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Swap e deveres dos intermediários financeiros : celebração de swaps de taxa de juro e os deveres de informação dos intermediários financeiros

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UNIVERSIDADE CATÓLICA PORTUGUESA

Swap e deveres dos intermediários

financeiros:

Celebração de swaps de taxa de juro e os deveres de

informação dos intermediários financeiros

Diogo Oliveira Santos

Faculdade de Direito | Escola do Porto 2018

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UNIVERSIDADE CATÓLICA PORTUGUESA FACULDADE DE DIREITO

ESCOLA DO PORTO

Swap e deveres dos intermediários

financeiros:

Celebração de swaps de taxa de juro e os deveres de

informação dos intermediários financeiros

Dissertação de Mestrado em Direito, na área de especialização de Direito da Empresa e dos Negócios, apresentada à Universidade Católica Portuguesa para obtenção de grau de Mestre por Diogo Filipe Oliveira Santos, sob orientação do Exmo. Senhor Professor Doutor José Engrácia Antunes.

(4)

“La liberté absolue raille la justice. La justice absolue nie la liberté. Pour être

fécondes, les deux notions doivent trouver, l’une dans l’autre, leur limite.”

(5)

Agradecimentos

Aos meus pais e avós, por

toda a lição dada, toda a paciência esgotada, toda a confiança, em mim, depositada, uma dívida que jamais pagarei, porque demasiado cara.

(6)

Resumo

O presente trabalho parte duma perspetiva pós-crise financeira de 2007 para efetuar uma análise à celebração de contratos swap de taxa de juro e aos deveres de informação que impendem sobre os intermediários financeiros, no seguimento desta.

Mantendo o foco sempre na especial posição que o intermediário financeiro assume no mercado, enquanto guia e, muitas vezes, contraparte do investidor, visa observar quais as normas que estes devem respeitar e, mais importantemente, se o fazem.

Centrado particularmente no contexto jurídico-económico português, o presente trabalho contacta com diversas áreas do Direito, entre as quais frisamos o Direito Civil, o Direito do Mercado de Capitais e dos Valores Mobiliários e o Direito da União Europeia.

A abordagem assenta em três vértices do mercado de capitais: o produto financeiro, o intermediário e o investidor. Não obstante, a mesma pauta-se por um estudo comparativo, tentando, sempre que possível, contrapor os diversos entendimentos que vigoram no Direito Português e da União Europeia, entre outros.

Através deste trabalho, foi possível retirar duas conclusões. A primeira remete para uma progressiva exigência legislativa a nível comunitário quanto aos deveres de informação dos intermediários financeiros, enquanto agentes do mercado. A segunda conclusão prendeu-se com a existência de tendências jurisprudenciais totalmente diversas consoante o país, destacando-se o contraste entre os tribunais portugueses e espanhóis.

Palavras-chave: informação; swap de taxa de juro; intermediário financeiro; derivados financeiros; instrumento financeiro.

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Abstract

The following works starts from a post-2007 financial crisis point of view, in order to analyze the information duties that financial intermediaries are subject to when celebrating interest rate swap contracts.

Maintaining its focus on the special role that the financial intermediary has in the market, as a guide and, several times, as a counterpart to the investor, it intends to observe which rules they are bound to and, most importantly, if they are followed.

Particularly centered around the Portuguese legal and economical context, the present work interacts with several areas, especially Civil Law, Capital Markets and Securities Law and European Union Law.

The subject is approached while keeping in mind three main points of the capital market: the financial product, the intermediary and the investor. However, the present work also does a comparative study between several points of view that are rooted within Portuguese and European Union Law, amongst others.

From this work, two conclusions arose. The first one relates to progressively demanding criteria implemented by law-makers, on an European Union level, on duties that financial intermediaries are subject to. The second one observes that there are totally different jurisprudential decision tendencies, depending on the country, while underlining the sharp contrast between Portuguese and Spanish courts.

Keywords: information; interest rate swap; financial intermediaries; financial derivatives; financial instruments.

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Índice

Lista de siglas e abreviaturas ... 9

1. Introdução... 10

2. Os derivados financeiros e a sua função no mercado ... 12

3. O contrato swap ... 15

3.1. O swap de taxa de juro e sua caraterização jurídica ... 16

4. O investidor ... 21

4.1. Investidor qualificado e não qualificado ... 22

4.2. Investidor não qualificado e consumidor de produtos financeiros ... 23

5. A informação e a intermediação financeira... 27

5.1. Princípios da intermediação financeira ... 28

5.2. Deveres dos intermediários financeiros ... 30

5.2.1. Deveres de informação dos intermediários financeiros ... 32

5.3. Deveres impostos pela LCCG ... 35

5.4. A DMIF II e os deveres dos intermediários financeiros ... 39

6. Análise jurisprudencial ... 41 6.1. Portugal ... 41 6.2. Espanha ... 44 6.3. Itália ... 45 7. Conclusão ... 48 Jurisprudência consultada ... 52 Bibliografia ... 54

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9

Lista de siglas e abreviaturas

Ac. – Acórdão Art. – Artigo

BGB – Bürgerliches Gesetzbuch CC – Código Civil

Cfr. – Conferir

CMVM – Comissão de Mercado de Valores Mobiliários CRP – Constituição da República Portuguesa

CVM – Código dos Valores Mobiliários

DMIF – Diretiva dos Mercados de Instrumentos Financeiros (Diretiva 2004/39/CE) DMIF II - Diretiva dos Mercados de Instrumentos Financeiros II (Diretiva 2014/65/UE)

EURIBOR – Euro Interbank Offered Rate

LCCG – Lei das Cláusulas Contratuais Gerais (Decreto-Lei 446/85) Nº - Número

Op. cit. – Opus citatum

OTC – Over the Counter p. – Página

pp. – Páginas ss. – Seguintes

STJ – Supremo Tribunal de Justiça TRL – Tribunal da Relação de Lisboa

(10)

10

1. Introdução

Num mundo jurídico-económico ainda em recuperação, lentamente reerguendo-se da crise económica que irrompeu em 2007, os instrumentos financeiros foram alvo de diversas polémicas. Dentro destes, assumiu especial preponderância os

swaps: no mundo empresarial, pelos diversos credit default swaps que levariam à

queda livre de gigantes como a A.I.G.; em Portugal, pela celebração de contratos swap por parte de empresas públicas como a Metro do Porto, com resultados claramente desfavoráveis, e também por particulares, sentindo-se o impacto no mercado de retalho enquanto instrumento financeiro OTC.

A implementação de medidas de austeridade por todo o mundo causou uma contração económica mundial séria. Como consequência das abruptas quedas e posterior manutenção em valores historicamente baixos das taxas de juro, os interest

rate swaps celebrados revelaram-se desastrosos para os investidores, onerando-os com

montantes a liquidar que, embora possíveis, não eram previsíveis. Os swaps passaram a ser conotados com um estigma de excessivo risco por parte de pequenos investidores, devido a um generalizado desconhecimento sobre o modus operandi destes. Com base nestes dados, iniciaremos a nossa exposição por uma abordagem aos derivados e à função dos mesmos, caraterizando, de seguida, o contrato de permuta de taxa de juro. Conscientes deste facto, optemos por um caminho diverso no debate doutrinal que circunda esta figura. Não obstante a meritória discussão doutrinal sobre temas como a exceção de jogo e aposta ou aplicabilidade do art. 437º do CC, acreditamos que o foco deverá ser outro. Numa perspetiva direcionada para o futuro, afigura-se imprescindível que erros passados não se repitam e que se verifique uma séria mudança: que o mercado no geral, com ênfase nos pequenos investidores, se torne mais esclarecido. Assim sendo, cumprirá efetuar a distinção entre tipos de investidores, explicando as assimetrias informativas existentes no mercado.

De modo a desmistificar o funcionamento dos interest rate swaps, a informação provará ser crucial. Para que esta prolifere eficientemente, sem descreditar o imprescindível apoio da CMVM, será igualmente imperativo o de outros intervenientes: os intermediários financeiros. Será através do escrupuloso cumprimento dos deveres de informação, que a estes competem, que se possibilitará a redução da natural assimetria existente entre os investidores institucionais e os demais, pelo que será obrigatório escrutinar os deveres em causa.

(11)

11 Dado o momento de realização desta dissertação, cumprirá naturalmente fazer uma breve leitura sobre a DMIF II e quais as mudanças que ela implementará no sistema jurídico-económico, de modo a não descurar uma perspetiva direcionada para o futuro.

Finalmente, num exercício de contraste, irá ser feita uma análise jurisprudencial, comparando as decisões nos diferentes sistemas jurídicos europeus, de modo a que se possam observar quais as linhas decisórias neste tema.

Será no confronto entre estas problemáticas que o presente trabalho incidirá, permitindo-nos, assim, contribuir para a desmistificação destes contratos e para a clara definição do devido comportamento que as partes deverão assumir num mercado. Que se quererá, como decorre do expresso, esclarecido e informado.

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12

2. Os derivados financeiros e a sua função no mercado

Comecemos pela definição de instrumento financeiro. Efetuando uma busca por uma definição legal, verificamos que a tendência da lei é não definir os instrumentos financeiros, mas apenas indicar quais eles são. Nesse sentido, a DMIF define “enquanto «Instrumento financeiro»: qualquer dos instrumentos especificados na Secção C do Anexo I;” no seu art. 4º nº 17, procedendo a uma longa enunciação dum núcleo onde se enquadrarão os swaps.

Não obstante, a noção foi sendo completada, estipulando o art. 3º nº1 alínea e) da Seção 2 da Diretiva nº2006/49/CE que instrumento financeiro corresponde a “qualquer contrato que dê origem simultaneamente a um ativo financeiro de uma parte e a um passivo financeiro ou instrumento financeiro de outra parte”. Ora, como afirma MARIA EMÍLIA TEIXEIRA, esta definição mostra-se desajustada, “pois existem

instrumentos financeiros que não são contratos”1, como, desde logo, os valores

mobiliários.

Face a este panorama, a alternativa será buscar uma definição doutrinal. De acordo com ENGRÁCIA ANTUNES, os instrumentos financeiros são “um conjunto de instrumentos juscomerciais suscetíveis de criação e/ou negociação no mercado de capitais, que têm por finalidade primordial o financiamento e/ou a cobertura do risco

da atividade económica das empresas.”2. Ora, será este o propósito dos contratos swap,

embora haja ainda que os discernir de figuras como as ações ou as obrigações.

Assim, os swaps inserem-se no lote dos instrumentos financeiros derivados, definidos pela doutrina enquanto “os instrumentos financeiros resultantes de contratos

a prazo celebrados e valorados por referência a um ativo subjacente”3. Isto significa

que os valores em causa nesta relação contratual derivam das vicissitudes de um outro ativo. Concretizando, poderemos ter, no caso de um interest rate swap, prestações pecuniárias a que as partes se obrigam consoante as variações da EURIBOR. Este será o ponto que melhor ilustra a diferença entre os derivados e outros instrumentos financeiros: a sua origem e o seu funcionamento não são autónomos. Seja na sua criação ou na execução do mesmo, a oscilação dos valores de referência afetam sempre

1 TEIXEIRA, Maria Emília, O Contrato de Swap: O Credit Default Swap e o Seguro de Crédito”,

Coimbra, Almedina, 2017, p.33.

2 ANTUNES, José Engrácia, Os Instrumentos Financeiros, 2ª edição, Coimbra, Almedina, 2014, p.7. 3 Ibidem, p. 113.

(13)

13 o resultado do contrato: destarte, os derivados “encontram-se umbilicalmente ligados

a um ativo subjacente”4.

No entanto, será de salientar o cariz abstrato destes. Embora haja uma conexão com um ativo que esteja na base da sua criação e com o qual permanecerão intimamente ligados num âmbito económico, os derivados são abstratos, isto é, “instrumentos juscomerciais «a se» cuja existência e validade é totalmente

independente das vicissitudes jurídicas desse ativo”5. Se, por ventura, um contrato de

mútuo que esteja na base de celebração de um swap seja declarado nulo, em princípio, tal não terá quaisquer consciências neste último, pois configura-se uma relação de

abstração6.

Outra caraterística dos derivados é a existência dum prazo, criando, deste modo, relações jurídicas em que o tempo é essencial. A essencialidade da linha temporal prende-se com as variações em causa a que está sujeito o ativo subjacente, pelo que é necessário precisar os momentos. Tal é coerente com o ideal de cobertura de risco na base destes, mas é também “determinante de vários aspetos do regime

jurídico – mormente, conformando o conteúdo das prestações contratuais.”7.

Cumprirá falar, por fim, no cariz de risco, próprio dos instrumentos financeiros derivados. Submetendo o futuro do contrato às variações de um qualquer ativo, a álea é a própria motivação do contrato, aquilo que permitirá que uma parte tenha um saldo positivo e outra não. Conforme afirmado por ENGRÁCIA ANTUNES, as partes “visam justamente negociar sobre tal incerteza, fazendo desta a verdadeira causa e

objeto negociais”8.

Com base nestes traços, a sua função económica é inegável, destacando-se pela sua versatilidade, capacidade de gestão de risco e pela alavancagem financeira possibilitada. Conforme salienta alguma doutrina, “os derivados são essencialmente instrumentos financeiros de cobertura dos riscos inerentes à atividade económica

(“hedging”), de especulação (“trading”) e de arbitragem (“arbitrage”)”9. Não obstante,

às vantagens são contrapostas uma série de riscos, pelo que “os derivados financeiros

4 SOUSA, Simão Mendes de, Contrato de “Swap” de Taxa de Juro: Dever de Informação e Efeitos da Violação do Dever, Lisboa, AAFDL, 2017, p. 22.

5 ANTUNES, José Engrácia, “Os Derivados”, Cadernos do Mercado de Valores Mobiliários, nº 30,

agosto de 2008, p. 101.

6 Não obstante a possível existência duma válvula de escape legal, como o instituto do abuso de

direito, previsto no art. 334º do CC.

7 Ibidem, p. 101. 8 Ibidem, p. 101. 9 Ibidem, p. 92.

(14)

14

não são rosas sem espinhos”10. Destarte, importará não olvidar que estes poderão

originar sérios problemas de cash flow, aumentar o risco sistémico de colapso do sistema financeiro no seu conjunto, bem como, agravar as perdas de investidores.

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15

3. O contrato swap

Segundo ENGRÁCIA ANTUNES, o swap é o contrato “pelo qual as partes se obrigam ao pagamento recíproco e futuro de duas quantias pecuniárias, na mesma moeda ou em moedas diferentes, numa ou várias datas predeterminadas, calculadas por referência a fluxos financeiros associado a um ativo monetário subjacente,

geralmente uma determinada taxa de câmbio ou juro.”11.

Os contratos swap têm como seu elemento natural a ideia de permuta, independentemente do ativo subjacente ao seu funcionamento. Ou seja, quer se trate dum swap de divisas, de equity ou de taxa de juro, operará sempre com base na

premissa que duas partes decidem trocar as posições que haviam assumido12.

A sua importância não pode ser subestimada, correspondendo ao “mais importante instrumento financeiro derivado tradicionalmente negociado fora de

mercado”13. Sendo um derivado OTC, assumem papel preponderante os

intermediários financeiros, usualmente bancos. No seu papel clássico, surgem “como intermediário que, através da cobrança de uma comissão junta duas contrapartes com

interesses convergentes sem assumir qualquer risco”14. Porém, é cada vez mais usual

que estes intermediários, intervenientes experientes no mercado, sejam as próprias contrapartes dos seus clientes.

Quanto às suas finalidades, os ideais de cobertura de risco, especulação e

arbitragem, são tendencialmente aceites1516. Não obstante, outros autores abordam

outros eventuais fins para estes. Poderão incluir-se assim finalidades “puramente

contabilísticas”17. Do mesmo modo, MARIA CLARA CALHEIROS destaca ainda

que poderão servir para “ultrapassar a indisponibilidade de capitais (…); contornar as restrições aos movimentos de capitais colocadas pelos controlos de câmbios; alterar e

11 ANTUNES, José Engrácia, Os Instrumentos…, op. cit., pp.156-157.

12 Exemplificando, A, com um certo montante em euros (€), troca a sua posição com B, que tinha o

mesmo montante em dólares ($). Mutatis mutandis, o mesmo exemplo poderá ser utilizado para explanar os demais tipos de contratos swap (imagine-se, num swap de taxa de juro, que A tinha uma taxa variável e B uma taxa fixa).

13 GONZÁLEZ, Pedro Boullosa, “Interest Rate Swaps: Uma Perspetiva Jurídica”, Cadernos do Mercado de Valores Mobiliários, nº 44, abril de 2013, p. 12.

14 Ibidem, p. 12.

15 Cfr. SOUSA, Simão Mendes de, op. cit., p. 31. 16 Cfr. GONZÁLEZ, Pedro Boullosa, op. cit., p. 13.

(16)

16 diversificar a estrutura de vencimentos de uma carteira de investimento; conseguir um

maior prazo de financiamento; aumentar a liquidez; obter vantagens fiscais”18.

3.1. O swap de taxa de juro e sua caraterização jurídica

Centremos as atenções no contrato swap de taxa de juro. De acordo com a doutrina, neste “as partes contratantes acordam trocar entre si quantias pecuniárias expressas numa mesma moeda, representativas de juros vencidos sobre um determinado capital hipotético, calculados por referências a determinadas taxas de juro

fixas e/ou variáveis numa ou várias datas preestabelecidas”1920.

Uma outra noção é-nos dada por ANTÓNIO PEREIRA DE ALMEIDA, afirmando este que os interest rate swaps são “contratos mediante os quais dois mutuários de empréstimos do mesmo montante e com o mesmo vencimento, mas com taxas de juro calculadas sobre bases distintas, se comprometem a fazer pagamentos recíprocos com base nas taxas de juro da contraparte sobre o valor nocional, mantendo-se as partes devedoras dos respetivos empréstimos para com os respetivos

mutuantes”21. Embora seja louvável a contextualização financeira que este último

efetua, demarcamo-nos desta noção. A verdade é que esta definição acaba por deixar de parte os contratos swap de taxa de juro meramente especulativos, nos quais não existe qualquer negócio subjacente, mas apenas um valor nocional livremente

acordado pelas partes22. Aliás, recordemo-nos que os derivados se destacam pela sua

caraterística de abstração, como abordámos supra23, pelo que o contrato que está na

sua base não detém especial relevância no plano jurídico24.

Baseando-nos, assim, na primeira noção, cumprirá caraterizar o contrato no âmbito jurídico.

18 CALHEIROS, Maria Clara, O Contrato de Swap, Boletim da Faculdade de Direito, Studia Iuridica

nº51, 2000, pp. 73-74.

19 ANTUNES, José Engrácia, Os Instrumentos…, op. cit., p. 163.

20 Posição igualmente defendida pela jurisprudência, conforme observável no acórdão do STJ, de 10 de

outubro de 2013, no processo nº 1387/11.5TBBCL.G1.S1, relatado por Granja da Fonseca.

21ALMEIDA, António Pereira de, Instrumentos Financeiros: os swaps, Estudos em Homenagem ao Professor Doutor Carlos Ferreira da Almeida, Coimbra, Almedina, 2011, p. 52.

22 Sobre este tema, cfr. FREITAS, José Lebre de, Contrato de Swap Meramente Especulativos: regimes de validade e de alteração de circunstâncias, in Revista de Ordem dos Advogados, Ano 72, Vol. IV

Outubro/Dezembro, Lisboa, 2012.

23 Vide o ponto 2.

(17)

17 Primeiramente, estes podem ser definidos enquanto contratos nominados,

preenchendo o tipo legal previsto no art. 2º nº1 alínea e) i) do CVM25. Dispondo dum

nomen iuris, não têm, porém, um regime legal previsto, pelo que se consideram

enquanto contratos atípicos. Há, portanto, “uma margem de autonomia das partes na configuração dos seus termos precisos, o que é também reforçado pelo facto de estes

instrumentos serem negociados fora do mercado”26.

Com base em tais dados, MARIA CLARA CALHEIROS carateriza estes

enquanto contratos consensuais2728, opinião à qual, respeitosamente, nos mostramos

reticentes. Pese embora a possibilidade de negociação que o princípio da liberdade contratual, previsto no art. 405º do CC, oferece, na praxis, é a adoção da forma escrita, em razão da especial complexidade que os dota. Além de tal, não existe uma típica negociação em que as partes se encontram num mesmo patamar. Assim, na medida em que, por uma das partes ser um banco (e, portanto, dotado de elevado conhecimento técnico e recursos financeiros), será usual a celebração de um simples contrato de

adesão escrito, ao qual o agente económico oposto se escolhe vincular ou não29.

Incontestável é, porém, o traço de bilateralidade destes contratos, existindo “duas ou mais partes, que emitem declarações negociais opostas, mas convergentes

num só sentido”3031. Destarte, a formação do swap tem como elemento essencial a

existência de duas vontades contrastantes de agentes económicos.

Igualmente, destaca-se por ser um contrato oneroso, existindo atribuições patrimoniais efetuadas pelas partes na vigência do mesmo. Assim, “à vantagem obtida por cada uma das partes corresponde um sacrifício económico para consegui-la

existindo um nexo de reciprocidade entre as atribuições patrimoniais das partes”32.

Tendo mencionado previamente o cariz crucial que o tempo assume no decurso da relação, é sem surpresa que este se assume como um contrato de execução

25 Citando o Ac. TRL de 05-08-2014, Proc. Nº 531/11.7TVLSB.L1-8 (ILÍDIO SACARRÃO

MARTINS): “A doutrina jurídica e económica especializada tem procurado agrupar os instrumentos derivados em diferentes espécies ou tipologias, de acordo com uma diversidade de critérios ordenadores, sendo o critério mais divulgado o que classifica os derivados de acordo com o conteúdo da posição jurídico - contratual. Segundo este critério, os "swaps", (a par dos "futuros" e "opções") são um tipo de instrumento financeiro derivado nominado, previsto no artigo 2°, n° 1, alínea e) do CVM”.

26 GONZÁLEZ, Pedro Boullosa, op. cit., p. 22.

27 Cfr. CALHEIROS, Maria Clara, O Contrato..., op. cit., pp. 78-80.

28 No mesmo sentido que MARIA CLARA CALHEIROS, cfr. ANTUNES, José Engrácia, Os Instrumentos…, op. cit., p. 170.

29 Cfr. TEIXEIRA, Maria Emília, op. cit., pp. 160-164. 30 TEIXEIRA, Maria Emília, O Contrato…, op. cit., p. 41. 31 No mesmo sentido, cfr. GONZÁLEZ, Pedro Boullosa, op. cit. 32 CALHEIROS, Maria Clara, O Contrato…, op. cit., p. 78.

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18 periódica, sendo que “o seu cumprimento não se esgota numa só prestação, antes exige

a realização de várias”33. Não poderia ser de outro modo, visto que é a própria

oscilação do ativo subjacente dentro dum acordado limite temporal que determina quem efetua a prestação pecuniária e qual o montante da mesma.

Não obstante, a caraterização jurídica deste tipo contratual também se pauta por alguma controvérsia. Neste âmbito, podemos referir a referência o sinalagma ativo pelo qual se destaca o contrato swap. Conforme menciona MARIA CLARA CALHEIROS, “o sinalagma é, no contrato de swap, genético e funcional: genético porque cada dever de prestação constitui para a outra parte a causa pela qual fica obrigada a realizar a sua própria prestação; funcional porque os deveres de prestação,

fundamentalmente interligados, devem cumprir-se simultaneamente.”3435. No entanto,

tal não é pacífico na doutrina, assumindo importância a opinião que os swaps não são sinalagmáticos, mas sim contratos diferenciais. Nestes, “é devida uma só prestação em dinheiro, que, no caso, é, igual à diferença entre os valores de referência inicial a bens

(reais ou nocionais) e os valores de mercado em data futura desses mesmos bens”36.

Seguindo este último raciocínio, não existirá qualquer sinalagmaticidade, dado que haverá apenas uma prestação.

Entre estes extremos, existem outras posições doutrinais dignas de referência. HÉLDER MOURATO refere-se, assim, a um sentido lato de sinalagma, “de modo a abranger a correspetividade de quaisquer atribuições ou vinculações, e não só de

obrigações”37. Discordamos que esta seja a única via, reconhecendo também um

sinalagma em sentido estrito a este tipo de contrato. Pese embora a existência de somente uma prestação pecuniária, a mesma é calculada com base nas oscilações temporais ocorridas. Observar apenas o resultado final revela-se uma opção que não atende à própria ratio do tipo contratual. Destarte, existem prestações a ser feitas por cada uma das partes, apesar de a menor destas se extinguir por aplicação do instituto

da compensação, previsto no art. 847º do Código Civil3839. O reconhecimento da

33 Ibidem, p. 81. 34 Ibidem, p. 82.

35 No mesmo sentido, cfr. ANTUNES, José Engrácia, Os Instrumentos…, op. cit.

36 ALMEIDA, Carlos Ferreira de, Swaps de Troca e Swaps Diferenciais, Estudos do Instituto dos Valores Mobiliários, p. 6.

37 MOURATO, Hélder, O Contrato Swap de Taxa de Juro, Coimbra, Almedina, 2014, p. 51. 38 No mesmo sentido, TEIXEIRA, Maria Emília, op. cit., p. 42.

39 O art. 847º nº1 do CC coloca como requisitos a existência de créditos e débitos, exigíveis

judicialmente, recíprocos e a fungibilidade do objeto da prestação. Não verificamos, do mesmo modo, qualquer impedimento à aplicação da compensação parcial, prevista no nº2 do mesmo preceito legal.

(19)

19 existência deste sinalagma na base do contrato implica simultaneamente a

“aplicabilidade plena do instituto da exceção de não cumprimento do contrato”4041.

Questiona-se também a classificação destes enquanto contratos intuitu

personae, isto é, em que há relevância quanto à pessoa e caraterísticas próprias desta

com quem se contrata. Por consequência, esta classificação é fulcral para aferir a eventual fungibilidade da obrigação e, consequentemente, a aplicação de figuras jurídicas como a cessão da posição contratual. ENGRÁCIA ANTUNES afirma que, sendo estes derivados contratos patrimoniais, se encontra “em regra afastando qualquer intuitus personae, sendo irrelevante a pessoa ou qualidades dos

contratantes”42. Mais moderada mostra-se MARIA CLARA CALHEIROS, afirmando

que “a classificação de um contrato de swap como intuitu personae só pode ser

realizada caso a caso”4344. A maior moderação justifica-se, pois existem diversos

fatores que poderão relevar neste âmbito, como a solvabilidade, localização da sede ou posição no mercado da empresa. De todo o modo, haverá que averiguar a importância que estes fatores assumiram na celebração do contrato. Somente se justificará a qualificação como contrato intuitus personae, caso o mesmo não fosse

celebrado na ausência das referidas condições 45.

Por fim, certos autores pronunciam-se pelo seu cariz de aleatoriedade. Destarte, é um “contrato oneroso, no qual a existência ou valor de uma ou de ambas as prestações

depende de um facto futuro e incerto”46. Este tema não é doutrinalmente pacífico, com

partes defendendo que se trata antes dum contrato comutativo47. Nestes, há uma

atribuição patrimonial mútua, de valor equivalente, que as partes conhecem ab initio. Ainda que seja correto que ambas as partes sabem, de antemão, que existe uma expetativa de ganho para cada uma, este não nos parece o verdadeiro objeto da prestação. No swap, o que ocorre é que as partes submetem o montante das prestações à variação de um qualquer ativo, sendo que não poderão influenciar este de nenhum

40 TEIXEIRA, Maria Emília, op. cit., p. 45.

41 Novamente em sentido oposto, MOURATO, Hélder, op. cit., p. 52. 42 ANTUNES, José Engrácia, Os Derivados, op. cit., p. 98.

43 CALHEIROS, Maria Clara, op. cit., p. 86.

44 No mesmo sentido, MOURATO, Hélder, op. cit., p. 54.

45 Ainda que tal fator não assuma especial pendor em sede de mercado secundário. Neste sentido, vide

MOURATO, Hélder, op. cit., p. 54 e TEIXEIRA, Maria Emília, op. cit., p. 49.

46 CALHEIROS, Maria Clara, op. cit., p. 87.

(20)

20 modo. Com este risco intrínseco criado pelas outorgantes, “sendo uma das prestações

certa e a outra incerta, mesmo assim, estamos perante um contrato aleatório”48.

(21)

21

4. O investidor

Agindo como o dínamo do mercado, não se poderá subvalorizar a importância dos investidores, enquanto agentes económicos que libertam capital para o funcionamento do sistema financeiro. Consequentemente, cumpre assegurar que as condições de intervenção no mercado são propícias a estes, para garantir um mercado e uma economia sãos.

À proteção dos investidores, subjazem diversas finalidades, nomeadamente: o interesse público, a necessidade de segurança dos mercados, a prossecução da

igualdade entre os diversos agentes que aí intervêm e a proteção dos consumidores49.

Relativamente ao interesse público, este compõe-se enquanto uma necessidade

de proteção da coletividade investidora. Assente em valores constitucionais50, o Estado

protege o número indeterminado de agentes no mercado, conferindo-lhe direitos para que estes, simultaneamente, possam cumprir os fins públicos. Deste modo, através de normas programáticas e no âmbito da função de supervisão da CMVM, visa-se garantir o correto funcionamento do mercado. No entanto, frise-se que esta proteção é realizada quanto à generalidade destes e não a um investidor concreto. A proteção surge em prol do bem superior do mercado, havendo “uma prevalência desse mesmo interesse sobre

o interesse privado de um participante em tal mercado”51.

Quanto à segurança dos mercados, o seu interesse decorre da necessidade de garantia das condições destes. Quanto mais transparente e seguro este for, maiores serão as perspetivas de atração de investimento. Destarte, há uma necessidade de promoção da salubridade do mercado para assegurar o funcionamento do mesmo, através da aplicação do aforro neste.

No que concerne à posição dos diversos agentes económicos, o objetivo pretendido prende-se com a reposição de igualdade entre estes, ainda que por vezes

esta se fique pelo campo formal52. O intuito será a reconstituição de uma paridade,

independentemente das diversas conjunturas financeiras. No entanto, não se pode

49 RODRIGUES, Sofia Nascimento, A Proteção dos Investidores em Valores Mobiliários, Coimbra,

Almedina, 2001, p. 23.

50 Cfr. art. 101º da CRP.

51 RODRIGUES, Sofia Nascimento, op. cit., p. 25. 52 Ibidem, p. 28.

(22)

22 deixar de salientar a desigualdade (justificada) existente entre os diversos agentes,

como, por exemplo, os investidores qualificados e não qualificados.53

Por fim, mencione-se o princípio de proteção dos consumidores, aplicando analogamente aos investidores a proteção constitucional plasmada no art. 60º nº1 da

CRP54. Segundo este, os investidores deveriam ser protegidos na medida em que, no

mercado, “consomem” produtos financeiros.55

Numa nota conclusiva, frise-se que estes princípios são, obviamente, limitados. Sendo o mercado assente numa perspetiva económica capitalista impõe-se a atenuação através de três vértices: a inevitabilidade do risco, recusa do paternalismo por parte da

entidade de supervisão e autorresponsabilização do investidor56.

4.1. Investidor qualificado e não qualificado

Contrariamente aos homens, nem todos os investidores nascem iguais. Tal decorre do conhecimento que estes detêm sobre o funcionamento do mercado. Assim, por um lado, teremos uma classe especializada, os investidores qualificados, de acordo com o art. 30º do CVM. Por outro lado, teremos a classe oposta, os investidores não-qualificados, que necessitarão duma outra proteção no investimento, mas cujo interesse em disponibilizar parte do que aforram no mercado de capitais é crucial.

Observando o art. 30º do CVM, concluímos que não nos é dada uma definição de critérios para esta qualificação jurídica. Em vez disso, a lei indica-nos quais as entidades assim classificadas, nomeadamente instituições de crédito, instituições de investimento coletivo, entre outras. Se atentarmos na DMIF, encontramos uma noção de cliente profissional no seu Anexo II, afirmando que se pode considerar como este o “cliente que dispõe da experiência, dos conhecimentos e da competência necessária para tornar as suas próprias decisões de investimento e ponderar devidamente os riscos que incorre”. Seguidamente, este diploma dá alguns exemplos de clientes profissionais, coincidentes com os integrantes da noção de investidores qualificados

53 SOFIA NASCIMENTO RODRIGUES faz ainda referência aos ónus de deveres de informação que

são colocados aos intermediários financeiros como meio de proteção dos investidores. Vide RODRIGUES, Sofia Nascimento, op. cit., pp. 28-29.

54 Afirma o mesmo que “os consumidores têm direito a qualidade dos bens e serviços consumidos, à

formação e à informação, à proteção da saúde, da segurança e dos seus interesses económicos, bem como à reparação de danos.”.

55 Sobre este tema, cfr., infra, ponto 4.2.

(23)

23 do art. 30º CVM. Conclui-se, deste modo, que estes investidores qualificados serão os agentes económicos detentores de especializado conhecimento financeiro, pelo que não necessitam de uma tão elevada proteção, em virtude da sua especial capacidade de gestão de risco. Ou seja, poderemos afirmar que esta “tipologia de investidores é aquela que atua sob a bitola da atividade profissional de investimento no domínio do

mercado de capitais”57.

Não oferecendo a lei uma definição de investidor não-qualificado, chegaremos a esta por um raciocínio de exclusão de partes, isto é, sê-lo-á quem não se enquadre na previsão legal do art. 30º do CVM. Em virtude de tal, a intervenção destes no mercado deverá ser aconselhada e acautelada, existindo diversos ónus na interação com estes,

destinados a protegê-los58. Novamente, haverá que atender à importância que a

intervenção destes também poderá ter no mercado. Igualmente, importa não olvidar que, apesar dum tecido empresarial caraterizado pela pequena e média dimensão, os seus administradores não deverão, necessariamente, abster-se do mercado. Pelo contrário, a sua própria intervenção poderá resultar na alavancagem financeira fulcral para o negócio (como será o caso dos contratos swap).

Note-se, igualmente, que esta classificação não é inalterável. Caso não deseje este nível de proteção, o investidor poderá sempre solicitar ao seu intermediário financeiro o tratamento enquanto investidor qualificado, desde que preencha os requisitos impostos pelo art. 317º-B do CVM.

4.2. Investidor não qualificado e consumidor de produtos financeiros

Uma questão que suscita aceso debate doutrinal prende-se com a qualificação do investidor, colocando-se a questão sobre a eventual aplicação a este das proteções constitucionais que são direcionadas ao consumidor, conforme previsto no art. 60º nº1 CRP. Através desta aplicação, concretizar-se-ia o princípio da proteção do investidor, com a lei como égide deste, enquanto parte mais frágil face aos agentes económicos que regularmente atuam no mercado. No entanto, este ideal terá que ser igualmente

57 ASCENSÃO, José Oliveira, A Proteção do Investidor in Direito dos Valores Mobiliários, Vol. IV,

2003, Lisboa, Coimbra Editora, p. 18 apud SOUSA, Simão Mendes de, op. cit. , p. 104.

58 A título de mero exemplo, o art. 321º nº1 do CVM prevê que os contratos de intermediação financeira

celebrados com investidores não-qualificados têm que revestir a forma escrita, sendo que a nulidade de inobservância de forma só poderá ser invocada por estes.

(24)

24 contrabalançado. O mercado de capitais tem como base a responsabilização dos investidores pelos seus atos, sendo que há que evitar o paternalismo da lei.

Foquemo-nos, primeiramente, na DMIF. Observando o art. 4º nº10 desta, não nos é dada uma noção de investidor ou consumidor, mas antes de cliente. Este será qualquer pessoa singular ou coletiva a quem uma empresa de investimento presta serviços de investimento e/ou serviços auxiliares. Ora, deste modo, podemos concluir que esta é uma delimitação abstrata, que nunca se poderá identificar com o conceito de investidor. O cliente é a pessoa que se relaciona contratualmente com um intermediário que presta serviços de investimento, e que, por via deste vínculo jurídico,

contrai obrigações e é protegido por direitos59. Um investidor será qualquer agente

económico que disponibiliza parte do seu aforro para o mercado financeiro, com o intuito de obter uma qualquer vantagem, podendo fazê-lo de modo independente (caso dos investidores qualificados). Porém, estes conceitos não são mutuamente exclusivos. Pelo contrário, usualmente, quem investe é, também, um cliente, em virtude de não deter os conhecimentos técnicos necessários para poder agir livremente no mercado. Assim sendo, há uma aquisição de um produto por este, situação jurídica que terá que ser protegida.

Cumprirá, a propósito, mencionar a noção de consumidor, num momento anterior à análise dos diversos argumentos. De acordo com o art. 2º nº1 da Lei nº 24/96, considera-se consumidor todo aquele a que sejam fornecidos bens, prestados serviços ou transmitidos quaisquer direitos, destinados a uso não profissional, por pessoa que exerça, com caráter profissional, uma atividade económica que vise a obtenção de benefícios. Como nota SOFIA NASCIMENTO RODRIGUES, em momento algum é

efetuada uma exclusão a bens e serviços financeiros60.

A divergência doutrinal em questão prende-se, em parte, por uma perspetiva que consumo e investimento são ideias incompatíveis. Enquanto a primeira se destina a destruir o valor através do consumo dos recursos excedentes, a segunda encontra-se “orientada a traduzir a conservação desse valor, colocando-o a render porque não fora

consumido”61. A esta posição, contrapõe-se o ideário que o investidor não-qualificado

59 A mesma noção é defendida pela doutrina espanhola. A este propósito, vide ZUNZUNEGUI,

Fernando. Hacia un estatuto del inversor, RDMF Working paper 1/26, dezembro de 2006, p.4.

60 RODRIGUES, Sofia Nascimento, op. cit., p. 31. 61 RODRIGUES, Sofia Nascimento, op. cit., p. 30.

(25)

25 e consumidor não possui as mesmas capacidades técnicas de atuação no mercado e, como tal, necessita igualmente de ser protegido no mesmo.

Tal discordância assumiu maior preponderância, devido à equiparação que é

feita no CVM entre investidores não qualificados e consumidores62. No entanto, como

afirma SIMÃO MENDES DE SOUSA, nesta situação, estes são apenas equiparados

porque o legislador entendeu existir uma analogia de situações63.

A questão de diferente proteção dos investidores não foi, porém, a única manifestação desta divergência. Para além de tal, na doutrina também “se dividia acerca da natureza da responsabilidade emergente para os prestadores de serviços financeiros por violação destes deveres, sendo que uma parte da doutrina dizia que consubstanciaria responsabilidade pré-contratual e outros defendiam que seria

responsabilidade delitual”64.

Deparamo-nos com uma clara dicotomia. Assim o será, pelo menos, em termos teóricos. Na nossa opinião, a razão prática deverá ditar o caminho, pelo que não devemos encarar esta equiparação como uma interpretação desconcertada da realidade do mercado de capitais. Neste sentido, a aplicação de princípios de Direito do Consumo neste contexto não deverá ser encarada como a ignorância dos princípios do mercado de capitais, mas antes como uma adaptação à realidade social vigente.

Importará não olvidar que a sociedade portuguesa se pauta por um público investidor que não detém um pleno conhecimento do funcionamento do mercado. Aliás, em função de tal, os seus maiores investimentos centram-se inclusivamente em

produtos de baixo risco como certificados de aforro65. Certamente que o caminho ideal

não passa por uma abordagem legal paternalista, na medida em que o princípio da responsabilização pelo investimento é incontornável no mercado de capitais. Não obstante, “o princípio da proteção dos investidores tem cabimento enquanto expressão da necessidade do Estado proteger quem adquire bens – em concreto, valores mobiliários – em condições assimétricas ou mesmo de inferioridade, designadamente

62 O art. 321º nº3 do CVM expressa o seguinte:

“Aos contratos de intermediação financeira é aplicável o regime das cláusulas contrautais gerais, sendo para esse efeito os investidores não qualificados equiparados a consumidores”.

63 SOUSA, Simão Mendes de, op. cit., p. 112. 64 TEIXEIRA, Maria Emília, op. cit., p. 175.

65 Para mais informações, cfr. “O Perfil do Investidor Particular Português”, estudo realizado pela

CMVM e disponível para consulta em:

http://www.cmvm.pt/pt/EstatisticasEstudosEPublicacoes/Estudos/Pages/O%20Perfil%20do%20Invest idor%20Particular%20Portugu%C3%AAs.aspx

(26)

26

informativa”66. Atendendo a esta conjuntura, não nos aparenta ser problemática a

aplicação de normas protetoras de Direito do Consumo aos investidores não-qualificados, enquanto contraentes débeis. A evolução legislativa vai, aliás, nesse sentido, após a crise financeira de 2007, como podemos observar pelos deveres

impostos pela DMIF II67.

Ainda que se possa aceitar que não “possa haver uma equivalência do estatuto

jurídico”68, pela diversidade concetual, a motivação subjacente parece-nos clara o

suficiente para que os investidores não-qualificados disponham dessa mesma proteção. Pese embora a estratégia dever passar pela educação e formação dos intervenientes do mercado, para que assim se possa atingir um mercado mais eficiente, não se poderá preterir, de forma alguma, o princípio da proteção dos investidores.

Destarte, pronunciamo-nos pela aplicabilidade do art. 60º da CRP, sendo que, assim, os investidores não-qualificados têm direito à qualidade dos bens e dos serviços consumidos, à formação e à informação, à proteção dos seus interesses económicos,

bem como à reparação de danos69. Do mesmo modo, também o art. 81º da CRP deverá

ser aplicável, num intuito de garantia de defesa dos interesses e direitos dos

consumidores, enquanto incumbência do Estado70.

66 RODRIGUES, Sofia Nascimento, op. cit., p. 31. 67 Cfr. infra, ponto 5.4.

68 SOUSA, Simão Mendes de, op cit., p. 113.

69 No mesmo sentido, cfr. RODRIGUES, Sofia Nascimento, op. cit., p. 32. 70 Ibidem.

(27)

27

5. A informação e a intermediação financeira

Explanadas as questões principais subjacentes quanto ao produto financeiro e quanto ao agente de mercado que o busca, resta falar do terceiro vértice desta relação: o intermediário financeiro.

Serão intermediários financeiros “aquelas pessoas singulares ou coletivas cujo objeto consiste no exercício profissional de uma ou mais das atividades de

intermediação em instrumentos financeiros previstas na lei”71. Assim, serão

intermediários os agentes do mercado que facilitam o encontro de vontades entre estes. Porém, tal noção poderá falhar uma noção realista da importância destes. Como refere SOFIA NASCIMENTO RODRIGUES, estes têm “um impacto direto muito significativo sobre as decisões dos investidores, pelo que aqueles representam também

um canal privilegiado por onde encetar a proteção destes”72.

Frise-se, porém, quanto à temática da informação, que o propósito não consistirá na retirada plena do risco no investimento, mas antes a garantia da consciência deste. Poderemos falar, deste modo, numa obrigação dos intermediários de garantia de liberdade e consciência do investimento.

Importa questionar sobre a qualidade desta informação a prestar pelos intermediários financeiros. Dispõe o art. 7º do CVM que esta deverá ser completa, atual, clara, objetiva e lícita. Desconstruamos esta definição.

Primeiramente, sendo completa, esta terá que ser suficiente para a tomada de uma decisão esclarecida. Quanto ao requisito da atualidade, este é de “difícil perceção, uma vez que se pode verificar que aquilo que se toma por atual varia de um momento para o outro sem que isso constitua um ilícito pelo qual o intermediário financeiro deva

responder”73. Exigir-se-á de todo o modo, o comportamento mais diligente possível

por parte do intermediário neste contexto (a título de exemplo, fornecimento da última cotação de mercado do instrumento financeiro visado pelo investidor). A informação será clara sempre que, quando informado, o investidor compreenda as especificidades e funcionamento deste instrumento, sendo dissipadas todas as dúvidas razoáveis que este tenha. Analisando o cariz de objetividade, enfatiza-se o modo como o produto é

71 ANTUNES, José Engrácia, “Deveres e Responsabilidade do Intermediário Financeiro – Alguns

Aspetos”, Cadernos do Mercado de Valores Mobiliários, nº 56, abril de 2017, p. 31

72 RODRIGUES, Sofia Nascimento, op. cit., p. 42. 73 SOUSA, Simão Mendes de, op. cit, p. 58.

(28)

28 apresentado ao investidor: terá que ser apresentado sem alusões ou recursos a expressões que possam conduzir o investidor em erro. Assim, em vez de tal, esta informação terá que ser o mais factual possível, não deixando margem para a formulação de ideias diversas quanto à segurança ou futuro do investimento. Quanto à licitude da informação, decorre da necessidade de cumprimento das normas jurídicas na obtenção desta, bem como na transmissão da mesma ao potencial investidor.

Esta relação tripartida exigirá, portanto, uma sintonia clara. Para que o mercado funcione, será sempre necessário que os intermediários financeiros prestem a informação corretamente aos investidores. Não obstante, frisemos: não se pretende um paternalismo dos intermediários, uma vez que “a proteção não se encontra na decisão

de investimento, mas sim, no processo que leva à decisão de investimento”74. Não se

quer proibir que o investidor arrisque ou erre. Permite-se que este o faça, mas por decisão consciente, e não devido à assimetria de informação vigente.

5.1. Princípios da intermediação financeira

Como mencionado supra, a atividade da intermediação financeira vê-se regulada pelos princípios vertidos no art. 304º do CVM. Tendo sido transpostos para a legislação portuguesa por imposição da DMIF, têm estes a missão de transmitir uma maior transparência e segurança do mercado para os potenciais investidores, permitindo, destarte, a maior eficiência da economia de capitais vigente.

Ora, como refere FELIPE CANABARRO TEIXEIRA, “tais preceitos são ínsitos à atividade de intermediação financeira, que são indissociáveis da mesma, que não há como se conceber a atividade de intermediação sem a observância de tais

vetores”75. Neste sentido, o art. 304º do CVM procede à estruturação da atividade.

Estes deveres conformarão a conduta geral dos intermediários financeiros, pese embora a controversa classificação jurídica dos mesmos. A divergência doutrinal deve-se à consideração destes princípios enquanto meros valores axiológicos da atuação no mercado ou, por contraposição, de serem considerados enquanto deveres

74 SOUSA, Simão Mendes de, op. cit., p. 55.

75 TEIXEIRA, Felipe Canabarro, “Os deveres de informação dos intermediários financeiros em relação

a seu cliente e sua responsabilidade civil”, Cadernos do Mercado de Valores Mobiliários, nº 31, dezembro de 2008, p. 52.

(29)

29 genéricos, com aplicabilidade direta (e, consequentemente, podendo originar responsabilidade dos intermediários financeiros em questão).

Neste sentido, debate-se a eventual relevância do incumprimento nestes deveres, no âmbito de responsabilidade civil. Quanto à responsabilidade contraordenacional, FAZENDA MARTINS suscita a eventual aplicação da norma

residual76, prevista no art. 400º do CVM. Apesar da utilização de um conceito

indeterminado para preenchimento do tipo legal, o autor afirma que tal “pode não ser obstáculo à passagem neste teste, pois como é sabido, mesmo no direito penal, a indeterminação e a vaguidade dos conceitos não é incompatível com o princípio da

legalidade”77. Na mesma linha doutrinal, FELIPE CANABARRO TEIXEIRA, destaca

que estes princípios estipulados no art. 304º do CVM, são igualmente aplicáveis

diretamente no caso concreto78, em caso de ausência de norma concreta. Não obstante,

o autor alerta ainda que se estes “não forem especializados por deveres específicos, para que na análise do cumprimento desses se possa verificar a observância do dever genérico, ou se não for analisado o seu cumprimento na análise de uma situação

concreta, não há como avaliar se a conduta do agente observou esse dever genérico”79.

Num prisma jurisprudencial80, não parece existir também oposição à aplicação

direta destes princípios, podendo o incumprimento destes originar responsabilidade extracontratual.

Cumprirá efetuar uma breve análise aos princípios vigentes, consistindo estes em: proteção dos interesses dos clientes; proteção da eficiência do mercado; atuação segundo os ditames da boa fé; know your costumer; sigilo profissional.

O princípio da proteção do interesse nos clientes surge-nos no art. 304º nº 1, decorrendo deste que o seu superior conhecimento das vicissitudes do mercado

76 MARTINS, Fazenda, “Deveres dos Intermediários Financeiros, em especial, os deveres para com os

clientes e o mercado”, Cadernos do Mercado de Valores Mobiliários, nº 7, abril de 2000, pp. 332-333.

77 MARTINS, Fazenda, op. cit., p. 333

78 TEIXEIRA, Felipe Canabarro, op. cit., p. 52. 79 Ibidem.

80 Lê-se o seguinte no Ac. STJ, 10-1-2013, Proc. 89/10.4TVPRT.P1.S1 (Tavares de Paiva):

“Além desta responsabilidade contratual nos termos descritos existe também responsabilidade extracontratual por parte do banco réu, em consequência da violação dos deveres não só do exercício

da sua atividade de intermediário financeiro, nomeadamente os princípios orientadores consagrados no art.. 304 do CVM, como sejam os ditames da boa fé, elevado padrão de diligência, lealdade e transparência , como também da violação dos mais elementares deveres de informação a

que aludem os artigos 7º nº1 e 312 nº1 ambos do CVM, fazendo, assim, incorrer o banco réu na

responsabilidade, a que alude o art. 314 nº1 do CVM , sendo certo também que o banco Réu não

ilidiu a presunção legal de culpa do nº2 do citado art. 314, constituindo-se por essa via também na obrigação de indemnizar os danos causado à autora .” (negrito nosso).

(30)

30 financeiro vincula-os a uma atitude de constante cautela nas decisões de investimento dos seus clientes. Destarte, os intermediários não se podem limitar à mera execução das ordens dos seus clientes, mas antes devendo-os alertar para os riscos e possíveis consequências das decisões de investimento destes.

Numa perspetiva mais abrangente, encontra-se o princípio da proteção da eficiência no mercado. Sendo os intermediários o ponto de contacto entre os investidores e o mercado de capitais, cabe-lhes a missão de orientar as condutas destes num sentido de defesa do interesse público subjacente.

Quanto à atuação de boa fé, nem sempre se revela fácil a concretização deste, dado se tratar dum conceito indeterminado. Suscitou-se, igualmente, a questão deste

princípio representar apenas um papel secundário81 ou antes ser um “princípio

fundamental da intermediação financeira que estabelece deveres de conduta diligente, leal e transparente para o intermediário financeiro como verdadeiros e próprios deveres

de prestação decorrentes, de boa fé”82, posição com a qual nos identificamos83.

O princípio know your costumer estipula uma obrigatória proximidade e adaptabilidade ao investidor. Assim, impõe-se uma “postura ativa de recolha de informação junto dos clientes relativamente a três aspetos fundamentais: o conhecimento e a experiência financeiros do cliente (…), a situação financeira do

cliente, (…) e ainda os objetivos do investimento”84.

Quanto ao princípio do sigilo profissional, caberá apenas afirmar que “possui caraterísticas concretas, que decorrem diretamente do mesmo, um dever concreto de

conduta”85. Consequentemente, a violação deste princípio fundamental originará a

responsabilização do intermediário financeiro.

5.2. Deveres dos intermediários financeiros

Esclarecida esta relação tripartida, será tempo de nos focarmos na conduta dos intermediários financeiros. Esta será regulada pelos princípios citados supra, bem como por uma série de deveres que são impostos aos intermediários financeiros,

81 Neste sentido, TEIXEIRA, Felipe Canabarro, op. cit., p. 60. 82 ANTUNES, José Engrácia, “Deveres…”, op. cit., p. 34.

83 Também neste sentido, SANTOS, G. Castilho, A responsabilidade civil do intermediário financeiro perante o cliente, Almedina, Coimbra, 2008, p. 98.

84 ANTUNES, José Engrácia, “Deveres…”, op. cit., p. 35. 85 Neste sentido, TEIXEIRA, Felipe Canabarro, op. cit., p. 63.

(31)

31 através de diversas fontes normativas. Destarte, estes “consubstanciam verdadeiros e próprios deveres jurídicos de conduta profissional no exercício das atividades de intermediação financeira (…), cuja violação por parte dos intermediários financeiros pode ser fonte para estes de responsabilidade civil e consequente obrigação de

indemnização perante os respetivos clientes”86.

Ademais, sendo a intermediação financeira uma atividade em que o exercício está condicionado ao cumprimento de certos pré-requisitos, a correção da conduta assume uma maior preponderância: isto porque significa que as autoridades administrativas, sabendo dos riscos inerentes ao erróneo exercício da intermediação financeira, confiaram nestas entidades para que com estas interajam não só os clientes, como todo o mercado.

Comecemos pela segmentação dos deveres em questão, segundo FAZENDA MARTINS. De acordo com este, poderemos dividi-los em quatro grupos. Assim, teremos deveres decorrentes de relações contratuais ou pré-contratuais com os clientes, deveres decorrentes das relações com qualquer dos intervenientes no mercado, deveres

gerais e deveres organizativos87.

A primeira categoria é centrada na interação entre o intermediário e os clientes. Consequentemente, subsume-se a esta os deveres de prevalência dos interesses dos clientes (no art. 309º nº3 do CVM), de adequação da operação de investimento ao cliente (previsto no art. 314º e ss. do CVM), de sigilo (art. 304º nº4 do CVM) e,

finalmente, os deveres de informação88.

Quanto aos deveres decorrentes de relações com quaisquer intervenientes no mercado, FAZENDA MARTINS considera que se incluirão nestes aqueles deveres

que parte da doutrina considera acessórios89: referimo-nos ao dever de atuação de

acordo com a boa fé e segundo critérios de diligência, lealdade e transparência. No que toca à categoria de deveres de defesa e proteção do mercado, a mesma refere-se aos intermediários financeiros, sobre os quais impende uma missão de proteção da credibilidade e transparência do mercado, de modo a assegurar o correto funcionamento deste. Trata-se duma questão de manutenção e preservação do ecossistema financeiro: “o caráter profissional da intermediação, não apenas protege

86 ANTUNES, José Engrácia, “Deveres …”, op. cit., p. 37. 87 MARTINS, Fazenda, op. cit., p. 334.

88 Cfr. infra ponto 5.2.1.

(32)

32 os investidores, como torna mais racional a oferta e a procura de valores que nele se

encontram, permitindo um adequado funcionamento do mercado.”90.

Finalmente, destaca-se a categoria dos deveres organizativos. Essencial para o correto funcionamento da atividade dos intermediários financeiros, salienta a necessidade de adoção duma metodologia procedimental por parte destes. Neste sentido, encontramos previstos o dever de organização interna, prevista no art. 305º e ss. do CVM, bem como o dever de conservação documental (nos artigos 307º, 307º-A e 307ºB do mesmo) e o fulcral dever de segregação patrimonial, patente no art. 306º do CVM, salvaguardando a separação de patrimónios de investidores e intermediários financeiros (evitando a transmissão de efeitos de uma parte para a esfera jurídica da outra).

5.2.1. Deveres de informação dos intermediários financeiros

Não obstante a menção geral aos diversos deveres assumidos pelos intermediários financeiros, será aos deveres de informação a prestar por estes que dedicaremos especial atenção. Tendo nos pronunciado já quanto à relevância da

informação supra91, tomemos apenas como noção introdutória que a existência destes

deveres se justifica numa ótica de proteção do mercado de capitais e dos seus investidores. A conduta destes deverá sempre ser pautada pela correção, visto estes serem um “elo de ligação entre o investidor e o mercado, gozando de uma posição de tal modo importante que, querendo podem causar danos irreparáveis não só aos

investidores, como também, ao mercado como um todo”92. Além disso, estes deveres

pressupõem um comportamento ativo do intermediário financeiro, “não podendo limitar-se à simples satisfação de eventuais pedidos de esclarecimento solicitados pelo cliente, num significativo reconhecimento da complexidade do mercado de capitais e

da necessidade de salvaguardar a confiança dos investidores”93.

Na generalidade, estes deveres encontram-se previstos no CVM, mas também se encontram normas sobre esta matéria em outras fontes como o Regulamento da CMVM nº2/2007 e nº2/2012. Estes deveres podem ser divididos em dois grupos

90 MARTINS, Fazenda, op. cit., p. 347. 91 Cfr. supra ponto 5.

92 SOUSA, Simão Mendes de, op. cit., p. 63.

(33)

33 fundamentais: deveres de informação pré-contratual e os deveres de informação

contratual e pós-contratual9495.

Os deveres de informação pré-contratual regulam as informações a prestar pelo intermediário financeiro a um “potencial cliente”, ou seja, a uma contraparte ainda antes que exista um vínculo contratual entre estas. Assim, o art. 312º nº1 do CVM dispõe que este deve prestar “todas as informações necessárias para uma tomada de decisão esclarecida e fundamentada”. Observando o mesmo por outro prisma, conclui-se que o potencial investidor tem um “direito subjetivo de exigir informação do intermediário, mesmo antes da realização de qualquer serviço, ou da formalização de

qualquer contrato”96. O objetivo será que a tomada de decisão não seja influenciada

por um défice informativo, não relevando se esta é uma decisão de investimento acertada ou não. Como menciona FELIPE CANABARRO TEIXEIRA, “é indiferente em relação ao intermediário financeiro se a decisão de investimento é equivocada, ou

não, pois a decisão final deve ser sempre do investidor”97. Ainda quanto a este artigo,

de referir que a enumeração efetuada por esta não é taxativa, mas meramente exemplificativa, como se verifica pelo termo “nomeadamente”. Assim, não se exclui a possibilidade de inclusão, neste dever, de outras informações que sejam, por algum

modo, essenciais ao processo decisório esclarecido98.

Passemos ao segundo número deste artigo. Determinando que “a extensão e a profundida da informação devem ser tanto maiores quanto menor for o grau de conhecimentos e de experiência do cliente”, surge-nos como uma manifestação do princípio know your costumer. Vigora um princípio de proporcionalidade inversa quanto a este, devendo o intermediário financeira explicar aquilo que, por vezes, não será necessário fazer quanto a um investidor médio. Cumprirá salientar, porém, que este preceito se aplica somente em relação aos clientes do intermediário financeiro e

não a um potencial investidor99. Assim sendo, por efeito do vínculo existente entre as

partes, estes dispõem duma maior proteção jurídica, acautelando-se, de modo mais eficaz, os efeitos da assimetria informativa.

94 Seguindo a mesma orientação, cfr. ANTUNES, José Engrácia, “Deveres…”, op. cit., p. 38.

95 Neste sentido, na doutrina italiana, cfr. GUIDOTTI, Rolandino, L’Inosservanza degli Obblighi di

Informazione degli Intermediari Finanziari, , Il Caso, I, setembro de 2017, p. 5.

96 TEIXEIRA, Felipe Canabarro, op. cit., pp. 68-69. 97 TEIXEIRA, Felipe Canabarro, op. cit., p. 68.

98 Neste sentido, cfr. TEIXEIRA, Felipe Canabarro, op,. cit., p. 68 e Sousa, Simão Mendes de, op. cit.,

p. 63.

(34)

34 Baseando-se a informação a prestar nos padrões de qualidade previstos por estas normas, a previsão legal que se segue destina-se a definir os “deveres secundários de prestação no âmbito da relação jurídico-negocial a estabelecer entre intermediário

e cliente”100.Será pelo respeito destes procedimentos que se assegurará a correta

prestação da informação. Nesse sentido, encontramos normas relativas à forma da informação (art. 312º nº 3 a 7), qualidade desta (art. 312º-A), o momento da prestação (art. 312º-B) e dados relativos à proteção do património dos clientes (art. 312º-F do CVM) e quanto ao próprio intermediário financeiro (art. 312º-C) e. Haverá também que ressalvar o art. 312º-E do CVM, que aborda a informação relativa aos instrumentos financeiros. Atendendo à problemática do cumprimento destes deveres na celebração de contratos swap, verificamos que este artigo impõe que os intermediários financeiros explicitem com um “grau suficiente de pormenorização, a natureza e os riscos do tipo de instrumento financeiro em causa”, bem como uma detalhada descrição dos riscos. Destaque-se que o investidor tem que ser obrigatoriamente informado do facto de “poder assumir, em resultado de operações sobre o instrumento financeiro, compromissos financeiros e outras obrigações adicionais, além do custo de aquisição do mesmo”, como refere o artigo 312º-E nº2 na sua alínea c).

Por outro lado, temos o grupo dos deveres de informação contratual e pós-contratual. Estes encontram-se essencialmente previstos nos artigos 323º e ss. do CVM. Por contraposição à primeira categoria, estes constituem “deveres acessórios de conduta do serviço ou contrato de intermediação financeira celebrado entre intermediário e cliente, destinados a assegurar o regular desenvolvimento da relação

negocial e a plena satisfação dos interesses do cliente”101. Assim, a conduta a adotar

pelos intermediários financeiros é estritamente regulada, de modo a garantir uma continuidade de informação, em âmbitos como a execução de ordens (art. 323º do CVM) ou na gestão de carteiras (art. 323º-A do CVM). Pretende-se, destarte, que o investidor entre no mercado com consciência da decisão que está a tomar e que mantenha essa situação de pleno conhecimento durante o decurso do contrato. Tal importará para que se assegure o respeito pelo princípio da proteção do investidor, bem como da eficiência do mercado.

Além do positivado no CVM, há que mencionar o Regulamento 2/2007 da CMVM. Através do art. 14º deste diploma, destinado aos investidores

100 ANTUNES, José Engrácia, “Deveres …”, op. cit., p. 39. 101 Ibidem.

Referências

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