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O AGENTE ECONÔMICO REFLEXIVO

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Academic year: 2021

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O AGENTE ECONÔMICO REFLEXIVO

U

M NOVO DESAFIO PARA A PSICOLOGIA ORGANIZACIONAL

SI G M A R MA L V E Z Z I PHD PS I C O L O G I A OR G A N I Z A C I O N A L, LA N C A S T E R UN I V E R S I T Y

PESQUISADOR EM PSICOLOGIA DO TRABALHO

Professor no Brasil das Universidades: Pontificia Universidade Católica de Sao Paulo PUC-SP

Fundacao Getulio Vargas FGV - SP

Universidade de Sao Paulo USP-Sp

Dentre as mudanças que circulam, compõem e transformam a sociedade atual, a profissionalização é uma das mais problemáticas. Impondo um redirecionamento radical na capacitação dos indivíduos, a re-profissionalização altera a probabilidade de êxito de seu desempenho profissional que é uma condição básica da sobrevivência e realização pessoal. A reprofissionalização é produto da metamorfose das empresas que substituem as estruturas, a engenharia de tarefas e manuais pelo trabalho "just-in-time" em equipes flexíveis, autônomas, interdependentes e polivalentes. A origem dessa metamorfose é competitividade sanguinária, desencadeada e exponenciada pelo processo de globalização da sociedade. Operando num ambiente globalizado, a empresa enfrenta a adaptação como rotina, reagindo através da crescente flexibilidade. A empresa flexível funciona através das decisões de muitos indivíduos; ou seja, da descentralização porque seus problemas exigem diagnósticos constantes e os manuais não podem prever todas as alternativas possíveis num mundo de imprevistos. Qual é o profissional requerido pela empresa flexível? Quais são os insumos de trabalho desse profissional? Responder a essas questões é o objetivo deste ensaio sobre a re-institucionalização do trabalho na forma do agente econômico reflexivo - a forma de trabalho profissional esperada pela sociedade no século XXI.

A GLOBALIZAÇÃO

A origem destas mudanças está no fenômeno da globalização, um processo complexo e multifacetado, potencializado pela rápida e generalizada substituição da tecnologia eletro-mecânica pela tecnologia da teleinformação. É uma nova sociedade (pós-moderna) que emerge da sociedade moderna. A globalização é um fenômeno múltiplo decorrente da alteração de cinco pilares básicos da articulação dos negócios, da sociedade e da cultura. Um primeiro pilar é a compressão do espaço e do tempo (o aspecto ontológico da globalização). A generalizada incorporação da teleinformação em todas as atividades está mudando os padrões de espaço sob pontos de vista: (1) o espaço muda enquanto distância porque permite que as pessoas e instituições conduzam eventos a milhares de quilômetros de distância como se estivessem presentes a eles; e (2) o espaço muda enquanto lugar porque a reprodução de documentos e textos em

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discos compactos ou disquetes permite que uma área, hoje, ocupada por um metro cúbico de dados possa ser contida em um disquete que ocupa um espaço desprezível. Um segundo pilar da sociedade alterado pela globalização é a possibilidade de rápida incorporação de capital financeiro e tecnologia aos negócios dificultando o controle sobre as regras do jogo comercial e, consequentemente, a estabilidade da empresa com influência direta na competitividade (o aspecto econômico da globalização).

O terceiro pilar é a imprevisibilidade de acontecimentos políticos, sociais e culturais sobre os negócios, limitando a possibilidade de planejamento. Mais e mais freqüentemente, os profissionais envolvidos nos negócios enfrentam fatos emergentes. (o aspecto sociológico da globalização)que os obrigam a reavaliar a situação e redirecionar suas ações. A vida profissional exige conhecimentos generalizados, para se dar conta dos imprevistos. O quarto pilar (o aspecto

antropológico) pode ser resumido no contínuo bombardeio de significantes sobre

os sujeitos e objetos, mudando seu significado, valor e sua utilidade funcional. Esta possibilidade complica a relação do indivíduo com o trabalho, porque limita a autonomia da subjetividade humana. É comum os profissionais encontrarem-se sufocados por muitas informações que veiculam novos valores e significados aos objetos e pessoas. É a importância do capital simbólico na sociedade atual. Finalmente, a possibilidade real de se experimentar e viver diferentes identidades (o sentido psicológico da globalização), complica o relacionamento social e profissional e o investimento numa identidade profissional.

Desafiadas por alterações tão significativas nos negócios, as empresas estão sendo forçadas a rever sua forma de ser e de atuar. De um modelo análogo ao funcionamento de uma orquestra, na qual todos têm uma partitura que direciona seu trabalho sob a busca de sinergia por parte do maestro (na empresa, por parte do gerente), a empresa está sendo redesenhada para um modelo mais similar ao jogo de basquetebol, no qual não há partituras, mas apenas diretrizes dadas pelo treinador. Os jogadores criam suas tarefas durante o próprio jogo. Por esse motivo, para se compreender o funcionamento dos negócios na sociedade globalizada e o profissional que atua nela, impõe-se o exame dos efeitos da globalização na empresa.

EFEITOS DA GLOBALIZAÇÃO NA EMPRESA

Se a regra é a convivência com eventos imprevisíveis que podem alterar as variáveis do jogo durante o próprio jogo, através da incorporação de capital financeiro e do conhecimento aos negócios, a burocracia perde sua força, porque é um instrumento de controle eficaz num ambiente estável que pressupõe e valoriza o funcionamento regularizado dos processos. Diante de um ambiente em significativa mutação, não é possível manter o funcionamento regular dos processos sem riscos de sobrevivência. A empresa perderia sua capacidade de adaptação, e portanto, teria seus riscos aumentados. Esse fato explica a desagregação da estrutura burocrática e o enfraquecimento dos instrumentos tradicionais de autoridade gerencial. A empresa não somente não necessita mais

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de burocracia, como esta a impede de desenvolver a flexibilidade. Outra conseqüência importante da globalização na condução dos negócios é a necessidade compulsória de automação como forma singular de economia de recursos. A automação diminui o número de procedimentos, o tempo de produção e as pessoas envolvidas. Além disso, a automação regulariza o processo como também diminui os erros. Com tais predicados, a automação funciona como um fator vital para a competitividade porque afeta diretamente duas das mais importantes variáveis das relações comerciais que são os custos e a rapidez dos negócios.

Afetadas por sua porosidade para receber capital e tecnologia num mundo que muda seus valores pelo manejo do capital simbólico através do bombardeio de significantes, as atividades econômicas ocorrem dentro de um contexto que agrega diversidade à sua articulação. Como se sabe, as variáveis do mercado são dependentes da estrutura política, social e institucional, por esse motivo os negócios ganham complexidade, incerteza e ambigüidade, gerando problemas como a dificuldade de medição dos preços, até a distinção entre risco e oportunidade. A evolução econômica e a inversão em técnica e pessoal depende do acesso a múltiplas fontes de informação e à atualização do conhecimento. Hoje se vive e se trabalha em uma sociedade na qual a inserção nas redes de informação diferencia o desempenho do agente econômico, assim como o conhecimento é a principal fronteira entre as empresas. Na era da globalização, a eficácia de uma empresa depende de seu capital intelectual e de seu capital social. O primeiro é o conhecimento disponível na empresa, a velocidade de sua combinação em sistemas mais complexos e o modo de sua utilização para agregar valor aos negócios. O segundo é o acesso permanente a fontes de informação e a propriedade compartilhada de informações.

Tais condições exigem decisões artesanais que é o trabalho do agente econômico reflexivo. Este atua dentro de um sistema gerencial que é menos fundamentado na autoridade e a hierarquia e muito mais na criação e coordenação das competências requeridas para a transformação de necessidades , expectativas e valores em qualidade dos produtos e serviços. A criação dessas competências é possível através do manejo do capital intelectual e do capital social. Dessa forma, esse agente tem, através da combinação desses dois recursos, um instrumento de poder mais eficaz que os instrumentos da autoridade porque é mais voltado para a criação do que para a punição e o controle.

A GESTÃO POR COORDENAÇÃO DE COMPETÊNCIAS

A criação e coordenação de capacidades de transformação é a forma de gerência da empresa flexível. Julgar uma batalha na qual os papéis mudam durante o jogo é uma situação que no permite estruturas e tarefas fixas. Assim é a condução dos negócios hoje. A alteração de uma variável no contexto pode inviabilizar um plano que marchava bem até o momento anterior a essa mudança. Por isso a gestão da empresa atual é uma atividade mais dependente de diagnósticos e avaliações que de uma estrutura e papéis fixos. Equipes dinâmicas e integradas ajudam mais

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uma empresa que uma estrutura de níveis hierárquicos. A empresa é chamada a recriar sua capacitação para manejar o negócio nas condições do cenário num particular momento e prever o controle sobre os momentos seguintes desse cenário ou dentro de um cenário distinto. Portanto, administrar é o manejo das capacidades das pessoas para formar comunidades de ação, capaz de aprender o cenário de um particular momento e re-ler os processos envolvidos no problema para se dar o passo seguinte com mais certezas. Essa condição de uma equipe provém de sua natureza de comunidade de ação. Comunidade significa integração, compromisso e aprendizagem. A equipe de trabalho é construída através da contínua aprendizagem organizacional, ou a aquisição e socialização do conhecimento através dos indivíduos e sua conseqüente transformação em

standards coletivos de desempenho. Na empresa o importante não é ter

indivíduos que aprendem mas grupos que absorvem o conhecimento, o incorporam, e o transformam em conduta coletiva.

Assim compreendida, a comunidade de ação demanda igualmente o compartilhamento da responsabilidade sobre a análise estratégica e sobre os resultados (participação). Todos acompanham os passos de cada um e conhecem o motivo da ação do outro. Cada um recebe “inputs” do todo e o todo recebe de cada um. La comunidade de ação depende também da atenção dirigida para o objetivo como um valor prioritário em suas atividades, o qual, em outras palavras, depende do compromisso, como combustível da ação. O desenvolvimento do compromisso provém de uma relação de reciprocidade entre o empenho do indivíduo na realização dos objetivos do grupo (neste caso, da empresa)

(empresabilidade) e o empenho da empresa na realização pessoal e profissional

dos indivíduos (empregabilidade). Do ponto de vista da gestão de recursos humanos, a coordenação de competências é a criação do sujeito coletivo através da articulação dos agentes econômicos reflexivos comprometidos com a realização dos resultados recíprocos e em comum com a empresa. Em poucas palavras, é a contínua reconstrução da comunidade de ação capacitando-a para seu autodesenvolvimento partir do manejo do seu capital social e capital intelectual dentro de relações de reciprocidade com a empresa. É um trabalho de ajuste do processo de transformação do produto ou serviço, por parte das mesmas equipes, para operar de forma otimizada no cenário dos negócios.

Num mundo caracterizado pela diversidade, ambigüidade, incerteza e complexidade, o fluxo de transformação dos produtos ou serviços é criado como algo aqui e agora pela comunidade de ação. O profissional que trabalha nesse jogo é o agente econômico reflexivo que é o profissional que busca agregar valor a seu trabalho através ¿?. Como esta forma de trabalho está ficando mais freqüente, se pode dizer que estamos reinstitucionalizando o trabalho. Até a industrialização a forma predominante de trabalho era a artesanal. O artesão era um trabalhador que necessitava de habilidades motoras e criatividade. As indústrias transformaram os artesãos em operários e ??. Aqueles eram trabalhadores que necessitavam somente das habilidades motoras e estes do conhecimento da produção e do manejo das pessoas. Na era da empresa flexível o operário e o supervisor estão sendo empregados pelo empreendedor que é o

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agente econômico reflexivo.

O TRABALHO DO AGENTE ECONÔMICO REFLEXIVO

O agente econômico reflexivo é o profissional que atua através da reflexão. Se pressupõe nele, a capacidade para identificar e desenvolver recursos e os coordenar para a produção de um fim, dentro de condições de incerteza e ambigüidade. Ele trabalha numa relação de sujeito para sujeito, atuando mais como facilitador que como negociador. É um profissional que tem a crítica e a hermenêutica como suas principais ferramentas. Ele é um agente que assume o papel social de criar valor econômico mas trabalhando independentemente de estruturas e manuais tendo como principal ferramenta sua reflexão. Esse trabalho é alimentado por alguns insulso que indicam suas principais atividades para produzir reflexões.

O primeiro “input” é a busca do consenso; uma conseqüência das condições de complexidade, incerteza e ambigüidade. É difícil ter certezas. Para criar competências, o profissional necessita de integrar suas percepções às percepções dos outros, fazer seus argumentos conhecidos, assim como conhecer os argumentos dos outros. Isto significa buscar a validação de sua percepção através da busca do consenso sobre a organização dos negócios. O segundo “input” é a valorização da crítica como instrumento de busca da certeza. A crítica evidencia aspectos que podem ser fracos e que necessitam melhor articulação. A crítica ao

status quo, como fonte de energização da equipe. Um terceiro “input” é benchmarking. O agente econômico reflexivo depende do conhecimento e

comparação para competir com padrões de excelência. Para tanto ele considera as diferentes possibilidades trazidas pela diversidade e os possíveis referenciais para compreender a situação frente a valores e parâmetros distintos. Uma situação complexa pode ser organizada de diferentes maneiras através de diferentes sentidos. O agente reflexivo não pode limitar-se a um só sentido porque ele limita seu acesso às potencialidades da situação. O agente econômico atua preocupado com seus referenciais, é crítico deles e busca ampliá-los. Um outro “input” relacionado a este é a elaboração de cenários. Como o ambiente é incerto e ambíguo, o agente econômico reflexivo trabalha considerando diferentes cenários. Ele necessita conhecer como os eventos impactam. uns sobre os outros e qual é a dinâmica que esse impacto cria no todo. O agente maneja a cadeia de eventos que funciona dentro de regras que só são conhecidas a partir do cenário. Um outro “input” que o agente necessita é o conhecimento do funcionamento das variáveis independentes e a forma como os mediadores atuam sobre elas. Isso exige atenção aos incidentes, como forma de identificação de um mediador que mudou a rotina e gerou outro resultado para a variável independente. Finalmente, todos sabem que nenhuma pessoa trabalha bem em um ambiente de incertezas e ambigüidades sem o feed back. O agente econômico reflexivo necessita da valorização das competências que sua articulação promoveu na produção e os valores que seu trabalho acrescentou. ao resultado. Como seu trabalho não é isolado, mas uma comunidade de ação, a partir da criação de conhecimentos

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entre seres hermenêuticos, ávidos de realização pessoal e profissional, o critério de valorização leva em conta esses três elementos. Assim, se o conhecimento cresce, os indivíduos devem crescer em realização pessoal e a empresa na transformação.. Essa ponte entre uso e acumulação de conhecimento garante que o processo sofrerá menos as incertezas internas por parte dos indivíduos que o compõem. Por isso, o agente econômico no conclui um trabalho sem a valorização das competências criadas e as possibilidades no aproveitadas de construção de outras.

A empresa vive dentro de um ambiente de muitas mudanças. Ela não pode mais contar com a força da estrutura e da burocracia. O caminho para ela é a reflexão. Refletir sobre esta nova forma de trabalho que tem potencialidade para resgatar a condição de sujeito que foi tirada do operário é a mais importante missão para os profissionais de recursos humanos nesta década.

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Referências

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