduarda 123

APÊNDICE F - Painel semântico sobre a personagem Misael 124 APÊNDICE G - Storyboard da vinheta de Boca de Ouro 125 APÊNDICE H - Storyboard da vinheta de Senhora dos afogados 129

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LISTA DE FIGURAS

FIGURA 01 - Ilustração representando o funcionamento do

fenacistoscópio

FIGURA 02 - Zootrópio

FIGURA 03 - “Man/horse (vehicle)”, um dos estudos de

Eadwe-ard Muybridge sobre o movimento animal

FIGURA 04 - Estudo de Etienne-Jules Marey sobre o movimento

humano

FIGURA 05 - Cinematógrafo

FIGURA 06 - Partícula retirada do filme Le Royaume de Fées (O

Reino das Fadas), de Méliès do ano de 1903

FIGURA 07 - Extrato do filme Fantasmagorie, de Émile Cohl, 1908 FIGURA 08 - Mickey Mouse em Steamboat Willie, 1928

FIGURA 09 - Abertura do filme Intolerance, de D.W. Griffith

(1916)

FIGURA 10 - Abertura do filme Modern Times, de Charles Chaplin

(1936)

FIGURA 11 - Title sequence de The Man with the Golden Arm

(1955, dir. de Otto Preminger), por Saul Bass

FIGURA 12 - Um dos cartazes de Saul Bass para divulgação de

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FIGURA 13 - Title sequence de It’s a Mad, Mad, Mad, Mad World

(1963, dir. de Stanley Kramer), por Saul Bass

FIGURA 14 - Title sequence de Anatomy of a Murder (1959, dir. de

Otto Preminger), por Saul Bass

FIGURA 15 - Cartaz de Saul Bass para divulgação de Anatomy of

a Murder (1959, dir. de Otto Preminger)

FIGURA 16 - Title sequence de Ocean’s Eleven (1960, dir. de Lewis

Milestone), por Saul Bass

FIGURA 17 - Storyboard feito por Saul Bass para a abertura do

filme Walk on the Wild Side (1962, dir. de Edward Dmytryk)

FIGURA 18 - Title sequence de Walk on the Wild Side (1962, dir. de

Edward Dmytryk), por Saul Bass

FIGURA 19 - Title Sequence de Dr. Strangelove or: How I Learned to

Stop Worrying and Love the Bomb (1964, dir. de Stanley Kubrick),

por Pablo Ferro

FIGURA 20 - Title Sequence de The Man with the Golden Gun

(1974, dir. de Guy Hamilton), por Maurice Binder

FIGURA 21 - Vinhetas do canal MTV

FIGURA 22 - Title sequence feito por Kyle Cooper para Se7en

(1995, dir. de David Fincher)

FIGURA 23 - Title sequence do filme Fight Club (1999, dir. de

David Fincher), que contou com uma equipe de efeitos especiais para ser feita

FIGURA 24 - Title sequence do filme Lord of War (2005, dir. de

An-drew Niccol), que combinou live action com computação gráfica

FIGURA 25 - Partículas retiradas da abertura da novela Vereda

Tropical (1984, dir. de Jorge Fernando e Guel Arraes), feita

intei-ramente com ilustrações

FIGURA 26 - Partícula da abertura da novela Cordel Encantado

(2011, dir. de Amora Mautner e Ricardo Waddington), que traz o característico estilo nordestino do cordel

FIGURA 27 - Partícula da abertura da novela Velho Chico (2016,

dir. de Carlos Araújo, Gustavo Fernandez, Antônio Karnewale e Philipe Barcinski), que empregou o stop motion e a pintura e entalhe em madeira

FIGURA 28 - Partícula retirada da abertura da novela Deus Salve

o Rei (2018, dir. de Fabrício Mamberti), que utilizou manipulação

gráfica e modelagem 3D

FIGURA 29 - Nelson Rodrigues, como Tio Raul, ao lado de Léa

Garcia na peça Perdoa-me por me traíres, em 1957

FIGURA 30 - Mapa de conceito

FIGURA 31 - Mapa mental de Boca de Ouro

FIGURA 32 - Mapa mental de Senhora dos afogados

FIGURA 33 - Style frame sobre a linguagem em Boca de Ouro FIGURA 34 - Style frame sobre as referências de Boca de Ouro FIGURA 35 - Style frame sobre os conceitos em Boca de Ouro

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FIGURA 36 - Style frame sobre a tipografia em Boca de Ouro FIGURA 37 - Style frame sobre a linguagem em Senhora dos afogados FIGURA 38 - Style frame sobre as referências de Senhora dos afogados FIGURA 39 - Style frame sobre os conceitos em Senhora dos afogados FIGURA 40 - Style frame sobre a tipografia em Senhora dos afogados FIGURA 41 - Geração de alternativas de Boca de Ouro

FIGURA 42 - Geração de alternativas de Senhora dos afogados FIGURA 43 - Fragmentos do animatics de Boca de Ouro

FIGURA 44 - Fragmentos do animatics de Senhora dos afogados FIGURA 45 - Código QR do animatics de Boca de Ouro

FIGURA 46 - Código QR do animatics de Senhora dos afogados FIGURA 47 - Evolução do cenário da escadaria

FIGURA 48 - Fragmentos da vinheta de Senhora dos afogados FIGURA 49 - Código QR da vinheta de Senhora dos afogados

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LISTA DE ILUSTRAÇÕES

ILUSTRAÇÃO 01 - Diagrama representativo da metodologia ILUSTRAÇÃO 02 - Disposição de elementos no storyboard ILUSTRAÇÃO 03 - Extrato do storyboard referente à vinheta de

Boca de Ouro

ILUSTRAÇÃO 04 - Extrato do storyboard referente à vinheta de

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LISTA DE QUADROS

QUADRO 01 - Extrato do painel semântico do Boca de Ouro QUADRO 02 - Extrato do painel semântico de Senhora dos afogados QUADRO 03 - Símbolos utilizados em storyboards e seus significados

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INTRODUÇÃO

Desde o século passado, a área do audiovisual é vista como um meio inovador, que influenciou grandes mudanças na socie-dade e incentivou a criação de tecnologias e métodos inéditos. Este meio, atualmente, é um grande veiculador comercial, cultural e social. Seu início se deu no final do século XIX, com o surgimento do cinema. Durante o século XX, teve um grande crescimento, em razão do surgimento de novas tecnologias, como a televisão e a Internet. Atualmente, o audiovisual é uma área bastante intrincada, multiforme e explorada em suas ramificações, uma delas o motion design. O motion design é visto como uma ferramenta poderosa para ser aplicada em diversos campos, dentre eles as title sequences, que consistem em vinhetas que antecedem obras audiovisuais, para informar ao espectador as pessoas envolvidas no projeto e inseri-los na atmosfera da trama.

Tendo em vista as diversas aplicações das title sequences, das vinhetas e, consequentemente, do motion design, e como seu uso pode enaltecer uma história, e até propor um olhar dife-renciado sobre o enredo, este projeto visa a criação de uma vinheta baseada em uma peça de Nelson Rodrigues. Inicial-mente, foram escolhidas duas peças, inspiradas em duas obras distintas do dramaturgo, para serem trabalhadas. Propõe-se evoluir as duas animações até a fase do animatics – uma versão inicial da animação – para, então, definir uma vinheta a ser con-cluída. Tem-se, então, o desenvolvimento do roteiro,

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elementos gráficos e sonoros –, porém a finalização de apenas uma, trabalhada isoladamente na fase final deste projeto. A escolha por uma peça como base para a vinheta se deu pela trama mais condensada, que permite uma análise e compreensão mais rápidas dos elementos que compõem a história, além de trazer menos detalhes que um romance, por exemplo.

Já a decisão por utilizar as obras rodriguianas se deu pela riqueza de detalhes e de aspectos determinantes de cada peça: elemen-tos clássicos e contemporâneos, que são combinados com maes-tria para criar personagens icônicas e ambientes característicos, compondo a atmosfera única de cada uma de suas histórias. As peças escolhidas se diferem bastante em seus conteúdos, e foram produzidas em períodos distintos da vida do autor.

Senho-ra dos afogados (1947) pertence às obSenho-ras de Nelson que mais se

assemelham às tragédias clássicas gregas, já Boca de Ouro (1959), embora considerada pelo autor uma tragédia carioca, asseme-lha-se muito ao que se considera uma farsa, trazendo elementos tragicômicos e personagens excêntricas que colorem a trama. Desta maneira, com obras tão distintas, será possível criar vinhe-tas com conceitos e estilos bastante diversificados, que exploram diferentes técnicas, cores e traços.

Ademais, Nelson faz uso de elementos estilísticos e cênicos em suas obras, que corroboram a linguagem e o gênero e, sem dúvi-da, ajudam a construir a estética da peça. Isto facilita, pois estes elementos traduzem bem o contexto psicológico das peças, não sendo necessário conceber nenhum elemento do zero.

Nestas vinhetas, será privilegiada uma das funções das title

sequences em específico: a “introdução” dos espectadores à

atmosfera da trama. Como as vinhetas não serão feitas para uma representação específica da peça, e sim para as histórias em si, uma de suas funções primárias – informar sobre elenco e equipe da obra – não será explorada. Ao invés disso, serão informados alguns dados da obra, como nome da obra, nome do autor, e a autoria da vinheta. Considerando que elementos como tipografia e sonoplastia também serão pensados, caso as vinhetas viessem a ser utilizadas para alguma apresentação, seria apenas necessá-rio acrescentar as informações que estão faltando.

Para a elaboração desta monografia, foram consultados livros, dissertações e artigos, buscando compreender o conceito de title

sequence e vinhetas, como elas se relacionam com o motion de-sign, e como se encaixam no panorama do audiovisual, em

espe-cial do cinema e da animação. Também foi de suma importância ler sobre a vida de Nelson Rodrigues para, então, compreender porque suas peças são construídas da maneira que são. Além disso, houve uma extensa análise das obras selecionadas, para compreender como elas se assemelham e diferenciam entre si, e o que cada uma delas significava para o dramaturgo e poderia significar para a crítica e a sociedade em geral.

O produto final deste projeto será uma aplicação não usual do

motion design, o que, por si só, já põe em evidência esta área que,

por vezes, não é reconhecida, além de demonstrar sua plura-lidade, geralmente pouco explorada. A vinheta criada poderá ser veiculada em mídias sociais, por exemplo, e alcançar um

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público que, de outra maneira, não receberia estas informações sobre Nelson e suas peças. Isto ajudará a divulgar o trabalho de um dos maiores dramaturgos do nosso país, incentivando não só a leitura de seus trabalhos, como também a visualização de representações de suas peças, o que impulsiona o meio teatral nacional. Em razão desta combinação inusitada de áreas distintas – o audiovisual, o design e o teatro –, e seu potencial de divul-gação, que traz consigo o reconhecimento e valorização destes domínios, que se vê a importância desta monografia.

A identificação pessoal com este projeto se dá pelo interesse na área do cinema e da animação e, consequentemente, o motion

design. Encanta-me como a combinação de elementos visuais

e, por vezes, sonoros podem exaltar uma obra audiovisual e até gerar algo que seja uma obra de arte por si só. Já a conexão com Nelson Rodrigues se baseia em sua capacidade de ver teor dramático e polêmico até mesmo nas coisas mais corriqueiras da sociedade, e seu talento para demonstrar isso em suas peças, que leio desde os quatorze anos. E não só, seu olhar artístico e sua maestria na criação e utilização de elementos estilísticos e cênicos atribuem às suas peças uma atmosfera excepcional, que envolve os espectadores, e até mesmo aqueles que apenas leram seus trabalhos.

Esta monografia é estruturada em capítulos que apresentam cada assunto analisado. O conteúdo do primeiro capítulo foi embasado a partir de revisão bibliográfica sobre a história do audiovisual, com ênfase no cinema e na animação. Também são apresentados o conceito e o histórico por trás do motion design e

das title sequences. Este capítulo está dividido em duas subpartes: a primeira relata a história do audiovisual, com o início do cinema e da animação; já a segunda trata especificamente sobre title

sequences e como se deu sua evolução ao longo dos anos até a

atualidade, enfatizando nomes que se destacaram nessa área. O segundo capítulo trata sobre a vida de Nelson Rodrigues e apresenta as duas peças escolhidas para o projeto. Para tanto, foi levantada a biografia do autor e consultadas análises an-tropológicas, psicanalíticas e literárias de outros autores sobre as obras do dramaturgo. Ademais, foram lidos e analisados os textos originais das peças de Nelson Rodrigues. Este capítulo se subdivide em cinco partes: a primeira apresenta a vida de Nelson Rodrigues; a segunda descreve e analisa a peça Boca de

Ouro; na terceira parte, são destacados os elementos e aspectos

marcantes dessa trama; a quarta parte relata e discorre sobre a peça Senhora dos afogados; e, por último, são identificados os elementos e aspectos determinantes desta obra.

O terceiro capítulo aborda o desenvolvimento de projeto deste trabalho, etapa por etapa. A aplicação das ferramentas e méto-dos para a criação das vinhetas e os resultaméto-dos obtiméto-dos. O objetivo geral desta monografia é criar, a partir do conceito de motion design e de title sequence, uma vinheta baseada em uma peça de Nelson Rodrigues. Como objetivos específicos des-tacam-se a análise das peças Senhora dos afogados (1947) e Boca

de Ouro (1959); o reconhecimento dos elementos marcantes de

ambas as obras; e a adaptação, a partir da utilização de elemen-tos gráficos, da trama do meio cênico para o meio audiovisual.

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1 AUDIOVISUAL E RAMIFICAÇÕES

O SURGIMENTO DO AUDIOVISUAL

O surgimento do cinema na história não ocorreu isoladamente. Os avanços tecnológicos que resultaram em sua criação tam-bém foram os fatores que iniciaram aquilo que viria a ser a ani-mação. Conforme Bendazzi (2016), “a pré história da animação e a pré história do cinema são a mesma coisa.” (p. 12) [tradução nossa] Não se pode pensar em um sem o outro. O que ocorria em um dos meios, influenciava ambos, de certa forma.

O cinema surgiu como resultado de uma sociedade moderna, que exigia, cada vez mais, rapidez em seus meios de comunica-ção (MACHADO, 2011). A fotografia, que fora um elemento ino-vador no início do século XIX, já não era suficiente para sanar os desejos de uma população que buscava incessantemente pelo desenvolvimento tecnológico. “Cientistas, inventores, fabrican-tes de brinquedos, apresentadores de circo e teatro, e, acima de tudo, o público estavam interessados em apenas uma coisa: movimento.” (BENDAZZI, 2016, p. 12) [tradução nossa]

Sabe-se que o cinema e a animação consistem em sequências de imagens estáticas, que passam mais rápido que a capa-cidade do nosso cérebro de computá-las separadamente, ocasionando um fenômeno chamado “persistência retiniana”. A percepção quando vemos é o movimento; na verdade, a ilusão do movimento. (LUPTON; PHILLIPS, 2014)

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Alguns “experimentos óticos” que se utilizam deste conceito surgiram por volta de 1830, dentre estes, destacam-se o fenacis-toscópio (ou fenaquisfenacis-toscópio) e o zootrópio. O fenacisfenacis-toscópio (Figura 01) consiste em dois discos paralelos, um deles com inci-sões, pelas quais se observava os desenhos no suporte do disco, a sequência de desenhos nos discos apresentava pequenas dife-renças de posicionamento das imagens ou na configuração das formas. A visualização destas imagens sucessivas em uma certa velocidade passavam a impressão de movimento. Já o zootrópio (Figura 02) se resume a um tambor giratório, que possui incisões em sua parte superior e imagens em sua parte inferior. Ao girá-lo e observar pelas incisões, as imagens parecem se mover.

Este fenômeno também foi explorado para fins científicos, por meio de cientistas como Eadweard Muybridge e Etienne-Jules Ma-rey, cujos trabalhos são apresentados nas Figuras 03 e 04, respec-tivamente. Marey e Muybridge, cada um a sua maneira, fizeram uso de câmeras para registrar movimentos de animais e humanos. Estes registros, quando postos em sequência, permitiam àquele que observasse compreender o passo a passo da movimentação e até visualizar a ação em movimento. (MACHADO, 2011)

Em 1890, Thomas Edison e seu assistente Dickson criaram uma má-quina que tirava fotos em sequência e as revelava, chamada cine-tógrafo. No entanto, para assistir as fotos reveladas, era necessário outro dispositivo, denominado cinetoscópio. Esta máquina, também construída por Edison e Dickson, consistia em uma caixa de madeira na qual as pessoas olhavam por um buraco e podiam assistir a ima-gens passando, formando uma curta animação. (RIZZO, 2015)

Figura 01 - Ilustração representando o funciona-mento do fenacistoscópio.

Fonte: site Semema.

Figura 02 - Zootrópio. Fon-te: site Acima da Linha.

Figura 03 - “Man/horse (vehicle)”, um dos estudos de Eadweard Muybridge sobre

o movimento animal. Fonte: Eadweard Muybridge: site Defining Modernities.

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Em 1895, após conhecer as máquinas de Edison, os irmãos Auguste e Louis Lumière criaram um aparato, que desempenhava sozinho a função de tirar fotos, revelar e projetá-las em sequência. Este arte-fato foi chamado de cinematógrafo (Figura 05), e era consideravel-mente menor e mais leve que o cinetógrafo de Edison. (RIZZO, 2015) Os irmãos Lumière abriram espaços denominados cinemas para exibir os filmes que faziam. Em 28 de dezembro de 1895, foi feita a primeira exibição pública de cinema, em Paris. Lá, foram exibi-dos filmes curtos, em preto e branco e sem som. Um em espe-cial, foi o vídeo de um trem deixando a estação, que surpreendeu a plateia. Segundo Machado (2011), apesar da falta de cor e som, os espectadores evocaram os efeitos da realidade e acreditaram ter até visto as barras incandescentes da locomotiva.

Os filmes dos irmãos Lumière tinham um caráter documental, mostravam imagens cotidianas, como um bebê comendo ou pessoas se divertindo no mar. Este estilo cinematográfico foi bastante comum até o início do século XX. Nestas “vistas” ou filmes “naturais”, como eram chamados no Brasil, a câmera per-manecia fixa em algum lugar e registrava a cena que se passava à frente, sem manipulação do cineasta. (BERNARDET, 1980) Em contrapartida ao naturalismo dos irmãos Lumière, temos Georges Méliès. Méliès construiu sua própria máquina inspi-rada no cinematógrafo, porém sua obra se distinguiu, e muito, das obras dos Lumière. Tendo trabalhado com teatro, mágica e fantoches, Méliès descobriu no processo de edição dos filmes que era possível manipular o tempo e o espaço cinematográ-ficos. A partir de então, ele se tornou notório pelos “efeitos Figura 04 - Estudo de Etienne-Jules Marey sobre o movimento humano.

Fonte: site Gréco Casadesus.

Figura 05 - Cinematógrafo. Fonte: site Cinema & Educação.

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especiais” em suas obras. Sua assinatura visual consistia em um grande esmero com seus cenários, figurinos, maquiagens, ilumi-nação, composição; Méliès se envolvia em todos os aspectos de seu filme, toda a mise-en-scéne tinha seu toque pessoal. (RIZZO, 2015) Na Figura 06, é possível notar a composição intrincada em uma cena da obra Le Royaume de Fées, de Méliès.

Méliès se tornou particularmente conhecido por seus filmes fantasiosos e de ficção científica, nos quais ele abusava de efeitos e cores. Sua obra revolucionou a forma de ver o cinema, e, a partir de 1915, percebeu-se nesta arte uma ferramenta poderosa para se contar histórias. Em razão disso, a forma de fazer cinema também mudou. Passou-se, então, a haver uma preocupação com a estrutura narrativa e a relação com o espaço. Aos poucos, os filmes deixaram de apenas relatar os acontecimentos um atrás do outro para apresentar ações con-comitantes e, até mesmo, registrar uma mesma ação de pontos de vista diversos. (BERNARDET, 1980)

Georges Méliès não foi importante somente para o cinema, ele também marcou o mundo da animação. Com ele, foi comprova-do que filmes não precisam apenas reportar situações cotidia-nas e realistas, pode-se mostrar o imaginário e o irreal, univer-sos muito explorados nos filmes animados.

Além de Méliès, Bendazzi (2016) afirma que outro ponto que influenciou no surgimento da animação foi a técnica quadro a quadro. Esta técnica consiste em registrar as imagens

separadamente, cada imagem um pouco diferente da ante-rior, e juntá-las posteriormente. Com esse procedimento,

Figura 06 - Partícula retirada do filme Le Royaume de Fées (O Reino das Fadas), de Méliès do ano de 1903. Fonte: site Daily Motion.

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era possível aos cineastas alguns efeitos especiais, como objetos se movendo sozinhos.

Foi a partir desta técnica que, em 1908, Émile Cohl lançou

Fan-tasmagorie. Este vídeo de apenas dois minutos foi um divisor de

águas na história da animação, em especial por definir um novo gênero de filmes que, a partir de então, seriam conhecidos por filmes animados. Com um gênero estabelecido, as animações passaram a apresentar características específicas do gênero, como a ocorrência de fenômenos que não necessariamente precisam apresentar verossimilhança. Por exemplo, um elefan-te se metamorfosear em uma casa (Figura 07), como ocorre em

Fantasmagorie. (BENDAZZI, 2016)

Nos anos que seguiram, a animação e o cinema foram explo-rando diferentes técnicas e processos, e obtendo resultados variados em qualidade e apelo ao público. A popularização de filmes com som, que se deu em 1928, foi um grande mar-co para ambos os meios, de formas variadas. Enquanto no cinema, o som se tornou mais um elemento que permitiu ao cineasta aproximar seu filme de uma impressão da realidade, na animação, os sons nem sempre coincidiam com as imagens mostradas. Isto era feito com o intuito de trazer um viés cômico e fantasioso. Em Steamboat Willie (1928), primeiro filme de Walt Disney que trazia Mickey Mouse como personagem, quando Mi-ckey bate nos dentes de uma vaca (Figura 08), o som resultante é de um xilofone (BENDAZZI, 2016). Pouco a pouco, o cinema e a animação foram se afastando quanto a sua linguagem fílmica, tornando-se entidades independentes e singulares.

Figura 07 - Extrato do filme

Fantasmago-rie, de Émile Cohl, 1908. Fonte: site Casa

de la historia Diana Uribe.

Figura 08 - Mickey Mouse em Steamboat

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A ÉPOCA DE OURO DA ANIMAÇÃO

Conforme Bendazzi (2016), a época entre 1928 e 1951 foi considerada a Época de Ouro da animação, um fato que não é estranho se considerarmos a situação do mundo durante essa época. A quebra da Bolsa de Nova York em 1929, a Grande De-pressão, a Segunda Guerra Mundial, tudo isso contribuiu para que a população se voltasse para o mundo da fantasia, já que a realidade não parecia tão promissora.

Durante estes anos, os filmes animados geralmente eram feitos para dois propósitos: publicidade para empresas ou para o cine-ma. Destes últimos, acreditava-se que as animações seriam mais chamativas ao público se tivessem um personagem principal nas histórias. Isso se deu, principalmente, nos Estados Unidos, como resultado do sucesso dos estúdios Disney. (BENDAZZI, 2016) Com o surgimento e popularização da televisão, os filmes anima-dos migraram para a TV em formato de séries animadas (também conhecidas como cartoons). O resultado foi uma queda da produ-ção de animaprodu-ção para o cinema. Os filmes animados se reinventa-ram ao longo das décadas de 1980 e 90, graças aos avanços tecno-lógicos da época, em especial o computador (BENDAZZI, 2016). Os animadores que fugiram do conceito de um personagem chave para seus filmes se enveredaram por ramos mais experi-mentais da animação, ramos que trabalhavam com cores, sons, texturas e movimentos; sem a necessidade de uma personagem ou linha narrativa clara. Vargas (2013) aponta que, nestas iniciati-vas, é possível observar o desenvolvimento do motion design.

De acordo com o Motion Plus Design (2012) – o primeiro centro de exibição dedicado exclusivamente ao motion design – o

motion graphic design (ou apenas motion design) é a arte de dar

vida ao design gráfico usando a animação. Ele pode ser aplica-do a textos, fotos, ilustrações, ícones. Embora a fronteira entre

motion design e animação seja difusa, pode-se dizer que, nos

filmes de animação, há uma narrativa na qual as personagens se expressam. Já no motion design, mesmo com a presença de personagens, elas não se expressam diretamente.

Assim como a animação, os primórdios do motion design tam-bém são vinculados ao cinema. Sua ascensão se deu na década de 1940, com Oskar Fischinger e Norman McLaren – que se utilizavam do movimento de figuras geométricas para demons-trar expressividade em seus filmes abstratos (ARNHEIM, 2014) – e avançou ainda mais na década seguinte, pelos trabalhos de designers como Saul Bass. Esta arte teve um grande salto com a revolução digital, que se deu especialmente a partir dos anos 1990 (VARGAS, 2013). Hoje em dia, o motion design se faz presente nos meios audiovisuais com poesias cinéticas, clipes musicais e, principalmente, title sequences.

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TITLE SEQUENCES

No universo do motion design, encontram-se as title sequences, que consistem nas aberturas e encerramentos de programas de TV, filmes, videogames, dentre outros. Não existe uma defi-nição específica das áreas em que as title sequences podem ser aplicadas, porém sabe-se que elas são responsáveis por trazer o nome da obra que está sendo introduzida (podendo, tam-bém, trazer informações extras sobre a obra, caso hajam) e por introduzir o espectador à atmosfera e à história que eles estão prestes a testemunhar (INCEER, 2007).

Conforme Inceer (2007), as primeiras title sequences surgiram por volta da década de 1920. Os filmes mudos traziam, em sua abertura, as informações concernentes à obra escritas em um papel, que era fotografado ou filmado e incorporados ao filme. Na Figura 09, tem-se um exemplo retirado do filme Intolerance (1916), de D.W. Griffith.

Na década seguinte, com a introdução do som e do uso de cores nos filmes, as aberturas evoluíram, porém permaneceram bastante instáveis. Por vezes, nem eram mostradas nas salas de cinema. Geralmente, utilizava-se uma tipografia que fosse con-dizente ao gênero do filme e, algumas vezes, essas informações passavam enquanto filmava-se, em um ponto fixo, uma pai-sagem ou objeto (INCEER, 2007). O filme Modern Times (1936), de Charles Chaplin, apresenta o nome do filme enquanto, ao fundo, são mostrados os ponteiros de um relógio (Figura 10). Figura 09 – Abertura do filme Intolerance, de

D.W. Griffith (1916). Fonte: site Christian Annyas.

Figura 10 - Abertura do filme Modern Times, de Charles Chaplin (1936). Fonte: site Max

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A grande revolução das title sequences se deu com Saul Bass, que foi uma das grandes figuras do design e cinema do século XX; sua car-reira se estendeu de 1936 até 1996. Ao final da década de 1950, ele, além do trabalho como designer gráfico, passou a trabalhar criando aberturas para filmes. Ele, juntamente com sua esposa Elaine, tam-bém fez curtametragens, alguns nominados, e até vencedores, do Oscar. Saul foi vastamente premiado, tanto como designer, quanto como cineasta. Sua área de atuação foi muito diversificada, incluin-do comerciais, aberturas de programas de televisão, embalagens, capas de álbuns, anúncios, capas de livros, brinquedos, exibições, dentre outras tantas coisas (BASS; KIRKHAM, 2011).

Seu trabalho com title sequences começou na década de 1950, com Carmen Jones (1954, dir. de Otto Preminger). Um de seus tra-balhos mais conhecidos se deu no ano seguinte, que foi a abertura de The Man with the Golden Arm (dir. de Otto Preminger), como mostrado na Figura 11. Já na Figura 12, tem-se um dos cartazes criados por Bass para a divulgação do filme.

Segundo Bass e Kirkham (2011), Saul Bass acreditava que as

title sequences tinham por função criar a atmosfera e definir o

humor do filme, além de transicionar o espectador da realidade para o universo da trama. Suas title sequences variavam de for-ma a concordar com a obra, for-mas nas vinhetas em que se fazia uso da animação, é possível perceber alguns elementos co-muns: a presença de ícones gráficos fortes e corpos humanos, ou partes dele. Ele também tinha uma primazia com o uso das cores em seus trabalhos, utilizando desde paletas com cores fortes e saturadas até pequenas nuances de cores pastéis.

Figura 11 - Title sequence de The Man with the Golden Arm (1955, dir. de Otto Preminger), por Saul Bass. Fonte: site Art of the Title.

Figura 12 - Um dos cartazes de Saul Bass para divulgação de The Man

with the Golden Arm (1955, dir. de Otto Preminger). Fonte: site Christian

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As title sequences de Saul prezam pela redução, pelo minima-lismo, assim como pelo uso de metáforas e ambiguidades. Detalhes em suas vinhetas, por vezes, guardam particularidades da própria trama da obra. Além disso, percebe-se o bom uso das grades construtivas, mesmo que as formas criadas por Saul nunca sigam criteriosamente o formato geométrico. Seu estilo de desenho, que se assemelha ao cartoon, também é bastante característico. Na Figura 13, tem-se a title sequence criada por Bass para o filme It’s a Mad, Mad, Mad, Mad World (1963, dir. de Stanley Kramer), na qual o estilo cartoon é explorado.

Ele também reconhecia a importância de uma tipografia ade-quada, sabendo que esta era vital para a criação da atmosfera da realidade fílmica. Como em Anatomy of a Murder (1959, dir. de Otto Preminger), Saul optou por um lettering com letras em tama-nhos variados e inconsistentes (Figura 14). Cada versão de cada letra se difere, da mesma maneira que, no filme, cada versão dos eventos é diferente e contraditória (BASS; KIRKHAM, 2011). Na Fi-gura 15, tem-se um dos cartazes criados por Bass para o mesmo filme. Nele, as cores são exploradas, ao contrário da title sequen-ce em si, na qual o preto, o branco e os tons de cinzas dominam. Bass também sabia que o impacto visual de suas title

sequen-ces seria potencializado, se combinado com uma trilha sonora.

Ele explorava as possibilidades de casar o visual ao sonoro, de maneira a causar o maior impacto e deslumbramento possível no espectador. Um bom exemplo desta combinação primo-rosa se dá na abertura de Ocean’s Eleven (1960, dir. de Lewis Milestone), na qual elementos gráficos animados são combina-Figura 13 - Title sequence de It’s a Mad, Mad, Mad, Mad World (1963, dir.

de Stanley Kramer), por Saul Bass. Fonte: site Art of the Title.

Figura 14 - Title sequence de Anatomy of a Murder (1959, dir. de Otto Preminger), por Saul Bass. Fonte: site Art of the Title.

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dos com uma música agitada para passar o clima de Las Vegas e seus cassinos (Figura 16). Bass também teve esse esmero em

Walk on the Wild Side (1962, dir. de Edward Dmytryk), no qual

os movimentos do felino coincidem com a música de jazz que toca ao fundo (Figuras 17 e 18).

Sua capacidade em trazer tantos significados e emoções, a partir de elementos simples, e seu talento em explorar uma cena com jogos de câmera e efeitos não muito dispendiosos o eternizaram não apenas como designer, mas como um dos grandes nomes do cinema e o principal nome quando falamos em title sequences. “Bass não apenas reinventou as aberturas de filme, mas também as tornou uma forma de arte”. (INCEER, 2007, p. 12) [tradução nossa]

Outro grande nome que marcou essa área foi Pablo Ferro. Ferro começou a trabalhar com design na década de 1950, e permanece em atividade até hoje. Suas title sequences se destacam especialmente pelo uso das tipografias. Alguns de seus trabalhos mais conhecidos são Dr. Strangelove or: How I

Learned to Stop Worrying and Love the Bomb (1964, dir. de

Stan-ley Kubrick) – como apresentado na Figura 19 –, The Thomas

Crown Affair (1968, dir. de Norman Jewison), Bullit (1968, dir. de

Peter Yates), Midnight Cowboy (1969, dir. de John Schlesinger),

A Clockwork Orange (1971, dir. de Stanley Kubrick), Beetlejuice

(1988, dir. de Tim Burton) e The Addams Family (1991, dir. de Barry Sonnenfeld).

Figura 15 - Cartaz de Saul Bass para divulgação de Anatomy of a Murder (1959, dir. de Otto Preminger). Fonte: site MoMA.

Figura 16 - Title sequence de Ocean’s Eleven (1960, dir. de Lewis Milesto-ne), por Saul Bass. Fonte: site Art of the Title.

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Figura 17 - Storyboard feito por Saul Bass para a abertura do filme Walk

on the Wild Side (1962, dir. de Edward Dmytryk). Fonte: Oscars.

Figura 18 - Title sequence de Walk on the Wild Side (1962, dir. de Edward Dmytryk), por Saul Bass. Fonte: site Art of the Title.

Figura 19 - Title sequence de Dr. Strangelove or: How I Learned to Stop

Worrying and Love the Bomb (1964, dir. de Stanley Kubrick), por Pablo

Ferro. Fonte: site Art of the Title.

Figura 20 - Title sequence de The Man with the Golden Gun (1974, dir. de Guy Hamilton), por Maurice Binder. Fonte: site Art of the Title.

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Desta mesma época, também é importante citar Maurice Binder. Sua carreira começou na década de 1950, mas atingiu maior su-cesso a partir da década seguinte. Ele é conhecido principalmente por suas title sequences feitas para os filmes da saga James Bond, com ênfase na icônica abertura de Dr. No (1962, dir. de Terence Young). Binder se destacou pelo bom emprego das cores em suas title sequences, como pode ser visto na title sequence de The Man

with the Golden Gun (1974, dir. de Guy Hamilton), na figura 20.

Com o surgimento de novas tecnologias a partir da década de 1980, as title sequences passaram a apresentar mais efeitos. A estreia da MTV, em 1981, também trouxe mudanças nas aber-turas de filmes e programas de TV, que passaram a trazer mais elementos gráficos e informações, e apresentar uma velocidade mais rápida de acontecimentos (VARGAS, 2013). A Figura 21 apresenta algumas das vinhetas criadas para o canal.

Na década de 1990, surgiu outro grande nome nesse campo de atuação, o diretor e designer Kyle Cooper. Cooper combina bem o uso de novas tecnologias com métodos e visuais mais antigos, conferindo a suas title sequences uma aura sinistra e sombria. Na Figura 22, tem-se a title sequence criada para o filme Se7en (1995, dir. de David Fincher).

Em 1990 e 2000, as title sequences se tornaram elaboradas ao ponto de haver uma grande equipe por trás de sua criação. Algumas vinhetas combinam não só tipografia, imagens e sonoplastia, mas também efeitos especiais e até a utilização de 3D, como é o caso de

Fight Club (1999, dir. de David Fincher), apresentado na Figura 23,

e Lord of War (2005, dir. de Andrew Niccol), mostrado na Figura 24.

Figura 21 - Vinhetas do canal MTV. Fonte: site Raw Volume.

Figura 22 - Title sequence feito por Kyle Cooper para Se7en (1995, dir. de David Fincher). Fonte: site Art of the Title.

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Apesar de suas diversas aplicações atuais, o cinema permanece a principal área na qual se deu o desenvolvimento das title

sequen-ces ao longo da história. Isto pois, antigamente, a área do cinema

permitia experimentações e efeitos que não poderiam ser testados na televisão, por exemplo (BENDAZZI, 2016). Atualmente, as title

sequences podem ser vistas em vinhetas de canais de televisão,

aberturas de programas de TV, desenhos animados, videogames, filmes, novelas, dentre outros meios audiovisuais.

No Brasil, uma demonstração relevante das title sequences se dá no ramo das novelas, tendo seu ápice a partir da entrada do designer alemão Hans Donner na Rede Globo, em 1975. Segundo o site Me-mória Globo, Donner trabalhou na identidade visual da Rede Globo, em aberturas de programas e diversas novelas e na cenografia de programas jornalísticos do canal. Donner também foi responsável pela criação do departamento de design da Globo, o Videographics. O departamento se encarrega das aberturas da emissora. Vale sa-lientar que, apesar da televisão e do cinema serem meios distintos, as title sequences de ambos são similares, tanto em função, quanto em elementos, como pode ser visto nas Figuras 25 a 28, que mos-tram partículas retiradas de aberturas de novelas da Globo, antigas e atuais e que empregam técnicas de produção diversas.

Figura 23 - Title sequence do filme Fight Club (1999, dir. de David Fincher), que contou com uma equipe de efeitos especiais para ser feita. Fonte:

site Art of the Title.

Figura 24 - Title sequence do filme Lord of War (2005, dir. de Andrew Niccol), que combinou live action com computação gráfica. Fonte: site

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Figura 25 - Partículas retiradas da abertura da novela Vereda Tropical (1984, dir. de Jorge Fernando e Guel Arraes), feita inteiramente com ilustrações. Fonte: site e10blog - Nos bastidores da teledramaturgia.

Figura 26 - Partícula da abertura da novela Cordel Encantado (2011, dir. de Amora Mautner e Ricardo Waddington), que traz o característico

estilo nordestino do cordel. Fonte: site AdoroCinema.

Figura 27 - Partícula da abertura da novela Velho Chico (2016, dir. de Carlos Araújo, Gustavo Fernandez, Antônio Karnewale e Philipe Barcinski), que em-pregou o stop motion e a pintura e entalhe em madeira. Fonte: site GShow.

Figura 28 - Partícula retirada da abertura da novela Deus Salve o Rei (2018, dir. de Fabrício Mamberti), que utilizou manipulação gráfica e

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2 NELSON E SUAS OBRAS

A VIDA DE NELSON RODRIGUES

A tragicidade da visão de Nelson fica esclarecida e justificada com as múltiplas experiências trágicas que ele viveu em sua família, e nos fazem sentir a necessidade premente de tor-nar a ler sua obra dramática, onde a presença da morte, dos perigos do ciúme e do adultério, das implacáveis consequ-ências de escolhas e atos explodem nas ações avassaladoras que tanto chocaram leitores e espectadores de sessenta anos atrás. (HELIODORA, 2015)

Para escrever este item, foram utilizados como base o livro de Castro (1992), assim como os textos autobiográficos do próprio dramaturgo, posteriormente reunidos e organizados no livro

Memórias: a menina sem estrela (2015).

Nelson Rodrigues nasceu em Recife, Pernambuco em outubro de 1912. Filho de Mário Rodrigues, jornalista e político, e Maria Esther; Nelson foi o quinto dos quatorze filhos do casal. Em 1916, partiu com a família (ainda não tão populosa) para a, então, capital federal, Rio de Janeiro.

Era uma criança muito inteligente e, desde cedo, já se atentava a questões como o pudor, a morte e o sexo. Ainda adolescente, começou a trabalhar no jornal do pai, A Manhã, na seção

poli-cial. Ali, mesmo com o simples trabalho de ligar para as delega-cias em busca de uma notícia, Nelson passou a ter contato com diversos crimes passionais, que viriam a ser notórios em suas

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histórias. Mesmo naquela época, ele já impunha aos relatórios trazidos pelos repórteres de campo um tom dramático, que im-pressionava a todos. Os casos que mais o interessavam eram, sem dúvidas, aqueles nos quais um casal de jovens namorados se matavam por algum motivo simbólico.

Com mais de uma década de residência dos Rodrigues na cida-de do Rio cida-de Janeiro, a situação econômica familiar melhorou consideravelmente. Nelson, em 1927, abandonou a escola e passou a se dedicar a seu emprego no jornal, sendo promovido à seção dos editorialistas, escrevendo artigos assinados, junto a grandes nomes, como Monteiro Lobato.

Em 1928, em razão de questões econômicas, Mário Rodrigues perdeu o jornal A Manhã para seu sócio. Semanas depois,

lançou o jornal Crítica, que foi considerado seu jornal mais

célebre. Nelson acompanhou o pai na mudança e passou a tra-balhar no novo jornal, na seção de esportes, outra paixão sua. No ano seguinte, passou por uma experiência que deixou marcas profundas. Testemunhou um atentado contra seu irmão mais velho, Roberto, que morreu em razão da ocorrên-cia: um crime passional que, na verdade, visava seu pai, Mário Rodrigues, em represália a uma notícia lançada por seu jornal. Nelson, em suas memórias, afirmou: “[...] o meu teatro não seria como é, nem eu seria como sou, se eu não tivesse sofrido na carne e na alma, se não tivesse chorado até a última lágrima de paixão o assassinato de Roberto.” (2015, p. 89)

Não muito tempo depois da perda de Roberto, o patriarca da família, Mário Rodrigues, morreu, em 1930, de encefalite aguda

e hemorragia. Mais uma tragédia familiar permeando a vida de Nelson, que creditava a morte de seu pai à tragédia de seu irmão: “Foi uma tragédia que quase destruiu minha família. Pensei, em certos momentos, que nenhum de nós sobreviveria; e que aquilo era o fim de cada um e de todos. Foi o fim de meu pai, que mor-ria dois meses depois. A mesma bala que se cravou na espinha de Roberto, ah, matou o velho Mário Rodrigues.” (2015, p. 90) No dia em que completou dezoito anos, há a notícia de que a mulher que assassinou seu irmão mais velho foi absolvida. Ain-da em 1930, o jornal Crítica deixou de ser lançado em função

da revolução que abalou as mídias impressas e levaram Getúlio Vargas – que era criticado ferozmente pelo jornal – ao poder. A partir de então, a queda social e econômica da família se iniciou. Tentativas de arrumar emprego fracassadas, vendas de objetos familiares e despejos de inúmeras casas marcaram os próximos meses da família, até que, em 1931, Nelson e seus ir-mãos conseguiram emprego em alguns jornais cariocas. Apesar de novamente empregados, a renda dos irmãos era o suficiente apenas para sustentar a família, nada mais.

Acometido por paixões súbitas e melancolias profundas, além da fome propriamente dita, Nelson vivia tão profunda e tragicamente quanto suas personagens. Em 1934, adoeceu em razão da tuberculose e teve que ir para Campos do Jordão se tratar, permanecendo lá por catorze meses. Lá no Sanatorinho, como era chamado o local de tratamento, Nelson escreveu sua primeira “peça”: um sketch cômico sobre a situação dos que estavam ali internados, estrelando os próprios enfermos.

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Mesmo depois de ter sido liberado para voltar para casa, a do-ença o acompanhou durante quinze anos, fato que o levou a ter pelo menos cinco recaídas graves nos anos a vir. Além dele, seu irmão mais novo, Joffre, também descobriu possuir a doença e, em 1936, foi para um sanatório em Petrópolis se tratar, Nel-son o acompanhou. Ao final de sete meses no sanatório, Joffre morreu. Nelson testemunhou seu sofrimento e, mais uma vez, assistia à morte de um familiar.

Não muito depois, a doença voltou a se manifestar e Nelson teve de retornar ao sanatório em Campos de Jordão para se cuidar, onde permaneceu alguns meses. De volta ao Rio, reto-mou seu trabalho no jornal O Globo, desta vez como crítico de

óperas e peças de teatro.

Durante o ano de 1938, a doença não o afligiu e Nelson iniciou um relacionamento com Elza Bretanha, que começara a traba-lhar na redação de O Globo. Apesar da desaprovação da mãe

da menina, o casamento foi marcado para maio de 1939. Um mês antes do casamento, Nelson teve de voltar ao Sanatorinho por causa de outra recaída da tuberculose, permanecendo lá quatro meses. O casamento, enfim, ocorreu em 1940. Em meados de 1941, com Elza grávida de seu primeiro filho, escreveu sua primeira peça: A mulher sem pecado. A peça só foi levada aos palcos depois de mais de um ano e muita insistência do autor, porém não obteve resposta positiva do público. Em janeiro de 1943, escreveu Vestido de Noiva, que teve sua estreia dia 28 de dezembro daquele ano. A obra foi um sucesso e o consagrou como dramaturgo.

Se Nelson obteve uma grande resposta com Vestido de Noiva, o alvoroço trazido por Álbum de Família, sua terceira peça, não poderia ter sido preconizado. A peça, de 1946, foi proibida em todo o país pela Censura Federal por incitar ao crime e conter temas como incesto. A liberação só veio em 1965 e a peça foi levada ao público pela primeira vez em 1967.

Nos anos que seguiram, mais peças polêmicas foram escritas:

Anjo Negro, em 1946; Senhora dos afogados, em 1947; e Dorotéia,

em 1949. Destas, apenas Anjo Negro foi levada aos palcos na época, as outras duas peças foram interditadas pela Censura. Além das peças, Nelson escreveu folhetins nesta época sob o pseudônimo de Suzana Flag. Depois se tornou correspondente de um correio sentimental no jornal, sob o pseudônimo de Myrna. Em 1951, escreveu o monólogo Valsa nº 6, que não teve pro-blemas com a Censura, porém, tampouco obteve sucesso com o público. Nesta mesma época, começou a trabalhar no jornal

Última Hora, no qual publicou as crônicas de “A vida como ela

é…”, que trouxeram mais frutos que suas últimas peças. Nelson voltou às boas graças do público em 1953 com sua peça

A falecida, uma trama tipicamente carioca que, embora

clas-sificada como tragédia, trazia quês de comédia que a torna-vam agradável e destoante das últimas peças que escrevera. Também conseguiu que sua peça Senhora dos afogados fosse liberada e levada ao público no ano seguinte, pela primeira vez desde que fora escrita, em 1947.

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Em 1957, Nelson escreveu Perdoa-me por me traíres e chocou a todos quando, pela primeira vez, foi aos palcos como tio Raul, uma das personagens chave da trama (Figura 29). A peça foi re-cebida de maneira negativa pelo público, sendo até censurada logo após sua estréia. Porém, após ter sido liberada mais uma vez, perdurou por dois meses a mais que os dez dias planeja-dos. Só que com outro ator no papel de tio Raul, pois Nelson declarou, ali, o fim de sua carreira de ator. Naquele mesmo ano,

Viúva, porém honesta foi escrita e levada aos palcos.

No ano seguinte, lançou Os sete gatinhos, que foi considerada por alguns sua melhor peça, e rechaçada por uns tantos ou-tros. Odiada ou não, a peça teve casa cheia durante toda sua permanência em cartaz.

Em 1959, Nelson escreveu Boca de Ouro, que foi interditada por alguns meses. Em 1960, foi apresentada em São Paulo, onde não obteve sucesso; no Rio, no ano seguinte, deu-se o contrá-rio. Ainda em 1961, Beijo no Asfalto também foi a cartaz e, ape-sar da trama polêmica, permaneceu rodando por sete meses, a maior duração de uma peça de Nelson Rodrigues. A duração da peça culminou com a saída de Nelson do jornal Última Hora,

onde trabalhava, e seu ingresso no Diário da Noite e,

poste-riormente, em O Globo.

Em 1963, Nelson se separa de Elza e casa com Lúcia Cruz Lima, que estava grávida de um filho seu. Neste mesmo ano, é lan-çada a peça Bonitinha, mas ordinária ou Otto Lara Resende, em homenagem ao amigo mineiro de Nelson.

Figura 29 - Nelson Rodrigues, como Tio Raul, ao lado de Léa Garcia na peça Perdoa-me por me traíres, em 1957. Fonte: site Funarte.

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Daniela, terceira filha declarada de Nelson (a primeira de seu relacionamento com Lúcia), nasceu prematura de seis meses e houve severas complicações em razão disso, a exemplo da paralisia cerebral, além da mudez e da cegueira. O primeira ano da criança foi passado em uma tenda de oxigênio. Nelson, em suas memórias (2015, p. 50-3), afirma que desde jovem acredi-tava que ficaria cego um dia; no final das contas, aconteceu algo bem pior: a “maldição” foi passada para sua filha.

Ainda neste ano, Boca de Ouro foi adaptada para cinema com di-reção de Nelson Pereira dos Santos. Filmagens de Bonitinha, mas

Ordinária e Anjo Negro já haviam sido anunciadas para compor

aquele movimento que estava apenas se iniciando, o Cinema Novo. Ao contrário de Bonitinha, mas Ordinária e Boca de Ouro que obtiveram considerável sucesso, o filme de A Falecida foi um fiasco comercial, embora tenha sido premiado em festivais. O fracasso do filme afetou, e muito, Nelson e seu filho Joffre, que tiveram que vender imóveis para tentar quitar a dívida deixada. Em razão disso, Nelson aceitou escrever telenovelas, escreveu três ao todo, que rodaram nos anos de 1963 e 64 (não sem sofrer alguns empecilhos com a censura, como de praxe): “A morta sem espelho”, “Sonho de amor” e “O desconhecido”.

Em 1965, foi aos palcos Toda nudez será castigada, que obteve bastante sucesso apesar da dificuldade em encontrar atores que estivessem dispostos a encená-la. Ainda endividado, Nelson tinha a televisão como sua maior fonte de renda. Seu programa de entrevistas na TV Globo, “A cabra vadia”, fez considerável sucesso, mas não o suficiente para que fosse sua única fonte de

renda. Nelson ainda escrevia textos para outros programas e colunas de jornal para dar conta dos gastos.

Em 1966, o irmão mais velho de Nelson, Mário Filho, morreu de um enfarte fulminante, deixando para trás livros escritos e uma sólida carreira como jornalista esportivo. Sua esposa, Célia, matou-se no ano seguinte bebendo veneno.

No ano seguinte, Nelson se junta ao Correio da Manhã, jornal no

qual começou a escrever uma coluna com suas memórias que, posteriormente, foram reunidas no livro Memórias: a menina sem estrela (o subtítulo foi dado em homenagem a sua filha,

Daniela). Em fevereiro deste mesmo ano, o irmão de Nelson, Paulo Rodrigues, morreu, juntamente a sua esposa, sogra e filhos, quan-do o prédio onde morava desabou por causa de uma tempestade. Sobre a morte de seus dois irmão, Nelson escreveu:

Quando meu irmão Mário Filho morreu, escrevi que a morte é anterior a si mesma. Ela começa muito antes, é toda uma luminosa e paciente elaboração. [...] O que me pergunto é se também Paulinho, sua mulher, seus filhos, sua sogra come-çaram a morrer antes. E só peço que nem meu irmão, nem meus sobrinhos, nem minha cunhada tenham percebido nada. Imagino uma morte compassiva, sem tempo para o medo e para o grito. (2015, p. 37)

Em 1969, após oito anos de relacionamento, Nelson separou-se de Lúcia e foi morar com Helena Maria, 35 anos mais jovem que ele.

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Na década de 1970, Nelson teve complicações médicas em virtude de um problema que já tratava há anos: sua úlcera. Estava com duas úlceras perfuradas e, durante sua estadia de alguns dias no hospital a espera de cirurgia, sofreu uma bron-copneumonia, uma parada respiratória e um enfarte. Quando pôde voltar para casa, passou a necessitar de cuidados médicos 24 horas por dia. Não muito tempo depois, em janeiro de 71, voltou a se sentir mal e teve de ser internado com insuficiência coronária aguda. Enquanto estava internado, pediu para que Helena Maria saísse da casa onde moravam juntos.

Em 1972, Nelsinho, o caçula de Nelson com Elza, foi preso e torturado pelos militares. Nos últimos dois anos havia se mantido na clandestinidade e se tornado um elo importante do grupo revolucionário MR-8, que lutava contra a ditadura militar. Nelson só pôde ver o filho cerca de uma semana depois de sua captura e o fez visitas sempre que pôde, durante os sete anos em que o filho permaneceu preso.

Nestes anos, a família de Nelson se tornou ainda menor: seu irmão, Milton, morreu em 72 de uma trombose cerebral; e sua mãe, Maria Esther, faleceu no ano seguinte de um edema pul-monar. Ainda neste ano, Arnaldo Jabor lançou o filme de Toda

nudez será castigada, que foi um sucesso de público e crítica e

foi enviado para o Festival de Berlim, porém foi censurado e retirado dos cinemas. Nos anos seguintes, Jabor fez mais adap-tações de obras de Nelson para o cinema, algumas bastante aclamadas como A dama do lotação, de 1978.

Em 1974, após oito anos sem escrever peças, Nelson lança

Anti-Nelson Rodrigues. A partir deste ano, Nelson passou a

apresentar quadros de saúde cada vez mais agravados, muitos em consequência da tuberculose que o afligira na juventude. Apesar das ordens médicas que já se repetiam há anos, Nelson permaneceu fumando até o fim de sua vida.

Em 77, Nelson e sua primeira (e, oficialmente, única) esposa, Elza, decidem voltar a morar juntos. Nos últimos anos, o casal se reaproximou, especialmente em razão da prisão de Nelsinho. Em 1979, Nelson escreveu sua última peça, A serpente.

No dia 21 de dezembro de 1980, aos 68 anos, Nelson faleceu de trombose e de insuficiência cardíaca, respiratória e circulatória. Naquele dia, durante a partida de futebol, esporte que tanto amava, do Brasil contra a Suíça, fez-se um minuto de silêncio durante o jogo em sua homenagem.

As obras de Nelson Rodrigues marcaram a literatura, o teatro, a televisão e o cinema brasileiro, tornando-o uma das figuras mais influentes e, certamente, polêmicas do país no século XX.

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BOCA DE OURO

Boca de Ouro foi escrita por Nelson Rodrigues em 1959. Anos

mais tarde, ela foi classificada, pelo crítico Sábato Magaldi (sob aprovação do próprio dramaturgo), como uma de suas tragé-dias cariocas. Segundo Medeiros (2010), os fatores principais

que definem esta categoria são as referências (sub)urbanas cariocas, a linguagem informal e as gírias comuns da época. Nestas tragédias cariocas, a cidade do Rio de Janeiro marca forte-mente a narrativa, tornando-se, ela também, uma personagem. Em Boca de Ouro, o local de destaque na peça é o bairro da Ma-dureira, que “é o lugar em que o protagonista [o bicheiro Boca de Ouro] se criou e desenvolveu seu poder dominador. É igualmen-te o espaço de onde os fatos são narrados e o meio de D. Guigui, que narra os acontecimentos.” (MEDEIROS, 2010, p. 157) [grifo nosso] Nelson gostava de situar suas peças com personagens de classe média e no subúrbio pois acreditava que isso doava um certo tom poético às histórias. “É como se essas tragédias, que Nelson considerava inerentes à condição humana e universais, encontrassem seu meio expressivo mais significativo quando situadas no subúrbio [...]”. (FACINA, 2004, p. 172)

Apesar de ser considerada uma tragédia, Boca de Ouro contém pitadas de humor e elementos cômicos. Segundo Henrique Oscar (Diário de Notícias, 1961, apud MEDEIROS, 2010, p. 50), apesar de ser definido como uma tragédia, “o espetáculo ainda mais que a leitura demonstra que não se trata de um texto trá-gico mas altamente cômico, muito mais de uma farsa à maneira

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de ‘A falecida’ que de uma pretensa tragédia, qualquer que seja o sentido atribuído à expressão [...]”.

Isso se dá porque, de acordo com Medeiros (2010), Lins afirma que Nelson “explora a tragédia num tom de deboche”, o que ex-plicaria porque os jornalistas viam suas peças como “tragédias malsucedidas”. (p. 56)

A trama consiste em um repórter, Caveirinha, que, diante da notícia do assassinato do famoso bicheiro Boca de Ouro, visita uma de suas ex-amantes, na esperança de obter um furo de notícia. Nos três atos que seguem, Dona Guiomar (ou Guigui, como é chamada) – que agora é casada e mora com seu mari-do, Agenor, e seus filhos – narra um acontecimento que se deu entre o Drácula de Madureira (como Boca de Ouro era chama-do) e o casal, Leleco e Celeste.

A questão é que, a cada nova narração, a história se altera. Isso se dá porque, na primeira vez que conta a história, D. Guigui não sabia da morte do bicheiro. A segunda vez, ao ser informa-da de sua morte, o retrata de forma muito mais bondosa que outrora. Já a terceira vez, conta uma versão que poderia ser considerada mais verdadeira que as outras duas, porém não se pode saber com certeza. Percebe-se, então, que Guigui não é uma narradora confiável. “Isto porque as narrativas de dona Guigui estão fortemente ligadas às suas impressões, obedecen-do, no decorrer da entrevista, à instabilidade de seus humores e de suas emoções”. (BRAZ, 2004, p. 19)

Xavier (2003) afirma sobre as versões contadas por D. Guigui:

No plano imediato, no primeiro dos flashbacks vale o des-peito pelo Boca de Ouro (afinal, foi ‘chutada’ por ele). Depois, vale a dor da notícia da morte do herói e o ressentimento dirigido ao marido Agenor (feliz com a novidade). Na última versão, vale o clima de reconciliação com o marido (manipu-lada pelo jornalista esperto). Assim, Boca é vilão na primeira versão, depois herói virtuoso e, finalmente, um assassino de mulheres. E a imagem do casal também varia: uma forma de, simbolicamente, Guiomar falar das disposições mais fundas dela própria diante da situação vivida no triângulo com Agenor e o bicheiro [...] (XAVIER, 2003, p. 241) E ainda aprofunda:

Na primeira versão, há o desejo de Boca de Ouro, a inocên-cia de Celeste e a esperteza de perna curta do marido, que sabe desse desejo. [...] No segundo caso, Guigui quer redi-mir o ex-amante e constrói a inocência do Boca, acentuando a falta de caráter do casal. [...] Na terceira versão, não há resíduos de inocência ou de emoções desarmadas; valem o mal que resulta do cálculo, o ritual perverso e a armadilha. [...] Nessa terceira versão, a dimensão gótica do Boca ganha lugar e, de navalha na mão, fala sobre seu poder divino de vida e de morte. (p. 241-4)

Ao final da peça, ainda não se pode definir quem era, verdadei-ramente, Boca de Ouro. Os únicos momentos em que o vemos sem intermédio de outra personagem são na primeira cena – na qual o vemos num consultório de dentista e pede para que seus dentes sejam extraídos e substituídos por uma dentadura

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de ouro, o que explica a origem de seu pseudônimo. Em todos os outros momentos, Boca aparece como uma “figura refletida no espelho dos outros, uma personagem em segundo grau que, por isso mesmo, diz tanto sobre seu contexto quanto sobre si mesma [...]” (XAVIER, 2003, p. 231).

Alguns fatos sobre Boca de Ouro, que são de conhecimento público, são sua emblemática dentadura de ouro, seu desejo de ser enterrado em um caixão de ouro – que já estava sendo feito – e sua procedência humilde, já que foi abandonado por sua mãe quando nasceu, deixado em uma pia de gafieira. As condições infames de seu nascimento, fazem com que o bichei-ro se torne obcecado pela ideia de um enterbichei-ro digno de reis. Xavier (2003) afirma que “os traços decisivos da personalidade do protagonista estão associados aos dados adversos de sua origem social, acrescidos a particularidade humilhante do Boca, nascido num banheiro de gafieira” (p. 231).

Nas narrações de D. Guigui, percebe-se que Boca se deslumbra com a hipótese de se equiparar a um deus asteca, como apontou uma das grã-finas, e se considera sobrehumano, alguém que não pode ser morto, pelo menos não até alcançar seu objetivo.

“BOCA DE OURO (abrindo seu riso) – Batuta, você pensa que vai me matar? Comigo você tomou bonde errado! Você não sabe, ninguém sabe, mas olha: eu estou fazendo um caixão de ouro. Ouro, rapaz! Enquanto o caixão não ficar pronto, ninguém me mata, duvido!” (RODRIGUES, 2004, p. 234) Em outro momento, conversando com Leleco, ele afirma:

LELECO – Pronto?

BOCA DE OURO – O caixão de ouro? Ainda não. Não há pres-sa. Pra que pressa? (ri, alvarmente)

LELECO – Você pode levar um tiro! [...] Ou facada! BOCA DE OURO (feliz da vida) – Batuta, eu tenho o corpo fechado! (RODRIGUES, 2004, p. 246-7)

Embriaga-se tanto com a ideia de poder que esta acaba por se tornar sua ruína. As condições de sua morte tornam sua situ-ação ainda mais ordinária, pois perdeu seu símbolo de poder, seus dentes, e não se consagrou como objetivava após sua morte. “Sua tragédia estará cristalizada, acima de tudo, nessas duas perdas no momento da morte inesperada, que lhe sonega a ocasião da pompa: dentes de ouro arrancados, caixão tosco de madeira.” (XAVIER, 2003, p. 232) Ele, que tanto queria se distanciar de sua origem humilde, morre “fraco e pobre como o mais fraco e pobre dos seres” (PELLEGRINO, 2004, p. 284) Agora voltemos o foco para as histórias contadas por D. Guigui. O ocorrido que ela relata não teve repercussão na mídia, o que torna ainda mais difícil saber o que é verdade e o que não é. Na primeira versão relatada, Celeste e Leleco são um casal apai-xonado que passa por dificuldades financeiras, e, com a recente demissão de Leleco e a morte da mãe de Celeste, resolvem pedir dinheiro emprestado ao bicheiro. Nesta versão, Boca de Ouro é um homem monstruoso e excessivamente agressivo, que tem um interesse por Celeste e vê na situação uma oportunidade de tirar proveito. Boca se dispõe a emprestar cem mil cruzeiros, com a condição que seja Celeste que vá buscar o dinheiro, sozinha.

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