UFSC
UNIVERSIDADE
FEDERAL DE SANTA CATARINA
_CURSO
DE
MESTRADO
EM
EDUCAÇÃO
LINIIA
DE
INVESTIGAÇÃO:
EDUCAÇÃO
E
CIÊNCIA
l
_ . . -
CONCEPÇOES
DE
TECNOL_OGIA
zUMA
CONTRIBUIÇÃO
PARA
A
EORMAÇAO
DE
PROFESSORES
DAS
ESCOLAS
TÉCNICAS
Dissertação
apresentada
como
requisitoà
Obtenção
do
grau
de
Mestre
em
Educação
SOLANGE MARIA
LOUREIRO
Orientador:
Dr.
Arden
Zylbersztajn
Coorientador:
Dr.
Demétrio
Delizoicov
UNIVERSIDADE
FEDERAL DE
SANTA
CATARINA
CENTRO DE
CIÊNCIAS
DA
EDUCAÇÃO
PROGRAMA
DE PÓS-GRADUAÇÃO
CURSO DE
MESTRADO
EM
EDUCAÇÃO
“CONCEPÇOES
DE
TECNOLOGIA
.-UMA
CONTRIE UJÇÃO PARA
A
FORMA ÇÃO
DE
PROFESSORES
DAS ESCOLAS
TECNICAS
'Ã » ADissertação
submetida ao
Colegiadodo Curso
de Mestrado
em
Educação do
Centrode
Ciências
da
Educação
em
cumprimento
parcialpara a
obtenção do
títulode
Mestreem
Educação.
APROVADO
PELA
COMISSÃO
EXAMINADORA
em
22/08/96Prof. Dr. Prof. Dr. Prof. Dr. Prof. Dr. Prof. Dr. //I “V / ,V /' /
/
× ¬Arden
Zylbersztajn - (Orientador)//_\
Demétrio Delizoicov (Co-orientador)EJA
bd
~'`
zé ar”/1
Herivelto
Moreira-CEFET/PR
(Examinador)Z/
Edmundo
Carlos deMoraes
(Examinador)~WGfi
'José
André
Peres Angotti (Suplente) , z7/
/. ,._ //
wi ‹
¬ _,/LL f -
WGE
ARIA
LOU
IRO
¿}\1›osto
nos
tennos
mais
dramáticos,
pode-se
fazer
a
acusação de que
o
crescimento descontrolado
da
tecnologia
destrói
as
fontes
vitaisde
nossa
Ílumanidade.
Cria
uma
cultura
sem
uma
base
moral.
/Kljinacertos
processos
mentais
e relações sociais
que
tomam
a
vida
humana
digna
de ser
vivida.¿Ím suma, a
tecnologia tanto
e'amiga
como
inimiga...precisamos
de
estudantes
que
compreendam as
relações entre
nossas
técnicas
e
nossos
mundos
sociais
epsíquico,
de
modo
que
possam
iniciarconversas
informadas sobre aonde
a
tecnologia
esta'nos
levando
e/¿/Veil
ćfostmanj
A
Vvtewpøu'/,Wnário Wbunoel
`¿}oureiro,pela
azmor
que
no-âzdedzzloow
ezpalm
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de
\/(douque
døízxzow.Sua
prezâønçaz
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Ao-
Gilberto,www
prúm>‹'/pe
realz,pelo
azmor,
‹'znoøv11.“wo~ ezajuda/
rwvy
horazâ
O
A
Deus
por iluminarmeu
caminho.O
Aos meus
pais,Mário
e Maria, pelo amor, dedicação e exemplos de vida.O
A
meus
irmãos, cunhadas e sobrinhasque sempre
sefizeram
presentesem
todos osmomentos.
O
Aos meus
orientadores, professoresArden
Zylbersztajn e Demétrio Delizoicov, pelasegurança na orientação recebida e pela
compreensão
e paciência dedicadas.O
Aos
amigos, cujas presenças e palavras, muitas vezes, sãoo
que nosmantém
caminhando.0 À. Universidade Federal de Santa Catarina pela estrutura oferecida para a conclusão deste
O
À
Escola Técnica Federal de Santa Catarina pela oportunidade de aperfeiçoamento.O
Aos
colegas professores daETF/SC
eUNED/SJ
que tão gentilmente se colocaram àdisposição para a realização das entrevistas
que
subsidiaram as conclusões desta pesquisa.SUMÁRIO
Lista de FigurasResumo
Abstract ›I 0CAPÍTULO
1 -SITUANDO
A
PESQUISA
`* 1.1 Introdução1.2
Porque
escolhemos pesquisar sobre o ensino tecnológico1.3 Características
do
CTS
CAPÍTULO
2
-cONcEI݂OEs
DE
TECNOLOGIA
2.1 Introdução2.2
Concepção
Positivistaou
Tecnocrática2.3
Concepção
Marxista e Neo-Marxista2.4
Concepção
SocialDemocrata ou
dos Teóricosdo
Pós-Industrialismo2.5
Concepção
Político-Ecológica\
2.6 Ciência Básica
(CB)
- Ciência Aplicada(CA)
- Tecnologia2.6.1 Ciência Básica
ou
Pura(CB)
2.6.2 Ciência Aplicada
(CA) ou
Pesquisa Aplicada3.1 Introdução
3.2 Aspectos da implantação da ciência e tecnologia
no
Brasil 3.3O
ensino técnicono
Brasil3.3.1 Periodo Colonial
3.3.2 Período Imperial
3.3.3 Período da República Velha
3.3.4 Período de 1930 até 1950
3.3.5 Periodo àe'19óo até 1980
3.3.6 Pen'Odo de 1980 até o
momento
atual3.3.7
Reflexões
sobre a história dasETFS
3.4
As
novas diretrizes para O ensino técnico3.4.1
As
atuais diretrizesdo
MÍEC
3.4.2
As
atuais diretrizes daETF/
SC
CAPÍTULO
4 -A
PESQUISA E
SUA ANÁLISE
4.1 Introdução
4.2 Escolha
do
tipo de instrumento de pesquisa4.2.2 Entrevista semi-estruturada
4.3 Elaboração
do
instrumento de pesquisa4.3.1 Teste-piloto
4.4 Processo de escolha dos entrevistados
4.4.1 Universo e população 4.4.2
Amostra
4.4.3 Caracterizaçãoda
amostra 4.5 Realização da entrevista 4.5.1O
primeiro contato 4.5.2 Aentrevista4.6 Transcrição das entrevistas
4.7 Construindo a análise
4.8
A
análise4.8.1
Concepção
de tecnologia4.8.2 Possibilidade de
mudança
4.8.3 Ciência Básica (CB), Ciência Aplicada
(CA)
e Tecnologia4.8.4 Discussão sobre a concepção de tecnologia
4. 8.5
Educação
Tecnológica4.8.6 Discussão sobre a
Educação
Tecnologica e suas diretrizesCAPÍTULO
5 -EDUCAÇÃO
TECNoLÓG1CAz
sUGEsTÕI‹:s
PARA
MUDANÇAS
5.1 Introdução -5.2 Características
da formação
dos professores5.2.1
Os
Cursos deEsquema
I e II A5.3
A
formaçãoque
asETFS
pretendem oferecer aos seus professores _5.4 Sugestões e
Encaminhamentos
5.5 Considerações finaisANEXOS
Fig. 01 - Papel da Tecnologia
LISTA
DE
FIGURAS
Fig.
O2
- Possibilidade deMudança
‹Fig. O3 - Ciência Básica, Ciência Aplicada e Tecnologia
Fig.
O4
- Tipo deFormação
Fig. O5 - Diretrizes
do
MEC
eETF/
SC
Fig.O6
- Papel das DisciplinasRESUMO
Tendo
como
pressupostoque
a escolatem
um
papel social importante eque
cabe àEscola Técnica Federal de Santa Catarina
(ETF/SC)
formar "cidadãos-técnicos",ou
seja,fomecer
subsídios para
que
seus alunosconsigam
atuarcomo
tais,entendemos
que o professortem
um
papel essencial nesse contexto. Nesta pesquisa
procuramos
entrevistar os professoresque atuam
nos vários cursos da Escola para caracterizar a
forma
como
elesconcebem
a tecnologia e aeducação tecnológica, e , ainda,
como
essas concepções se traduzemem
suas disciplinas.Após
aanálise das entrevistas, percebemos, que falta clareza a esses professores
com
relação a certos aspectosque envolvem
a ciência-tecnologia e suas implicaçõescom
a sociedade.Nossa
contribuição foino
sentido de explicitar algumas concepções de tecnologiaque
deverão fazer partedo
currículo dos cursos de formação deles, tendoem
vistaque
os atuaisEsquemas
I e IInão
priorizam estas reflexões
em
suas abordagens. Essas concepções poderão auxiliar os professores acontextualizar melhor a categoria tecnologia de acordo
com
seus pressupostos e suas perspectivasde intervenção, pennitindo conferir-lhe um-~ significado mais
amplo
derivado de suas dimensõessociotecnológicas, organizativa e cultural. i
xii
ABSTRACT
Assuming
that 'the school has an important social role and that Escola TécnicaFederal de Santa Catarina
(ETF/SC)
is supposed to graduate “citizen-technicians”, i.e., providemeans
so that students are able to act as such, I understand that teachers play a crucial role in thecontext. In this study I interviewed teachers
who
act in different coursesof
this school in order to characterizehow
they understand technology and technological education, and still,how
theirconceptions are translated through their disciplines.
Afier
analyzing the interviewsil detected thatthese teachers still lack light
on
some
aspectswhich
involve science and teclmologyand
theirimplications with society. This survey contributes to the research in the area in the sense
of
expliciting
some
conceptionson
the technologywhich
should be partof
these teachers' coursecurricula, having in
mind
that the currentEsquema
I and IIdo
not favor these reflections in theirapproaches.
Such
conceptionsmay
help teacher to contextualize better technology as a categoryaccording to their presuppositions and perspectives
of
interventions, giving it a broadermeaning
1.1
Introdução
O
_desenvolvimento da ciência acarretou avanços tecnológicos, acelerando asmudanças no
mundo
do
trabalho, refletindoem
mudanças
nos níveis econômico, político e social.Podemos
dizerque
a Ciência e a Tecnologia(C&T)1
"foijaram" a sociedade atual,que
têm
em
ambas
a sua base de sustentação, eque
estes conhecimentos estão Ccotidianamente
(re)organizando nossas vidas, conseqüentemente alterando nossas consciências.
A
"revolução" científica-tecnológicano
mundo
do
trabalho fezcom
que
mesmo
as tarefas mais 'simples dosprocessos produtivos se sustentassem
numa
complexidade de conhecimentos. Isto passou a exigirda escola
uma
nova forma
de educar. Hoje,há
necessidade crescente de se entender os processostecnológicos
com
que convivemos
diariamente.A
escolatem
um
papel social importante,na
medida
em
que
deve contribuir para acompreensão
destes processos.Entretanto, segundo
ANGOTTI
(1991),embora
atualmente seja inquestionávelque
C&T
sejam partes integrantes da culturaz, pareceque
o seu ensino nãotem
propiciadono
âmbito das nossas escolas, práticas pedagogicas que, desvelando
o
conhecimento tecnológicoem
sua associaçãocom
o
científico e contextualizando-o,pemútam
um
melhor entendimentode
nossas realidades, auxiliando a formar cidadãos capazes de atuar
numa
perspectivatransformadora.
Logo, entendemos
que é necessárioque
a escola e a atuação docente proporcionemuma
educação que desvende omeio
em
que
vivemos, dando-nos condições de avaliá-lo e repensá-lo.Como
aC&T
são partesdo
nosso cotidiano, é importanteque
a escola'
Para este trabalho as variáveis ciência e tecnologia serão abreviadas como C&T.
3
Comungam
da mesmaCap. 1 - Situando a Pesquisa 2
consiga
fomecer
subsídios para entendê-las, parapodermos
convivercom
asmesmas, procurando
não endeusá-las,
mas
sabendo usá-las para conseguirmosuma
sociedade melhor para a maioria.Com
relação ao ensino tecnológicoo
papel 'da escola de (re)pensar e (re)avaliar asquestões
da
C&T
em
interaçãocom
o
social, é ainda de maior importância, tendoem
vistao
seucaráter específico.
1.2
Porque
escolhemos
pesquisar sobre o ensino tecnológicoPraticamente toda a nossa vida acadêmica transcorreu
no
âmbitoda
áreatecnológica, desde
o segundo
grau até a especialização. Contudo,em
nenhum
momento
dessa formação tivemos a oportunidade de convivercom
o conteúdo dealguma
disciplinaque
possibilitasse reflexão sistemática a respeito das implicações
da
C&T
em
nossas vidas e das profundas modificaçõesque
elas incitamno
mundo.
A
lacuna deixada pelos cursosque
freqüentamos na área tecnológica foram fontes de muitos dos questionamentos
que
nosfizemos,
ao longo dos anos,
como
professora daETF/SC,
ligada aoCurso
de Eletrotécnica. Parece-nos que utilizamos a tecnologiacomo
"instrumento"no
mero
repasse dos conteúdos e,no
entanto,não fazemos
da
mesma
o
eixo de reflexãodo
ensino técnico, permitindoque
as questõestecnológicas
possam
ser desveladas para alémdo
seu caráter puramente técnico.Ao
ingressarmosno Mestrado
em
Educação
já tínhamos clarezaque
gostaríamos de pesquisar algo sobre aeducação tecnológica,
que
nos pudesse auxiliarnuma
perspectiva deabordagem
diferenteda que
tivemos enquanto aluna e docente desta área de formação.
Sempre entendemos
que a educação deveria ser algo que apontasse perspectivas, e que contribuísse para entender omundo
naturalque
nos cerca e os processos sociaisque
nele sedesenrolam.
Em
se tratando da educação tecnológicanão
podemos
também
deixarde
desejarque
ela nosdê
condições de atuarmoscomo
bons técnicos.Por
isso, desejamosuma
educação
tecnológica
que
reconheça na tecnologiaum
enorme
potencial para auxiliarno
desenvolvimento,mas
que
isto nãofique
limitadosomente
ao progresso material e quetambém
não
seja encaradacomo
a única saída para os problemas da humanidade.Desejamos
participar deum
processoem
que
auxiliemos na formação de técnicos,mas
que
estes nãopercam
sua identidadehumana
econsigam
atuarcomo
"cidadãos-técnicos", tendo consciênciado
seu papel social.Para conseguirmos viabilizar
uma
propostade
educação tecnológicaque
tenhapor
objetivo, não só a formação
do
técnico,em
suas habilidades parao
trabalho, mas, sobretudo, aprioridade na formação
do
cidadão critico e conscientedo
papelque
a tecnologiatem
na
nossasociedade e suas implicações, é necessário que:
1.
A
escola esteja interessadaem
desenvolver esta proposta;2.
Que
os professorestenham
clarezaque o
ensino técnico tem, alémdo
seu caráter específico,um
alcance socialque
"precisa ser explicitado, epara
ser trabalhadoem
sala de aula, pressupõeum
magistério social e culturalmentecomprometido
com
uma
educação
técnica enão
simplesmente
com
a
transmissãode
conteúdos visandoa
uma
profissionalização"(PETEROSSI,
1994, p.132_).Neste sentido, o
movimento
CTS
(Ciência - Tecnologia e Sociedade),que
surgiu na década de 70,pode
oferecer parâmetrosque
balizemuma
atuação educacional na área tecnológicaem
sintoniacom
estes aspectos.As
abordagensCTS
poderão ajudar na formação destesnovos
"cidadãos-técnicos",
uma
vez que é seu objetivo procurar entender as relaçõesque
existem entreC&T
esuas implicações
com
o social.É
relevante dizerque entendemos
cidadaniade
uma
forma
ampla,ou
seja, ser cidadão implica "conhecer os direitos e obrigações decada
um,em
pensar
por
sipróprio, ter
uma
visão criticada
sociedadena
qual se vive, especialmentea
disposiçãode
Cap. 1 - Situando a Pesquisa 4
1.3 Características
do
CTS
O
movimento
CTS
tem
por objetivo incluir o tratamento dadimensão
cívica,científica e ética
da
tecnologia,bem como
políticas ligadas às questões tecnológicas ecomo
elasfiguram
em
nossas vidas(SOLOMON,
1995). Essas abordagenstêm
sido largamente difimdidasem
paísesda
Europa
eda América do
Norte.As
abordagensCTS
apresentadaspor
AJKENHEAD
(1987)têm
como
objetivoauxiliar os alunos a entenderem
o
mundo
natural,o
mundo
tecnológico eo
mundo
social,onde
as suas experiências acontecem, visualizando as interrelações entre eles.O
CTS
se inserenum
movimento
maiorque
visa apromover
uma
alfabetização tecnológica,mesmo
em
espaços educacionaisnão
restritos ao ensino técnico,com
a intençãode
preparar os cidadãos para
uma
participação mais democráticacom
relação às decisõessociotecnólogicas.
É
propósito da instruçãoCTS,
segundo
AIKENHEAD
(1987), desenvolver osestudantes
em
seus aspectos pessoais, sociais e intelectuais. Dentre estes aspectos estão: "auto estima, técnicasde comunicação
oral e escrita,pensamento
lógico, técnicasde
resoluçãode
problemas,
tomada de
decisão,aprendizagem
colaborativa/cooperativa, responsabilidade social, cidadania ativa, flexibilidade cognitiva eo
interesse ativo nas questões sociais" (p. 217-8) (tradução nossa).
As
estratégias de ensino para a instruçãoCTS
são muitas, por isso,exigem
um
grande preparo dos professores, pois são usadas: " Conferências, demonstrações, sessõesde
questionamento, práticas
de
resoluçãode
problemas
com
palavras, laboratórios, simulações, jogos,desempenho
de papéis, fórunsde
debates, projetosem
grupos, escriturasde
cartasa
autoridades, pesquisa ativa, trabalho
de campo,
convidados conferencistas eação
comunitária"No
entanto, para Hall (1987), as abordagensCTS
apresentam problemas tais COIIIOÍ" * Falta
de
definições; 1
* Falta
de
estrutura teórica;* Procedimentos inadequados
de
desenvolvimentode
currículo;* Resistência
dos
professores;*
Oposição
a
educação mais
elevada;*
Deficiência
deformação
dos
professores;* Periodicidade de materiais de currículo". (p. 726) (tradução nossa).
Dois
dos pontos mencionados, "Resistênciados
professores" e a "Deficiênciade
formação
dos
professores", são particularmente significativosao
se consideraruma
educação
tecnológica
que
atue nesta perspectiva. Neste trabalho pretendemos abordar os problemasrelativos a estes dois pontos.
GILBERT
(1992) identifica três maneirasde abordagem
para a tecnologia,que
seriam: "ensinar para, sobre e
na
tecnologia"(GILBERT,
apud
ACEVEDO,
1995, p. 80)(tradução nossa). Para
ACEVEDO
(1995), aopção de
ensinar "para a tecnologia" visa a formartrabalhadores para a indústria, pois centra-se nas questões técnicas e tende a enfatizar
uma
visão detenninistado
desenvolvimento.O
ensino "sobrea
tecnologia"tem
como
meta
ressaltar osaspectos culturais e organizativos da tecnologia, sendo a orientação das abordagens
CTS, mas
não
tem nonnalmente
preocupações de aquisição de capacidades técnicas e destrezas práticas.Entretanto,
ACEVEDO
(1995) diz que o ensino segundo* a visão "na tecnologia",propõe
dar amesma
importância a todas as dimensõesda
tecnologia,ou
seja, a técnica, a cultural e aorganizativa.
A
opção
de ensino "na tecnologia" éuma
proposta para a educação tecnológicaque
norteará as nossas análises, poisentendemos que
acomponente
técnica já é consideradade
boa
qualidade, restando-nos incorporar a esta as outras duas componentes, a cultural e aCap. 1 - Situando a Pesquisa 6
Nossa
argumentação éque há
necessidade de se incluir pelomenos
uma
disciplina,em
todos os cursos técnicos ligados aETF/
SC,que
discuta e reflita sobre os aspectos ligados àsabordagens
CTS
eque
estes estejam articuladoscom
aabordagem
técnica.Porém,
esta proposta não exclui, pelo contrário, reforça a possibilidade deque
as outras disciplinastambém
contemplem
alguns aspectos das abordagensCTS.
Enfatizamostambém
a necessidade deque
toda a
comunidade
escolar esteja envolvida, pois segundoSOLOMON
(1987), os materiaisCTS
são essencialmente interdisciplinares.
É
importantetambém
que
efetuemos estes debates sobre a naturezada
tecnologia,conforme propõe
SOLOMON
(1995), deforma que
amesma
possa ser vistana
sua perspectivahistórica, permitindo aos alunos entenderem as inovações tecnológicas
em
seu desenvolvimento ao longodo
tempo, "onde as histórias sobre pessoas e suas necessidadestenham
um
lugarprivilegiado"
(SOLOMON,
1995, p. 17) (tradução nossa).A
implementação deuma
proposta deste tipo prescindeum
conhecimento dasconcepções e desejos dos alunos e dos professores sobre a
C&T.
Pois, segundoACEVEDO
(1995),
poucos
são os instrumentosque apontam
as idéiasque
os alunos e os professorestêm
sobreC&T
e sua interaçãocom
o social. Utilizando-se de alguns trabalhos, realizados por outros pesquisadores,ACEVEDO
(1995) verificaque
alunos e professores, geralmente,têm
crenças taiscomo:
-
A
maioria consideraque
a tecnologia é subserviente à ciência, sendo apenasuma
aplicaçãodesta;
C
-
Adotam
a visão tecnocrática de decisões sociais,onde
os técnicos teriam maiores condições dedecidir devido aos seus conhecimentos,
-
Consideram
que osgovemos
estão mais capacitados a coordenar programas de pesquisa e desenvolvimento(P&D);
-
A
tecnologia seria a aplicação práticada
ciênciano
mundo
moderno
para produzir artefatoscom
~a intençao
de
melhorar a qualidadede
vida.Outro ponto abordado por
ACEVEDO
(1995) são os estudos sobre a questãode
gênero.
Segundo
ele estes estudostêm
recebido maior atenção eapontam
para diferençasde
interesse
com
relaçãoao
estudoda
tecnologia entremeninos
e meninas, e isto estaria ligado aospapéis
que
se atribuem socialmente a eles.Como
o professornão
é neutro, as suas concepções, sejam elas políticas,ideológicas, filosóficas, pedagógicas, etc., estarão presentes
em
seu discursona
salade
aula,mesmo
que
implicitamente, e guiarão suas ações. Explicitar nossas concepções, acercade
qualquer fator
que
possa interagirem
nossa vida é importante, porque pode-nos desvelarprocessos de abordagens e soluções altemativas para os problemas
que possam
surgir.Como
sugere
BOHM
(1989),devemos
manter nossa criatividade "acesa",mas
isso só é possível setivermos consciência
do que
nos cerca.No
casodo
professor, a "clareza"de
suasconcepções
é importante pela "influência" e pela responsabilidadeque
omesmo
tem
na formaçãode novos
"cidadãos- técnicos".
Como
as abordagensCTS,
no
Brasil, segundoTHIOLLENT
(1982), são recentes,é necessário
que
setomem
iniciativasno
sentido de incluirno
currículode
formação
dosprofessores das escolas técnicas e tecnológicas essas abordagens. Pois, segundo
PETEROSSI
(1994), estes são normalmente "colocados"
em
salade
aulasem
quetenham
tidouma
formação
adequada
para tal.São
geralmente profissionais da área para a qualvão
lecionar, técnicos de segundo grauou
de nivel superiorsem
qualificação prévia para o magistério, habilitando-se paraas disciplinas
em
questão mediante seus conhecimentos específicos,o
que lhes confere, muitasvezes, dificuldades de articulação desses conhecimentos específicos,
com
os aspectosque
aquiCap. 1 - Situando a Pesquisa 8
Por
isso, explicitar as concepçõesque
os professoresda
Escola Técnica Federalde
Santa Catarina
(ETF/SC)3
têm
sobre a tecnologia e a educação tecnológica, poderá nos auxiliar a entendermos melhorcomo
se estruturao
ensino técnico nasmesmas,
ecomo
poderíamos
agirpara implementar nossa proposta. Inicialmente nossa hipótese foi
que
predominava aconcepção
positivistaou
tecnocrata entre os professores, contudo, ao longoda
pesquisa, verificamosque
isto, pelo
menos
em
nível de discursonão
era verdadeiro, pois os professoresmostraram que
algumas situações,
que
são resultados da utilizaçãoda
tecnologia, são preocupações presentesem
suas aulasou
pelomenos
em
seus discursos. Contudo, após a pesquisa constatamos a necessidadede os
mesmos
refletirem deforma
mais aprofundada sobreo
papelda
tecnologia, suas implicaçõescom
o social, o papel da educação tecnológica eo
seu papelcomo
professorde
disciplinastécnicas.
A
Temos
clareza que, para termosum
ensino técnico de qualidade,que forme bons
"cidadãos-técnicos",
comprometidos
com
a buscade
uma
sociedade mais democrática,não
éapenas de professores
comprometidos que
precisamos,também
necessita deuma
políticaeducacional coerente
com
estameta
e de boas condiçõesde
trabalho. Entretanto,no
dia-a-diada
sala de aula a peça-chave é
o
professor e dele dependeráem
muito, os caminhosda
escola.Logo,
este estudo pretende evidenciar as idéias e concepções que os professoresda
(ETF/SC)
e(UNED/SJ)
têm
acercado
papelque
osmesmos
atribuem à tecnologia nasociedade,
do
tipo de educação tecnológicaque
eles desejam, da percepçãoque
elestêm
de
como
a Escola eo
MEC
encaminham
estafomiação
e, por último,como
e/ou se os aspectos das interrelações entre ciência-tecnologia e sociedade são discutidos/refletidosem
suas disciplinas.Estes dados
foram
obtidos a partir de entrevistas. Portanto, este trabalhoficou
assim estruturado:3
Para este trabalho foram entrevistados, também, professores da Unidade Descentralizada de Ensino de São Jose'
(UNED/SJ), tendo
em
vista que, apesar da vinculação administrativa entre a ETF/SC e as UNEDs, as mesmasNo
Capítulo 2 apresentamos quatro concepçõesde
tecnologia,bem como
sobreas áreas de conhecimento de Ciência Básica (CB), Ciência Aplicada
(CA)
e Tecnologia, elaboradascom
o
objetivode
servir de referencial teórico, auxiliando na caracterização daspossíveis concepções dos professores.
No
Capítulo 3 discutimos as políticasque
guiaram a implantaçãoda
C&T
edo
ensino técnico
no
Brasil, apresentando os motivosque regeram
a legislaçãodo
ensino técnico,desde sua criação
em
1909
atéo
momento
atual, verificando quaisforam
as possíveis diretrizesque
nortearam omesmo
em
relação aos aspectosda
C&T
ecomo
no
âmbito das Escolas' TécnicasFederais (ETFS) as
mesmas
foram
ou
não direcionando suas formações.No
Capítulo 4 descrevemos a parte empírica da pesquisa,com
a metodologia utilizada, os resultados obtidos e suas conclusões.A
partir dos dados e das conclusões, apresentamosno
Capitulo 5, sugestões para aformação de professores das escolas técnicas, mais coerente
com
aforma
como
concebemos
amesma, que
vai ao encontroda "Formação
para os Professores" defendida atualmente pelasETFs
eCEFETs
(Centros Federais deEducação
Tecnológica).CAPÍTULO
2
CONCEPÇÕES DE TECNOLOGIA
2.1
Introdução
_
Uma
pesquisa bibliográfical permitiuque pudéssemos
caracterizar 'quatroconcepções
que
poderiam nos auxiliar a contextualizar melhor a categoria tecnologia a partirde
seus pressupostos e das perspectivas de intervenção.
Também
procuramos
caracterizar eidentificar melhor as áreas de conhecimentos
de
Ciência Básica (CB), Ciência Aplicada(CA)
etecnologia, verificando
o
tipo deabordagem
em
cada área, suas abrangências, suas interligações,suas limitações e o
fluxo
de conhecimentoque
ocorre entre elas,porque
acreditávamosque
osprofessores teriam dificuldades quanto a isto.
i
Nossa
intenção inicial erade
usar estas concepções para procurar enquadrar os pensamentos e crenças dos professores, entretanto, istonão
foi possível, por motivosque
ficam
claro na análise das entrevistas, apresentadas
no
Capítulo 4 desse trabalho.No
entanto,temos
clareza
que
as concepções elaboradas poderão auxiliar os professores a situaremmelhor
as categorias mencionadas anteriormente e poderão fazer parte dos curriculos dos cursosde
formação dos
mesmos, conforme
sugestão apresentadano
Capítulo 5.As
concepções explicitadas a seguir tratam aC&T
de acordocom
a visão política eeconômica
de desenvolvimentoque
as guiam, assimcomo
"determinam" normalmente,uma
educaçãoque
reforce ahegemonia
políticaque
asmantém. Logo,
cadauma
delas aponta paraum
tipo de sociedade, e, portanto, de educação.
H
1
Agradecemos o auxilio do professor Dr. Paulo Vieira, nas delimiracões das concepções, bem como por algumas
Visando propiciar aos leitores
que
desejarem melhor aprofundamentoou
reflexãosobre os aspectos das várias concepções explicitadas a seguir,
colocamos no
anexo I, comentários de bibliografiasque
nos auxiliaram a elaborar asmesmas.
2.2
Concepção
Positivistaou
TecnocráticaNesta concepção a tecnologia é vista
como
meio
para alcançarmoso
progresso,sendo encarada
como
autônoma
e auto-determinante,ou
seja, independentedo
contextoem
que
está inserida, a definição social é excluída.
Nesta
concepção, o essencial é adaptaro
homem
à máquina.O
conhecimento seja científicoou
tecnológico é tidocomo
objetivo e neutro. Estacorrente reconhece a teoria
como
fundamentalno
processodo
conhecimento epropõe que o
mesmo
se desenvolva através deacumulação
de evidências empíricasque
comprovem
as teorias.Supõe que
o objeto de conhecimento seja regido por regularidades possíveis de se transformaremem
leis. Neste sentido, passa a ter importânciao
grau de utilização técnica desses conhecimentos(GREDIAGA,
1987).A
neutralidadedo
conhecimentoque
pleiteia sero
cientistauma
pessoaque
procura conhecer por conhecer e
o
tecnólogoque
procura criarsem
ter maiores preocupaçõescom
a naturezaou
a sociedade(BUNGE,
1980) foi combatida por várias correntes.Hoje
amaioria dos sociólogos, filósofos e epistemólogos
admitem que
o serhumano
é caracterizado pelaintencionalidade de suas ações,
bem
como,
a construçãodo
conhecimento sedá
pela interaçãosujeito-objeto,
permeado
pelo contexto socialque
os engloba(PIAGET
eGARCIA,
apud
GREDIAGA,
1987).A
Concepção
Positivista-Tecnocrática enfatiza a ordem, a certeza, a precisão e aeficiência.
Sua
racionalidade prioritária se encerra na obtençãodo
lucro.Por
isso,o
sistema capitalista se "utilizou" maisdo que
nunca dos elementos definidos por esta concepção para seCap. 2 - Concepções de Tecnologia 12
legitimar.
A
divisãodo
trabalho, a especialização, a importânciada
máquina, a diminuiçãode
custos, via
aumento
de eficiência sãosempre
metas almejadas.Por
isso,o
critérioeconômico
prepondera e é considerado naturalmente racional(TI-IIOLLENT,
1980).A
tecnologia passa adar "suporte técnico
à
concentração e centralizaçãodo
poder econômico"
(VARGAS,
1984, p.21).
Segundo
ELLUL
(1979), esta sociedadetem
dificuldade de ser humanistaporque põe
em
primeiro lugar as coisas materiais.
`
Os
efeitos negativosda
tecnologia são vistoscomo
podendo
ser minimizados pela própria tecnologia.Ou
seja, as caracteristicas desagradáveisdo
desenvolvimento tecnológico,acredita-se, poderão ser superadas pela aplicação
da
própria tecnologia(ELLUL
1979). ParaELLUL
(1979), a tecnologia é autônoma, pois ela é auto-determinante e estaria totalmente forado
controle social. 'O
Estadoassume
as rédeas das decisõesem
termos de desenvolvimentoda
C&T
ea usa para legitimar-se e manter seus interesses de classe.
Conforme
diria Marcuse, aC&T
assumem
o papel de ideologia, despolitizando destaforma
as massas, quepassam
a ver nasmesmas
uma
forma
intrínseca de racionalidade, assumindo a "formade
uma
consciênciacomum
-positivista - e articulada
como
consciência tecnocrática"(MARCUSE,
apud
HABERMAS,
1980, p. 338). Nesta concepção os "donos
do
poder"tendem
a ser os técnicos porque, utilizando- se de decisores científicos,tomariam
decisões racionais a respeito dos problemas sociais.Entendemos que
nesta concepção a escola passa a teruma
função importante,que
é a de "dar" status, através das medidas de rendimento individual. Isto permite "a garantia
do
mínimo
de
bem-estar social,a
perspectivade
segurançado
lugar de trabalho,bem como a
estabilidade dos vencimentos. Esses
programas
de
substitutivos obrigao
sistemade
dominação
as chances
de
ascensão pessoal, ea
prevenir os riscosdo
crescimento"(HABERMAS,
1980, p.329)
2.3
Concepção
Marxista
eN
eo-MarxistaO
marxismo
propõe que o processo de conhecimento exigeuma
reflexãoque
permita construir o objeto de estudo,
em
sua complexidade, atravésde
uma
articulação das partescom
o
todo e interrelacionando teoria e prática, contextualizando-0 historicamente.O
marxismo
enfatiza a "relação
que
existe entreformas
particularesde
organização social emaneiras
distintas
de
reflexão"(GREDIAGA,
1987, p. 218) (tradução nossa).Admite que
toda ação eintenção
têm
um
caráter político, logo é impossível a neutralidadedo
conhecimento.O
marxismo advoga que o
conhecimento se constrói a partirdo
real, considerandoos meios
que temos
disponiveis, via interação sujeito-objetopenneado
pelo meio. Possui, portanto,uma
componente
psicogenética euma
social(GREDIAGA,
1987).l\./Iarx vincula o desenvolvimento tecnológico
não
apenas ao conhecimento
científico,
mas
compreendido
dentro das relações sociaisque
lhes dão origem. ParaMarx, o
desenvolvimento tecnológico não é neutro,
uma
vezque
responde aos interessesdo
capital. Paraele, contextualizando-0
em
sua época, o desenvolvimento tecnológico provocaria, a longo prazo,uma
contradição entre as capacidades deprodução
e a apropriação de riquezas, produzindoassim,
uma
nova
revolução demudança
das relações sociais de produção.Por
isso, paraMam,
"as inovações tecnológicas
assumem
um
papel
importantena
organização e reproduçãoda
vidasocial"
(GREDIAGA,
1987, p. 227) (tradução nossa).No
entanto,GREDIAGA
(1987) argumenta
que
nãopodemos
analisar o desenvolvimento tecnológico apenascomo
produtode
Cap. 2 - Concepções de Tecnologia
14
desenvolvimento
como
um
elementoque
afeta a vida cotidiana, e,em
última análise, nossasorganizações sociais e nossas consciências.
A
teoria marxista foi repensada pelos filósofosda
Escola de Frankfurt,que
"deram" à
mesma uma
componente
subjetiva, apoiando-seno
método
psicanalíticode
Freud.Desses autores os
que
mais trabalharamcom
a categoria tecnologiaforam Marcuse
eHabermas.
Para Marcuse, a ciência e a técnica passaram a ter,
na
sociedade industrial, dupla fiinção enquanto força produtiva e enquanto ideologia.À
medida que
o capitalismo foiganhando
espaço, a
C&T
foram
setomando
cada vez mais "eficientes", garantindo assim, adominação da
natureza e
do
homem,
que
passou a ver neste domíniouma
forma
"natural" de obtermaior
bem-
estar. Esta
dominação
setomou
tão "coerente"que
passou a legitimar o poder político. Para Marcuse, a racionalidade técnica seria o eixoda
alienaçãoda
sociedade contemporânea. Estaracionalidade determina "a autocoisificação
do
homem
sobas
categoriasdo
agir racional-com-respeito-a¡fins e
do
comportamento
adaptativo"(HABERMAS,
1980, p. 332).Habermas
dizque
estamos vivendo
numa
fase de "capitalismo tardio"2,em
que
as contradições geradasno
interiordesse sistema
podem
gradativamente levar àformação
deum
novo
consenso, na buscade novos
caminhos. `
A
intenção dos autores neo-marxistas é "mostrar"que
aC&T,
longe deserem
autônomas, são "armas" nas
mãos
das classes governantes e dos empresários que as utilizam paragarantir o domínio das elites
no
poder. Portanto, a tecnologia não é neutra,há
sempre por trásda
mesma
a ideologia demanutenção do
sistema capitalista.2Nesta fase, enfatiza Habermas, a contradição dentro do sistema capitalista não se dá entre forças produtivas e relações de produção.
A
contradição se encontra agora entre as exigências do sistema econômico que necessita devalores que justifiquem suas formas de desempenho e o sistema sócio-cultural que se vê impossibilitado de suprir tais valores (F reitag e Rouanet, 1990).
Tendo
como
princípioque
aC&T
são os elementos principaisda acumulação de
capital, na atualidade, a inovação tecnológica éuma
das formas pelas quais o capitalismoconsegue
o aumento do
lucro. Outraforma
de alcançaro
lucro seria através das transferênciasde
tecnologia.
Dentro da
divisão intemacionaldo
trabalho os países desenvolvidosproduzem
tecnologia e as
exportam
para os países subdesenvolvidos, muitas vezes, tecnologias já obsoletasnos países de origem.
O
problema maiorda
transferência de tecnologia éque
com
ela "introduz-setambém
um
novo
tipode
arranjo social. Ou, atémesmo,
um
novo
estilode
vida"(MEDEIROS,
1993, p. 34).
Nonnalmente,
a transferência de tecnologia tende a realimentar aacumulação de
capital, privilegiando minorias e agravando a exploração e a misériada
maioria(RATTNER,
1930)
RATTNER
(1980) argumentaque
para os paisesem
desenvolvimentoou
Subdesenvolvidos, o necessário seria identificar e controlar as transferências de tecnologia, incentivando a utilização de tecnologias intermediáriass produzidas nos institutos de pesquisas e
universidades. Isso implicaria novas prioridades e valores
que
determinem0
desenvolvimentoda
C&T,
ou
seja, necessitaiiamos deuma
nova abordagem
política,onde
a população deverá ser vistacomo
a riqueza mais importanteda
nação e a prioridade maior seria a satisfaçãode
suas necessidades básicas.Entendemos que
para obtermos isto, a educação terá papel fiindamental, desdeque
consigamos "constn1í-la"
como
um
processo educativo "pelo trabalho e pela pesquisa,em
vezda
orientação atual, que enfatiza
o
estudopara
o
trabalho epara
a
pesquisa"(RATTNER,
1980,p. 167). Esta educação deverá priorizar nos jovens a formação de
uma
consciência crítica, proporcionando atitudesque vejam no próximo
um
semelhante,que
cultivem o coletivo eque
3Tecnologias intermediárias são aquelas que se preocupam com a utilização de mão-de-obra (força de traballio),
Cap. 2 - Concepções de Tecnologia 16
acima de tudo despertem a criatividade. Desta forma,
quem
sabe,poderemos
ajudar, vianova
visão política e
novo
processo educativo, a construiruma
sociedade mais democrática.2.4
Concepção
SocialDemocrata
ou
dos Teóricosdo
Pós-IndustrialismoTeóricos
que
defendem
esta concepção,como
BELL
(1977) eTOFFLER
(1980),dizem
que
uma
nova
sociedadecomeçou
a surgir a partir de contradições existentesno
seioda
atual sociedade, dita industrial. Para eles
o marco da
mesma
foio
final daSegunda Guerra
Mundial,
quando aumentou
consideravelmenteo
número
de
pessoas trabalhandoem
escritórios,ou
seja,na
área terciária ( área de serviços).Já para
NEGROPONTE
(1995), estamos na erada
"pós-informação". Para ele, aera
da
"infonnação" caracterizou-se porum
aumento
considerável dos meiosde
comunicação.Com
isto conseguiu-se atingirum
maior público,podendo
especializar-se mais no atendimentode
pequenos
grupos.Porém,
na era da "pós-informação",o
público seráuma
única pessoa, sendoque
"tudo é feitopor
encomenda, ea
informação
é extremamente personalizada"(NEGROPONTE,
1995, p. 143). VSegundo
NEGROPONTE
(1995), nossa vida está setomando
uma
"1/Q
Qgit¿l",onde
os bits passarão a ter mais valordo que
os átomos.O
bitpode
ser encaradocomo
um
"estado",
como
por exemplo, ligadoou
desligado, dentroou
fora, zeroou
um. Para o autor nas"indústrias
da
informação edo
entretenimento, bits eátomos
sãoconfimdidos
com
freqüência"(NEGROPONTE,
1995, p. 18). Nestanova
"forma de vida",o computador
adquire importânciavital, porque é através dele
que
se viabiliza o "púb1ico unitário".Em
seu livro "Vida Digital" (1995),NEGROPONTE
vêcom
otimismo essanova
"forma de vida" viabilizada pela tecnologia. Contudo,
não
deixa de reconhecerque
todacrer nas vantagens
da
vida digital.São
elas: "a descentralização,a
globalização,a
harmonização
ea
capacitação"(NEGROPONTE,
1995, p. 196). Estas característica_s estariam ligadas às possibilidadesdo
usodo computador
pessoal, etendem
amudar
a naturezado
trabalho,do
comércio e até dos relacionamentos.
Como
os computadores,em
sua maioria,no
futuro, estarãoligados a redes mundiais, as pessoas de lugares mais distantes possíveis, poderão estar
em
contato, ajudando a criaruma
harmonia mundialque
nos conduzirá aum
estado de globalização ede diminuição das forças nacionalistas.
Porém,
para Negroponte, a melhor das características é apossibilidade de capacitação
que
ocomputador
produz, tendoem
vistaque
um
programa
decomputador pode
ser conhecido de muitos pontos de vista.Nessa nova
sociedade al tecnologianão
será a "mola propulsora",mas
um
recursoestratégico que deverá ser usado
como
sustentáculodo
sistema político. Esta tecnologia serámuito mais "vigiada"
em
termos ecológicos,econômicos
e sociais, e terá pormeta
auxiliar asociedade a sair da sua escassez
promovendo
o
bem-estar para a maioria(BELL,
1977).Para a sociedade pós-industrial, a base serão os serviços
com
predominânciade
atividades na área terciária.
A
informação será veiculadacom
muita rapidez e ocomputador ou o
microcomputador "assumem"
papéis importantes na organizaçãodo
trabalho.V
Nessa
sociedade o conhecimento teórico teráum
papel fundamental.As
ciências aplicadas que embasarão este conhecimento serão a eletrônica, a informática, a biologiamolecular, a oceânica, a nucleônica, a ecologia e as ciências espaciais. Isto implica
o
interrelacionamento entre
C&T,
que serão cada vez maior, dando-se ênfase à Pesquisa e ao Desenvolvimento(P&D). Por
isto, a universidade será a "instituição primordialda
sociedadeCap. 2 - Concepções de Tecnologia
13
As
características básicas4 dessanova
sociedade serão:l-
uma
produção
mais descentralizada,menos
produtos padronizados e séries mais curtas dosmesmos
ou
personalizadas;2- escala apropriada,
no
sentido de valorizaçãodo
"pequeno é belo"; 3- priorização da utilização de recursos renováveis;4- desurbanização, devido aos problemas enfrentados nas grandes cidades e a
uma
maior busca deharmonia
com
a natureza;5-
aumento do
trabalho feitoem
casa, enfatizandouma
maior aproximação da família,que
trabalhará unida. Condição só
tomada
possível devido ao desenvolvimento da indústria de baseeletrônica e a utilização dos microcomputadores e computadores;
6- altos niveis de
prossumo
(produtorque
é aomesmo
tempo
seu próprio consumidor).Três classes
comporão
anova
sociedade:uma
serácomposta de
cientistas eadministradores profissionais (elite), outra
composta
de engenheiros ede
professores (classemédia) e a última
composta
de técnicos e assistentes de ensino (proletariado)(BELL,
1977).Essa
nova
sociedade deverá enfatizar os contextos, as relações entre a parte e o todo e buscará novas síntesess _O
serhumano
estaráem
destaque viatomada
de consciência de sua importância.As
pessoas terão seus pensamentos influenciados pelos conceitos de "processa retroalimentação e desequilíbrio. Terãomais
consciênciadas
descontinuidadesque
fluem
diretamente das continuidades"
(TOFFLER,
1980, p. 352). Esta consciência seráaumentada
pelas novas descobertas dentro das ciências naturais, que deverão servir
como
reflexão para as estruturas de disseminação das informações."Todas as caracteristicas têm como base os livros;
O
Advento da Sociedade Pós-lndustrial (1977) eA
Terceira _Onda (1980).As
estratégias de desenvolvimento deverão priorizar as necessidades locais e levarem
consideração os caráteres religioso e cultural.A
tendência é se diluírem as fronteiras das nações atravésda
atuação das multinacionais..
A
educação, maisdo que
nunca, deverá enfatizar a multidisciplinaridade, a interdependência, tantodo
serhumano
em
relação ao seu próximo, quanto dos conteúdos.Deverá
resgatar a importância de se construir o "todo" via contribuição de cada
um.
Essa sociedade será"altamente tecnologista e antiíndustrial"
(TOFFLER,
1980, p. 24).Apesar
de reconhecermosque
grandes transformações estão ocorrendo,em
todosos níveis,
na
sociedade atual, parece-nosque não
podemos
embotar nossa visãodo
futurode
um
utopismo exagerado. Pois, "as
novas
tecnologias alteram as estruturasde
nossos interesses:as
coisas sobre as quais pensamos. Alteram
o
caráterde
nossos símbolos: as coisascom
que
pensamos.
E
alterama
naturezada
comunidade:
a
arena
na
qual ospensamentos
sedesenvolvem"
(POSTMAN,
1994, p. 29).Todas
as tecnologiastêm
seus beneficios e seusdéficits, e os beneficios não são colhidos por todos igualmente.
Ou
seja, a tecnologia tende a criar"uma
culturasem
uma
base moral"(POSTMAN,
1994, p. 12).Procuramos
interpretar Postman,vendo que
eleassume
uma
posiçãode que
a tecnologia é necessária,mas
nãopode
ser a única "cultura" existente. Pois,sem
dúvida, poderáser através dela
que
conseguiremos melhorar as condições de vida da maioria das populações. Entretanto, isto só se concretizará se a olharmoscomo
um
"instrumento"e não
como
um
fim
em
si
mesma.
Portanto, precisamos ter as rédeas dessa "carruagem" nas mãos, sobpena de sermos
guiados por ela. Precisamos de
computador?
É
claroque
sim.Mas, tambémiprecisamos
refletirsobre o seu uso
como
ferramenta. E, assimdevemos
fazercom
toda e qualquer tecnologia, pois, a tecnologia"mina
certos processos mentais e relações sociaisque tornam
a
vidahumana
digna
Cap. 2 - Concepções de Tecnologia 20
Dessa
forma,entendemos
ser importanteque
a educação desmistifique atecnologia e sua "teia" de envolvimentos e priorize a qualidade de vida
que
elapode
gerar.Se
estaqualidade de vida não for buscada para a maioria,
do que
nos adiantaria termosuma
sociedadealtamente tecnológica, se alguns dos problemas sociais
como:
a fome, o desemprego, as guerras, a poluição, etc., continuarão a existir? Acreditamosque
a tecnologia não sópode
como
deve
servir de parâmetro para discutir (refletir) os anseios sociais. É, portanto, essa qualidadede
vidaque
desejamos manter, eque
a educação,como
um
todo, deverá priorizar.i
2.5
Concepção
Político-EcológicaEsta concepção nasceu gradativamente
da
importante percepção, a partirda
segunda
metade
do
séculoXX,
dos problemas enfrentados pela população mundial,com
relaçãoao
meio
ambiente. Estes problemas, eram,no
inicio, locaisou
mesmo
regionais,mas
a partirda
década de
70 ganharam
escala mundial. -Poderíamos
dizerque
esta concepção surge enquanto critica à sociedade industrial,
e postula
como
idéia central a "gualidadeg
viga". Pressupõeque
o desenvolvimentohumano
deve ser conseguido enquanto harmonia entre
o
material eo
espiritual(VIOLA;
LEIS,
1991). Nesta visão, ohomem
de exploradorda
natureza deverá tomar-se aliado dela, reconhecendo seuslimites naturais, tanto
em
termos defomecimento
de recursos quanto de absorçãoda
poluição.Cu
seja, "a ecologia geral suscitao
problema
da
relaçãohomem/natureza no
seu conjunto,na
sua amplitude,
na
sua
atualidade. Suscitaum
problema de
vida, de morte,de
devir,para
a
espécie
humana
epara
a
biosƒera..."(MORIN,
apud
VIOLA;
LEIS,
1991, p. 23).A
ecologiaseria a síntese que procura reunir ciência, política e moral na busca de
um
mundo
melhor
para'A tecnologia nesta
concepção
é consideradacomo
contraditória, revelando seucaráter tanto positivo quanto negativo
(DALY;
ROEGEN,
apud
VIOLA;
LEIS, 1991). Para isto,a
humanidade
se quiser sairda
criseem
que
se encontra, deverá priorizar o usode
tecnologiasque levem
em
consideraçãouma
racionalidade social enão
apenas a racionalidademeio/fim,
predominante
no meio econômico
capitalistaque
tende amaximização do
lucro.A
tecnologiadefendida pelos ecologistas é aquela
que
tenhacomo
meta
a justiça social e seja solidáriacom
asgerações futuras (Idem, Ibidem).
No
entanto, se estas são as metasdo
ecologismo, e existe consenso quanto àsmesmas,
resta-nos veiificarque
há contradições intemasque
dividem os ecologistasem
setoresdentro
de
uma
luta aparentemente igual. Estes setores são:"a)
o
ambientalismo-conservacionista,que
buscaa
preservaçãodo
ambiente
em
compatibilidade
com
0
sistema capitalista. Este setor tevesua
origemna América do
Norte,
mas
tem se expandido pelaEuropa
Ocidental, Ásia,Oceania
eAmérica
Latina;b)
O
ecologismo radicalde ação
direta,que
se expressaem
organizaçõescomo
Greenpeace
e Earth First,que
ataca igualmente os sistemas capitalista e socialistaem
seus pontosmais
vulneráveis desdeuma
perspectiva de interpelaçãoda
consciênciadas
massas. Este setor existe
predominantemente
no
hemisfério norte; c)a
"Política Verde ", constituída atravésde
uma
ampla
constelação
de
associaçõesecologistas, redes informais e partidos verdes,
aponta
para
a
participaçãona arena
parlamentar (local, estadual, nacional e supranacional), tendo
como
objetivo ecologizara
cultura política;chegam
inclusive,a
participarde governos de
coalizãoem
condiçõesfavoráveis. Este setor está hoje expandido
na Europa
Ocidental, Oriental eno
Brasil;d)
o
ecologismo camponês,que
valoriza os sistemas emodos
de
vida ruraiscom
vistasa
um
desenvolvimentode
tecnologias apropriadasde
baixo impacto ambiental,baseadas
em
redes comunitárias. Este setor está presente especialmentena
Ásia,mas
também
aparece
em
alguns lugaresda
América
Latina (comunidades indígenas bolivianas e equatorianas; seringueiros indígenas e ribeirinhosda Amazônia
brasileira;comunidades
experimentais
da
região centraldo
Brasil);e)
o
ecologismo deação
global, de forte base cientifica, orientadopara
a
modelização
planetária
em
termos de diagnóstico ede prospecção de
alternativas (do qualsão
exemplos
a
Society forGeneral
Systems Research,0 Clube de
Roma,
eo
WorldWatch
Institute).
Sua
ação
estápredominantemente
dirigidaa
influenciar decisores (nãoapenas
políticos)
em
diversos níveis.A
lógicade
intervenção destegrupo
leva-osa
enfatizara
necessidade
premente de
instituiruma
autoridade mundial, -tanto