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Práticas de EDS em Educação de Adultos

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Práticas de EDS em Educação de Adultos

Courela, C. & César, M.

Escola Sec. Manuel Cargaleiro e Universidade Aberta; Universidade de Lisboa, Instituto de Educação conceicaocourela@yahoo.com & macesar@ie.ul.pt

Introdução

Na população portuguesa em idade escolar, a persistência de fenómenos de insucesso académico, abandono precoce e saída antecipada do sistema educativo, designadamente no 3º ciclo do ensino básico (Rosa, 2004; Strecht, 2008), aliados à ausência crónica de uma política educativa pública estruturada e persistente de educação/formação de adultos (Lima, 2005), colocam a população adulta portuguesa numa situação crítica, no que respeita a habilitações académicas: 71,6% da população atingiu como escolaridade máxima o 3º ciclo do ensino básico; destes, 61,1% concluíram, no máximo, o 6º ano de escolaridade (INE, 2002). Esta situação, associada a uma escassa participação cívica da população adulta portuguesa (Eurostat, 2007), tornam pertinentes a mobilização/desenvolvimento de capacidades e competências relacionadas com a EDS.

O ensino recorrente constituiu uma segunda oportunidade para os adultos obterem diplomas equivalentes aos do ensino regular. Todavia, a nível do 3º ciclo do ensino básico recorrente, a inadaptação de grande parte do público-alvo às características do sistema de ensino por unidades capitalizáveis (SEUC) conduziu ao insucesso académico e ao abandono escolar (Pinto, Matos, & Rothes, 1998). Como alternativa ao SEUC, houve a possibilidade de se constituírem, na escola, currículos em alternativa, adaptados a públicos-alvo específicos, procurando promover o sucesso académico dos adultos e tornar a escola mais inclusiva (Ainscow & César, 2006). Os currículos em alternativa ao 3º ciclo do ensino básico, estabelecidos ao abrigo do Despacho 22/SEEI/96 (Gabinete da Secretária de Estado da Educação e Inovação - GSEEI, 1996) possibilitam práticas pedagógicas como o trabalho colaborativo, designadamente sob a forma de trabalho de projecto. Na praxis desenvolvida nos trabalhos de projecto colaborativos podem estar presentes as “(…) três dimensões na relação através da qual a prática é a fonte de coerência da comunidade (...) 1) um empenhamento mútuo (mutual engagement), 2) um empreendimento conjunto (joint enterprise) e 3) um reportório partilhado (shared

repertoire)” (Wenger, 1998, p. 72-73). Como refere Roth (2003), o conceito de comunidade de aprendizagem (Lave &

Wenger, 1991) tem sido utilizado pelos educadores para a criação de ambientes de aprendizagem vocacionados para a EDS.

O trabalho de projecto colaborativo promove a emergência de interacções sociais ricas que, associadas a um contrato didáctico (Brosseau, 1988; Schubauer-Leoni, 1986) diferente do habitual, com uma distribuição mais equitativa do poder entre o educador e o educando adulto, bem como a tarefas de aprendizagem diversificadas e significativas, que facilitam a apropriação de conhecimentos e a mobilização/desenvolvimento de competências complexas, tais como saber observar, discutir, argumentar, analisar pontos de vista diferentes do próprio e tomar decisões fundamentadas (César, 2003), constituem-se como práticas facilitadoras da manutenção e do desenvolvimento de comunidades de aprendizagem (Lave & Wenger, 1991). Conforme a participação dos intervenientes na comunidade de aprendizagem vai deixando de ser periférica, transformando-se numa participação legítima (Lave & Wenger, 1991), há um crescente assumir de protagonismo pelos participantes (Courela, 2007; Courela & César, 2004, 2006, 2007, 2009, in press). A temática ambiental e o desenvolvimento sustentável, pela relevância que assumem no quotidiano, enquanto configuradores da qualidade de vida, constituem-se como focos de interesse dos participantes, propícios à realização de trabalhos de projecto colaborativos, com o envolvimento activo dos participantes numa comunidade de aprendizagem, processo que proporciona a vivência de uma cidadania maximizante (Evans, 2000).

À EA está associado um passado histórico rico e documentos como a Carta de Belgrado (UNESCO, 1975) e a Declaração de Tbilisi (UNESCO/UNEP, 1977). A EDS surgiu nos discursos politicos e académicos, desde o final da década de 80, do século XX. Como referem Mckeown e Hopkins (2003), a EDS associa-se ao Relatório Brundtland (World Commission on Environment and Development, 1987) e à Agenda 21 (ONU, 1992). Na conferência internacional de Tessalónica, o desenvolvimento sustentável foi apresentado assente em três pilares: ambiente/ecologia, economia e sociedade (Scoullos, 2004). Por sua vez, estes três pilares estão ancorados na educação para o ambiente e para a sustentabilidade (Scoullos, 2004).

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Enquanto a EA desenvolveu, principalmente, abordagens conservacionistas e de promoção de atitudes e comportamentos ditos pró-ambientais (Freitas, 2005; Mckeown & Hopkins, 2003), não se centrando nas questões sociais, a EDS tem dado maior relevo às problemáticas sociais (Fleer, 2002). Por vezes, o constructo de desenvolvimento sustentável tem sido apropriado e instrumentalizado pela ala neo-liberal (Freitas, 2005; González-Gaudiano, 2006); procura-se manter a qualidade de vida dos que usufruem dos recursos naturais, secundarizando os povos que vivem nos territórios onde esses recursos são extraídos. Nesta perspectiva, as desigualdades sociais são consideradas inevitáveis e arredadas do cerne do debate. Não é esta a EDS que pretendemos, mas uma EDS comprometida com a sustentabilidade, com posturas assertivas face ao poder político, bem como uma disposição para intervir nas comunidades escolar, educativa e social (Courela & César, 2006, 2007, 2009). Tilbury e Goldstein (2003) salientam que a EDS deve extravasar da educação formal, alargando-se à comunidade social e promovendo a literacia ambiental. Enquanto educadores, a actual Década da Educação para o Desenvolvimento Sustentável (DEDS) (UNESCO, 2005) constitui-se como uma inegável oportunidade para a operacionalização do compromisso que assumimos para com as gerações futuras, através da promoção da EDS, em cenários de educação formal, que possibilitem o envolvimento activo e a apropriação deste compromisso pela sociedade.

Metodologia

Esta investigação insere-se no projecto Interacção e Conhecimento que, durante 12 anos (1994/95 a 2005/06), estudou e promoveu interacções sociais em cenários de educação formal. Este estudo inclui-se no Nível 2 do referido projecto (César, 2003, 2009), relativo a projectos de investigação-acção, em que professores de diversas disciplinas e níveis de escolaridade estudam e implementam formas de trabalho colaborativo durante pelo menos um ano lectivo (César, 2007; Hamido & César, 2009). Durante o curso com currículo em alternativa recorrermos à investigação-acção, por se adequar à abordagem de problemas concretos, localizados numa situação imediata para o investigador (Pazos, 2002) com vista à sua melhoria (Kumpulainen, Hmelo-Silver, & César, 2009). Esta opção apresenta um carácter de intervenção (McNiff & Whitehead, 2002), concordante com os propósitos deste trabalho: a (co)construção de uma alternativa curricular dirigida a adultos pouco escolarizados. A este projecto seguiu-se um follow up, com sete anos de duração e que se encontra em curso, que nos tem permitido compreender os impactos que as práticas têm para os agentes envolvidos no processo (McNiff & Whitehead, 2002), nomeadamente em termos de promoção da EDS nas comunidades escolar, educativa e social (Courela, 2007).

Adoptámos uma abordagem interpretativa (Denzin, 2002), histórico-cultural e institucionalmente situada (Hamido & César, 2009; Kumpulainen et al., 2009). Esta investigação tem inspiração etnográfica (Hamido & César, 2009): realização de trabalho de campo prolongado, ênfase no processo, preocupação com os sentidos que os sujeitos atribuem às suas acções, existência de um design de investigação flexível, a descrição e a indução (André, 1991). Após a conclusão do curso, o projecto de investigação-acção e o follow up constituiram-se como um estudo de caso intrínseco (Stake, 1995).

Participaram neste estudo os sete estudantes, seis do género feminino e um do género masculino, com idades compreendidas entre os 18 e os 45 anos (à data de início do curso), a professora/investigadora, que leccionava Educação Ambiental (EA), os professores do conselho de turma, uma técnica da Divisão de Ambiente da Câmara Municipal do Seixal (CMS), crianças, educadoras e monitoras de jardins-de-infância e centros de Actividades de Tempos Livres (ATL) dos concelhos de Seixal e Sesimbra, bem como alunos e professores de escolas dos 1º, 2º e 3º ciclos de ambos os concelhos. São ainda participantes diversos adultos pertencentes a associações do concelho, que desenvolvem práticas artesanais, bem como uma formadora de artes plásticas, que se deslocaram à comunidade escolar, para partilharem os seus saberes com os restantes participantes. Nos instrumentos de recolha de dados destacam-se a observação participante, entrevistas semi-estruturadas, tarefas de inspiração projectiva e os trabalhos realizados pelos estudantes.

A planificação do currículo em alternativa foi efectuada pelo conselho de turma e decorreu no 3º período do ano lectivo de 1999/2000, tendo sido objecto de recolha documental e de registos no diário de bordo da professora/investigadora. O currículo em alternativa foi implementado e avaliado do ano lectivo de 2000/2001 a

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2002/2003. Neste currículo existiam três componentes de formação: geral, sócio-cultural e vocacional (Escola Secundária Manuel Cargaleiro – ESMC, 2000). A EA pertencia à componente sócio-cultural, estando presente nos 1º e 2º anos do curso. Em EA implementámos o trabalho colaborativo, principalmente sob a forma de trabalho de projecto.

Resultados

Apresentamos dois trabalhos de projecto realizados pela turma na componente curricular de EA e que envolveram as comunidades escolar, educativa e social. Os temas dos trabalhos de projecto resultaram das preocupações e interesses dos estudantes e correspondem a situações debatidas em grupo, relativamente às quais os participantes desejavam intervir na comunidade escolar e social, contribuindo para a minimização de algumas situações que punham em causa o desenvolvimento sustentável na região, numa perspectiva de concretização da Agenda 21 (ONU, 1992) a nível local.

O trabalho de projecto Aprender a Separar para mais tarde Reciclar foi realizado no 3º período do ano lectivo de 2000/2001. Decorreu do interesse dos estudantes pela temática dos resíduos sólidos urbanos (RSU). Redigiram um texto dramático com o mesmo título e dramatizaram-no com fantoches, que construíram, bem como todo o cenário (ver Figura 1).

Figura 1 – Apresentação da peça

O texto tem dois actos: no primeiro, a propósito de uma situação do quotidiano, duas crianças estabelecem um diálogo acerca da separação dos RSU, tendo em vista a separação, a redução, a reutilização e a reciclagem; o segundo acto decorre junto aos ecopontos, que entram em diálogo com as personagens, aprovando ou corrigindo a deposição que estas fazem dos RSU. Este texto dramático encontra-se registado na Inspecção Geral das Actividades Culturais e ao dispor da comunidade educativa (Courela, 2005, 2007). A peça foi apresentada na escola, no final de 2000/2001. Desde então tem sido apresentada pelos estudantes, por professoras estagiárias, educadoras e monitoras em jardins-de-infância e escolas maioritariamente do 1º ciclo do ensino básico, mas também dos 2º e 3º ciclos do ensino básico dos concelhos de Seixal e Sesimbra. O público segue a peça com atenção, coloca questões pertinentes e, nas tarefas de inspiração projectiva (TIP) solicitadas às crianças (textos e/ou desenhos), no final da peça, estas revelam ter compreendido a mensagem, como se ilustra com a TIP apresentada na Figura 2.

Numa das apresentações, a técnica da CMS avalia muito positivamente este trabalho de projecto, como relata:

E, inclusivamente, eles tinham feito aquela modelação de vozes, que houve muito empenhamento da parte deles na construção da peça. E acho que estava muito interessante. E também tinha... eh... Portanto, tinha conteúdos de sensibilização mas de uma forma muito, muito, a brincar, a brincar, mas realmente eles tocaram aspectos muito importantes em termos de ambiente... (E, técnica da CMS).

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A técnica da CMS destaca o envolvimento dos estudantes neste trabalho de projecto, bem como o contributo deste trabalho para a sensibilização/educação para o desenvolvimento sustentável das comunidades escolar, educativa e social, numa perspectiva de promoção da cidadania (Courela, 2007). A este respeito, uma das estudantes narra:

Sim, gostei de ter Educação Ambiental porque aprendi coisas que eu não sabia em relação ao ambiente. O contacto, aquilo que nós devemos fazer em casa, os cuidados com a separação do lixo e também ensinou-me muita coisa que eu, por exemplo, ao meu marido e ao meu filho tento transmitir aquilo que aprendi na escola, em relação ao ambiente. Como se deve fazer as coisas. O cuidado que se deve ter com o ambiente. (E, Alzira)

Figura 2 – TIP elaborada por uma criança do 3º ano

A Alzira refere que tenta sensibilizar as pessoas que lhe estão mais próximas, de forma a promover comportamentos ambientalmente correctos, o mesmo se passando com outra estudante, a Daniela que relata:

(…) foi uma luta com a separação do lixo. Era a coisa mais simples, chegar e meter... eu tenho lá dois baldes, que é para separar mas mesmo assim eu quando vou lá vejo tudo junto! Eu ao princípio falava com eles várias vezes, mas chegou a uma determinada altura que eu desisti... (E, Daniela)

Outra estudante, a Luísa revela que alterou muitos dos seus comportamentos: “Por exemplo, eu mandava lixo para o chão, não tinha o trabalho de o pôr... (...) e... por exemplo, vou fazer a reciclagem [separação], faço tudo correcto...” (E, Luísa).

Este trabalho de projecto permitiu, aos estudantes, sentirem-se valorizados pelos elementos das comunidades escolar, educativa e social, como evidencia o seguinte excerto de uma entrevista a uma das estudantes:

Gosto, gosto mesmo, isto mostra que nós trabalhámos bem, gosto disso. Por exemplo, parece que divertiram-se mais com o teatro (…) nos fantoches as pessoas riram-divertiram-se, acharam piada. Até chegaram a ir crianças (…) para cantarem lá no palco, a música que nós fizemos... (E, Luísa)

No 2º e parte do 3º períodos realizámos um trabalho de projecto denominado Ateliê Imaginar, Reutilizar e

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criativa e artisticamente os materiais, contrariando o consumismo, contribuindo, assim, para o desenvolvimento sustentável. Os objectivos estabelecidos pelos participantes foram os seguintes:

- Reconhecer materiais e objectos que possam ser reutilizados, para as suas funções habituais ou outras, de carácter utilitário ou decorativo;

- Promover o desenvolvimento de hábitos de economia, contrariando o consumismo; - Estimular a criatividade;

- Incentivar o desenvolvimento de aptidões técnicas e de perícias manuais, permitindo simultaneamente a expressão de capacidades individuais;

- Promover atitudes de apropriação do trabalho realizado e de valorização dos materiais, numa perspectiva de conservação dos recursos naturais;

-Desenvolver competências na área da informática (processamento de texto), tal como antes fora solicitado pelos alunos;

- Promover o convívio intergeracional;

- Desenvolver e mobilizar competências necessárias à sensibilização/educação das comunidades escolar, educativa e social para o desenvolvimento sustentável.

Neste sentido, a turma concretizou diversas tarefas, em que a contribuição da partilha de saberes foi importantíssima, nomeadamente:

- Realização de um ateliê de construção de instrumentos musicais: chincalhos, matracas, tambores, carrilhão vertical, xilofone de água, pau de chuva, lixas e adufe, usando desperdícios de materiais, dinamizado pela técnica da CMS (ver Figura 3).

- Elaboração de textos descritivos da construção dos instrumentos, usados na exposição final e que permitiram desenvolver e mobilizar competências de processamento de texto.

- Concretização de um ateliê de construção de brinquedos: barcos, bonecas, carrinhos, robbots, utilizando desperdícios, orientado pela técnica da CMS (ver Figura 4).

- Realização de um ateliê de construção de objectos decorativos com base na aplicação de uma pasta de papel em diversos objectos (caixas de cartão, caixas plásticas e placas de madeira), utilizando pincéis espalmados. Após secagem da pasta de papel, os objectos foram pintados, seguindo-se a aplicação de

goldfinger, um produto dourado. Por fim, os objectos foram decorados com flores, recortes de papéis

coloridos, botões, fitas, etc. Este ateliê foi dinamizado por uma formadora de um centro de dia para idosos e pela professora de EA (ver Figura 5)

- Realização de um ateliê de construção de objectos decorativos e adornos diversos aproveitando o material usado nas collants de senhora, revestindo armações feitas com arame flexível e que representam chapéus ou flores, orientado por um elemento de um centro de dia para idosos (ver Figura 6).

- Realização de um ateliê de construção de objectos decorativos em madeira e conchas, utilizando desperdícios, dinamizado por um artesão do concelho (ver Figura 6 – com produtos finais – e Figura 7 – com imagem do ateliê).

- Apresentação de uma exposição final de todos os trabalhos e abertura dos ateliês à comunidade educativa (ver Figura 8).

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Figura 3 – Instrumentos musicais (na exposição/ateliê)

Figura 4 – Ateliê de construção de brinquedos (início da construção de um robbot e produto final)

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Figura 6 – Pregadores, objectos decorativos em madeira e cartão

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Figura 8 – Momento de experimentação dos instrumentos musicais na abertura da exposição/ateliê, (instrumentos

musicais construídos foram usados para musicar um poema escrito pelo artesão, sobre a temática do ambiente)

Na exposição/ateliê final estiveram presentes os elementos da comunidade educativa e todos os dinamizadores dos diversos ateliês (ver Figura 9).

Figura 9 – Elementos da comunidade social que colaboraram connosco

Os ateliês constituíram-se como espaços de troca de saberes e de aprendizagem/experimentação de formas de actuação mais sustentáveis, no que respeita aos recursos naturais, contribuindo, para a EDS dos participantes. Num ambiente securizante, cada adulto pode mostrar o que sabia fazer e desenvolver outras competências. Uma das estudantes narra a importância destas aprendizagens para o seu quotidiano: “Aprendi muita coisa, aprendi que material na minha casa que já não fazia necessidade, aprendi com o ateliê que podia fazer muitos brinquedos, por exemplo, para

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os meus irmãos, hã...” (E, Luísa). A exposição/ateliê foi avaliada de forma muito positiva pelos visitantes das comunidades escolar e social, como ilustram os seguintes registos:

Figura 10 – Comentário de visitante da exposição/ateliê

Figura 11 – Comentário de outro visitante da exposição/ateliê

Além da exposição dos trabalhos, havia oportunidade de experimentar as diversas técnicas e construir alguns objectos, sob orientação dos dinamizadores externos e dos estudantes da turma, o que constituiu, muito provavelmente, o aspecto menos conseguido do trabalho de projecto, como os estudantes referiram, em conversa informal, no próprio dia, pois os visitantes quase se limitaram a observar os objectos e a conversar a respeito do que observaram, sem passarem à experimentação. No entanto, estas conversas informais serviram para reforçar a possibilidade de cada um construir objectos, utilizando recursos já considerados sem utilidade, evitando o consumo de novos recursos. Como a turma tinha decidido, este trabalho foi divulgado a toda a comunidade escolar, através da publicação de um artigo no jornal da escola A Outra Margem.

Os participantes planificaram, operacionalizaram e avaliaram os trabalhos de projecto. Este processo revelou-se rico e participado, tendo contribuído para a consolidação da comunidade de aprendizagem (Lave & Wenger, 1991) e para a vivência de uma cidadania crítica e participativa. Os estudantes realçaram a relevância e o interesse dos conhecimentos apropriados, a oportunidade de trabalhar colaborativamente com os outros participantes e a satisfação pelo reconhecimento público dos trabalhos. Os professores da turma, auxiliares da acção educativa (como à data eram designados os assistentes operacionais) e cidadãos que participaram em diversas actividades desenvolvidas no âmbito dos trabalhos de projecto, também salientaram a pertinência dos mesmos, bem como o envolvimento dos estudantes e dos diversos participantes nas actividades, sublinhando o impacto que estes projectos tinham tido na educação para o desenvolvimento sustentável, nas comunidades escolar, educativa e social (Courela, 2005, 2007; Courela & César, 2004, 2006, 2007, 2009, in press).

Estes trabalhos de projecto não se limitaram a constituírem-se como trabalhos criativos e artísticos, embora essa também tenha sido uma das suas vertentes. Em todos os projectos houve a identificação e discussão de uma situação considerada problemática (equivalente ao tema gerador), uma reflexão sobre as acções em curso e as desejáveis em relação a essa situação e a (co)construção de formas de acção capazes de contribuírem para a sustentabilidade das formas de actuação dos cidadãos. Portanto, tratou-se de uma acção enquadrada pela reflexão, de modo a gerar-se uma nova acção mais esclarecida (Tozoni-Reis, 2006). Como refere Roth (2003), o tratamento de temas ambientais de forma lúcida e moderada facilita a emergência e desenvolvimento de uma comunidade de aprendizagem e, como pudemos observar, a EDS tem, também, esta potencialidade

Dado que, na maior parte das intervenções, o público-alvo dos trabalhos de projecto foram crianças é de esperar, de acordo com Marcos (2010) e Uzzel, Fontes, Jensen, Vognsen, Uhrenholdt, Davallon e Kofoed (1998), que

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estas amplifiquem esta acção de educação para o desenvolvimento sustentável desenvolvida através da participação nestes trabalhos de projecto, junto dos adultos significativos com quem interagem.

No follow up efectuado aos estudantes estes têm considerado os trabalhos de projecto realizados em EA como os acontecimentos mais significativos do curso. A circunstância de continuarem a participar em acções de sensibilização/educação para o desenvolvimento sustentável, após terem concluído o curso, ilumina como foi importante, para estes adultos, a participação nesta comunidade de aprendizagem e a relevância que atribuem ao desenvolvimento sustentável (Courela, 2005, 2007; Courela & César, 2004, 2006, 2007, 2009, in press).

Uma vez que alguns produtos dos trabalhos de projecto realizados em EA continuaram (e continuam) a ser utilizados por elementos das comunidades escolar, educativa e social, na escola, no âmbito do Programa Eco-Escolas, noutras escolas e em cursos de formação profissional para públicos adultos qualificados, que deles se apropriaram, recriando a sua utilização junto de outros públicos-alvo, existem evidências empíricas da sua riqueza, enquanto facilitadores da educação para o desenvolvimento sustentável (Courela & César, 2004; 2007, 2009, in press).

Considerações Finais

Este caso ilumina os contributos da presença da componente de Educação Ambiental, num currículo de educação/formação de adultos pouco escolarizados, enquanto promotora da constituição e desenvolvimento de uma comunidade de aprendizagem. A participação dos estudantes nesta comunidade de aprendizagem tornou-os cidadãos activos, dotados dos conhecimentos e das competências que os tornam capazes de agir, em prol do ambiente e do desenvolvimento sustentável. Estas acções são mantidas por um espírito crítico e reflexivo que permite, a estes adultos, suscitarem nos outros, com quem interagem, uma reflexão crítica capaz de transformar as práticas e tornar o meio mais sustentável. Este caso ilustra, também, a possibilidade dos professores se assumem como construtores de currículo, e não apenas como meros executores. Desta forma, o currículo pode constituir uma poderosa ferramenta mediadora entre os conhecimentos e vivências dos estudantes e os conhecimentos e culturas académicas (César & Oliveira, 2005), tornando a educação formal de adultos um campo promissor para a EDS, a base do Desenvolvimento Sustentável (Scoullos, 2004).

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Nota: O projecto Interacção e Conhecimento foi parcialmente subsidiado pelo IIE, em 1996/97 e em 1997/98, medida SIQE 2, e pelo CIEFCUL, desde 1996. Agradecemos aos orgãos de gestão da escola onde decorreu a investigação, Escola Secundária com 3º CEB Manuel Cargaleiro o acesso aos dados necessários e a autorização para divulgarmos o nome da referida escola. O nosso agradecimento também para os participantes no estudo, pela disponibilidade para a realização do mesmo, bem como aos colegas do grupo de investigação, cujos trabalhos e discussões nos permitiram progredir.

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Figura 1 – Apresentação da peça
Figura 2 – TIP elaborada por uma criança do 3º ano
Figura 3 – Instrumentos musicais (na exposição/ateliê)
Figura 7 – Momento no ateliê dinamizado por Armindo, em que este orienta duas estudantes
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Referências

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