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A INCONSTITUCIONALIDADE DA INDETERMINAÇÃO TEMPORAL DA MEDIDA DE SEGURANÇA À LUZ DO CÓDIGO PENAL E DA CONSTITUIÇÃO FEDERAL DO BRASIL

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Derecho y Cambio Social

A INCONSTITUCIONALIDADE DA INDETERMINAÇÃO TEMPORAL DA MEDIDA DE SEGURANÇA À LUZ DO CÓDIGO PENAL E DA CONSTITUIÇÃO FEDERAL DO

BRASIL

Larissa de França Campos1

Fecha de publicación: 01/05/2016

Sumário: Introdução. 1.- A medida de segurança como sanção

penal do estado. 2.- Aplicação e extinção da medida de segurança. 3.- O prazo indeterminado de duração das medidas de segurança. Considerações finais.

Resumo: O presente trabalho tem como objetivo o estudo da Medida de Segurança, analisando o conflito existente em torno do seu prazo indeterminado de duração. Busca demonstrar que o parágrafo primeiro do artigo 97 do Código Penal configura-se inconstitucional, uma vez que viola diversos princípios constitucionais, como, por exemplo, o da vedação de penas com caráter perpétuo, o da proporcionalidade, o da legalidade, o da igualdade e o da dignidade da pessoa humana. Tal dispositivo prevê que a medida de segurança não tem prazo máximo de duração, extinguindo-se apenas com a cessação da periculosidade do autor comprovada por perícia médica, assim, enquanto não averiguada a extinção da periculosidade deve o indivíduo permanecer submetido à medida de segurança, não importando quanto tempo ela dure. Isto posto, numa metodologia teórico-discursiva e crítica, expõe-se correntes doutrinarias e importantes decisões jurisprudenciais do Supremo Tribunal Federal e do Superior Tribunal de Justiça, que surgiram se posicionando a favor da existência de um limite temporal para a medida de segurança, solucionando, assim, esta irregularidade.

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PALAVRAS-CHAVE: Medidas de Segurança. Inimputabilidade. Direitos Humanos. Inconstitucio-nalidade.

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www.derechoycambiosocial.com │ ISSN: 2224-4131 │ Depósito legal: 2005-5822 3 INTRODUÇÃO

No direito penal, para que um fato seja considerado crime, é indispensável que ele seja classificado como típico, antijurídico e culpável. Dessa forma, de acordo com esses requisitos, também se faz necessário para que uma pessoa humana seja responsabilizada com a pena privativa de liberdade, que haja nexo causal entre a conduta do agente e o delito cometido, que, no momento da ação ou omissão, o autor tenha perfeita capacidade de entender o caráter ilícito do fato, e que possa se determinar conforme esse entendimento, escolhendo se vai ou não praticar a conduta criminosa.

A condenação com a atribuição da pena só ocorre para aquelas pessoas que praticam um tipo penal sem revelar quaisquer dos vícios excludentes da imputabilidade revelados no art. 26, Caput do Código Penal, ou seja, praticam uma conduta típica penal com maturidade, consciência da ilicitude e domínio sobre a sua vontade. Desta forma, são imputáveis.

Para aqueles que praticam uma conduta descrita no tipo penal, mas que por causa de uma doença mental não possuem capacidade de entender o caráter ilícito do fato ou de se determinar de acordo com esse entendimento, aplica-se outra reprimenda penal: a medida de segurança.

Sendo assim, a medida de segurança configura-se como uma punição diferente aplicável aos detentores de uma condição especial, denominados inimputáveis e semi-imputáveis, que, apesar de não cometerem propriamente um crime, violam o ordenamento jurídico-penal pátrio.

Em relação ao termo “semi-imputável” é importante ressaltar que ele se mostra inadequado diante do fato de que, conforme o art. 26, parágrafo único do Código Penal: A pena pode ser reduzida de um a dois terços se o

agente, em virtude de doença mental ou por desenvolvimento mental incompleto ou retardado não era inteiramente capaz de entender o caráter ilícito do fato ou de determinar-se de acordo com esse entendimento. Logo,

a pessoa humana denominada “semi-imputável” é, em princípio, um imputável que possui a sua culpabilidade diminuída em virtude da determinação legal de uma redução da pena.

Embora também seja considerada uma sanção penal, a medida de segurança possui regulamentação diferente da pena privativa de liberdade,

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uma vez que a lei não atribuiu, de maneira expressa, o prazo máximo de duração desta sanção penal. Na verdade, a atual disciplina da matéria estabelece, no artigo 97, § 1º, do Código Penal de 1940, reformado na Parte Geral em 1984, que as medidas de segurança perdurarão por prazo indeterminado, até que se verifique, mediante perícia médica, a cessação da periculosidade do doente mental infrator.

Neste diapasão, o sujeito submetido à medida de segurança ficará por tempo indefinido sobre a custódia do Estado, podendo durar poucos ou muitos anos, ou até mesmo perdurar durante todo o resto da sua vida, assumindo a inconstitucional característica da perpetuidade.

A nossa Constituição Federal proíbe, expressamente, a existência de penas com caráter perpétuo, e a indeterminação temporal das medidas de segurança viola claramente este dispositivo, evidenciando-se, assim, inconstitucional.

Ademais, a indeterminação temporal das medidas de segurança viola não só a vedação de penas de caráter perpétuo, mas também diversos outros princípios como o da proporcionalidade, da igualdade, da legalidade e da dignidade da pessoa humana.

Diante disto, muitas discussões doutrinárias e jurisprudenciais surgiram no mundo jurídico a respeito desse assunto, posicionando-se, em sua maioria, pela aplicação de um prazo máximo às medidas de segurança.Entretanto, tais posicionamentos não são uniformes, trazendo, assim, diferentes soluções para tal irregularidade. Acontece que ainda hoje não há um consenso sobre qual delas deve ser adotada, o que ocasiona uma significativa insegurança jurídica.

1 A MEDIDA DE SEGURANÇA COMO SANÇÃO PENAL DO ESTADO

1.1 CONCEITO E CARACTERÍSTICAS

Como se depreende do breve histórico, as medidas de segurança surgiram da necessidade de tratamento diferenciado para aqueles que não possuem o discernimento necessário na realização de uma conduta contrária à lei, ou seja, ela é aplicada geralmente em portadores de doenças mentais, os considerados inimputáveis ou semi-imputáveis para o direito penal, que apresentam, assim, um certo grau de periculosidade e praticam uma conduta típica e antijurídica, denominada injusto penal.

Dessa forma, a medida de segurança nada mais é do que uma providência Estatal, baseada no jus puniend, que busca o reestabelecimento da ordem jurídica ofendida por aquele que no momento da ação ou da

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omissão não entende o caráter ilícito dos seus atos ou não consegue se determinar segundo esse entendimento.

Portanto, assim como a pena privativa de liberdade, a medida de segurança classifica-se como uma espécie do gênero sanção penal, aplicada ao infrator de uma norma jurídica, após o devido tramite processual.

A medida de segurança é, então, um instrumento que protege a sociedade do indivíduo inimputável, que embora não culpável é perigoso, poiso retira do convívio social, com o intuito de fazer cessar sua periculosidade existente, por intermédio dos tratamentos adequados , para que o mesmo não volte a delinquir, e, desse modo, não apresentem mais risco para a coletividade.

Com muita propriedade e seguindo esta mesma linha de raciocínio, o autor Guilherme de Souza Nucci conceitua a medida de segurança como:

[...] uma forma de sanção penal, com caráter preventivo e curativo, visando a evitar que um autor de um fato havido como infração penal, inimputável ou semi-imputável, mostrando periculosidade, torne a cometer outro injusto e receba tratamento adequado.2

Ainda, permanecendo também neste mesmo entendimento, de acordo com Ferrari:

A medida de segurança constitui uma providência do poder político que impede determinada pessoa, ao cometer um ilícito-típico e se revelar perigosa, venha a reiterar na infração, necessitando de tratamento adequado para a sua reintegração social.3

Diante de tal explanação, não nos resta dúvida a respeito do caráter sancionatório das medidas de segurança, que veio para coibir os atos atentatórios à ordem social.

Não obstante, grande parte dos doutrinadores adotarem o mesmo posicionamento acima transcrito, essa concepção não é unânime entre os autores, existindo aqueles que negam o caráter penal-sancionador do instituto, afirmando que essas medidas seriam apenas um tratamento, com intento curativo, conferido aos inimputáveis e semi-imputáveis que cometem ilícitos, com uma função estritamente administrativa de polícia.

Nesse sentindo, Zaffaroni e Pierangeli idealizam uma natureza material-formal da medida de segurança, uma vez que não a consideram de natureza propriamente penal, porque materialmente tais medidas teriam

2

NUCCI, Guilherme de Souza. Manual de Direito Penal. 10. ed. rev., atual. e ampl. Rio de Janeiro: Forense, 2014. P. 527.

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cunho administrativo, devido a não apresentação de um conteúdo punitivo. Desta forma, estes autores não consideram, concretamente, as medidas de segurança de caráter penal, porém um tratamento médico ou uma custódia psiquiátrica. Entretanto, formalmente, seriam penais, em razão de ficarem impostas e controladas pelo Poder Judiciário como incidentes de um processo penal. 4

Tal concepção não se sustenta, na medida em que esse instituto incide diretamente no direito de liberdade do indivíduo, configurando-se uma sanção de igual ou maior gravidade de que a pena privativa de liberdade que substitui de forma incidental. Além disso, não se pode esquecer, que as mesmas são reguladas pelos Códigos Penais e submetidas à apreciação dos juízes penais, que deliberam quanto a sua aplicação e execução durante o trâmite regular do processo penal.5

Por conseguinte, em se tratando dos propósitos específicos dessa sanção, é inegável sua finalidade preventiva, ao passo que se relaciona com a recuperação de indivíduos que possuem doença mental ou desenvolvimento mental incompleto ou retardo, e que, por isso, são incapazes de compreender a ilicitude das suas condutas.

Assim sendo, é uníssono entre os autores a negativa da existência da finalidade retributiva, presente, portanto, apenas na aplicação de uma pena privativa de liberdade

Logo, ausente o fim retributivo, prevalece, na doutrina, a função de prevenção especial, onde se busca tratar o agente com o escopo de impedir que o mesmo volte a delinquir, e assim ressocializá-lo, permitindo seu retorno ao convívio da sociedade. Nas palavras do autor Paulo Queiroz a finalidade principal é evitar a reincidência. 6

Como finalidade secundária encontra-se a prevenção geral, que alcança não só o doente mental, mas toda a coletividade, isto porque quando um delito é cometido, quebra-se a ordem social, que precisa ser reestabelecida. Caso não houvesse a aplicação da medida de segurança,

4

ZAFFARONI, Raúl Eugenio; PIERANGELI, José Henrique. Manual de Direito Penal

Brasileiro: parte geral, volume 1. 8 ed. rev. e atual. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2009. P

731.

5

LEBRE, Marcelo. Medidas de segurança e periculosidade criminal: medo de quem? Disponível em: <http://www.observasmjc.uff.br/psm/uploads/Medidas_de_

seguran%C3%A7a_e_periculosidade_criminal_medo_de_quem.pdf>. Acesso em: 23/05/2015. p. 274.

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QUEIROZ, Paulo. Direito Penal: Parte Geral. 4 ed. Rio de Janeiro: Lumen Juris, 2008. p. 394.

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existiria tanto a possibilidade do infrator voltar a delinquir, quanto dos demais cidadãos, que amparados pela impunidade, nãoveriam óbice a prática da conduta ilícita.

Nessa perspectiva, o emprego de tal punição evitaria o cometimento de delitos por toda a sociedade que vendo a existência de uma proteção aos bens jurídicos, não irão confrontá-la, como pelos próprios inimputáveis ou semi-imputáveis transgressores, que tendo sua periculosidade tratada, não oferecerão mais riscos a coletividade, visto que não voltarão a violar as normas penais.

Vale salientar, que em relação a prevenção geral não existe um consenso entre os autores, que divergem quanto a existência de uma prevenção geral positiva e uma prevenção geral negativa. Nessa esteira, Paulo Queiroz7 sustenta não haver finalidade geral, nem positiva nem negativa, enquanto Eduardo Ferrari 8 defende a existência da prevenção geral positiva, mas nega a prevenção geral negativa.

1.2 DISTINÇÃO ENTRE PENA E MEDIDA DE SEGURANÇA Como já explanado, a pena e a medida de segurança são espécies do gênero sanção penal. Sendo assim, se faz necessário uma diferenciação conceitual entre elas, já que na prática acabam se confundindo, por serem sentidas praticamente da mesma maneira.

Uma das principais diferenças levantadas pela doutrina relaciona-se com a finalidade das mesmas, uma vez que se considera ter a pena um caráter retributivo-preventivo, pois além de corresponder ao mal causado pelo agente, também evita o cometimento de novos delitos, enquanto que a medida de segurança possui natureza eminentemente preventiva especial.

Noutro giro, a aplicação da medida de segurança advém de uma sentença absolutória imprópria, fundamentada na periculosidade do sujeito desvendada por meio do cometimento de um injusto penal. Por sua vez, a pena é sobreposta por meio de uma sentença penal condenatória que leva em conta a culpabilidade do agente juntamente com a gravidade da infração.

Ademais, a medida de segurança dirige-se unicamente aos inimputáveis e semi-imputáveis, estes apenas quando necessitarem de especial tratamento curativo, e a pena aos imputáveis e semi-imputáveis, que possuem discernimento para entender o caráter ilícito de sua conduta.

7

QUEIROZ, 2008. Op. cit., p. 394/395.

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Vale frisar que vige no nosso ordenamento o sistema vicariante, portanto em relação aos semi-imputáveis deverá ser empregada ou pena ou medida de segurança, dependendo do caso concreto, jamais as duas concomitantemente.

Por fim, as duas punições ainda se diferenciam em relação ao prazo de cumprimento, pois a pena, de acordo com o crime cometido, possui um prazo máximo delimitado em lei, enquanto que a medida de segurança não possui um prazo máximo de cumprimento, sendo indeterminado e vinculado ao desaparecimento da periculosidade do sujeito, já que esta última só cessará quando o agente não for mais considerado perigoso, o que afronta diretamente nossa carta magna, como será visto mais adiante.

1.3 ESPÉCIES

Durante a vigência do Código Penal de 1940 as medidas de segurança eram de duas modalidades, quais sejam, patrimoniais e pessoais. Aquelas representadas pela interdição de estabelecimento ou sede de sociedade ou associações e pelo confisco, foram revogadas pela reforma de 1984. Neste diapasão, atualmente nosso ordenamento jurídico prevê apenas a imposição de medidas de segurança pessoais.

Assim sendo, o Código Penal Brasileiro, em seu artigo 96, traz duas espécies de medida de segurança pessoal, vejamos: Art. 96. As medidas de segurança são: I – internação em hospital de custódia e tratamento psiquiátrico ou, à falta, em outro estabelecimento adequado; II – sujeição a tratamento ambulatorial.

A imposição de tais medidas está regulada pelo artigo 97 do Código Penal, que determina a aplicação da medida detentiva, internação em hospital de custódia, aos inimputáveis do artigo 26 do mesmo diploma legal, que cometerem um delito. Excepcionalmente, quando o fato previsto como crime for punido com pena de detenção, poderá o juiz instituir o tratamento ambulatorial, tratando-se, neste caso, de medida de segurança restritiva.

Portanto, a escolha da medida de segurança aplicável não se motiva pela necessidade de tratamento do indivíduo, mas sim pelo tipo de pena privativa de liberdade cominada ao injusto praticado, que se for de reclusão cominará na internação, porém caso seja de detenção estará o juiz autorizado a aplicar o tratamento ambulatorial, quando as condições pessoais do agente autorizarem.

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Tal disposição acaba gerando inúmeras críticas pela doutrina, que relata a incoerência entre a finalidade curativa do instituto e o mandamento legal supracitado.

Nesse sentindo Nucci alega que “esse preceito é nitidamente injusto, pois padroniza a aplicação da sanção penal e não resolve o drama de muitos doentes mentais que poderiam ter suas internações evitadas.”9

Além disso, ainda é possível deduzir da análise do artigo 97 do Código Penal, que a aplicação da medida detentiva configura-se como regra, permitindo a fixação da medida restritiva somente em caráter excepcional.

Em contraposição a este mandamento está a Lei 10.216/01, conhecida como Lei da Reforma Psiquiátrica, que dispõe no seu art 4º, que “ A internação em qualquer de suas modalidades só será indicada quando os recursos extra-hospitalares se mostrarem insuficientes”.

Apesar disso, a Lei de Reforma Psiquiátrica não obteve êxito no seu propósito, já que nos tribunais brasileiros vêm prevalecendo a aplicação do descrito no Código Penal.

1.3.1 Internação em Hospital de Custódia e Tratamento Psiquiátrico

Essa espécie de medida de segurança também é conhecida como medida detentiva, isto porque priva a liberdade de locomoção do indivíduo, na medida que o retira do convívio em sociedade, para tratá-lo internado em um hospital de custódia e tratamento psiquiátrico.

Aplica-se impreterivelmente aos inimputáveis e semi-imputáveis que cometerem crime punível com pena de reclusão, e opcionalmente aos imputáveis ou semi-imputáveis que praticarem crime apenado com detenção, mas que não seja indicado o tratamento ambulatorial.

A internação e o tratamento psiquiátrico devem ser realizados em estabelecimentos dotados de características hospitalares, como se depreende do art. 99 do Código Penal. Trata-se de um hospital-presídio com o propósito de tratar os pacientes, como também fazer a custódia do internado.10

1.3.2 Tratamento Ambulatorial

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NUCCI, 2014. Op. cit., p. 531.

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É a espécie de medida de segurança restritiva, pois não priva o paciente da sua liberdade, uma vez que é cumprida através do comparecimento do doente mentalao hospital, nos dias determinados pelo médico, para ser submetido à modalidade terapêutica prescrita.

Aplica-se aos inimputáveis e semi-imputáveis que cometerem crime punido com detenção. Segundo Bitencourt, somente a pena de detenção não é suficiente para determinar a aplicação do tratamento ambulatorial ao indivíduo infrator, é necessário que as condições pessoais do agente se configurem compatíveis com esse tratamento, ou seja, tais condições devem ser favoráveis a conversão da internação, regra no nosso ordenamento, para o tratamento ambulatorial.11

O tratamento ambulatorial, segundo o art. 101 da Lei de Execução Penal, deve ser realizado também no Hospital de Custódia ou Tratamento Psiquiátrico, ou em caráter subsidiário, em outro local com dependência médica adequada.

A LEP, em seu art. 43, garante a liberdade de contratação de médico de confiança pessoal do internado ou do submetido a tratamento ambulatorial, por seus familiares ou dependentes, a fim de orientar e acompanhar o tratamento. Caso haja divergência entre o médico oficial e o particular, caberá ao juiz da execução resolver o conflito.

Outrossim, a medida detentiva não é imutável, uma vez que em qualquer fase do tratamento ambulatorial, poderá o juiz determinar a internação do agente, se essa providência for necessária aos fins curativos (art. 97, § 4º)12

Tal instituto é denominado de detração, e também é regulado pela Lei de Execução Penal, que permite a conversão do tratamento ambulatorial em internação toda vez que o agente revelar incompatibilidade com a medida (art. 184).

1.3.3 Medida de Segurança Provisória

O Código Penal de 1940 previu a possibilidade de aplicação provisória de medida de segurança aos inimputáveis por doença mental ou desenvolvimento mental incompleto, aos ébrios eventuais e aos toxicômanos. Todavia, com a reforma de 84, divergências surgiram em relação a esta faculdade, e hoje é entendimento pacificado pelos tribunais

11

BITENCOURT, Cezar Roberto. Tratado de direito penal: parte geral. 20 ed. rev., ampl. e atual. São Paulo: Saraiva, 2014. p. 861.

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superiores da não aceitação deste tipo de medida, estando completamente revogada.No caso de agente infrator perigoso, deve-se aplicar a prisão preventiva e não mais medida de segurança provisória.

1.4 SUBSTITUIÇÃO DA PENA POR MEDIDA DE SEGURANÇA A pena pode ser substituída por medida de segurança em duas situações: uma quando se tratar de semi-imputáveis e a outra no surgimento superveniente de doença mental ao condenado com pena privativa de liberdade.

1.4.1 Semi-imputabilidade

Confirmada a prática do delito pelo semi-imputável, e comprovada a sua culpabilidade, deve o juiz aplicar a pena devida. A imposição de pena privativa de liberdade com redução do artigo 26 do Código Penal, para aqueles que cometem crime em virtude de perturbação de saúde metal ou por desenvolvimento mental incompleto ou retardado, é regra no nosso ordenamento jurídico.

Logo, sempre que comprovada a realização de uma infração penal pelo semi-imputável deve o juiz condená-lo a pena prevista em lei. Assim, a substituição pela medida de segurança acontece excepcionalmente, apenas quando o delinquente necessitar de especial tratamento curativo.

Isto ocorre por disposição do artigo 98 também do Código Penal, que possibilita tal substituição, apenas em relação a pena privativa de liberdade já justaposta, dessa forma não se admite que se aplique diretamente a medida de segurança, fazendo-se necessário a imposição anterior da pena privativa, para depois substituí-la, mesmo que se recomende desde logo o tratamento curativo.

A pena, a depender do caso concreto, pode ser substituída tanto pela internação em hospital de custódia e tratamento psiquiátrico, quanto pelo tratamento ambulatorial.

1.4.2 Superveniência de Doença Mental

Quando, no curso do cumprimento da pena privativa de liberdade, sobrevier ao condenado doença metal ou perturbação da saúde metal, determina o artigo 183 da Lei de Execução Penal, a conversão da pena por medida de segurança. Isto advém por requerimento do Ministério Público, da Defensoria Pública ou da Autoridade Administrativa, ou ainda de ofício pelo Juiz.

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É importante ressaltar que, tanto na ocasião do semi-imputável quanto na superveniência de doença mental, “a medida de segurança não poderá ter duração superior ao correspondente à pena substituída.”13

Ademais, não se deve confundir esta hipótese com a do artigo 41 do Código Penal, utilizada quando sobrevier uma doença mental não duradoura, onde transfere-se o condenado para o hospital de custódia ou tratamento psiquiátrico durante o tempo necessário para a sua cura.14

2 APLICAÇÃO E EXTINÇÃO DA MEDIDA DE SEGURANÇA

A medida de segurança, como já visto, emprega-se àqueles que por doença mental ou desenvolvimento mental retardado ou incompleto, praticam um delito sem saber o caráter ilícito da sua conduta. Assim, para que sua aplicação seja feita de forma justa e coerente, se faz necessário o preenchimento de alguns pressupostos.

Da mesma forma, para que a extinção dessa medida seja efetivada é necessário seguir determinados procedimentos, que analisam a possível liberação do doente mental.

2.1 PRESSUPOSTOS DE APLICAÇÃO DA MEDIDA DE SEGURANÇA

O nosso ordenamento jurídico estabeleceu que a medida de segurança aplicada como sanção criminal é unicamente a pós-delitual, ou seja, para que seja imposta essa reprimenda penal é necessário que ocorra anteriormente a prática de um fato criminoso. Ademais, este fato criminoso, obrigatoriamente deve ser praticado por um inimputável ou semi-imputável que necessite de especial tratamento curativo, caso contrário deverá ser cominada pena privativa de liberdade

Concomitantemente com esses eventos, deve ser verificada a periculosidade do autor, requisito indispensável para aplicação da medida de segurança. Assim, somente a prática de um ilícito penal por um doente mental não é suficiente, fazendo-se imprescindível a constatação da periculosidade do agente infrator.

Dessa Maneira, Cezar Roberto Bitencourt, brilhantemente assevera quesão pressupostos obrigatórios para aplicação da medida de segurança a

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BITENCOURT, 2014. Op. cit., p. 867.

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“prática de fato típico punível”, a “periculosidade do agente” e a “ausência de imputabilidade plena.”15

2.1.1 Ausência de Imputabilidade Plena

Como já é cediço saber, as medidas de segurança aplicam-se única e exclusivamente aos inimputáveis e excepcionalmente aos semi-inimputáveis que necessitarem de especial tratamento curativo. Aos imputáveis atribuem-se pena privativa de liberdade.

À vista disso, o código penal brasileiro em seu artigo 26, caput, define quem são os inimputáveis, e em seu parágrafo único, esclarece sobre os semi-imputáveis, vejamos:

Art. 26. É isento de pena o agente que, por doença mental ou desenvolvimento mental incompleto ou retardado, era, ao tempo da ação ou da omissão, inteiramente incapaz de entender o caráter ilícito do fato ou de determinar-se de acordo com esse entendimento.

Parágrafo único. A pena pode ser reduzida de um terço a dois terços, se o agente, em virtude de perturbação de saúde mental ou por desenvolvimento mental incompleto ou retardado não era inteiramente capaz de entender o caráter ilícito do fato ou determinar-se de acordo com esse entendimento.

Depreende-se da leitura do transcrito acima, a adoção, pelo nosso código penal, do critério biopsicológico, que oriundo da junção dos critérios biológico e psicológico, exige a presença de dois fatores para considerar o indivíduo inimputável ou semi-imputável. Primeiro deve ser constatada a existência de uma doença mental no infrator e, em razão dessa doença mental, o agente não deve ter poder de autodeterminação, ou seja, no momento da ação não compreende a ilicitude dos seus atos ou mesmo entendendo não consegue agir segundo essa percepção.

Não se adotou o critério unicamente biológico, porque este leva em conta apenas a presença da doença mental, não se importando se no momento da ação o agente tinha capacidade de se determinar ou de entender o caráter ilícito dos fatos. Dessa forma, bastaria apenas a comprovação pericial da existência de uma enfermidade mental para considerar um indivíduo inimputável ou semi-imputável, a depender do grau de autodeterminação existente. Acontece que não raro são os casos de pessoas com doenças mentais capazes de determinação e entendimento dos fatos.

Noutro giro, também não se adotou o critério exclusivamente psicológico, porque este leva em consideração apenas o fato de o indivíduo

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não conseguir se determinar ou não entender a ilegitimidade de suas ações, tornando, então, a avaliação muito subjetiva, pois não apreciam o motivo que levou o sujeito a agir de maneira inadequada.

Ademais, são várias as causas que levam a exclusão da culpabilidade, mas nem todas geram aplicação da medida de segurança.

De acordo como o artigo 27 do Código Penal, também são considerados inimputáveis os menores de dezoito anos, entretanto à eles não se aplicam nem medida de segurança, nem pena privativa de liberdade. Por isto, o Estatuto da Criança e do Adolescente - Lei nº 8.069/90 - prevê a destinação de medidas socioeducativas sem caráter punitivo.

Igualmente são considerados inimputáveis, pelo § 1º, do artigo 28 do mesmo diploma legal, aqueles que cometem delito completamente incapazes de entender o caráter ilícito do fato ou de determinar-se de acordo com esse entendimento, por causa de embriaguez proveniente de caso fortuito ou força maior. Neste caso, o agente está isento de qualquer tipo de sanção penal, portanto, não se sujeita a medida de segurança.

Logo, pode-se concluir que a única causa que gera inimputabilidade e dar ensejo a aplicação de medida de segurança, é a existência de enfermidade mental, prevista no citado artigo 26 do código penal.

2.1.2 Prática de Fato Típico Punível

Um dos principais pressupostos de aplicação da medida de segurança é a ocorrência prévia da prática de um fato criminoso, isto porque a nossa legislação pátria adotou como regra a medida de segurança pós-delitual. Tal requisito tem como finalidade dar proteção jurídica ao cidadão, pois proíbe a destinação de sanção penal antes da realização de um delito.

Dessa forma, Ferrari afirma que

“A medida de segurança que prescindir da prática de um ilícito-típico não constituir-se-á em espécie de sanção penal, mas em medida terapêutica administrativa. O delito é assim, um marco para a incidência da medida de segurança criminal”16

Percebe-se, então, que as medidas administrativas não tem como pressuposto a prática de um delito, bastando a presença do perigo oferecido pelo agente portador de doença mental ou desenvolvimento mental incompleto ou retardado, para a sua imputação. Dessa maneira, não possuem caráter punitivo.

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A doutrina nacional majoritariamente adota a teoria tripartite a respeito da conceituação do crime, afirmando que para configurar a execução efetiva de um delito deve necessariamente ocorrer a prática de um fato típico, ilícito e culpável. Diante disto, surgem algumas discussões a respeito do evento motivador da aplicação da medida de segurança, uma vez que segundo essa teoria o inimputável não comete crime, já que está excluída sua culpabilidade.

Para aqueles que minoritariamente defendem a concepção bipartite do crime, configurando-o com fato típico e ilícito, não há qualquer polêmica a respeito da aplicação da medida de segurança, isto porque a culpabilidade, para eles, é apenas uma condição de punibilidade, servindo como pressuposto de pena privativa de liberdade. São adeptos dessa teoria Damásio de jesus, Mirabette, Dotti, entres outros.

Neste caso a culpabilidade estaria para pena, assim como a periculosidade estaria para a medida de segurança.

Em contrapartida, os que acreditam que a culpabilidade integra o crime, explicam a aplicação da medida de segurança pela prática de um injusto penal, entendido como um fato típico e antijurídico, que apesar de não constituir crime, é desaprovado pelo direito e por isso deve ser reprimido e prevenido. Esse entendimento é adotado por diversos autores como Zaffaroni, Pierangeli, Nucci, Greco, Bitencourt, Fragoso, etc.

Nessa esteira, Zaffaroni e Pierangeli sintetizam do seguinte modo:

Na doutrina, chamamos conduta típica e antijurídica um “injusto penal”, reconhecendo que o injusto penal não é delito, e sim que, para sê-lo, é necessário que seja também reprovável, isto é, que o autor tenha tido a possibilidade exigível de atuar de outra maneira, requisito que não se dá por exemplo na hipótese de “louco” (de quem, em razão de sua incapacidade psíquica, não se pode exigir outra conduta). Esta característica de reprovabilidade do injusto do autor é o que denominamos culpabilidade e constitui a terceira característica especifica do delito.17

Dessa forma, o injusto penal ocorre quando se tem a prática de um conduta descrita nas leis penais, como, por exemplo, o código penal, a lei de contravenções penais, e lei de drogas, e que seja contrária ao direito, portanto ilícita, e por isso, não amparada pelo ordenamento jurídico.

Assim, a inimputabilidade por doença mental, isenta o indivíduo de pena, mas autoriza a aplicação da medida de segurança, isso porque como salienta Greco, “no caso de ataque de inimputáveis, o ordenamento jurídico

17

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não protege esse tipo de comportamento. A agressão é considerada injusta, e não justa como no estado de necessidade.”18

, portanto, deve ser o agente responsabilizado por sua ação.

É importante lembrar, que a ocorrência do injusto penal desconfigura-se quando falta prova do crime ou da autoria, ou quando presente alguma causa de exclusão de ilicitude, ou até mesmo de exclusão de culpabilidade como, erro de proibição invencível, coação irresistível, obediência hierárquica e embriaguez completa fortuita ou por força maior, excetuando-se apenas a inimputabilidade por enfermidade mental. Nesses casos , não há imposição de sanção penal.19

2.1.3 Periculosidade do agente

Como se deduz da leitura do § 1º do artigo 97 do código penal, o último requisito indispensável para a determinação das medidas de segurança é a presença de periculosidade do agente, podendo ser entendida como o perigo que o indivíduo portador de enfermidade mental oferece para a sociedade, por apresentar instintos ou desvios de conduta que o tornam propenso à prática de delitos.

Neste diapasão, diferencia-se a periculosidade social da periculosidadecriminal, àquela evidenciada antes mesmo do cometimento de um crime, legitima-se “pelo simples comportamento desajustado comunitariamente” 20

, sendo a periculosidade constatada apenas pela personalidade do indivíduo. Já a periculosidade criminal resulta justamente do cometimento de um fato descrito como crime, sendo evidenciada após o injusto penal, consistente na “probabilidade de o agente vir a cometer novos fatos ilícitos-típicos.21

O direito brasileiro, em matéria de medida de segurança como punição do estado, reconhece somente a periculosidade criminal, visto que, vige no nosso ordenamento jurídico o princípio da reserva legal, previsto no artigo 5º, inciso XXXIX, da Constituição Federal, aplicável analogicamente ao instituto das medidas de segurança, que além de outros mandamentos também prediz não haver reprimenda penal, sem anterior infração da norma.

18

GRECO, Rogério. Curso de Direito Penal. 16 ed. Rio de Janeiro: Impetus, 2014. P. 355/356.

19

BITENCOURT, 2014. Op. cit., p. 860.

20

FERRARI, 2001. Op. cit., p. 155.

21

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Diante disto, não se pode considerar o indivíduo perigoso para fins punitivos, sem que o mesmo tenha dado motivo para isto. Ferrari, considera ilegítimo, em um Estado Democrático de Direito, a adoção da periculosidade social como pressuposto para aplicação da medida de segurança, devendo haver imediata substituição para periculosidade criminal, que visualiza a real, e não a mera possibilidade, de o indivíduo voltar a delinquir.22

Bitencourt, então, define a periculosidade criminal como “um estado subjetivo mais ou menos duradouro de antissociabilidade”. Afirmando também ser “um juízo de probabilidade – tendo por base a conduta antissocial e a anomalia psíquica do agente – de que este voltará a delinquir.”23

O Código penal divide a periculosidade criminal em presumida e real. A periculosidade presumida ocorre nos casos em que a lei presume a periculosidade do sujeito, estando prevista no caput do artigo 26 do mencionado diploma legal, para os inimputáveis que, devido a enfermidade mental, são completamente incapazes de se autodeterminar. Já a periculosidade real é aquela que deve ser verificada pelo juiz e refere-se aos semi-imputáveis do parágrafo único do mesmo artigo supracitado, que não são inteiramente incapazes, possuindo algum discernimento, e, por isso, cabe ao juiz, em cada caso concreto, com o auxilio de laudos periciais, determinar se eles necessitam ou não de especial tratamento curativo.

Além disso, a periculosidade pode ser classificada em abstrata e concreta. A periculosidade abstrata é aquela que se baseia apenas em suposições ou deduções, não existindo nenhum elemento concreto que comprove que determinado indivíduo seja perigoso, por isso é totalmente rejeitada pelo Supremo Tribunal Federal. Já a periculosidade concreta é evidenciada por meio de provas sólidas de que o agente infrator oferece real perigo a sociedade, sendo, portanto, a utilizada pelos tribunais brasileiros.24

Há, ainda, quem divida a periculosidade em subjetiva e objetiva, sendo periculosidade subjetiva aquela que decorrente da avaliação de perigo revelado pelo autor do crime, podendo ser considerada de forma

22

FERRARI, 2011. Op. cit., p. 155/156.

23

BITENCOURT, 2014. Op. cit., p. 860.

24

COELHO, Alexs Gonçalves. Prisão Preventiva: ordem pública e periculosidade do

agente. 2009. Disponível em: <

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presumida (art. 26 caput) ou de forma real (art. 26, parágrafo único). Já a periculosidade objetiva deriva do fato em si praticado pelo doente mental, da gravidade do injusto penal cometido.

José Frederico Marques fala em fatores e sintomas da periculosidade, que transformam o indivíduo em um ser capaz com probabilidade de delinquir, onde os fatores são elementos externos ou internos “referentes às condições físicas individuais, morais e culturais, condições físicas do ambiente, de vida familiar ou de vida social”, reveladores da personalidade do indivíduo. E os sintomas são os “antecedentes criminais, civis ou administrativos, os motivos determinantes da prática delituosa e suas circunstâncias”.25

Diante disto, surge um problema: conseguir limitar a análise de periculosidade para aplicação da Medida de segurança em virtude da realização do risco pela causação do autor, ou seja, discernir uma forma de limitação do alcance da periculosidade subjetiva, evitando-se as avaliações de um Direito Penal do Autor. Ao mesmo tempo, encontrando um instrumento válido de proteção de vítimas potenciais diante do "perigo" revelado. Neste sentido, o perigo é revelado pela prática do crime (situação objetiva), mas a periculosidade presumida advém da ausência de possibilidade de traçar um prognóstico causal perfeito em virtude de um estado de doença mental: quais as previsões e expectativas podem se concretizar diante da loucura? Enfim, a periculosidade objetiva é revelada pelo fato e a subjetiva depende de avaliações, presumidas ou reais, dos autores de crime que tenham doença mental ou desenvolvimento mental incompleto ou retardado.

Assim sendo, algumas críticas são feitas pela doutrina a respeito do requisito da periculosidade, dado que sua análise é feita principalmente sobre elementos subjetivos, não existindo um critério que comprove com certeza que o autor voltará a cometer delitos, o que leva a insegurança jurídica, pois baseada tão só em indícios, a probabilidade de o infrator voltar a delinquir é hipotética e abstrata, sendo, por conseguinte, suscetível a erros.

Deste modo, discorrendo sobre esse pressuposto, Ferrari, salienta que

ao conceito de perigo criminal constitui a probabilidade do dano, não significando que a certeza do perigo importe na precisão do dano, de modo

25

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que, ainda que averiguada a certeza do perigo de novos crimes, não se pode nunca ter a convicção de que tais delitos efetivamente serão cometidos. 26

Não obstante, a periculosidade criminal possui grande importância para o instituto das medidas de segurança, pois além de ser necessária para o emprego das mesmas, é igualmente indispensável para a sua extinção, uma vez que só é liberado desta sanção penal o indivíduo que tem a sua periculosidade cessada, constado isso num Exame Pericial.

2.2 EXTINÇÃO DA PUNIBILIDADE

Por previsão do parágrafo único do artigo 96 do Código Penal, são aplicáveis às medidas de segurança todas as causas de extinção da punibilidade, não se impondo medida de segurança, nem subsistindo a quem tenha sido imposta quando a punibilidade do autor for extinta.

Havendo a extinção da punibilidade não resta dúvida quanto a cessação da aplicação da medida de segurança, já que não há mais justificativa para o jus puniend do Estado, encontrando-se finda a pretensão punitiva, mesmo que na modalidade de tratamento.27

2.3 MEDIDA DE SEGURANÇA E SUA SENTENÇA CRIMINAL A medida de segurança é aplicada por meio de uma sentença absolutória imprópria, isto porque, excluída a culpabilidade do autor pela inimputabilidade, não se considera que o doente mental pratique, formalmente, um crime, considerado um fato típico, ilícito e culpável, porém sua conduta típica e ilícita apesar de não gerar aplicação de pena privativa de liberdade, dá ensejo ao emprego das medidas de segurança.

Embora a sentença justaposta seja de absolvição, nada impede que uma sanção penal seja designada, pois o artigo 386, parágrafo único, III, do Código de Processo Penal, afirma que “ Na sentença absolutória o juiz : III- aplicará a medida de segurança se cabível”.

Além disso, esse entendimento já é sumulado pelo Supremo Tribunal Federal que editou a súmula 422, que diz: “A absolvição criminal não prejudica a medida de segurança, quando couber, ainda que importe privação de liberdade.”

2.4 EXECUÇÃO

A execução das medidas de segurança está disciplina pelos artigos 171, 172, 173 e 174 da Lei de Execução Penal.

26

FERRARI, 2001. Op. cit., p.157.

27

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Tais artigos, dispõem que transitada em julgado a sentença que fixou o cumprimento da medida de segurança, é obrigatória a expedição da guia de internamento ou tratamento ambulatorial pela autoridade judiciária competente, de forma que, o cumprimento das medidas só se efetivará com a apresentação deste documento.

A guia de execução deverá ser remetida para a autoridade administrativa com todas as informações necessárias, como também será dada ciência ao Ministério Público do seu recolhimento.

Logo, recebida a guia de internamento ou tratamento ambulatorial, será iniciada a execução das medidas de segurança, com o encaminhamento do inimputável ao hospital de custódia, bem como para o tratamento indicado.

2.5 EXTINÇÃO DA MEDIDA DE SEGURANÇA

Ao contrário das penas privativas de liberdade, que se extinguem pelo decurso do prazo estipulado na sentença condenatória, as medidas de segurança não possuem prazo máximo preestabelecido, e, por isso, não se findam com o simples cumprimento de um termo final.

A legislação pátria não estabelece um limite máximo de duração desta sanção penal, sendo, portanto, indeterminado o prazo de execução, que durará enquanto permanecer o perigo identificado no infrator, ou seja, durará enquanto persistir a necessidade do tratamento, com finalidade curativa da periculosidade do agente.

Assim, aplicada a medida de segurança, não existe uma data predeterminada para o seu fim, podendo durar poucos ou muitos anos, de forma que ela poderá perdurar até o falecimento do paciente.

Dessa forma o Código Penal estabelece no § 1º do artigo 97 que: “A internação, ou tratamento ambulatorial, será por tempo indeterminado, perdurando enquanto não for averiguada, mediante perícia médica, a cessação da periculosidade. O prazo mínimo deverá ser de um a três anos.”

A extinção da medida de segurança está, então, vinculada a cessação da periculosidade do autor, que só pode ser verificada por meio de perícia médica, a qual avaliará as condições pessoais do paciente, e principalmente a probabilidade de o indivíduo não voltar a delinquir, para que o mesmo seja considerado curado e possa voltar a conviver no meio social.

O prazo de um a três anos previsto no parágrafo supramencionado, não constitui um limite máximo das medidas de segurança, na verdade é apenas um termo determinado pelo juiz na sentença absolutória imprópria

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para realização do primeiro exame de cessação de periculosidade, considerado pela legislação nacional e pela doutrina um prazo mínimo de duração da medida imposta.

Regulada pela Lei de Execução Penal, a cessação da periculosidade será averiguada quando terminar o prazo mínimo de duração das medidas de segurança, devendo a autoridade administrativa remeter ao juiz, até um mês antes do termo final, relatório minucioso, devidamente instruído com laudo psiquiátrico, que o habilite a decidir sobre a revogação ou a permanência da medida (artigo 175).

Caso a autoridade administrativa não envie automaticamente o relatório, o juiz, ex ofício, pode instaurar procedimento, com o fim de requisitar tal documento. Também pode fazer essa requisição o Ministério Público, o Conselho Penitenciário, ou qualquer outro interessado ou quem o represente.

Conforme o artigo 176 da LEP, pode haver antecipação do exame de cessação a periculosidade, podendo até mesmo ocorrer antes do término do prazo mínimo fixado na sentença. Para isso, necessária se faz a presença de elementos indicativos da cura do doente mental infrator, e o requerimento fundamentado do Ministério Público ou do interessado, seu procurador ou defensor.

Recebido os autos com a juntada do relatório, ou realização das diligências, serão ouvidos, sucessivamente o Ministério Público e o curador ou defensor, no prazo de três dias cada um, devendo ser nomeado curador ou defensor ao agente que não o tiver.

Mesmo que já expirado o prazo mínimo de duração da medida imposta, pode o juiz, de ofício ou a requerimento de qualquer das partes, determinar novas diligências. Cumpridas estas diligências ou ouvidas as partes, o juiz tem o prazo de cinco dias para proferir sua decisão.

Se o exame de cessação de periculosidade for desfavorável, atestando a continuidade das características perigosas do indivíduo, o juiz decidirá pela permanência da medida de segurança, e o agente continuará internado ou submetido a tratamento ambulatorial, até que nova análise ateste sua recuperação.

Neste caso, o § 2º do artigo 97 do Código Penal, certifica que novos exames deverão ser realizados a cada ano, ou a qualquer tempo, se determinar o juiz da execução

Dessa maneira, sobre a verificação da cessação da periculosidade, explica Bitencourt que:

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A determinação legal é de que o exame seja realizado no fim do prazo mínimo fixado na sentença e, posteriormente, de ano em ano. Mas esse é o exame legal obrigatório. No entanto, o juiz da execução pode determinar, de ofício, a repetição do exame a qualquer tempo. Cumpre ressaltar que a determinação oficial a qualquer tempo, só pode ocorrer depois de decorrido o prazo mínimo, isto é, o juiz pode determinar de ofício a repetição do exame. 28

Por outro lado, se o resultado do exame de cessação de periculosidade for favorável, atestando a cura do paciente ou até mesmo a considerável diminuição da periculosidade, o juiz se concordar com o laudo, pode determinar a desinternação ou a liberação condicional, colocando o agente em liberdade sob algumas condições.

A desinternação condicional aplica-se aos inimputáveis ou semi-imputáveis que estavam submetidos a internação em hospital de custódia e tratamento psiquiátrico, e a liberação condicional destina-se àqueles em execução do tratamento ambulatorial.

A desinternação e a liberação são condicionais, por deliberação do artigo 178 da LEP que determina a aplicação, pelo juiz, das mesmas condições do livramento condicional ao doente mental, que passará por um período de transição para ter sua sanção efetivamente extinta.

Assim, sempre e obrigatoriamente, o juiz da execução, na decisão de desinternação ou liberação, decretará o cumprimento das seguintes condições: obter ocupação lícita, dentro do prazo razoável se for apto para o trabalho; comunicar periodicamente ao juiz sua ocupação; não mudar do território da comarca do juízo da Execução, sem prévia autorização deste (Art. 132 da LEP).

Pode ainda, facultativamente, serem impostas as obrigações de não mudar de residência sem comunicação ao juiz e à autoridade incumbida da observação cautelar e de proteção; de recolher-se à habitação em hora fixada; e de não frequentar determinados lugares.

Muito comum também é a estipulação das obrigações de não ingerir bebida alcoólica e de frequentar certos grupos de apoio.

Se for permitido ao liberado ou desinternado residir fora da comarca do Juízo da Execução, deve-se remeter cópia da decisão ao juízo do lugar para onde ele houver se transferido e à autoridade incumbida da observação cautelar e de proteção (Art. 133 da LEP).

28

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Em conformidade com o § 3º do artigo 97 do Código Penal, a desinternação e a liberação serão sempre condicionais, não havendo hipótese de extinção das medidas de segurança sem o período anterior de observação, onde durante um ano o agente não pode praticar nenhum fato que indique a persistência da sua periculosidade, caso contrário será restabelecida a medida anterior.

Nota-se que o dispositivo legal retromencionado fala em “ fato indicativo de persistência de sua periculosidade”, e não em cometimento de novo injusto penal, portanto, não é necessário que o indivíduopratique um novo fato típico e antijurídico, bastando qualquer situação que indique a permanência da periculosidade.

Passado um ano sem que o indivíduo pratique qualquer fato que indique a persistência de sua periculosidade a medida de segurança será definitivamente extinta.

Ressalta-se que o artigo 179 da Lei de Execução Penal, só permite o efetivo cumprimento da desinternação ou da liberação condicional, após o trânsito em julgado da sentença que as estipulou, uma vez que interposto recurso contra essa decisão, suspender-se-á o início do período de observação, permanecendo a execução da medida de segurança até o julgamento do recurso.

O recurso cabível das decisões do juiz da execução penal é o agravo em execução, que em regra não possui efeito suspensivo, configurando-se, então, exceção a norma do artigo 197 da Lei de Execução Pena a suspensão supracitada.

Diante do exposto, é possível observar o total descompasso das normais penais, posto que, em desrespeito ao princípio da igualdade, tratam completamente diferente as duas modalidades de sanção criminal, tornando as medidas de segurança uma punição mais severa, pois uma vez iniciada não se sabe qual o seu fim, enquanto que a pena privativa de liberdade tem seu começo e seu fim bem delimitados.

Além do mais, a maneira como são extintas as medidas de segurança é um assunto bastante polêmico na doutrina, que em grande parte questionam a subjetividade presente no exame de cessação da periculosidade, e não concordam com a indeterminação temporal do Código Penal, como será visto mais adiante.

(24)

www.derechoycambiosocial.com │ ISSN: 2224-4131 │ Depósito legal: 2005-5822 24 3 O PRAZO INDETERMINADO DE DURAÇÃO DAS MEDIDAS

DE SEGURANÇA

O prazo de duração das medidas de segurança, como já visto, é regulado pelo § 1º do artigo 97 do Código Penal, que vincula o fim da aplicação desta sanção penal à cessação da periculosidade por parte do infrator.

Dessa maneira, o legislador apenas delimitou o prazo mínimo de duração da medida imposta, sendo este de 1 a 3 anos, como já fora tratado. Entretanto, no que diz respeito a imposição de um limite ao poder de punir do Estado, o legislador foi omisso, uma vez que não estipulou um prazo máximo de cumprimento das medidas de segurança, fazendo com que sua duração fosse indeterminada e ilimitada.

Assim, as medidas de segurança perduram por tempo indeterminado, até que seja averiguada, por meio de perícia médica, a cessação da periculosidade do autor, podendo inclusive o infrator passar o resto da sua vida cumprindo esta penalidade, pois enquanto não atestada a extinção da periculosidade, permanecerá a aplicação da medida estabelecida.

Diante disto, a doutrina dividiu-se entre os que concordam e os que discordam com esta indeterminação temporal, ou seja, parte dos doutrinadores posiciona-se favoravelmente ao descrito no Código Penal, defendendo a constitucionalidade do dispositivo, e outra parte se posiciona de modo desfavorável, afirmando que tal preceito é inconstitucional, uma vez que fere diversos princípios constitucionais.

De acordo com Ferrari, os doutrinadores que defendem a ausência de limites máximos (indeterminação) e a obrigatoriedade de limites mínimos, assim o fazem por duas razões: primeiro porque partem da ideia de que os doentes mentais e os imputáveis são diferentes, e por isso devem ser tratados de formas distintas, sendo esses elementos mais um fator de diferenciação, e, depois, porque consideram o doente mental uma pessoa perigosa, que traz riscos para a sociedade, pois possui grande probabilidade de voltar a delinquir.29

Todavia, em um Estado Democrático de Direito, não é possível que a intervenção estatal seja ilimitada, sendo indispensável a presença de limites ao poder do Estado, como por exemplo ao jus puniend, logo, deve ser aplicada as medidas de segurança criminais todo conteúdo garantístico relativo às penas.30

29

FERRARI, 2001. Op. cit., p. 181.

30

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Isto porque, em nome do princípio da igualdade, é inadmissível que o sujeito com doença mental que pratica um injusto penal, seja considerado pior criminoso do que o imputável que comete um delito; e também, não se pode respaldar a indeterminação temporal das medidas de segurança na reincidência, pois é patente o elevado grau de reincidência entre os imputáveis, que em sua grande parte, ao sair da penitenciária, retornam a vida do crime, não se justificando, portanto, a diferença de tratamento entre as duas sanções penais, onde se privilegia quem está submetido ao cumprimento de pena, uma vez que, segundo determinação do art. 75 do Código Penal, o tempo máximo para execução da pena é de 30 anos.31

Além disso, apesar das diferenças formais, apontadas em capítulo anterior, essencialmente não se pode diferenciar a pena privativa de liberdade da modalidade internação da medida de segurança, visto que ambas restringem o direito de liberdade do cidadão, sendo sentidas da mesma maneira, pois impedem que o indivíduo infrator permaneça no convívio com a sociedade.32

Deste modo, tanto a pena como a medida de segurança de internação, são sanções aflitivas, que segregam o sujeito, afastando-o de toda a coletividade.

Mesmo que se busque justificar o tratamento diferenciado dessas duas reprimendas penais, pelas distintas finalidades, onde a medida de segurança visa o tratamento do indivíduo para fazer cessar sua periculosidade, e a pena além do fim preventivo também possui o retributivo, a verdade é que na prática a diferença é quase inexistente, pois são executadas da mesma forma, e limitam o mesmo direito do indivíduo, qual seja, o direito fundamental à liberdade individual.

Sob outro enfoque, porém chegando a mesma conclusão, Paulo Queiroz afirma:

Conclusivamente, distinção ontológica alguma há entre penas e medidas de segurança, pois ambas perseguem, essencialmente, os mesmos fins e supõem o concurso de idênticos pressupostos de punibilidade: fato típico, ilícito, culpável e punível. A distinção reside, portanto, unicamente nas consequências: os imputáveis estão sujeitos à pena e os inimputáveis, à

31

FERRARI, 2001. Op. cit., p. 181/182.

32

MONTEIRO, Lizianni de Cerqueira. Breves considerações sobre a medida de segurança à

luz da constituição federal. Disponível em: <http://www.conpedi.org.br/

manaus/arquivos/anais/salvador/lizianni_de_cerqueira_monteiro.pdf>. Acesso em :05/06/2015. p. 1752-1753.

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medida de segurança, atendendo-se a critério de pura conveniência político-criminal ou de adequação.33

Neste diapasão, não existe argumento plausível para o tratamento desigual destinado as medidas de segurança, devendo ser aplicadas as mesmas garantias concedidas a pena privativa de liberdade.

Não obstante, há quem defenda a manutenção do diferente tratamento para cada uma das espécies de sanção penal, são os adeptos do posicionamento legalista, que presam pela constitucionalidade da indeterminação temporal das medidas de segurança.

Para justificar tal posicionamento, os defensores da

constitucionalidade da ausência de prazo máximo das medidas de segurança, se pautam no caráter curativo dessa reprimenda, afirmando que nenhum tratamento é suspenso antes da real cura do paciente, e assim, necessário se faz a comprovação da cessação da periculosidade do sujeito, para que o mesmo seja considerado curado e possa voltar a viver em sociedade.

Ademais, sabe-se que não é difícil encontrar posicionamentos daqueles que negam, até mesmo, a presença do caráter punitivo das medidas de segurança, tratando-as apenas como remédio para a periculosidade do autor.

Guilherme de Sousa Nucci, apesar de não negar o caráter de sanção penal das medidas de segurança, concorda com a indeterminação temporal, defendendo uma interpretação restritiva do artigo 75 do Código Penal, onde as disposições desta determinação legal não se estendem as medidas de segurança, uma vez que diferem das penas. Em sua opinião, deve o doente mental infrator permanecer sob custódia do Estado, até que se verifique sua cura.34

Dessa forma, dispõe o renomado autor que:

[...] apesar de seu caráter de sanção penal, a medida de segurança não deixa de ter o propósito curativo e terapêutico. Ora, enquanto não for devidamente curado, deve o sujeito submetido à internação permanecer em tratamento, sob custódia do estado. Seria demasiado apego à forma transferi-lo de uma hospital de custodia e tratamento criminal para outro, onde estão abrigados insanos interditados civilmente, somente porque foi atingido o teto máximo

33

QUEIROZ, Paulo de Souza. Penas e medidas de segurança se distinguem realmente?. Disponível em: <http://pauloqueiroz.net/penas-e-medidas-de-seguranca-se-distinguem-realmente/>. Acesso em: 23/05/2015.

34

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da pena correspondente ao fato criminoso praticado, como alguns sugerem, ou teto máximo de 30 anos, previsto no art. 75, como sugerem outros.35

Rogério Grego, em certos momentos, também compartilha com esse posicionamento, tendo em vista que ao reconhecer a deficiência do Estado em fornecer um tratamento eficaz para seus doentes, trata a medida de segurança como remédio e não como uma pena, que deve ser aplicado corretamente a cada paciente, para que o mesmo não ofereça mais riscos e seja liberado, entretanto defende a manutenção da medida imposta caso os riscos não sejam anulados. 36

Nas palavras do exímio autor:

Se a internação não está resolvendo o problema mental do paciente ali internado sob regime de medida de segurança, a solução será a desinternação, passando-se para o tratamento ambulatorial, [...]. Mas não podemos liberar completamente o paciente se este ainda demonstra que, se não for corretamente submetido a um tratamento médico, voltará a trazer perigo para si próprio, bem como para aqueles que com ele convivem.37

Com a devida vênia, não podemos concordar com esses pensamentos, uma vez que a medida de segurança, tal qual a pena configura-se como uma espécie de sanção penal, que procura prevenir a reiteração de novos delitos. Portanto, do mesmo modo que os inimputáveis, os imputáveis que cometeram um crime, também oferecem riscos a sociedade, e nada garante que após o cumprimento de sua pena, não voltem a delinquir, entretanto à eles é garantido a limitação do poder de punir do Estado.

Na verdade, os imputáveis não só oferecem igual perigo, como o índice de reincidência é elevadíssimo, mas, mesmo assim, continuam a ser beneficiados, pela expressa previsão de um prazo máximo de 30 anos para a execução, estipulado no artigo 75 do Código Penal.

Ademais, restringir a intepretação do artigo ora mencionado, é negar e, por vezes, se omitir quanto aos direitos daqueles que necessitam de especial tratamento, como por exemplo, o direito a dignidade da pessoa humana, que visa tratamentos adequados e humanitários para todos os indivíduos sem nenhuma distinção.

Resta claro que a presente obra monográfica se posiciona pela inconstitucionalidade da indeterminação temporal das medidas de

35

NUCCI, 2014. Op. cit., p. 532/533.

36

GRECO, 2014. Op. cit., p. 687/689.

37

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segurança, negando a validade dos dispositivos legais que estabelecem tal irregularidade.

Da mesma maneira, se posicionam os que defendem uma visão constitucionalista da matéria, pois visualizam violação a importantes princípios previstos na nossa carta magna e, assim, buscam dar soluções para resolver este conflito.

3.1 A INSCONSTITUCIONALIDADE DA INDETERMINAÇÃO TEMPORAL

Antes de iniciar a análise da inconstitucionalidade da indeterminação temporal das medidas de segurança, é importante esclarecer que apesar de comumente os doutrinadores e operadores do direito utilizarem essas expressões, quais sejam, constitucionalidade ou inconstitucionalidade, para tratar da não determinação do prazo máximo das medidas de segurança, a nomenclatura técnica mais correta é recepção ou não recepção, já que a norma em questão é anterior a Constituição Federal de 1988.

Apesar disso, a maioria da doutrina não utiliza a terminologia acima descrita, o que leva a nos posicionar de igual maneira. Dessa forma, em se tratando da inconstitucionalidade da ausência de prazo máximo, inúmeros são os doutrinadores que compartilham desse posicionamento, isto porque a perpetuação indeterminada das medidas de segurança fere claramente diversos princípios constitucionais, tais como, os princípios da proporcionalidade, da igualdade, da legalidade, da dignidade da pessoa humana e, especialmente, o princípio da proibição de penas com caráter perpétuo.

Diante disto, é impensável corroborar com tamanha irregularidade, porquanto apesar da condição especial do portador de doença metal, deve ser assegurado a ele todos os direitos e garantias previstas constitucionalmente, não podendo, deste modo, serem privados de sua dignidade humana ou menos ainda, serem submetidos a pena perpétua.

Sendo assim, diversos são os posicionamentos que defendem a liberdade do cidadão, buscando impor limites ao jus puniend do Estado, e fazendo com que seja assegurado ao inimputável todas as garantias concedidas aos imputáveis.

3.1.1 Violação ao Princípio da Proporcionalidade

O princípio da proporcionalidade, muito conhecido como princípio da proibição do excesso, está implícito no artigo 59 do Código Penal, que estabelece que o juiz deve aplicar a quantidade de pena, “ conforme seja necessário e suficiente para reprovação e prevenção do crime”.

(29)

www.derechoycambiosocial.com │ ISSN: 2224-4131 │ Depósito legal: 2005-5822 29

Entende-se, então, que o princípio da proporcionalidade estabelece uma correspondência entre a gravidade do crime e a sanção cominada, não podendo esta ser desproporcional, de forma a extrapolar o objetivo desejado e exagerar de tal maneira, que cause um mal ao indivíduo. Assim, o que se deseja é aplicar a punição criminal de modo que não seja tão branda à incitar o cometimento de novos delitos, como o exercício arbitrário das próprias razões, nem seja tão exagerada ao passo de perder a relação entre a penalidade e o crime cometido, ultrapassando os limites da culpabilidade do autor.

Procura-se, aqui, uma aplicação justa de qualquer reprimenda penal, sem excessos ou abrandamentos, mas sim um equilíbrio, onde os delitos e as penas são proporcionais.

Todavia, esta não é a realidade das medidas de segurança, que se configuram como uma sanção extremamente severa e, portanto, desproporcional, pois não possuem nenhuma relação com o delito praticado, fazendo com que todo agente inimputável que cometa um injusto penal e, independentemente da gravidade da ofensa cometida, fique cumprindo esta penalidade indeterminadamente.

Não é razoável que o indivíduo que pratique o delito de lesão corporal leve, cuja pena máxima é de um ano de detenção, possa ficar sujeito a três, seis, dez ou mais anos de medida de segurança, por exemplo.38

Ademais, o princípio da proporcionalidade também pode ser visto sobre outra perspectiva, que não esta de proteção contra os excessos do Estado, considerada uma espécie de garantismo negativo, mas sim sob o aspecto de um garantismo positivo, onde o Estado configura-se como protetor de determinados direitos fundamentais. Aqui a preocupação do sistema jurídico está no “fato de o Estado não proteger suficientemente determinado direito fundamental, caso em que estar-se-á em face do que, a doutrina alemã, passou a denominar de “proibição de proteção deficiente”.”39

38

QUEIROZ, 2008. Op. cit., p. 396.

39

STRECK, Lenio Luiz. Bem jurídico e Constituição: da proibição de excesso

(ubermassverbot) à proibição de proteção deficiente (untermassverbot) ou de como não há blindagem contra normas penais constitucionais. Disponível em:

<https://ensaiosjuridicos.files.wordpress.com/2013/04/bem-jurc3addico-e-constituic3a7c3a3o-da-proibic3a7c3a3o-de-excesso-lenio.pdf>. Acesso em: 10/10/2015. p. 8.

Referências

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