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Pontifícia Universidade Católica de São Paulo PUC-SP

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Pontifícia Universidade Católica de São Paulo

PUC-SP

Rômulo Pedrosa Saraiva Filho

A vulnerabilidade dos ativos das Entidades Fechadas de

Previdência Complementar nos casos de Fundo de Investimento

em Participações sobreprecificado e suas consequências

jurídicas

Mestrado em Direito

São Paulo 2020

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Pontifícia Universidade Católica de São Paulo

PUC-SP

Rômulo Pedrosa Saraiva Filho

A vulnerabilidade dos ativos das Entidades Fechadas de

Previdência Complementar nos casos de Fundo de Investimento

em Participações sobreprecificado e suas consequências

jurídicas

São Paulo 2020

Dissertação apresentada à Banca Examinadora da Pontifícia Universidade Católica de São Paulo, como exigência parcial para a obtenção do título de Mestre em Direito Previdenciário, sob a orientação do Professor Doutor Miguel Horvath Jr.

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Ficha Cartográfica

SARAIVA FILHO, Rômulo Pedrosa.

A vulnerabilidade dos ativos das Entidades Fechadas de Previdência Complementar nos casos de Fundo de Investimento em Participações sobreprecificado e suas consequências jurídicas: São Paulo. Programa de Pós-graduação em Direito Previdenciário, 2020.

346 p.

Orientador: Professor Doutor Miguel Horvath Jr. Dissertação (Mestrado em Direito).

I. Pontifícia Universidade Católica de São Paulo II. Título

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Rômulo Pedrosa Saraiva Filho

A vulnerabilidade dos ativos das Entidades Fechadas de Previdência Complementar nos casos de Fundo de Investimento em Participações

sobreprecificado e suas consequências jurídicas

BANCA EXAMINADORA:

___________________________________________________ ___________________________________________________ ___________________________________________________

Dissertação apresentada à Banca Examinadora da Pontifícia Universidade Católica de São Paulo, como exigência parcial para a obtenção do título de Mestre em Direito Previdenciário, sob a orientação do Professor Doutor Miguel Horvath Jr.

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“You can fool all the people some of the time, and some of the people all the time, but you cannot fool all the people all the time”

(6)

Para ALINE, ESTÊVÃO e INÁCIO, a razão de tudo. Para meus PAIS. Para o Prof. Doutor MIGUEL HORVATH JR., pela

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AGRADECIMENTO

Por mais que haja a concentração dos atos no aluno na confecção de seu trabalho, a elaboração de uma dissertação de mestrado não é, definitivamente, atividade de autoria única. Ao redor do aluno têm várias pessoas que – direta ou indiretamente – despejaram sua parcela de contribuição nessa exaustiva tarefa.

Vários apoiadores merecem o retributo da gratidão, ainda que em singelas palavras.

Primeiramente, uma gama da família ocupa esse espaço. Aline Crispino Pessoa Saraiva, minha amada esposa, esteve presente nas horas mais difíceis para compartilhar os problemas e apontar que continuar era necessário. Estêvão e Inácio, meus filhos, que mostravam compreensão quando abdicavam do pai que recusava constantemente de brincar em prol do compromisso. E meus queridos pais, Rômulo e Welane, que ao seu modo me estimularam e viabilizaram que eu chegasse até onde cheguei. E meu irmão Wellington que pacientemente auxiliou com sua crítica textual.

Miguel Horvath Jr., meu orientador, que compartilhou as agruras e alegrias da nobre tarefa que assumiu na docência, principalmente no mestrado. Vocacionado que é, compartilhou por meses os mais diversos sentimentos que se possa ter numa relação aluno-professor. Com criticidade e lucidez, dedicou parte da sua atribulada agenda e vasto conhecimento jurídico previdenciário para refinar a construção deste trabalho acadêmico.

Amizades que despretensiosamente foram aos poucos construídas e fortalecidas nos corredores da PUC-SP, com pessoas de diferentes formações e cidades do país, que se agregaram também nessa rede de colaboração mútua e troca de conhecimento para alcançar o objetivo acadêmico. Durante essa etapa, foram importantes nas palavras de estímulo, críticas, observações e companheirismo. Entre eles, não poderia deixar de destacar com especial carinho Lúcia Lombardi, Guilherme Casado, Ronaldo Gallo, Fábio Maia e Carlos Lonel.

Por fim, e o mais importante, agradeço Àquele que “é a minha força e o meu escudo; nele o meu coração confia e dele recebo ajuda”.

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RESUMO

SARAIVA FILHO, Rômulo Pedrosa. A vulnerabilidade dos ativos das Entidades

Fechadas de Previdência Complementar nos casos de Fundo de Investimento em Participações sobreprecificado e suas consequências jurídicas. 2020. 346f.

Dissertação (Mestrado) – Pontifícia Universidade Católica de São Paulo, São Paulo.

As entidades fechadas de previdência complementar (EFPCs), também chamadas de “fundos de pensão”, possuem legislação própria, que lhes confere uma série de características e peculiaridades legais. Têm a necessidade legal de diversificar sua carteira de investimento e, para isso, procura o mercado financeiro em busca de assegurar solvência, liquidez, equilíbrio econômico-financeiro e atuarial do seu plano de benefício. E o Fundo de Investimento em Participação (FIP) tem despertado a atenção das entidades previdenciárias para alocação de recursos em razão de sua rentabilidade. O volume financeiro circulante nos fundos de pensão brasileiros tem atraído também pessoas má intencionadas, sejam elas agentes internos ou externos da EFPC. O objeto do estudo analisa a vulnerabilidade em se investir em FIP com precificação distorcida e superavaliada, colocando em risco os recursos garantidores das reservas técnicas e benefícios. A gestão fraudulenta ou temerária dos dirigentes previdenciários auxilia na realização do investimento ruinoso e enseja várias consequências e prejuízo aos integrantes que formam a entidade previdenciária. Os participantes e assistidos, em especial, são mais prejudicados, pois, como hipossuficientes, a minoração da renda em razão do equacionamento do déficit atinge sua aposentadoria em momento decisivo da vida ou têm a necessidade aumentar o valor da contribuição previdenciária. O presente trabalho aponta a responsabilidade jurídica nas esferas administrativa, penal e civil de quem deu azo ao cometimento do dano em decorrência de fraude no fundo de pensão.

Palavras-chave: Previdência complementar. Fundos de pensão. Fundo de

Investimento em Participação. Sobreprecificação. Contingenciamento de risco. Avaliação. Gestões fraudulenta e temerária. Fraudes. Responsabilidade jurídica.

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ABSTRACT

SARAIVA FILHO, Rômulo Pedrosa. The vulnerability of the assets of Closed

Private Pension Funds in the case of an overpriced Participation Investment Fund

and its legal consequences. 2020. 346p. Dissertation (Master Degree) – Pontifical

Catholic University of São Paulo, São Paulo.

Closed supplementary pension entities (EFPCs), also called “pension funds”, have their own legislation, which gives them a series of legal characteristics and peculiarities. They have a legal need to diversify their investment portfolio and, for this, they seek the financial market in search of ensuring solvency, liquidity, economic-financial and actuarial balance of their benefit plan. And the Participation Investment Fund (FIP) has attracted the attention of social security entities to allocate resources because of its profitability. The current financial volume in Brazilian pension funds has also attracted people with bad intentions, whether they are internal or external agents of the EFPC. The object of the study analyses the vulnerability of investing in FIP with distorted and overvalued pricing, putting the resources guaranteeing technical reserves and benefits at risk. The fraudulent or reckless management of social security officers assists in making the ruinous investment and entails several consequences and losses for the members who form the social security entity. Participants and beneficiaries, in particular, are most affected, since, as under-paid, the reduction of income due to the solution of the deficit reaches their retirement at a decisive moment in life or they need to increase the value of the social security contribution. The present work points out the legal responsibility in the administrative, criminal and civil spheres of those who gave rise to the damage caused by fraud in the pension fund.

Keywords: Supplementary pension. Pension funds. Equity Investment Fund.

Overpricing. Risk contingency. Valuation. Fraudulent and reckless management. Fraud. Legal responsibility.

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LISTA DE ABREVIATURAS E SIGLAS

Abrapp – Associação Brasileira das Entidades Fechadas de Previdência Complementar

ACP – Ação Civil Pública

Aerus – Instituto Aerus de Seguridade Social

AETQ – Administrador Estatutário Tecnicamente Qualificado Bacen – Banco Central do Brasil

BD – Plano de benefício definido BDR – Brazilian Depositary Receipts

BNDES – Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social Bovespa – Bolsa de Valores de São Paulo

BPD – Benefício proporcional deferido CD – Plano de contribuição definida CDB – Certificado de Depósito Bancário CEO – Chief Executive Officer

CF/1988 – Constituição da República Federativa do Brasil de 1988 CGPC – Conselho de Gestão de Previdência Complementar

CGPLD/FT – Comitê Estratégico de Gestão da Prevenção à Lavagem de Dinheiro e ao Financiamento do Terrorismo

CMN – Conselho Monetário Nacional

CNPB – Conselho Nacional de Planos de Benefícios CNPC – Conselho Nacional de Previdência Complementar

CNPJ – Cadastro Nacional de Pessoas Jurídicas CNSP – Conselho Nacional de Seguros Privados

COE – Certificado de Operações Estruturadas

Copat – Processo Administrativo Sancionador e Termo de Compromisso CPI – Comissão Parlamentar de Inquérito

CPMI – Comissão Parlamentar Mista de Inquérito CRA – Credit Rating Agency

CV – Plano de contribuição variável CVM – Comissão de Valores Mobiliários

DAIEA – Demonstrativo Analítico de Investimentos e Enquadramento das Aplicações

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DAS – Cargo de Direção e Assessoramento Superiores

DNSPC – Departamento Nacional de Seguros Privados e Capitalização DR – Depositary Receipts

EAPC – Entidade Aberta de Previdência Complementar EC – Emenda Constitucional

EFPC – Entidade Fechada de Previdência Complementar ERISA – Employee Retirement Income Security Act

ESI – Entidades Sistemicamente Importantes EUA – Estados Unidos da América

FGC – Fundo Garantidor de Crédito FII – Fundo de Investimento Imobiliários

FIDC – Fundo de Investimento em Direito Creditório

FIDC-NP – Fundo de Investimento em Direito Creditório Não-Padronizado FIP – Fundo de Investimento em Participação

FMIEE – Fundo Mútuo de Investimentos em Empresas Emergentes FUNCINE – Fundo de Financiamento da Indústria Cinematográfica Nacional

Funcef – Fundação dos Economiários Federais IBA – Instituto Brasileiro de Atuária

IBGC – Instituto Brasileiro de Governança Corporativa IBGE – Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística IGPM – Índice Geral de Preços do Mercado

INSS – Instituto Nacional do Seguro Social IPC – Índice de Percepção da Corrupção IPCA – Índice de Preço ao Consumidor Amplo

LC – Lei Complementar

LCA – Letra de Crédito do Agronegócio LCI – Letra de Crédito Imobiliário

LI – Letra Imobiliária

LIA – Lei de Improbidade Administrativa LSA – Lei das Sociedades Anônimas MPF – Ministério Público Federal

OCDE – Organização para Cooperação e Desenvolvimento Econômico PE – Private equity

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PGBL – Plano Gerador de Benefício Livre PLS – Projeto de Lei do Senado

Postalis – Instituto de Seguridade Social dos Correios e Telégrafos Previ – Caixa de Previdência dos Funcionários do Banco do Brasil Previc – Superintendência Nacional de Previdência Complementar

RAI – Relatório Anual de Informações

Refer – Fundação Rede Ferroviária de Seguridade Social RGPS – Regime Geral de Previdência Social

RPC – Regime de Previdência Complementar RPPS – Regime Próprio de Previdência Social

SBR – Supervisão Baseada em Risco

Seccor – Secretaria de Relações Institucionais de Controle no Combate à Fraude e Corrupção

Seinfra – Secretaria Extraordinária de Operações Especiais em Infraestrutura Selic – Sistema Especial de Liquidação e de Custódia

Serpos – Serviço Federal de Processamento de Dados SFN – Sistema Financeiro Nacional

SOX – Lei Sarbanes-Oxley

SPC – Secretaria de Previdência Complementar

SPPC – Secretaria de Políticas de Previdência Complementar STF – Supremo Tribunal Federal

STJ – Superior Tribunal de Justiça TCU – Tribunal de Contas da União

TIR – Taxa Interna de Retorno TMR – Taxa Média de Retorno

VAR – Value At-Risk VC – Venture capital

VGBL – Vida Gerador de Benefício Livre VPL – Valor Presente Líquido

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LISTA DE TABELAS

Tabela 1 – Fraudes em bilhões nos fundos de pensão estatais ... 75

Tabela 2 – Comparativo dos crimes de gestão fraudulenta e temerária ... 113

Tabela 3 – Órgãos do Sistema Financeiro Nacional ... 148

Tabela 4 – Perdas dos maiores fundos de pensão com FIPs ... 229

Tabela 5 – Irregularidades na valuation do FIP Florestal ... 258

Tabela 6 – Penalidades administrativas dos gestores Petros ... 258

Tabela 7 – Irregularidades na valuation do FIP Cevix ... 265

Tabela 8 – Penalidades administrativas dos gestores Funcef ... 266

Tabela 9 – Responsabilidades dos dirigentes das EFPCs ... 275

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LISTA DE GRÁFICOS

Gráfico 1 – Volume de EFPC e Planos no Brasil ... 159

Gráfico 2 – Investidor de PE/VC no Brasil e o capital comprometido ... 210

Gráfico 3 – Ciclo de atividade do FIP ... 217

Gráfico 4 – Sujeitos ativos e passivos de investimento ... 225

Gráfico 5 – Núcleos de influência na realização do FIP sobreprecificado ... 250

Gráfico 6 – Sanções de ilícitos decorrentes das normas administrativa, civil e penal ... 270

Gráfico 7 – Zona de influência dos partícipes na formação da fraude... 273

Gráfico 8 – Divisão dos agentes internos e externos da EFPC ... 276

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SUMÁRIO

INTRODUÇÃO ... 17

1. EVOLUÇÃO DA PROTEÇÃO, GESTÃO DA PREVIDÊNCIA COMPLEMENTAR NO BRASIL E AS REGRAS DE INVESTIMENTOS ... 22

1.1 Surgimento histórico da Previdência Complementar ... 22

1.2 Modelo de Governo: Estados Liberal, Social e Neoliberal ... 25

1.3 Regulação da norma previdenciária: constitucional e infralegal ... 29

1.3.1 Regime constitucional ... 30

1.3.2 Regime infralegal ... 33

1.3.3 Regulação normativa das Lei n. 6.385/1976 e Leis Complementares n. 108 e 109/2001 ... 39

1.3.3.1 Normas da Comissão de Valores Mobiliários ... 45

1.3.3.2 Normas da Superintendência Nacional de Previdência Complementar ... 48

1.3.3.3 Normas do Conselho Monetário Nacional ... 51

1.4 Características das entidades de previdência complementar ... 54

2. O RISCO SOCIAL, O CONTINGENCIAMENTO DO RISCO DE INVESTIMENTOS E OS ATOS DE GESTÃO NOS FUNDOS DE PENSÃO 62 2.1 O fator “risco” na Previdência ... 63

2.2 Contingenciamento e espécies de risco ... 77

2.2.1 Fatores de risco comuns aos valores mobiliários ... 84

2.2.1.1 Risco de investimento financeiro ... 85

2.2.1.2 Risco de mercado ... 86

2.2.1.3 Risco do negócio ... 87

2.2.1.4 Risco de crédito ... 88

2.2.1.5 Risco atuarial ... 92

2.2.1.6 Risco operacional ... 95

2.2.2 Fatores de risco específicos ao Fundo de Investimento em Participação ... 97

2.2.2.1 Riscos relacionados ao desempenho e à solvência das companhias investidas ... 98

(16)

2.2.2.2 Riscos relacionados à participação no processo das

companhias investidas ... 99

2.2.2.3 Riscos relacionados à concentração da carteira do fundo ... 100

2.2.2.4 Riscos relacionados ao critério de precificação de ativos ... 101

2.3 Atos de gestão nos fundos de pensão ... 103

2.3.1 Gestão fraudulenta ... 104

2.3.2 Gestão temerária ... 106

2.3.3 Diferença: gestão fraudulenta x gestão temerária ... 107

2.3.4 Má gestão ... 114

2.3.5 Terceirização da gestão ... 119

3. ESTRUTURA ORGANIZACIONAL E ÓRGÃOS DE CONTROLE E BOAS PRÁTICAS NA GESTÃO PREVIDENCIÁRIA ... 127

3.1 Estrutura organizacional das EFPCs ... 128

3.1.1 Conselho deliberativo ... 131

3.1.2 Conselho fiscal ... 139

3.1.3 Diretoria executiva ... 141

3.2 Órgãos de controle ... 144

3.2.1 Órgãos de assessoramento ... 151

3.2.2 Superintendência Nacional de Previdência Complementar ... 153

3.2.3 Banco Central do Brasil ... 166

3.2.4 Conselho Monetário Nacional ... 170

3.2.5 Tribunal de Contas da União ... 173

3.3 Boas práticas na gestão previdenciária ... 183

3.3.1 Governança corporativa ... 185

3.3.2 Compliance ... 192

3.3.3 Supervisão Baseada em Risco (SBR) ... 197

(17)

4. FUNDO DE INVESTIMENTO EM PARTICIPAÇÃO SOBREPRECIFICADO COMO INSTRUMENTO DE GESTÃO FRAUDULENTA NOS FUNDOS DE

PENSÃO E SUAS CONSEQUÊNCIAS JURÍDICAS ... 206

4.1 Fundo de Investimento em Participações (FIP) ... 206

4.1.1 Características do Fundo de Investimento em Participação ... 211

4.1.2 Ciclo de atividade no FIP ... 215

4.2 A fraude da sobreprecificação do FIP ... 222

4.3 Complexidade das fraudes e a necessidade de expertise para identificá-las ... 232

4.4 Modus operandi da ação fraudulenta ... 243

4.5 Casos de sobreprecificação de FIP ... 251

4.5.1 Sobreprecificação dos ativos do FIP Florestal ... 252

4.5.2 Sobreprecificação dos ativos do FIP Cevix ... 261

4.6 Consequências jurídicas da precificação fraudulenta do FIP ... 267

4.7 Responsabilidade dos agentes internos e externos da EFPC na fraude ... 274

4.7.1 Responsabilidade administrativa ... 276

4.7.2 Responsabilidade penal ... 289

4.7.3 Responsabilidade civil ... 299

4.7.3.1 Agente interno da EFPC... 306

4.7.3.2 Gestor terceirizado ... 310

4.7.3.3 Agente externo ... 314

4.7.3.4 Agente estatal ... 315

CONCLUSÃO ... 320

(18)
(19)

INTRODUÇÃO

As entidades fechadas de previdência complementar (EFPCs), também conhecidas como fundos de pensão, movimentam no Brasil cerca de R$ 990 bilhões anualmente por meio de 1.142 planos de benefícios, segundo levantamento do Ministério da Economia. Como se trata de renda que deve ser gerida por muito tempo até que se complete o ciclo de aposentadoria de cada participante, esse volume de dinheiro é escoado por dirigentes em complexas transações de valores mobiliários, buscando diversidade, segurança e rentabilidade, além de ser importante instrumento de estímulo à economia, como grande poupança interna.

O patrimônio coletivo, formado pela contribuição financeira de participantes e patrocinadores, é resultado da relação jurídica que se aperfeiçoa por meio do contrato previdenciário, cuja efetividade depende da perícia dos fundos de pensão em lidar com a administração desses ativos, cumprindo seu dever fiduciário e buscando o melhor desempenho atuarial-financeiro. A decisão sobre onde alocar os recursos previdenciários é tomada pelos dirigentes das entidades que, mesmo cientes de suas responsabilidades e regras prudenciais (art. 3º, III, LC n. 109/2001), tendem a escolher investimentos com melhor rentabilidade financeira, normalmente os mais arriscados.

Dentre os valores mobiliários disponíveis no mercado financeiro, os fundos de pensão brasileiros têm revelado interesse em alocar recursos no Fundo de Investimentos em Participações – FIP (private equity), ao adquirirem suas cotas, tornando-se sócios de empresa-alvo com a finalidade de investir financeiramente em projetos ou negócios promissores a darem lucro a longo prazo, caracterizados por ser uma operação de renda variável, complexa, rentável e arriscada por envolver pessoas jurídicas iniciantes ou em reestruturação.

A liberdade de diversificação do portfólio da EFPC no investimento FIP não é irrestrita. Esbarra inicialmente no limite de até 20% aplicável a todos os investimentos do segmento de renda estruturado e, dentro desse teto, encontra-se a margem de até 15% dos recursos do plano em cotas de fundos de investimento em participações (art. 23, I, Resolução do Conselho Monetário Nacional n. 4.661/2018). Mesmo assim, a depender do porte e da relevância da

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entidade previdenciária, a expressão financeira dos recursos legalmente mobilizados em tal operação pode ser milionária ou bilionária.

Como toda atividade que concentra quantias vultosas, nesse caso com a guarda de patrimônio por anos, nos fundos de pensão é natural que o volume de ativos desperte a cobiça de pessoas más intencionadas em obter vantagem indevida. As entidades fechadas de previdência complementar submetem-se ao risco do mercado financeiro para que outro risco, o social, possa ter sustentáculo econômico e prover as contingências sociais fixadas pelo ordenamento jurídico.

A necessidade dessa convivência perdurável com o risco é objeto de regulação da legislação previdenciária que impôs, conforme art. 10 da Resolução do Conselho Monetário Nacional (CMN) n. 4.661/2018, que a Entidade Fechada de Previdência Complementar (EFPC) “na administração da carteira própria, deve identificar, analisar, avaliar, controlar e monitorar os riscos de crédito, de mercado, de liquidez, operacional, legal, sistêmico e outros inerentes a cada operação”.

Tanto a área de previdência complementar fechada como o mercado financeiro sofrem demasiada regulação estatal, dotada de engrenagem complexa em sua estrutura organizacional, fiscalizatória e de controle externo. Não obstante, pode acontecer, e acontece, de esses mecanismos normativos e de segurança não serem suficientes para evitar operações fraudentas.

A fraude escolhida como problema central do trabalho é a prática de sobreprecificação do FIP, distorção praticada no mercado financeiro e ameaça o patrimônio previdenciário, quando o investidor é a Entidade Fechada de Previdência Complementar. Por sobreprecificação, entende-se como avaliação propositalmente distorcida acima do valor justo, o que eleva o risco de prejuízo. A vulnerabilidade dos ativos dos fundos de pensão processa-se quando há falha – antes, durante e depois da conclusão do investimento – no processo de avaliações econômico-financeiras (valuations), no monitoramento dos riscos e na observância das regras prudenciais.

Expõe-se, nesta análise, a fragilidade do aparato de segurança na gestão da EFPC e aborda-se a repercussão legal imposta aos partícipes envolvidos na fraude e, principalmente, as dos dirigentes dos fundos de pensão

(21)

quando agem ilicitamente, respondendo estes por gestões temerárias e fraudulentas previstas na Lei n. 7.492/1986, que define os crimes contra o sistema financeiro.

Uma vez fixado o ponto central do estudo, seu desenvolvimento começa no primeiro capítulo tratando da evolução histórica da previdência complementar no mundo e no Brasil. Aborda o amadurecimento das normas no âmbito constitucional e infralegal, bem como o tratamento específico a esse tipo de fraude pelas diferentes normas dos órgãos de controle aplicáveis e as características das entidades de previdência complementar.

O fator “risco” na área previdenciária ganha destaque no segundo capítulo, ponto fulcral do trabalho, pois, se bem avaliado, a entidade fechada de previdência complementar cumpre duplo objetivo quando garante a um só tempo que os “riscos sociais” – a exemplo de doença, invalidez, velhice e morte – possam ser pagos em razão da rentabilidade alcançada em decorrência de uma gestão eficaz no contingenciamento dos riscos específicos e genéricos: de investimento financeiro, de mercado, do negócio, de crédito, atuarial e o operacional. Este último, o risco operacional, é o que comporta a possibilidade de a ação humana agir em desalinho com as regras prudenciais e deixar os recursos previdenciários em “vulnerabilidade” a exemplo da superestimação do FIP.

No terceiro capítulo, o leitor poderá ter dimensão de como é a estruturação organizacional das entidades fechadas de previdência e como há a concentração do poder decisório, para, por exemplo, deliberar ou rechaçar os investimentos, inclusive os que representam elevado risco ou são desaconselhados pela assessoria técnica. Os órgãos de controle externos funcionam para supervisionar esse microssistema organizacional, a fim de averiguar se os atos internos que acontecem na EFPC estão em conformidade com a lei. Além da principal atribuição de supervisão e punição, tais órgãos de controle também assumem a função de normatizar, coordenar, fiscalizar e controlar as atividades das entidades de previdência (art. 5º da LC n. 109/2001).

Cabe à Superintendência Nacional de Previdência Complementar a responsabilidade de supervisionar o oitavo maior sistema de previdência complementar do mundo, mas o controle também é acompanhado pela atuação

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concomitante do Conselho Monetário Nacional, do Banco Central do Brasil e do Tribunal de Contas da União. O capítulo também aborda a adoção de práticas como governança corporativa no ambiente previdenciário, compliance, supervisão baseada em risco (SBR) e o whistleblowing, “lei do apito” ou medidas para denunciar suspeitas de violações da lei, que funcionam como políticas de minimização e de combate à fraude.

O quarto e último capítulo aborda precipuamente as características do FIP que, por ser promissor no retorno da rentabilidade e do lucro, chama a atenção de investidores, inclusive os fundos de pensão, para adquirirem cotas em empresas emergentes ou em reestruturação financeira. A partir daí se explica como se utiliza o FIP com desvio de finalidade para fins ilícitos, abordando especificamente o fenômeno da “sobreprecificação”, e o tratamento dispensado pelas normas previstas com o fim de enquadrar e punir os infratores.

Este estudo envolve tema interdisciplinar, pois atrai o interesse das áreas da previdência complementar, do sistema financeiro nacional e da ciência criminal. O foco aqui tratado, contudo, é a abordagem do direito previdenciário, mas isso não dispensa a confluência regulatória dos outros campos, até porque há previsão normativa que interfere na análise do FIP sobreprecificado. A LC n. 109/2001 contém as regras gerais do sistema de previdência complementar, mas a regulamentação do dever de fidúcia é aprofundada pelas normas infralegais.

O FIP sobreprecificado, a depender dos agentes que se envolveram na transação, atrai a incidência de normas oriundas do Conselho de Valores Mobiliários (Instrução CVM n. 8/1979, item II, letra “c”, e da Instrução CVM n. 409/2004, art. 65, inciso VI, e art. 71, inciso II, “b”), do Conselho Monetário Nacional (Resolução CMN n. 4.661/2018, arts. 4º e 10 e Resolução CMN n. 3.456/2007, art. 61), da Superintendência Nacional de Previdência Complementar (Resolução CGPC n. 13/2004, arts. 1º, § 1º; 4º e 12, §§ 1º e 2º), do Decreto n. 4.942/2003 (arts. 63 e 64) e da Lei n. 7.492/1986 (art. 4º, caput). Todas elas convergem para que as operações financeiras levem em conta a adequada análise de risco e evitar a vulnerabilidade do patrimônio.

O patrimônio previdenciário encontra-se, portanto, em situação de vulnerabilidade quando os dispositivos do conjunto normativo acima são

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transgredidos e implicar em prejuízo à EFPC, gerando a tipificação de fraudes na Entidade Fechada de Previdência Complementar. O último capítulo aborda a complexidade das fraudes, a dificuldade em identificá-las, o modus operandi frequente no processo de sobreprecificação do FIP e casos que já foram objeto de investigação criminal e processo administrativo, a exemplo dos FIPs sobreprecificados (FIP Florestal e FIP Cevix). Por fim, o trabalho traz uma análise reflexiva sobre as consequências jurídicas desses ilícitos no âmbito administrativo, penal e cível.

(24)

1

EVOLUÇÃO DA PROTEÇÃO, GESTÃO DA PREVIDÊNCIA

COMPLEMENTAR NO BRASIL E AS REGRAS DE

INVESTIMENTOS

1.1 Surgimento histórico da Previdência Complementar

O montepio foi o modelo antecessor da estrutura do sistema de previdência supletiva,1 que sofreu processo de amadurecimento anos mais tarde

no Brasil até o nosso modelo atual. Seu significado remonta ao século XV, quando esse termo era utilizado na Itália por frades franciscanos como derivação de “monte di pietà” ou crédito de piedade. Era uma forma de conceder empréstimos baratos aos pobres mediante entrega de algum bem em garantia. O frade franciscano Marco de Monte Santa Maria em Gallo (ou Marcos de Montegallo)se tornou beato2 pela Igreja Católica justamente por ter disseminado

o modelo do Montes-Pios (ou Montes Pietatis) em várias cidades italianas, instituições que combatiam a usura.

1 Conquanto haja discussão conceitual e terminológica na doutrina sobre a diferenciação das

expressões de previdência “supletiva”, “suplementar” e “complementar”, são palavras com significados próximos e remetem a ideia da proteção proporcionada pelo regime de previdência complementar. Ao longo do tempo sua conceituação foi aperfeiçoada. Com as mudanças realizadas no art. 202 da Constituição Federal e na legislação infralegal, especialmente as Leis Complementares ns. 108 e 109, foi encampado no ordenamento jurídico a expressão “complementar” em detrimento das anteriores variáveis. E, por isso, do ponto de vista técnico, é mais assertivo usar a expressão “complementar”, termo adotado e praticado pela legislação vigente. Affonso Almiro, em sua obra de 1978 (A previdência supletiva no Brasil. São Paulo: LTr, 1978. p. 36), define o objetivo da “previdência supletiva, que tem por escopo a tranquilidade econômica do profissional, face às suas repercussões na economia das empresas, na estabilidade política e nas relações sociais, em termos de segurança nacional”. Wladimir Novaes Martinez (Curso de direito previdenciário, Tomo IV: previdência complementar. São Paulo: LTr, 2002. p. 24) conceitua as previdências suplementares “como renda de trato sucessivo, de certa forma aferidas sobre a retribuição do participante, em níveis variáveis, sem esgotar a diferença entre esta e a oficial. Provém do latim suplementum, com o significado de adição, juridicamente querendo dizer o acrescido”. Daniel Pulino (Previdência complementar: natureza jurídico-constitucional e seu desenvolvimento pelas entidades fechadas. São Paulo: Conceitual, 2011, p. 259-261) pontua que “não há grande utilidade em procurar obter um conceito essencialmente correto para a designação da matéria” e arremata que a expressão “previdência complementar” seria a “denominação oficial” e essa “proteção complementar visa a buscar também a manutenção do padrão de vida do participante, só que já não se está mais no nível de cobertura de subsistência”.

2 INDELICATO, Elide Mercatili. Vite e opere di Marco dal Monte Santa Maria in Gallo (1425-1496). Ascoli Piceno: Capponi, 2010. p. 546.

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Os Montes Pios (ou, em português, montepios) assumiram uma feição de instituição de caridade e aperfeiçoaram-se para, no futuro, prover às pessoas menos favorecidas outros tipos de proteção, sob forma de cobertura de doença, prisão, velhice ou pensão por morte. Criada na Itália, a prática se arraigou pela Europa, inclusive em Portugal – que colonizou o Brasil e trouxe o modelo para nossas terras. Essa influência da legislação estrangeira foi o ponto de partida para o crescimento da normatização brasileira e dos montepios.

A história da previdência brasileira nasce de forma rudimentar, como sistema de socorro mútuo e de concessão de benefícios pelo Estado, que não tem critério claro e que sofre ingerências externas, principalmente com uso da discricionariedade para beneficiar pessoas ligadas aos governantes. De acordo com Affonso Almiro,3 a primeira manifestação de previdência se deu por causa da

instalação da Santa Casa de Misericórdia no período colonial, quando se tornou necessário criar um sistema de proteção aos seus funcionários.

No período colonial (1500-1822), houve uma incipiência na própria organização do governo, da sociedade e das leis no Brasil. Mas destaca-se que, em 2 de setembro de 1795, o príncipe Dom João VI, filho de Dona Maria I, contribuiu na composição do Montepio dos Oficiais da Marinha da Corte por meio do Plano de Beneficência dos Órfãos e Viúvas dos Oficiais da Marinha,4 registro

mais antigo de implementação de previdência brasileiro, que influenciou na organização dos próximos montepios, a exemplo da Marinha5 (em 1821) e dos

servidores (1835) com o Montepio Geral de Economia dos Servidores do Estado (Mongeral). A chegada do Mongeral é considerada por Affonso Almiro6 como o

3 “Efetivamente, a primeira manifestação de previdência e mutualismo, entre nós, data do ano

de 1543, quando Braz Cubas fundou a Santa Casa de Misericórdia de Santos, e na mesma oportunidade, criou um fundo de pensão para os seus empregados. Proliferaram, desde então, no Brasil, as sociedades de socorro mútuo e de montepio, organizadas por iniciativa particular, de acordo com o forte espírito previdencialista que herdamos de Portugal”. ALMIRO, Affonso. A previdência supletiva no Brasil. São Paulo: LTr, 1978. p. 21-22.

4 MARTINEZ, Wladimir Novaes. Curso de direito previdenciário. 2. ed. São Paulo: LTr, 2003. t.

II. p. 69.

5 PINHEIRO, Ricardo Penha. A demografia dos fundos de pensão. Brasília: Ministério da

Previdência Social. Secretaria de Políticas de Previdência Social, 2007. p. 27.

6 Em 22 de junho de 1835, foi criado o Montepio Geral dos Servidores do Estado (Mongeral),

primeiro criado no Brasil, com formato de entidade de previdência privada, aberta e sem fins lucrativos, oferecendo planos previdenciários com características de facultatividade e mutualismo. Essas são “instituições em que, mediante o pagamento de cotas cada membro adquire o direito de, por morte, deixar pensão pagável a alguém de sua escolha. São essas as

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surgimento da “previdência privada”; cujos planos detinham características de facultatividade e mutualismo, como se observa atualmente.

No período do Império (1822-1889), houve uma sucessão de novos montepios, instituição sem fins lucrativos que tinha o objetivo de prestar assistência e cobertura previdenciária, e também criação de leis7 que viabilizavam

rendas vitalícias, a depender da discricionariedade política e da avaliação dos serviços prestados, mesmo sem prévia fonte de custeio. Na República (1889-1930), diversos decretos regulamentaram a proteção previdenciária dos funcionários públicos, a exemplo dos integrantes dos Ministérios da Fazenda, da Guerra e da Marinha, e também a criação em 1904 da Caixa de Montepio8 para

trabalhadores privados. Essa movimentação e a criação de diversos órgãos para prover a segurança previdenciária de várias categorias profissionais serviram para consolidar as normas futuras e se desenhar o modelo brasileiro de proteção social.

A Lei Eloy Chaves foi criada através da Lei n. 4.682, de 24 de janeiro de 1923, que consolidou e desenvolveu o sistema previdenciário brasileiro com instituições que cobriam, por exemplo, os riscos de velhice, invalidez e morte. Essa evolução da previdência geral influenciou anos depois como modelo de estruturação e de organização o regime de previdência complementar.

manifestações mais antigas de Previdência Social” BRASIL. Câmara dos Deputados. Decreto n. 2.437, de 6 de julho de 1859. Disponível em: https://www2.camara.leg.br/legin/fed/decret/ 1824-1899/decreto-2437-6-julho-1859-557502-norma-pe.html. Acesso em: 26 out. 2019.

7 O professor de História da Universidade Federal Fluminense (UFF), Luiz Fernando Saraiva,

analisou cerca de 4.500 leis aprovadas no período imperial, durante o período de 1826 a 1889, das quais um terço eram normas de cunho estritamente pessoal, que abordavam desde a nomeação de algum servidor até a concessão da aposentadoria, pensão por morte ou tençãs à custa do Estado. Segundo ele, as “tençãs era a forma como normalmente os Estados no Antigo Regime premiavam com pensões os serviços considerados relevantes ao príncipe”. SARAIVA, Luiz Fernando; SILVA, Lílian França da. Os atos do Poder Legislativo no Império Brasileiro (1826-1889). Passagens – Revista Internacional de História Política e Cultura Jurídica, Rio de Janeiro, v. 3, n. 1, jan.-abr. 2011, p. 18. Disponível em:http://www. historia.uff.br/revistapassagens/ artigos/v3n1a12011.pdf. Acesso em: 17 mar 2019.

8 Em 1904, foi criada a Caixa de Montepio dos Funcionários do Banco do Brasil da República do

Brazil (antecessora da PREVI – Caixa de Previdência dos Funcionários do Banco do Brasil, fundo de pensão que gerencia a previdência complementar dos funcionários do Banco do Brasil e um dos mais antigos e maior da América Latina) para prover cobertura previdenciária de 52 funcionários e “garantir o pagamento de uma pensão mensal ao herdeiro do funcionário que dela fizer parte, na forma estabelecida pelos presentes Estatutos”. BELOCH, Israel. Da Caixa Montepio à PREVI: 100 anos do maior fundo de pensão da América Latina. Rio de Janeiro: Memória Brasil, 2004. p. 16.

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Entre o período de 1904 a 1977, houve certa estagnação na produção de normas regulatórias de previdência complementar nacional, mas nem por isso deixaram de ser criadas, mesmo que desordenadamente, pois ausente a figura de autoridade supervisora centralizada ou diretriz normativa. Essa quase total ausência de Estado perdurou até 1977, quando ocorreu a regulamentação da previdência privada em todo o país com a Lei n. 6.435/1977, criada num momento de crescimento econômico do país, “alinhada com a experiência internacional”9

das mudanças na legislação norte-americana, no caso a Employee Retirement

Income Security Act – ERISA.10

Mesmo com amadurecimento normativo e estrutural ocorridos em momentos diferentes, tanto a legislação oriunda do regime geral de previdência social e do regime de previdência complementar têm algo em comum, pois foram desenvolvidas para atenderem os interesses da coletividade e se inspiraram na organização e estrutura do Estado, principalmente no modelo de Governo da época. A Constituição Federal de 1988, cujos efeitos irradiaram para a legislação previdenciária (dos regimes geral de previdência social – RGPS, do próprio de previdência social – RPPS e de previdência complementar – RPC), foi determinante, por exemplo, para enraizar a proteção social no ordenamento jurídico. Por essa razão, antes de analisar a estrutura constitucional e infralegal das normas previdenciárias, far-se-á uma digressão sobre a influência do modelo de governo no nosso sistema normativo, pois as normas são o reflexo de sua sociedade.

1.2 Modelo de Governo: Estados Liberal, Social e Neoliberal

O conjunto de normas brasileiras não está dissociado da influência do que ocorre no resto do mundo, principalmente no desenvolvimento do direito

9 RODARTE, José Cláudio. A evolução da Previdência Complementar Fechada no Brasil, da década de 70 aos dias atuais: expectativas, tendências e desafios. Monografia (Ciências Atuariais) – Universidade Federal de Minas Gerais, Belo Horizonte, 2011. p. 32.

10 Employee Retirement Income Security Act – ERISA (ou Lei de Segurança de Renda de Aposentadoria de Empregados) é uma lei tributária e trabalhista federal dos Estados Unidos que estabelece padrões mínimos para planos de pensão no setor privado e influenciou a lei brasileira. U.S. DEPARTMENT OF LABOR. Employee Retirement Income Security Act (ERISA). Disponível em: https://www.dol.gov/general/topic/retirement/erisa. Acesso em: 17 nov. 2019.

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moderno e o aperfeiçoamento da própria ideia de Estado. Nesse contexto, o papel do Estado nos aspectos sociais e jurídico-econômicos vem passando por mutações desde a criação dos seguintes modelos de Governo: Estado Liberal, do Estado Social e do Estado Neoliberal. Essa evolução do Estado gera repercussões no sistema normativo de qualquer sociedade, inclusive no Brasil com o intervencionismo estatal como instrumento da proteção social e corroborada pela Constituição Federal.

O Estado Liberal remonta aos séculos XVII e XVIII com o desenvolvimento das ideias iluministas e da ideologia liberal, segundo a qual se busca a interferência mínima do Estado na sociedade. A ideologia liberal ou liberalismo foi inspiração para o desenvolvimento de várias teorias políticas e econômicas que em essência eram favoráveis à plena liberdade dos indivíduos, limitando o poder de interferência dos Estados na vida e nas escolhas de seus cidadãos, representada na expressão francesa laissez-faire, laissez-passer.11

Esses ideais foram respaldados por pensadores como John Locke, ao apregoar que cabia aos governos garantir direitos básicos, ou Adam Smith ao defender, em

A riqueza das nações, o abstencionismo estatal na economia, delegando a este

apenas a “mão invisível”12 do mercado. O liberalismo caracterizou-se pelo não

intervencionismo, pela livre concorrência ou na crença na autorregulação dos ciclos econômicos.

11 A partir do século XVIII, essa expressão francesa passou a representar o liberalismo

econômico, que transmite a ideia de que o mercado deve funcionar livre e sem interferência do governo, seja na aplicação de taxas ou subsídios, mas apenas com regulamentos mínimos para proteger os direitos de propriedade. Segundo Gregório Iriarte, a expressão ‘“laissez faire, laissez passer” “foi o pensamento basilar para o liberalismo econômico, significando o “laissez faire” (deixar fazer) uma oposição ao intervencionismo estatal, abertura da economia à iniciativa privada, e o “laissez passer” (deixar passar) uma supressão às barreiras alfandegárias, para que haja um estímulo à circulação das riquezas”. IRIARTE, Gregório. Neoliberalismo sim ou não? Manual destinado a comunidades, grupos e organizações populares. São Paulo: Paulinas, 1995. p. 13.

12 Esse termo ficou conhecido por esse economista escocês que defendia que se a economia

fosse livre, sem intervenção de órgãos externos ou do governo, ela irá regular de forma automática, como se houvesse uma mão invisível por trás de tudo. Na sua obra, a expressão foi usada na contextualização de que o indivíduo ao investir seus recursos “tem em vista apenas sua própria segurança; ao orientar sua atividade de tal maneira que sua produção possa ser de maior valor, visa apenas o seu próprio ganho e, neste, como em muitos outros casos, é levado como que por uma mão invisível a promover um objetivo que não fazia parte de suas intenções. Aliás, nem sempre é pior para a sociedade que esse objetivo não faça parte das intenções do indivíduo. Ao perseguir seus próprios objetivos, o indivíduo muitas vezes promove o interesse da sociedade muito mais eficazmente do que quanto tenciona realmente promovê-lo.” SMITH, Adam. A riqueza das nações – investigação sobre sua natureza e suas causas. São Paulo: Abril Cultural, 1983. p. 379.

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A ocorrência de eventos históricos como a Primeira Guerra Mundial (1914-1919) e a crise econômica de 1929 abalaram as estruturas político-econômicas vigentes de países como Reino Unido e Estados Unidos, principais representantes de Estados liberais, surgindo espaço para a ascensão de propostas alternativas. Após a Segunda Guerra Mundial (1939-1945), o país norte-americano passou a acolher com intensidade os ideais intervencionistas, aderindo a doutrina keynesiana.13 Na Europa, o economista sueco Gunnar Myrdal

adotou modelo semelhante à doutrina keynesiana, chamado de Welfare State,14 e

influenciou os países europeus.

No Estado Social, o governo assume o protagonismo de garantir aos indivíduos direitos sociais, como: saúde, educação, seguridade social, conforme previsto no art. 6º da Constituição Federal de 1988, que define um modelo de bem-estar social. Segundo José Joaquim Gomes Canotilho, o Estado Social é “o tipo de Estado que coloca entre os seus princípios fundantes e estruturantes o princípio da socialidade, que deve se articular com o conceito de democraticidade, pois ‘só há verdadeira democracia quando todos têm iguais possibilidades de participar no governo da polis’.15

O Estado de bem-estar social caracteriza-se como modelo de governo no qual esse mesmo Estado seria o instrumento de proporcionar melhor condição de vida, com o fim de viabilizar serviços essenciais aos cidadãos, a exemplo de educação, saúde e moradia, e por regular as relações econômicas, normativas, políticas e ser provedor de direitos sociais. A impressão de que esse bem-estar foi projetado na sociedade brasileira é abordada pela professora Roberta Soares da

13 Essa doutrina é atribuída ao economista britânico John Maynard Keynes, defensor do

intervencionismo, que discorreu em A teoria geral do emprego, do juro e da moeda que o capitalismo sofria uma crise. Keynes defende que o Estado deve intervir na economia para, quando empresas investirem menos, não ocorra processo de retração econômica e, por conseguinte, novas crises.

14 É o “Estado no qual o cidadão, independentemente de sua situação social, tem direito a ser

protegido, através de mecanismos/prestações públicas estatais, contra dependências e/ou ocorrências de curta ou longa duração, dando guarida a uma fórmula onde a questão da igualdade aparece – ou deveria aparecer – como fundamento para a atitude interventiva do Estado”. MORAIS, José Luis Bolzan de. As crises do Estado e da Constituição e a transformação espacial dos direitos humanos. Porto Alegre: Livraria do Advogado, 2002. p. 37-38.

15 CANOTILHO, José Joaquim Gomes. O direito constitucional como ciência de direcção: o

núcleo essencial de prestações sociais ou a localização incerta da socialidade (Contributo para a reabilitação da força normativa da “constituição social”). Revista de Doutrina da 4ª Região, Porto Alegre, n. 22, p. 5, fev. 2008.

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Silva, em sua tese de doutorado, que “no direito positivo brasileiro, o bem-estar e a justiça social são considerados valores supremos da sociedade. Representam a essência, a diretriz, o pilar de todo o sistema constitucional, tanto no campo social como no da ordem econômica”.16

A partir da década de 1970, novas correntes de pensamento econômico combateram os princípios do pensamento keynesiano, os excessos do Welfare

State e o custo financeiro desse Estado Social. As perspectivas liberais dos

teóricos da escola monetarista de Chicago ganharam espaço no pensamento econômico capitalista, fomentando o neoliberalismo como reação ao Estado intervencionista.

Nos anos 1970, James Buchanan defendia ser necessária a redução do Estado para valorizar os valores do individualismo e da livre escolha. Ele, principal cultor da Teoria da Escolha Pública (Theory of Public Choice), era um crítico de que o poder público não compreendia17 corretamente a essência do laissez-faire.

O Estado Neoliberal fundamenta-se na ideologia do neoliberalismo de que o mercado é quem regula a vida social e o Estado deve primar por funções mínimas.

À guisa dos modelos de estados históricos, no Brasil o intervencionismo estatal foi a corrente adotada para a proteção social. A criação da Constituição Federal de 1988 valorizou esse sistema de modelo e, portanto, o conjunto de normas brasileiras sofreu a influência do Estado Social18 e tem repercutido na

16 SILVA, Roberta Soares da. A concreção eficacial do princípio da contrapartida no sistema de seguridade social: uma proposta de orçamento. Tese (Doutorado em Direito). São Paulo: Pontifícia Universidade Católica de São Paulo, 2014. p. 123.

17 O prêmio Nobel, James McGill Buchanan Jr, foi um dos pensadores de maior destaque da

Escolha Pública ou da Teoria da Escolha Pública. Em 1962, publicou o livro The Calculus of Consent, obra que estabeleceu a escolha pública como um ramo da economia. “Se alguma coisa está mal, o governo regula. Se os reguladores falham, regulam-se também e por aí fora [...] à falta de compreensão, pelos poderes públicos, do princípio do laissez-faire, ou seja, do princípio de acordo com o qual o resultado da interacção dos indivíduos, quando deixados sozinhos, pode ser, e muitas vezes é, superior aos resultados que emergem da interferência política”. BUCHANAN JR, James McGill. The limits of liberty. Between anarchy and leviathan. Chicago/London: The University of Chicago Press, 1975. p. 91.

18 De acordo com Ingo Wolfgang Sarlet, a Constituição Federal não fala expressamente sobre

Estado Social, mas apenas direito social. “Diversamente de outras ordens constitucionais, a CF acabou não consagrando de modo distinto as noções e correspondentes princípios do Estado Democrático, do Estado Social e do Estado de Direito. Quanto ao Estado Social, aliás, sequer há referência expressa e direta no direito constitucional positivo quanto ao seu

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legislação infralegal, inclusive na forte atuação do Estado no domínio econômico. Cabe salientar, contudo, que desde 1988 a Constituição foi alterada por 106 emendas constitucionais e isso a alterou significativamente sua essência.

A carta política preservou a essência da ordem social, calcada nos direitos sociais e no bem-estar e na justiça sociais; mas o sistema econômico adotado pela Carta Magna se afastou do modelo clássico e se aproximou de um sistema híbrido, adotando valores elementares do modo de produção capitalista, a exemplo da propriedade privada e da livre iniciativa, sem se dissociar da possibilidade do mesmo Estado intervir na economia.

Filiamo-nos à opinião do austríaco Friedrich August von Hayek, economista e pensador neoliberal do século XX, defensor de que “não existe nenhum sistema racionalmente sustentável em que o Estado não faça nada”.19

Independentemente de correntes e de posições mais ou menos radicais sobre o tamanho do Estado e o seu nível de intervenção na sociedade, cada Constituição de um país, conforme suas características culturais e necessidades, deve dispor sobre a participação de políticas públicas desse Estado, protraindo seus efeitos sobre suas normas previdenciárias: nas esferas constitucional e legal.

1.3 Regulação da norma previdenciária: constitucional e infralegal

O crescimento nacional das entidades de previdência complementar e a unificação dos institutos de aposentadoria e pensão acabaram criando demandas e conflitos, que justificaram produção normativa e de órgãos reguladores desse mercado, tanto no âmbito legal como no constitucional. Destaca-se que o Estado desenvolve um papel importante na intermediação e regulação do mercado de previdência complementar brasileiro.

reconhecimento”. SARLET, Ingo Wolfgang. Curso de direito constitucional. São Paulo: Saraiva, 2019. p. 275.

19 HAYEK, Friedrich August von. La route de la servitude. 2. ed. Paris: Presses Universitaires de

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1.3.1 Regime constitucional

As primeiras cartas políticas do país não tinham a preocupação de tratar sobre aspectos relacionados à previdência ou direitos sociais. A proteção previdenciária foi paulatinamente galgando espaço nas reiteradas edições de cada Constituição Federal brasileira.

Em 1824, a primeira Constituição do Brasil, foi promulgada em momento em que o país atravessava tensão política, logo após sua independência, sendo governado pelo imperador Dom Pedro I e estabelecia a monarquia hereditária e as eleições censitárias.20 Já a Constituição de 1891, criada num contexto de

pós-proclamação da República, destacou-se por sedimentar a separação dos três poderes.

Após a crise econômica de 1929, surgiu a Constituição de 1934 com a influência da Constituição de Weimar e promulgada na chamada Era Vargas, com preocupação em criar uma ordem econômica e social, foi criada a Justiça do Trabalho, mas não instalada efetivamente. Seu preâmbulo tinha o objetivo “para organizar um regime democrático que assegura à nação a unidade, a liberdade, a justiça e o bem-estar social e econômico”. A Carta de 1937 surgiu na redemocratização do país e manteve a previsão relativa à Justiça do Trabalho. Com a deposição de Getúlio Vargas e fim do Estado novo em 1945, a Constituição Brasileira de 1946 previu a Justiça do Trabalho como órgão do Poder Judiciário e representou avanço da democracia e das liberdades individuais do cidadão.21

A Carta seguinte, de 1967, foi criada no período de autoritarismo com o governo militar e representou retrocesso nos direitos civis e políticos. No entanto, a Constituição não alterou os direitos sociais conquistados nas edições anteriores e manteve os direitos dos trabalhadores e sua proteção previdenciária.

20 O voto censitário é aquele que impõe restrições de voto para alguns grupos sociais ou levando

em consideração outros grupos, como baseado no gênero sexual, na religião, na etnia etc. Não é um sistema aplicável em estados democráticos, justamente por ferir princípios básicos da democracia e da soberania exercida pelo povo, sem qualquer discriminação.

21 A “Constituição de 1946 retomou o catálogo clássico de direitos individuais e políticos, trouxe

uma lista importante de direitos trabalhistas, na linha da tradição inaugurada em 1934, prevendo pela primeira vez, por exemplo, o direito de greve e de participação nos lucros”. BARCELOS, Ana Paula de. Curso de direito constitucional. 2. ed. Rio de Janeiro: Forense, 2019. p. 87.

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Por fim, a Constituição Federal de 1988 foi promulgada num momento de redemocratização, que definiu o funcionamento do Estado e a garantia de direitos fundamentais à população, inclusive a ordem da seguridade social.

Do art. 193 ao 232 da Constituição Federal são tratados os temas relacionados ao bom convívio e desenvolvimento social do cidadão, criando uma nova ordem social atribuindo uma série de deveres do Estado, como: a seguridade social (saúde pública, previdência social e assistência social); educação, cultura e esporte; ciência e tecnologia; comunicação social; família; meio ambiente e populações indígenas.

No que tange aos direitos sociais, a promulgação da Constituição Federal em 1988 teve peso importante para o Regime Geral de Previdência Social (RGPS), mas não foi dispensada muita atenção em relação ao Regime de Previdência Complementar (RPC) e ao Regime Próprio de Previdência Social (RPPS). A carta política – em seu texto primitivo – restringiu-se à matéria da competência (art. 21, VIII), regulatória (art. 192, II) e sobre requisitos da aposentadoria no regime geral, na forma do art. 201, §§ 7º e 8º:

Art. 201. Os planos de previdência social, mediante contribuição, atenderão, nos termos da lei, a:

[...]

§ 7º A previdência social manterá seguro coletivo, de caráter complementar e facultativo, custeado por contribuições adicionais. § 8º É vedado subvenção ou auxílio do Poder Público às entidades de previdência privada com fins lucrativos.22

A redação do art. 201 da CF/1988 vigorou por dez anos, quando foi suprimida pela EC n. 20 em 1998.

Já o art. 202 da Constituição Federal contempla o regime de financiamento por capitalização ao estabelecer que a previdência privada tem caráter complementar, de natureza contratual, com financiamento por capitalização e baseado na prévia constituição de reservas que garantam o benefício contratado. Com a EC n. 20, de 15 de dezembro de 1998, a Carta Magna passou a estabelecer no art. 202, caput, a organização autônoma da

22 BRASIL. Câmara dos Deputados. Constituição da República Federativa do Brasil de 1988.

Disponível em: http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/Constituicao/Constituicao.htm. Acesso em: 23 mar. 2019.

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previdência complementar em relação ao Regime Geral de Previdência Social (RGPS). A EC n. 20/1998 reformulou o art. 202 e ampliou a importância da previdência complementar como proteção social, abordando que somente lei complementar deve regular a matéria, conforme seus §§ 4º a 6º:

Art. 202. O regime de previdência privada, de caráter complementar e organizado de forma autônoma em relação ao regime geral de previdência social, será facultativo, baseado na constituição de reservas que garantam o benefício contratado, e regulado por lei complementar.

[...]

§ 4º Lei complementar disciplinará a relação entre a União, Estados, Distrito Federal ou Municípios, inclusive suas autarquias, fundações, sociedades de economia mista e empresas controladas direta ou indiretamente, enquanto patrocinadoras de entidades fechadas de previdência privada, e suas respectivas entidades fechadas de previdência privada.

§ 5º A lei complementar de que trata o parágrafo anterior aplicar-se-á, no que couber, às empresas privadas permissionárias ou concessionárias de prestação de serviços públicos, quando patrocinadoras de entidades fechadas de previdência privada. § 6º A lei complementar a que se refere o § 4° deste artigo estabelecerá os requisitos para a designação dos membros das diretorias das entidades fechadas de previdência privada e disciplinará a inserção dos participantes nos colegiados e instâncias de decisão em que seus interesses sejam objeto de discussão e deliberação.

A promulgação da EC n. 20/1998 permitiu a inserção da previdência complementar no sistema de seguridade social por alteração do art. 202,23 que

emprestou maior relevo à previdência complementar, ao abordar características de complementaridade, autonomia e facultatividade do regime e proibir que o Poder Executivo facilitasse qualquer subvenção ou auxílio para entidades de previdência complementar com fins lucrativos. Com a alteração realizada pela EC n. 20, a previdência complementar foi incorporada ao Sistema Nacional de Seguridade Social e, portanto, concebida como independente e organização autônoma24 em comparação aos regimes geral e próprio de previdência social

23 “Art. 202. O regime de previdência privada, de caráter complementar e organizado de forma

autônoma em relação ao regime geral de previdência social, será facultativo, baseado na constituição de reservas que garantam o benefício contratado, e regulado por lei complementar”. BRASIL. Câmara dos Deputados. Emenda Constitucional n. 20, de 15 de dezembro de 1998. Disponível em: http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/Constituicao/ Emendas/Emc/emc20. htm#art7. Acesso em: 23 mar. 2019.

24 Arion Sayão Romita destaca que a partir do art. 202 da CF ocorreu estruturação de um regime

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nessa nova configuração do Estado do Bem-Estar Social no Brasil, mas com traços de natureza jurídica contratual e privada.

A EC n. 41/2003, quando alterou a redação do art. 192, transferiu a contextualização da previdência privada do capítulo do Sistema Financeiro Nacional para deslocá-lo a outro trecho da carta política que foi o título da Ordem Social. Apesar de parecer uma singela mudança topológica, foi uma iniciativa significativa que colocou a previdência privada na circunjacência dos valores e dos objetivos do bem-estar e da justiça social.

Ao longo do tempo, a Constituição Federal foi sendo aprimorada para transformar o tratamento dado à previdência complementar, como se vê do art. 202 da Constituição, a fim de que ele possa ter maior importância25 e servir de

guia para as normas legais e infralegais existentes. Essa legislação, inspirada nessa ordem constitucional, passou a interferir na autonomia privada ou restringi-la, via regulamentação específica, como aconteceu com as Leis Complementares n. 108 e 109, ambas de 2001.

Essa intervenção estatal no Brasil se justifica como forma de buscar a regulação e impingir a efetividade da previdência complementar como direito social, pois, embora a carta política preveja esse direito, sua concretização é realizada por meio da legislação infraconstitucional.

1.3.2 Regime infralegal

A evolução da proteção previdenciária nacional remodelou-se ao longo do tempo e acompanhou as inovações trazidas nas diversas versões da Constituição Federal, sempre com o propósito de aprimorar e de garantir a proteção da seguridade social, inclusive o regime de previdência complementar,

baseada na constituição de reservas que garantem o benefício contratado. ROMITA, Arion Sayão. Estruturação da relação de previdência privada. Porto Alegre, Síntese Trabalhista, v. 13, n. 154, p. 5, 2002.

25 Segundo Rodolfo Arango, a “incorporação de direitos em uma Constituição está orientada a

reconhecer sua importância e a dar uma maior proteção, não sendo possível sua modificação por meio de simples leis. O alto grau de importância de um respectivo direito se reconhece automaticamente mediante sua consagração constitucional”. RIVADENEIRA, Rodolfo Arango. El concepto de derechos sociales fundamentales. Bogotá: Legis, 2004. p. 33.

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em nível constitucional. Na medida em que tal aperfeiçoamento se dava no âmbito da carta política, foi sendo refletida na legislação infraconstitucional desde quando começaram a surgir os primeiros montepios no Brasil até o modelo de entidade fechada de previdência complementar conhecido atualmente.

Embora haja registro da criação de entidades de previdência complementar na época do Império, sua estruturação normativa e o amadurecimento do modelo organizacional consolidaram-se a partir da década de 1960 no Brasil, e evoluíram até 1988, quando novamente a constitucionalização da previdência complementar aconteceu de modo mais refinado. Antes da década de 1960, porém, mesmo com a popularização do mercado de previdência complementar e necessidade de ordenar as relações sociais, o país atravessou um período de significativa carência26 de normas estruturadas e claras regulando

especificamente a temática. O Código Civil de 1916 condicionou a criação de entidades à prévia autorização do Governo.27

No plano das normas infralegais, a evolução delas ocorreu com alternância de dispositivos que ora regulavam os seguros privados, ora envolviam a previdência complementar. Há simbiose temática dos instrumentos legais nessas matérias. Em 1966, o Decreto-lei n. 73 regulou a previdência complementar aberta, instituindo o Sistema Nacional de Seguros Privados e as operações de seguros e resseguros.

O contexto histórico internacional com a Grande Depressão28 ocorrida

nos Estados Unidos, ou a Crise de 1929, influenciou anos mais tarde o sistema

26 “Durante muito tempo, a previdência privada foi uma atividade praticamente desregulamentada,

exercida livremente pelos particulares. Aplicavam-se tão somente as regras gerais do Código Civil e do seguro privado, com quase nenhuma fiscalização”. MARTINS, Danilo Ribeiro Miranda. Previdência privada: limites e diretrizes para a intervenção do Estado. Curitiba: Juruá, 2018. p. 45. 27 “Art. 20. As pessoas jurídicas têm existência distinta da dos seus membros. § 1º Não se

poderão constituir, sem prévia autorização, as sociedades, as agências ou os estabelecimentos de seguros, montepio e caixas econômicas, salvo as cooperativas e os sindicatos profissionais e agrícolas, legalmente organizados. Se tiverem de funcionar no Distrito Federal, ou em mais de um Estado, ou em territórios não constituídos em Estados, a autorização será do Governo Federal; se em um só Estado, do Governo deste [...]”. BRASIL. Código Civil de 1916 (Lei n. 3.071, de 1º de janeiro de 1916). Disponível em: http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/ LEIS/L3071.htm. Acesso em: 23 mar. 2019.

28 A Grande Depressão é considerada o pior e o mais longo período de recessão econômica do sistema

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