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Gastos Catastróficos a partir da aquisição de medicamentos das famílias

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Academic year: 2021

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Gastos Catastróficos a partir da aquisição de

medicamentos das famílias

Isabel C M. V. dos Santos1

Monica Viegas Andrade2

Kenya Noronha3

Palavras-chaves: Financiamento, Equidade em saúde, desigualdade social em saúde

1 DPE/ IBGE 2 UFMG/CEDEPLAR 3 UFMG/CEDEPLAR

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Gastos Catastróficos a partir da aquisição de

medicamentos das famílias

Isabel C M. V. dos Santos4

Monica Viegas Andrade5

Kenya Noronha6

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Introdução

Um dos principais objetivos de sistemas de saúde igualitários é a equidade no financiamento que pressupõe que os gastos em saúde das familias ocorram de acordo com a capacidade de pagamento e seja dissociado da necessidade. Para alcançar esse objetivo, é importante a adoção de políticas tributárias que associem o financiamento à capacidade de pagamento e que este não ocorra no ato da realização do serviço. A combinação das diferentes fontes de financiamento da saúde (impostos, mecanismos de seguro publico, seguro privado e desembolso direto) pode resultar em distribuição iniquitativa, dependendo como estas fontes afetam o orçamento dos mais pobres relativamente aos mais ricos (WAGSTAFF et al, 2000). A maior parte dos sistemas de saúde apresenta um componente de desembolso direto das famílias como uma das fontes de financiamento (WAGSTAFF et al, 2000). Quando os desembolsos diretos excedem a uma proporção considerável da capacidade de pagamento das famílias, estas incorrem em Gastos Catastróficos (GC) (XU et al 2003, WAGSTAFF & DOORSLAER 2000, ZURUGA-BRENER. et al 2012). A expectativa de incorrer em GC pode ter repercussões na vida das famílias, uma vez que estas podem não procurar serviços de saúde necessários e/ou adiar tratamentos médicos. No caso dos medicamentos, o impacto no estado de saúde pode ser mais severo, uma vez que estes são, muitas vezes, determinantes da cura de doenças ou da manutenção da saúde (no caso, de doenças crônicas). Os gastos catastróficos não estão associados somente a tratamentos de alto custo uma vez que dependem da importância relativa dos gastos no orçamento familiar (XU et al, 2003, XU et al, 2007). Há fatores que podem aumentar a possibilidade de gastos catastróficos, como baixa disponibilidade de recursos da família e falta de um mecanismo de pré-pagamento que aumente a proteção das famílias. Desta forma, quando os gastos com medicamentos têm alta participação no orçamento familiar, além de poder gerar ruína financeira, podem afetar diretamente o estado de saúde, pois muitas vezes há o adiamento do tratamento ou o uso irregular destes.

4 DPE/ IBGE 5 UFMG/CEDEPLAR 6 UFMG/CEDEPLAR

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A equidade no financiamento tem como pressuposto que todo o gasto com saúde deve ocorrer de acordo com a capacidade de pagamento. Quando uma parte considerável do financiamento da saúde é realizada por Desembolso Direto (DD), este pode provocar dois efeitos: comprometer substancialmente o orçamento familiar com gastos com saúde e/ou tornar a família pobre. Quando os gastos provocam uma pressão financeira de forma a alterar a estrutura orçamentária da família, como, por exemplo, redução do consumo de outros bens e despoupança, estes gastos são considerados catastróficos. No Brasil, o gasto com medicamento é um desembolso importante realizado diretamente pelas famílias. Para grupos socioeconômicos menos favorecidos, a parcela gasta com medicamentos pode representar uma proporção significativa da renda, sendo, portanto, fonte de iniquidades no acesso à saúde no Brasil.

Diversos estudos têm estimado a prevalência de famílias que incorrem em GC em diferentes sociedades. Xu et al (2003) investigaram o desembolso direto de saúde de 59 países com o objetivo de estimar os gastos catastróficos. Os autores desenvolveram uma nova metodologia em que a principal inovação foi a construção da capacidade de pagamento. Neste método, a capacidade de pagamento é o consumo total das famílias, subtraído de uma linha de pobreza alimentar construída pelos autores. Foram consideradas como incorrendo GC as famílias cuja proporção do desembolso direto com saúde, em relação à capacidade de pagamento, fosse superior a uma linha de corte de 40%. De acordo com os resultados encontrados, entre os países desenvolvidos, os maiores percentuais de famílias vivenciando gastos catastróficos foram em Portugal (2,71%) e Grécia (2,17%), enquanto que, nos países em transição, destacam-se Vietnam (10,45%) e Brasil (10,27%).

Para o Brasil, Diniz et al (2007) elaboraram uma análise sobre os gastos catastróficos utilizando a metodologia de Xu et al (2003), e a base de dados da POF 2002-2003. Ao replicarem a metodologia de Xu et al (2003) e compararem os resultados, os autores verificaram grande diferença. O estudo de Diniz et al mostrou que os GC estavam abaixo de 1% contra 10,27% estimado por Xu et al (2003). A principal explicação para essa diferença foi o uso de fontes de dados diferentes, pois Xu et al (2003) utilizaram a Pesquisa de Padrão de Vida 1996-1997.

Mais recentemente, Diaz et al (2012), estudaram em que medida diferenças regionais, restrição de acesso a serviços e medicamentos e a cobertura de seguro privado podem impactar a prevalência de GC no Brasil. Neste trabalho, foram utilizados dois indicadores, cuja diferença está na construção da capacidade de pagamento. De acordo com resultados encontrados, as regiões Centro-Oeste e Sul se destacaram com maiores prevalências de GC. Além das diferenças regionais, Diaz et al (2012) mostram a importância de algumas características das famílias na determinação de GC. Por exemplo, famílias com presença de idosos possuem maiores chances de incorrer em GC. Quanto à cobertura de plano de saúde, observou-se que nas famílias com pelo menos um membro com seguro de saúde privado, as prevalências eram maiores que em famílias sem nenhuma cobertura. O estudo de Boing (2013) analisou os gastos catastróficos em saúde e as desigualdades sociais em saúde para o Brasil. A fonte de dados do estudo foram as POF’s 2002-2003 e 2008-2009. Neste trabalho, as famílias foram classificadas em GC quando 10,0%, 20,0% ou 40% da despesa com saúde estivesse comprometendo a capacidade de pagamento das famílias. As prevalências de GC variaram entre 0,7% e 21,0%, dependendo do método de cálculo.

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O objetivo deste artigo é contribuir com a literatura evidenciando a magnitude dos GC devido a gastos com medicamentos, principalmente no acesso a medicamentos por aquisições não monetárias. A magnitude dos GC foi estimada sob três formas. A primeira estimativa considera apenas os gastos observados/reportados com medicamentos (monetários e não monetários). Na segunda há a exclusão dos gastos não monetários. A comparação dessas duas prevalências permite inferir sobre a importância dos gastos não monetários como mecanismos que evitam as famílias de incorrerem em GC.

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Método de estimação de Gasto Catastrófico

No método de estimação de GC, um dos principais conceitos é o de Capacidade de Pagamento (CP ) que é definida como o gasto total da família, excluindo gasto com itens de subsistência. Foram construídos três indicadores para a análise de GC em medicamentos que diferem entre si de acordo com a definição dos gastos para subsistência. No primeiro indicador, os gastos com subsistência referem-se aqueles realizados com alimentação (OMS, 2000). O segundo indicador segue a proposta de Xu

et al (2003) na qual os gastos para subsistência foram determinados a partir de uma

linha de pobreza alimentar, estimada pela média dos gastos com alimentos por adulto equivalente das famílias do 45º-55 º percentil na distribuição de alimentos. Este método pressupõe que os gastos com alimentos por adulto equivalente devem ser similares aos observados para a família mediana. Como, de acordo com essa definição, a capacidade de pagamento pode assumir valores negativos, uma vez que é estimada exogenamente ao domicílio. Dessa forma, para valores menores que zero, os gastos com subsistência foram substituídos pelo gasto com alimentação por adulto equivalente, observado no

próprio domicílio.7 O terceiro indicador utiliza a metodologia de Wagstaff e Doorslaer

(2003) na qual os gastos com subsistência são definidos pelo valor da linha nacional de

pobreza alimentar, também denominada linha de indigência8.

Para classificar as famílias que incorreram em gastos catastróficos, é necessário definir um ponto de corte para a proporção dos gastos com medicamentos em relação à capacidade de pagamento. Famílias que realizam gastos com medicamentos acima desse ponto de corte são consideradas como incorrendo em GC. Na literatura, não há consenso sobre o ponto de corte, podendo variar de 5% a 40% (DINIZ, 2007 DIAZ et al 2012). Neste artigo, foram utilizados três pontos de corte (z): 15%, 30% e 40%, sendo definidos como GC moderado, grave e extremo, respectivamente. Todos os três indicadores de GC foram estimados considerando os três pontos de corte (z). O quadro 1 apresenta de forma sintética a definição dos indicadores de GC estimados.

7 Este artigo é parte da tese de doutorado na qual também foram construídas escalas de equivalências.

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Quadro 1. Definição dos indicadores de GC segundo os conceitos de gastos com subsistência

Elaboração própria

A fonte de dados utilizada é a Pesquisa de Orçamentos familiares para dois recortes transversais, 2008-2009 e 2002-2003. A POF tem por objetivo principal analisar o dispêndio das famílias. As informações coletadas permitem mensurar as despesas monetárias e não monetárias das famílias durante o período de 12 meses. A parcela monetária corresponde aos gastos efetuados no mercado através de moeda, quase moedas, cartões, cheques pré-datados, entre outros meios de pagamento. A parcela não monetária é aquela obtida por troca, doação, produção própria ou retirada do próprio negócio.

Os indicadores de prevalência de GC foram estimados considerando atributos individuais importantes na determinação da capacidade de financiamento das famílias. Quatro abordagens foram realizadas. Inicialmente, consideram-se as diferenças entre os quintis de renda familiar por adulto equivalente. A segunda estimativa é desagregada por grandes regiões geográficas de residência, de modo a captar diferenças nas políticas públicas de acesso aos medicamentos e incorporar as disparidades socioeconômicas regionais marcantes no Brasil. Na terceira, as estimativas foram realizadas por características da família no que se refere à estrutura etária e etnia/cor. Finalmente, as estimativas foram realizadas desagregando pela presença de seguro saúde.

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Estatística Descritiva

O acesso aos medicamentos pode ser evidenciado pela proporção de famílias que reportaram algum gasto. Nos períodos 2002-2003 e 2008-2009, mais de 80% das familias brasileiras apresenta algum desembolso monetário e não monetário com medicamentos, sendo que esse percentual se elevou de 81,23 para 83,6% entre os períodos. A análise por tipo de desembolso, monetário e não monetário, evidencia que o componente mais importante para o acesso a medicamento no Brasil ainda é através do dispêndio monetário. Em 2008-2009, 77% das famílias teve algum dispêndio monetário com medicamentos enquanto somente 20% teve acesso através de dispêndio não monetário.

Para os gastos monetários, observa-se um gradiente monotônico e positivo com a posição socioeconômica: o percentual de familias que realiza algum dispendio monetario se eleva de 76% no primeiro quintil de renda para 88% no quinto quintil. Em contrapartida, quando o gasto é apenas não monetário, as maiores participações

Indicador Trabalho Original Definição dos gastos com subsistência (S )

GC1 OM S Gastos reportados com alimentação por cada família.

Gwg Wagsatff e Doorslaer (2003) Linha de pobreza alimentar nacional publicada pelo IBGE (2008 ).

GCxu Xu et al(2003)

Linha de pobreza endógena definida pela média dos gastos reportados pelas famílias do 45º-55º percentil da distribuição de alimentos.

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encontram-se até o terceiro quintil de renda, evidenciando que o maior acesso na aquisição de medicamentos por meio nao monetario ocorre nas camadas mais pobres. Entre os períodos ocorre redução da proporção de famílias com gasto não monetário com medicamentos nos estratos mais pobres, de 25,37% para 21,86%, e um aumento nos mais ricos de 11,23% para 13,46%.

A análise por região mostrou um crescimento da participação das famílias na aquisição de medicamentos entre os dois períodos analisados. Em 2008-2009, a região Sul foi a que apresentou maior acesso a medicamentos, de 85,37% nas aquisições monetárias. No entanto, quando se trata de aquisições não monetárias, foi a região Sudeste que deteve a

maior participação, de 22,69%. Entre os períodos estudados, a participação das famílias

caiu nas regiões Norte, Nordeste e Centro-Oeste e aumentaram nas regiões Sudeste e Sul, o que demonstra um maior acesso aos medicamentos na forma de doação em regiões consideradas mais desenvolvidas economicamente.

Ao observar características da família, como a cor/etnia do chefe, observa-se que há uma menor participação na aquisição de medicamentos em famílias com chefes negros que as famílias não negras, em ambos os períodos estudados. Notadamente esse fato se inverte, quando analise é por aquisições não monetárias, posto que as famílias chefiadas por negros possuem uma maior participação. Outro aspecto relevante na análise da aquisição de medicamentos é a composição etária da família. Nas famílias com idosos, a probabilidade de realizar gastos com mediamentos e muito elevada, sendo que nos domicílios com mais de três idosos essa chance fica próxima de 100%. Esse resultado mostra a importância deste grupo populacional no acesso a medicamentos, pois são os mais idosos que possuem maiores necessidades.

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Tabela 1– Proporção de famílias que tiveram gastos com saúde e medicamentos - Brasil 2008-2009

proporção das famílias com gasto

em saúde

proporção de familias com gastos com medicamentos

proporção das famílias com gasto

monetario

proporção dass famílias com gasto

não monetario Brasil 87.37 83.61 77.60 20.44 Quintos de renda 1 78.14 76.27 67.19 21.86 2 83.32 81.17 72.47 24.29 3 86.54 83.61 76.69 24.27 4 89.40 85.12 79.85 21.59 5 94.34 88.28 85.86 13.46 Caracteristicas do local Reg. Norte 83.66 81.26 77.20 11.52 Reg. Nordeste 86.12 83.65 77.35 22.28 Reg. Sudeste 88.59 84.01 77.02 22.69 Reg. Sul 89.42 85.37 80.89 19.37 Reg. Centro-oeste 83.72 79.68 75.55 11.23 Caracteristicas da família Cor do Chefe Não negro 89.96 85.81 80.63 19.12 Negro 84.72 81.36 74.51 21.78

Com Criança e sem Idoso

1 88.97 85.16 81.97 18.03

2 86.51 83.10 81.92 18.08

3 + 84.21 82.35 73.98 26.02

Com Idoso e sem criança

1 89.97 87.28 79.24 27.55

2+ 94.33 92.44 85.80 30.62

3+ 98.05 97.40 95.55 35.07

Forma de acesso a serviços de saúde Cobertura de plano de saúde

Ninguém com plano 82.77 80.83 73.21 23.18

Com menos metade da família com plano 95.14 90.51 85.31 24.78 Com mais da metade da família com plano 95.61 89.55 86.12 18.51

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Tabela 2– Proporção de famílias que tiveram gastos com saúde e medicamentos - Brasil 2002-2003

As tabelas 3 e 4 apresentam os gastos médios mensais com medicamentos das famílias: total, monetário e não monetário, para os períodos 2008-2009 e 2002-2003, respectivamente. Além disso, mostram-se as despesas totais e condicionadas para cada classificação adotada. No Brasil, a despesa média com medicamentos era de 75 reais em 2008-2009 enquanto a despesa média condicionada era de 88,34 reais. A análise por grupos de renda mostra que o gasto com medicamentos apresenta elasticidade-renda da demanda positiva com o gasto médio com medicamentos cerca de quatro vezes maior no ultimo quintil de renda em relação ao primeiro. Para o gasto não monetário, observa-se uma maior participação desobserva-se componente no total das aquisições de medicamentos entre os quintis mais pobres, cerca de 23% contra 18% no grupo de renda mais elevada. O número de crianças e idosos na família também altera o padrão de gastos com medicamentos com os menores gastos sendo observados entre as famílias com crianças. Esse padrão pode indicar tanto uma associação entre a taxa de fecundidade e o estrato socioeconômico, como a presença de economias de escala. Em famílias com presença de idosos, os gastos com medicamentos são mais altos. Uma explicação plausível é que, para doenças infantis, os remédios podem ser compartilhados, enquanto para os idosos, que apresentam doenças crônicas, o tratamento é continuo e não haveria espaço para compartilhamento dos medicamentos. A comparação do gasto médio com medicamentos condicionado em relação à média total revela que a maior parte dos

proporção das famílias com gasto em saúde proporção de familias com gastos com medicamentos proporção dass famílias com gasto monetario

proporção das famílias com gasto não monetario Brasil 85.82 81.23 75.23 19.87 Quintos de renda 1 76.07 74.26 63.53 25.37 2 81.12 78.31 70.15 24.74 3 84.8 82.11 74.72 24.59 4 87.7 82.94 78.19 18.53 5 93.44 84.82 82.85 11.23 Caracteristicas do local Reg. Norte 80.54 77.74 73.33 14.75 Reg. Nordeste 82.94 80.36 73.44 22.16 Reg. Sudeste 88.34 82.90 76.73 21.55 Reg. Sul 86.36 81.03 75.70 16.93 Reg. Centro-oeste 83.7 77.39 72.82 12.46 Caracteristicas da família Cor do Chefe Não negro 88.27 82.96 77.79 18.03 Negro 82.92 79.17 72.20 22.06

Com Criança e sem Idoso

1 87.09 82.19 76.76 17.60 2 84.66 81.48 76.62 19.58 3 + 84.08 81.88 71.12 27.59

Com Idoso e sem criança

1 87.57 83.91 75.34 25.52 2+ 93.17 91.74 85.60 29.49 3+ 96.35 96.35 93.84 40.27

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domicílios realizou algum gasto com medicamento. Para a média brasileira, essa diferença foi de R$13,00.

Entre os dois períodos estudados, o crescimento do gasto não monetário com medicamentos foi mais expressivo do que o monetário, posto que se elevou em 50%, enquanto o gasto monetário se elevou em 20%. Notadamente, observa-se que esse aumento do gasto não monetário não ocorreu de forma uniforme entre os quintis de renda. Enquanto em 2002-2003, não se verificavam diferenças muito importantes entre os grupos de renda, em 2008-2009, o gasto não monetário é maior entre os quintis mais altos de renda. A presença de idoso aumenta de forma significativa a importância dos gastos não monetários. Em 2008-2009, os gastos não monetários representavam 27% do total dos gastos com medicamentos em famílias com presença de um idoso. Em 2002-2003, essa parcela era de 19%. A informação de cobertura de plano de saúde para todos moradores só é disponível para 2008-2009. O gasto não monetário em termos absolutos foi praticamente constante em relação ao grau de cobertura das famílias, mas a participação deste gasto no somatório total dos gastos com medicamentos se altera de forma importante com a cobertura. Quanto maior o grau de cobertura do plano de saúde das famílias menor a participação dos gastos não monetários no total.

Tabela 3 - Gasto médio mensal das famílias com medicamentos segundo renda, características do local de domicilio, características da família . -Brasil 2008- 2009 (R$ de 2009)

Fonte: IBGE.POF 2008-2009. Elaboração própria. *Teste de média estatisticamente significativa no nível de 95 % para média

Brasil Despesa com medicamentos despesa média condicionada com medicamentos Despesa com medicamentos Monetários Despesa com medicamentos não monetários Brasil 75.42 88.34 59.61 15.81 Quintos de renda 1 32.91 * 42.37 * 25.33 * 7.59 * 2 46.60 * 56.47 * 34.57 * 12.04 * 3 59.20 * 69.42 * 44.79 * 14.41 * 4 74.17 * 85.21 * 58.01 * 16.16 * 5 131.64 * 145.56 * 107.84 * 23.81 * Caracteristicas do local Reg. Norte 47.88 * 57.88 * 43.72 * 4.16 * Reg. Nordeste 50.71 * 59.49 * 40.16 * 10.55 * Reg. Sudeste 90.62 * 105.78 * 68.88 * 21.73 * Reg. Sul 89.70 * 102.39 * 72.64 * 17.07 Reg. Centro-oeste 68.01 * 82.98 * 60.60 7.41 Caracteristicas da família Cor do Chefe Não Negro 95.21 * 108.59 * 75.66 * 19.54 Negro 55.21 * 66.50 * 43.21 * 12.00 *

Com Criança e sem Idoso

1 54.08 * 61.97 * 45.21 * 8.87 * 2 47.54 * 56.22 * 40.00 * 7.53 * 3 + 40.79 * 48.78 * 30.33 * 10.46 *

Com Idoso e sem criança

1 113.64 * 128.10 * 83.13 * 30.52 2 165.94 * 177.74 * 124.34 * 41.61 * 3+ 239.44 * 244.79 * 189.31 * 50.13

* * * *

Forma de acesso a serviços de saúde Cobertura de plano de saúde

Ninguém com plano 55.05 * 66.70 * 39.23 * 15.81 * Com menos metade da família com plano 90.20 * 98.18 * 71.85 * 18.35 Com mais da metade da família com plano 105.78 * 115.68 * 90.54 * 15.23 * Todos os moradores com plano 121.44 * 135.10 * 106.08 * 15.36 *

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- Tabela 4-Gasto médio mensal das famílias com medicamentos segundo renda, características do local

de domicilio, características da família . -Brasil 2002-2003 (R$ de 2009)

Fonte:IBGE.POF 2002-2003. Elaboração própria

*Teste de média estatisticamente significativa no nível de 95 % para média Brasil ** Preços atualizados para janeiro de 2009

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Resultados

4.1 Gastos com medicamentos Catastróficos

Esta seção apresenta as prevalências de gastos catastróficos para os períodos 2008-2009 e 2002-2003, estimadas com base nos indicadores GC1, GCxu e GCwg, considerando três pontos de cortes, 15%, 30% e 40%. A análise é realizada considerando a amostra total e desagregando segundo a posição socioeconômica, local de domicílio e composição familiar. Os valores computados dos gastos com medicamentos incluem os dispendios monetários e não monetários. Os três indicadores diferem segundo o conceito de subsistência alimentar. Como o gasto catastrófico é uma medida que considera o dispêndio relativo a capacidade de pagamento, as prevalências em GC podem ser determinada por um elevado gasto com medicamentos e também por reduzida capacidade de pagamento.

No Brasil, em 2008-2009, considerando o ponto de corte de 15%, a prevalência de GC variou de 7,5%, quando estimada pelo GC1, a 10,4%, quando estimada pelo GCxu. No

Despesa mèdia com medicamentos despesa média condicionada com medicamentos

Monetários não monetários

Brasil 60.06 71.40 49.93 10.12 Quintos de renda 1 29.13 * 38.44 * 19.98 * 9.15 * 2 40.72 * 50.49 * 29.00 * 11.73 3 50.11 * 59.65 * 37.75 * 12.36 4 58.50 * 68.23 * 49.82 8.69 * 5 98.75 * 110.18 * 89.56 * 9.19 Caracteristicas do local Reg. Norte 42.09 * 52.87 * 35.64 * 6.45 * Reg. Nordeste 44.22 * 53.91 * 36.35 * 7.86 * Reg. Sudeste 70.91 * 82.29 * 58.00 * 12.91 * Reg. Sul 62.05 * 73.37 * 53.68 * 8.37 * Reg. Centro-oeste 59.27 72.69 * 51.48 7.80 Caracteristicas da família Cor do Chefe Não Negro 71.72 * 83.35 * 61.26 * 10.46 * Negro 46.21 * 56.48 * 36.48 * 9.73 *

Com Criança e sem Idoso

1 46.71 * 82.94 * 39.16 * 7.55 *

2 47.02 * 54.80 * 38.78 * 8.25 *

3 + 39.22 * 56.30 * 28.03 * 11.19 *

Com Idoso e sem criança

1 84.22 * 97.58 * 68.36 * 15.86 *

2 129.31 * 139.64 * 107.17 * 22.14 *

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outro extremo, considerando o ponto de corte de 40%, as prevalências se reduzem substancialmente para 0,61% (GC1), 1,4% (GCwg), e 2,4% (GCxu). Comparando os três índices, a prevalência é sempre mais elevada quando estimada pelo GCxu, seguido do GCwg e GC1 (Tabela 5). Essa ordenação decorre das diferentes definições de capacidade de pagamento de tal forma que, no GCxu, a capacidade de pagamento é sempre menor do que a de GCwg e GC1. Entre os períodos estudados, 2002-2003 e 2008-2009, a prevalência de GC se reduz levemente, independente do indicador e ponto de corte. Considerando o ponto de corte de 15%, por exemplo, a redução observada para os indicadores GC1, GCwg, e GCxu foi de 0,08, 0,22 e 0,31 pontos percentuais, respectivamente, apontando para uma tendência, ainda que pequena, de redução da iniquidade no financiamento dos gastos com medicamentos.

Tabela 5- Prevalências de Gastos catastróficos para Brasil segundo indicadores GC1, GCXu, GCwg .2008-2009 e 2002-2003

Fonte: elaboração própria

A desagregação dos indicadores por quintil de renda mostra forte associação entre a chance de incorrer em GC e posição socioeconômica, conforme observado na tabela 6. As prevalências de GC decrescem de forma significativa com a renda familiar. Considerando o ponto de corte de 15% em 2008-2009, entre as famílias do primeiro quintil de renda, a prevalência de GC era próxima de 8,0% (GC1), 16,0% (GCw), e 20,0% (GCxu), enquanto no último quintil esse valor era menor, igual a 3,05% (GC1), 2,9% (GCw), e 2,8% (GCxu). Este resultado pode estar associado a baixa capacidade de pagamento e/ou alta necessidade em saúde. Entre os mais pobres, devido a menor capacidade de pagamento, quando ocorre um gasto com medicamento, mesmo pequeno, este pode produzir gastos catastróficos. Adicionalmente, indivíduos mais pobres, por serem mais vulneráveis, podem apresentar maior necessidade em saúde e, portanto, demandar mais medicamentos. Segundo a PNAD 2008, 67% das pessoas que reportaram saúde ruim, ganhavam até 1 salário mínimo. Este resultado realça o caráter iníquo desse fenômeno, pois são os mais pobres que mais sofrem financeiramente, quando necessitam realizar um tratamento médico com uso de medicamentos (PNAD,2008). Em famílias mais ricas, o financiamento dos gastos com medicamentos podem ser realizados por despoupança, venda ativos ou empréstimos. Entre os mais pobres, muitas vezes, a única opção é alterar o padrão de consumo para adquirir os remédios, reduzindo outros bens essenciais como habitação, transporte, alimentação. Esses ajustes no padrão de consumo podem ter consequências permanentes, por exemplo, em famílias que reduzem o gasto com alimentação, refletindo assim na nutrição das crianças (DIAZ & VALDÍVIA, 2013). Essa constatação pode ser ilustrada empiricamente. De acordo com os resultados da POF 2008-2009, 39,4% das famílias declararam estar consumindo alimentação insuficiente, sendo que, entre as famílias em gastos catastróficos, essa insatisfação aumenta consideravelmente, alcançando a proporção de 61%. Essa informação pode estar indicando uma relação entre GC e quantidade alimentar insuficiente, sugerindo que essas famílias estariam restringindo itens como alimentação.

Indicador

Pontos de corte 15.00 30.00 40.00 15.00 30.00 40.00 15.00 30.00 40.00

2008-2009 7.47 1.64 0.61 10.35 3.91 2.36 7.8 2.54 1.46

2002-2003 8.27 2.13 1.07 10.66 4.13 2.74 8.02 2.91 1.99

(12)

11

Um ponto que merece destaque é a variação da prevalência entre os períodos estudados, 2002-2003 e 2008-2009, por quintis de renda. Entre as famílias do primeiro quintil, a redução da prevalência de GC no período analisado foi expressiva, em contraposição ao aumento observado no outro extremo da distribuição. Uma explicação possível é o crescimento maior da renda entre os mais pobres, reduzindo o peso dos medicamentos no orçamento total da família.

Tabela 6. Prevalências de Gastos catastróficos classificados por quintil de renda por adulto-equivalente- Brasil 2008-2009 e 2002-2003

Fonte: elaboração própria

Na análise considerando a composição domiciliar por idade, observou-se uma relação crescente entre prevalência de GC e número de crianças ( Tabela 7). Nas famílias com maiores taxas de fecundidade, a necessidade de adquirir medicamentos tem efeitos mais perversos. Em famílias com 3 ou mais crianças, a prevalência de GC é o dobro daquela estimada para famílias com apenas um filho. Por exemplo, em 2008-2009, considerando o ponto de corte de 15% e o indicador GCxu, a prevalência entre as famílias com três filhos, ou mais, foi de 13,88%, contra 6,23% entre aquelas com apenas uma criança. A presença de pelo menos um idoso define uma prevalência mais elevada de GC, mesmo comparado a famílias que possuem 3 crianças ou mais. O menor valor encontrado é cerca do dobro da média nacional (GC1=14,88% com ponto de corte de 15%). Em 2008-2009, a prevalência de GC (medida pelo indicador GCxu e ponto de corte de 15%) era igual de 17% com as famílias com 1 idoso,. Entre as famílias com três crianças ou mais, esse percentual era menor, igual a 13,88%. É bastante plausível supor que o aumento da prevalência relacionado à presença de idosos seja consequência de uma maior necessidade de medicamentos por doenças crônicas, pressionando fortemente o orçamento familiar. Segundo dados da Pesquisa Nacional de Amostra e Domicílios-2008 (PNAD 2008), 79% das pessoas com mais de 65 anos relataram ter pelo menos uma doença crônica. Diaz et al (2012) mostram que, para o Brasil, em famílias com idosos, ocorre a maior probabilidade de GC. Em outros países da América Latina, como Argentina, Costa Rica e República Dominicana, a prevalência de GC também é mais elevada em famílias com idosos (KNAUL et al, 2012).

A análise entre dois pontos no tempo (2002-2003 e 2008-2009) revela redução na prevalência de GC para as famílias com idosos. Como se observa na tabela 5.5, considerando o ponto de corte de 15%, houve uma redução de 7 pontos percentuais na prevalência de GC, quando medida pelo GC1, e em torno de 12 pontos percentuais,

Indicador Pontos de corte 15.00 30.00 40.00 15.00 30.00 40.00 15.00 30.00 40.00 2008-2009 Quintis de renda 1 7.93 1.59 0.6 20.22 9.81 7.04 15.89 7.55 5.74 2 10.88 2.47 0.83 16.51 6.9 4.3 10.7 3.52 1.7 3 10.7 2.74 1.01 12.51 4.91 2.32 9.48 2.88 1.27 4 7.57 1.59 0.57 7.94 1.88 1.01 6.49 1.36 0.66 5 3.05 0.47 0.26 2.82 0.49 0.22 2.39 0.43 0.16 2002-2003 1 14.97 4.41 2.33 23.75 12.1 8.59 19.21 10.33 8.16 2 14.5 4.32 2.23 18.92 8.48 5.62 13.13 4.55 2.69 3 9.84 2.34 1.09 12 3.22 2 8.47 2.02 1.15 4 5.19 0.92 0.39 5.11 1.01 0.44 4.06 0.72 0.34 5 2.05 0.35 0.2 1.89 0.31 0.2 1.59 0.31 0.18 GC 1 GCxu GCwg

(13)

12

quando medida pelo GCxu, e 12,9 no GCw. Essa redução pode estar associada a um maior acesso aos programas de distribuição gratuita, ou subsidiada, de medicamentos, como, por exemplo, o Farmácia Popular. Segundo a PNS-2013, 30% das pessoas com mais de 60 anos adquiriram medicamentos na Farmácia Popular e em torno de 38% no serviço público.

Tabela 7 Prevalências de Gastos catastróficos classificados por composição familiar . Brasil 2008-2009 e 2002-2003

Fonte: elaboração própria

A presenca de cobertura privada de plano de saúde não protege completamente as famílias de incorrerem em GC, mas reduz de forma importante a sua intensidade. Famílias sem nenhuma cobertura privada de seguro saúde apresentaram maiores prevalências em GC, independentemente do indicador e ponto de corte. A distância entre as famílias com cobertura completa (todos os indivíduos no domicilio) de plano de saúde privado e as famílias sem cobertura chega a sete pontos percentuais, quando medida pelo indicador GCxu e ponto de corte de 15%. Como a aquisição de plano de saúde privado tem forte associação com a renda familiar, esse resultado pode ser também mais um reflexo da diferença de poder aquisitivo do que da protecao ofertada pelos planos de saude para acesso a medicamentos no Brasil. Entre as famílias com cobertura plena de seguro de saúde privado, cerca de 5% incorriam em GC. Embora essas famílias tenham maior acesso aos serviços médicos, muitas precisam dos programas de assistência farmacêutica gratuita, ou de custo compartilhado, para adquirir o medicamento. Inicialmente o programa Farmácia Popular tinha como público alvo inicial justamente as famílias que acessam os serviços privados e que apresentam dificuldades financeiras para arcar com o custo total dos medicamentos.

Indicador

Pontos de corte 15.00 30.00 40.00 15.00 30.00 40.00 15.00 30.00 40.00 2008-2009

Com Criança e sem Idoso

1 3.91 0.64 0.23 6.23 2.04 1.23 4.09 1.07 0.56 2 4.01 0.67 0.13 7.26 2.87 1.81 4.42 1.16 0.71 3 + 4.03 0.87 0.57 13.88 4.37 3.18 12.29 7.41 6.75

Com Idoso e sem criança

1 14.88 3.81 1.56 17.17 6.45 3.85 13.75 4.3 2.08 2 21 5.28 2.14 24.27 9.32 5.33 19.41 5.81 3.37 3+ 16.76 3.5 0.29 23.87 8.61 4.68 18.71 5.18 4.34 2002-2003

Com Criança e sem Idoso

1 5.39 1.32 0.71 7.42 2.93 2.05 4.8 1.67 1.03 2 7.12 1.16 0.45 9.97 3.29 2.19 6.55 1.63 0.97 3 + 9.6 2.91 1.6 14.28 6.29 4.14 14.43 8.7 7.36

Com Idoso e sem criança

1 16.56 4.9 2.78 18.17 7.25 4.43 14.15 4.48 2.98 2 20.6 5.23 2.79 23.88 9.06 5.87 18.42 5.79 2.81 3+ 24.31 7.07 4.43 36.21 10.09 7.47 31.67 7.62 5.66

(14)

13

Tabela 8 Prevalências de Gastos catastróficos classificados por grau de cobertura de seguro de saúde privado . Brasil 2008-2009

Fonte: elaboração própria

4.2 Os Gastos Não Monetários com medicamentos nos

Gastos Catastróficos -

O acesso a medicamentos sem a necessidade de desembolso direto monetário, além de garantir que o tratamento da saúde seja realizado, protege financeiramente as famílias no evento da doença evitando que incorram em GC. Os indicadores de GC foram construídos considerando todas as aquisições das famílias, inclusive não monetárias. Para entender como essas aquisições não monetárias com medicamentos reduzem a incidência de GC, foi construído um indicador de GC considerando apenas os gastos monetários das famílias, de tal forma que a diferença entre os dois indicadores (total e monetário) vai mostrar o peso do não monetário na redução do GC.

A tabela 9 mostra a proporção de famílias que deixaram de incorrer em GC devido ao acesso a medicamentos, sem o desembolso direto monetário para o período de 2008-2009. No ponto de corte de 15%, em todos indicadores, observam-se reduções de no mínimo três pontos percentuais, o que equivale aproximadamente a um milhão e quinhentas mil famílias. Em termos relativos, de acordo com cada indicador, a redução alcançou 40%. Nesse ponto de corte, as famílias pertencentes aos grupos socioeconômicos mais pobres tiveram reduções substanciais. Em pontos percentuais, no primeiro quintil de renda, a redução alcançou, no indicador GCxu acima de 5 p.p. No indicador GCxu uma amplitude de 4,4 revelando que o gasto não monetário foi mais significativo quanto a minimizar o impacto orçamentário entre os mais pobres. Entre as regiões, o Nordeste obteve a maior redução e o Norte a menor. Já nas famílias com chefes negros houve reduções, em pontos percentuais, maiores do que as encontradas nas de não negros. Segundo Boing et al (2013), os indivíduos de cor preta e parda tiveram maior acesso a medicamentos pelo setor público, confirmando os achados neste trabalho. A Pesquisa Nacional de Saúde de 2013 (PNS 2013) também mostrou que o acesso a medicamentos pelo setor público é mais elevado entre os negros. Estes resultados podem estar evidenciando uma maior dependência do setor público das famílias com chefes negros para o acesso a medicamentos, posto que estas possuem baixo poder de compra (Boing et al,2013).

Indicador

Pontos de corte 15.00 30.00 40.00 15.00 30.00 40.00 15.00 30.00 40.00

2008-2009

Ninguém com plano 8.86 2.07 0.8 13.02 5.33 3.32 9.67 3.47 2.09

Com menos metade da família com plano 6.77 1.64 0.67 7.92 2.24 0.83 6.9 1.75 0.77

Com mais da metade da família com plano 5.26 0.91 0.39 5.79 1.32 0.63 4.61 0.96 0.38

Todos os moradores com plano 5.1 0.86 0.26 5.47 1.33 0.6 4.39 0.82 0.33

(15)

14

Com relação à composição familiar, observa-se que quanto maior o número de crianças, maior a proporção de famílias que deixaram de incorrer em GC. Este resultado evidencia que, para estas famílias, o acesso a medicamentos, prioritariamente pelo setor público, estaria reduzindo a iniquidade no acesso observada nos resultados anteriormente descritos. Outro destaque é a alta proporção de famílias com idosos em que o acesso a medicamentos pela forma não monetária retirou dos GC. A tabela 9 mostra que, nas famílias com 2 idosos, a redução chegou a próximo de 8 p.p, maior proporção encontrada em toda a análise. Nota-se que, diferentemente das famílias com crianças, há uma redução do impacto dos gastos não monetários a partir do segundo idoso. É plausível supor que seja resultado de economias de escalas nessas famílias, reduzindo o impacto do não monetário.

(16)

15

Tabela 9- Número de famílias que deixaram de incorrer em GC pelo acesso a medicamentos da forma não monetária, em pontos percentuais 2008-2009

Fonte: elaboração própria

5

Discussão

Este artigo analisou o impacto do desembolso direto com medicamentos no orçamento familiar, ressaltando a importância das aquisições de remédios na forma não monetária. Para o Brasil, que possui parte significativa do seu financiamento por desembolso direto, este estudo é relevante, pois mostra o efeito do acesso aos gastos não monetários em medicamentos, na redução da iniquidade do financiamento. As aquisições de forma não monetária são aquelas em que não há necessidade de qualquer tipo de moeda, como doação ou troca. Este trabalho demostrou que no Brasil, em 2008-2009, 83,6% das famílias tiveram algum gasto com medicamentos, podendo ser um indicativo de acesso. As famílias que não tiveram esse acesso, ou seja, que não reportaram nenhum gasto com medicamento, pode estar relacionado a duas situações: a) a família não teve necessidade dentro do período de referência da pesquisa; b) a família teve necessidade, mas não teve

Indicador Pontos de corte 15 30 40 15 30 40 15,00 30,00 40,00 Brasil -2,99 -0,9 -0,4 -3,49 -1,58 -1,01 -2,91 -1,11 -0,64 Quintos de renda 1 -2,83 -0,64 -0,35 -5,41 -3,04 -2,27 -4,59 -2,3 -1,66 2 -4,04 -1,14 -0,43 -5,36 -2,35 -1,66 -3,84 -1,56 -0,83 3 -4,58 -1,5 -0,69 -4,67 -2,48 -1,24 -4,09 -1,45 -0,8 4 -3,27 -1,04 -0,4 -3,16 -1,04 -0,66 -2,75 -0,85 -0,46 5 -1,14 -0,33 -0,22 -1,01 -0,3 -0,16 -0,95 -0,3 -0,13 Caracteristicas do local Reg. Norte -0,74 -0,19 -0,1 -1,3 -0,58 -0,43 -1,05 -0,42 -0,22 Reg. Nordeste -3,21 -1,11 -0,58 -4,13 -2,19 -1,46 -3,38 -1,52 -0,89 Reg. Sudeste -3,29 -0,89 -0,37 -3,75 -1,55 -0,83 -3,14 -1,07 -0,6 Reg. Sul -3,16 -0,97 -0,45 -3,15 -1,27 -1,12 -2,89 -1,21 -0,82 Reg. Centro-oeste -2,09 -0,62 -0,19 -2,41 -1,22 -0,74 -1,61 -0,38 -0,12 Caracteristicas da família Cor do Chefe Não Negro -2,79 -0,82 -0,41 -3,11 -1,26 -0,85 -2,61 -0,93 -0,51 Negro -3,19 -0,96 -0,4 -3,87 -1,91 -1,16 -3,22 -1,31 -0,79

Com Criança e sem Idoso

1 -1,45 -0,31 -0,14 -1,91 -0,58 -0,33 -1,49 -0,45 -0,23

2 -1,64 -0,3 -0,06 -2,16 -0,87 -0,43 -1,52 -0,34 -0,17

3 + -2,65 -0,49 -0,53 -5,29 -2,1 -1,69 -4,57 -2,09 -1,93

Com Idoso e sem criança

1 -5,81 -2,05 -0,97 -6,04 -2,97 -1,95 -5,13 -2,14 -1,16

2 -7,61 -2,99 -1,47 -8,19 -3,83 -2,62 -7,25 -2,88 -2,03

3+ -4,97 0 0 -4,53 -0,25 -0,34 -4,05 -0,84 0

Forma de acesso a serviços de saúde Cobertura de plano de saúde

Ninguém com plano -3,7 -1,14 -0,52 -4,38 -2,19 -1,4 -3,61 -1,53 -0,91

Com menos metade da família com plano -2,52 -0,85 -0,46 -0,99 -0,56 -0,02 -3,73 -0,98 -0,47 Com mais da metade da família com plano -2,01 -0,39 -0,24 -2,24 -0,44 -0,25 -2,08 -0,36 -0,16

Todos os moradores com plano -1,58 -0,45 -0,2 -1,66 -0,43 -0,27 -1,4 -0,34 -0,18

(17)

16

acesso a medicamentos. A segunda situação pode estar revelando alguma iniquidade no acesso a medicamentos, visto que este estaria em desacordo com a necessidade.

O resultado principal do estudo mostrou uma proporção considerável de famílias que se encontravam em GC moderado, ou seja, tinham mais de 15% do seu orçamento destinado ao financiamento de medicamentos. De acordo com o indicador GCxu, em 2008-2009, 10,35% das famílias encontravam-se em GC, e, em 2002-2003, 10,66%. A queda observada das prevalências de gastos catastróficos, entre os períodos estudados, corrobora com a tendência de queda da desigualdade de renda e pobreza observada nos últimos anos, no Brasil. O estudo revelou uma forte associação entre renda e possibilidade de incorrer em gastos catastróficos. As famílias pertencentes aos primeiros quintis de renda apresentaram as maiores prevalências, o que realça o caráter iníquo desse fenômeno, pois são os mais pobres os que mais sofrem financeiramente quando necessitam realizar um tratamento médico com uso de medicamentos. No ponto de corte de 15% do indicador GCxu, a prevalência das famílias no primeiro quintil foi de 20,22% e no último, de 2,82%.

O estudo também apresentou que existia uma relação crescente entre prevalência de GC e número de crianças nas famílias. Além de crianças, a presença de idosos também determina, financeiramente, maiores pressões, sendo traduzidas nas maiores prevalências de GC encontradas nesse estudo. É bastante plausível supor que o aumento da prevalência, relacionado à presença de idosos, seja consequência de uma maior necessidade de medicamentos, condicionado pelas doenças crônicas e pressionando fortemente o orçamento familiar (PNAD 2008). Outra característica importante analisada é a presença de cobertura de seguro privado. Os resultados encontrados sugerem que ter cobertura privada de saúde não protege integralmente as famílias de incorrerem em GC, mas tende a reduzir sua intensidade. De acordo com dados encontrados nas análises de GC monetários, as famílias com nenhuma cobertura tiveram prevalência de 8,64% e famílias com cobertura plena de 3,81%, uma diferença de 56%. Esse resultado indica uma desigualdade nos gastos com medicamentos, visto que famílias que não possuem cobertura privada foram as que tiveram maiores pressões financeiras, para realizar o tratamento médico com medicamentos.

Nos estudos sobre gastos catastróficos para o Brasil, as estimativas revelam um problema de proteção financeira no acesso à saúde. A contribuição deste artigo foi mostrar que o acesso a medicamentos na forma não monetária reduz a prevalência de gastos catastróficos, ou seja, reduz o caráter iníquo desse fenômeno. Dessa forma, o acesso na forma não monetária, além de garantir que o tratamento da saúde do individuo seja mais eficaz, permite que orçamento familiar esteja mais equilibrado, a ponto de não ter necessidade de reduzir bens essenciais, como alimentação, por exemplo. No presente estudo, verificou-se uma redução da prevalência de GC na ordem de 3 pontos percentuais, o que significa que 1,5 milhões de famílias não sofreram graves pressões financeiras diante da necessidade de medicamentos. No entanto, há de ressaltar que há ainda uma parcela considerável de famílias incorrendo em GC.

Em suma, todos esses resultados mostram que o acesso a medicamentos por forma não monetária pode diminuir a iniquidade, ao garantir que o financiamento seja de acordo com a capacidade de pagamento. Os resultados também mostraram que grupos mais vulneráveis, como os mais pobres, estavam sendo favorecidos pelas políticas públicas, que é um garantidor de acesso a medicamentos, sem comprometer o orçamento familiar, e, por conseguinte, o bem-estar. No entanto, os dados também revelaram que uma

(18)

17

parcela significativa da população ainda se encontra em GC por gastos com medicamentos, o que mostra uma necessidade de ampliação dos programas de assistência farmacêutica tanto regionalmente como para grupos específicos, os mais pobres ou famílias com idosos.

O financiamento para aquisição de medicamentos pelo desembolso direto é um fato preponderante de produção de iniquidade. Para reduzi-la, uma proposta é que a proporção de desembolso direto seja substituída por uma ampliação do acesso na forma não monetária. Este trabalho demonstrou que o acesso a medicamentos na forma não monetária, através prioritariamente dos programas de assistência farmacêutica do SUS, possibilitou a redução, tanto de restrições drásticas no orçamento como do aumento da incidência de pobreza. No entanto, há ainda uma parcela da população que sofre financeiramente no momento da necessidade de medicamentos. Considerando que a população brasileira está envelhecendo e, portanto, está havendo uma transição epidemiológica, configurando uma maior incidência de doenças crônicas, a ampliação de políticas gratuitas de medicamentos ou com custos subsidiados, de acordo com a capacidade de pagamento, torna-se necessária a fim de promover uma melhor qualidade de vida para a população. Espera-se que os resultados desse trabalho possam subsidiar políticas públicas de assistência farmacêutica quanto à oferta de medicamentos para regiões e grupos populacionais, com menores acessos.

6

Referências

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(19)

18

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Referências

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