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O DICIONÁRIO ESCOLAR: O SIGNO TOPONÍMICO NO TEXTO LEXICOGRÁFICO PEDAGÓGICO DE LÍNGUA PORTUGUESA RESUMO

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O DICIONÁRIO ESCOLAR: O SIGNO TOPONÍMICO NO TEXTO

LEXICOGRÁFICO PEDAGÓGICO DE LÍNGUA PORTUGUESA

Pedro Antonio Gomes de Melo1

RESUMO

Este artigo propõe discutir o não-acolhimento dos topônimos nos textos lexicográficos de dicionários escolares monolíngues impressos em Língua Portuguesa, À luz das áreas interdisciplinares da Toponímia e da Metalexicografia, advogando a relevância destes signos toponímicos no corpus lexicográfico pedagógico com a justificativa de que estes vocábulos não são registros raros de uso da língua, tanto em sua modalidade oral como escrita, como também não são usados apenas com a função identificadora como elementos de referencialização espacial, mas como elemento pragmático e discursivo de organização social e espacial. Assim, deveriam ser inclusos como palavra-entrada de verbetes nestas obras lexicográficas.

Palavras-chave: linguística, metalexicografia, toponímia, dicionário escolar.

Introdução

A prática de nomear lugares evidencia os efeitos da sociedade sobre o linguístico e a maneira pela qual o mundo nele se representa, sobretudo em seu léxico toponímico2, refletindo e refratando o modo de ver a realidade exterior e a forma como seus sujeitos sociais organizam o meio que os circunda, em seu trato diário com a língua.

Sendo assim, é possível percebermos como os falantes se valem da língua em sua multimodalidade para representar o mundo a sua volta e como o contexto extralinguístico é um relevante fator para o processo de aquisição e para o processo de ensino/aprendizado do léxico.

Nesse sentido, refletirmos sobre os nomes de cidades brasileiras é retratar a história sociocultural da constituição lexical da língua portuguesa no país, na medida em que eles veiculam em seus conteúdos semânticos características geofísicas, ideológicas,

1 Mestre em Linguística pela Universidade Federal de Alagoas. Atualmente, é professor na Universidade

Estadual de Alagoas, campus III – Curso de Letras. E-mail: petru2007@ibest.com.br

2 Isquerdo (2012, p. 116) define léxico toponímico como o conjunto de “unidades lexicais investidas da

função de nome próprio de lugar que podem reunir formas do vocabulário comum, alçadas à categoria de topônimos; nomes próprios de pessoas, de lugares, de crenças, de entidades sobrenaturais que são ressemantizadas com o fim precípuo de nomear um lugar.

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políticas, culturais e históricas registradas numa memória toponímica, como também, mostrar os fundamentos do nome próprio em nossa civilização.

Com isso, queremos dizer que estes locativos3 (re)adquirim diferentes aspectos da realidade de um grupo social e são receptores e refratores de determinantes geofísicos e antropoculturais de representações semânticas intencionais que podem revelar traços socioculturais da identidade de um povo mediante as particularidades cristalizadas nos topônimos.

O pecúlio lexical toponímico corresponde a um corpus lexical vivo e funcional que se atualiza continuamente no léxico ao ser utilizado pelos falantes em todas as situações da fala, não se constitui em um rol passivo de nomes de lugares, apenas identificando acidentes físicos e/ou humanos. Mas, sobretudo, em um repertório aberto, quer dizer, capaz de se renovar seguindo tendências de ordem biossocial que podem condicionar e/ou influenciar o surgimento, a permanência e/ou a mudança de topônimos. Daí a importância dos dicionários escolares registrarem as inovações vocabulares toponímicas que vão surgindo no léxico toponímico e se incorporando à língua geral, como reflexo da evolução da sociedade contemporânea.

A partir do supradito, percebemos a relevância desse tipo de vocábulo na língua portuguesa, todavia, após uma observação preliminar dos dicionários de uso escolar: Michaelis (2014), Biderman (2012), Bechara (2011), Silveira Bueno (2007), Tufano (2005), Cegalla (2005), Mini-Aurélio (2001), não detectamos, em seu corpus lexicográfico, a presença de topônimos encabeçando verbetes nesses materiais pedagógicos atuais e considerados, pela crítica e professores, como excelentes em sua função pedagógica e, em alguns casos, avaliados e indicados pelo Programa Nacional do Livro Didático, mais precisamente pelo PNLD – Dicionário, do Ministério da Educação (MEC).

Desse modo, neste artigo, torna-se oportuno advogarmos a inserção do signo toponímico como palavra-entrada do enunciado-verbete no repertório dos dicionários escolares monolíngues impressos em língua portuguesa para o Ensino Básico, sobretudo em dicionários adotados em aulas do Ensino Médio, fundamentado teoricamente na interface entre as subáreas da Linguística: Toponímia e Metalexicografia Pedagógica.

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Cumpre ressaltarmos que pela carência de investigações lexicológicas/lexicográficas estatísticas no Português do Brasil que viabilizem à identificação de um vocabulário básico adequado ao público escolar, muitas decisões para confecção de dicionários ainda são tomadas com base na intuição, pois faltam pesquisas para subsidiá-las. Portanto, se faz mister que estudos sejam realizados sobre o fazer dicionarístico, reconhecendo o dicionário como objeto multifacetado, do qual resultam várias formas de examiná-lo sob diferentes abordagens.

Logo, quanto à pertinência e atualidade deste artigo, entendemos que se justifica à medida que poderá oferecer uma real contribuição para a especialidade em questão, visto que não registramos, em abundância, estudos sobre o léxico toponímico neste gênero de obra de referência4 como aqui proposto.

1. Uma interface entre a Toponímia e a Metalexicografia: um percurso teórico-metodológico

A Onomástica (do grego antigo ὀνομαστική, ato de nomear, dar nome) é uma ciência que integra a Linguística, mais particularmente às pesquisas lexicais, “caracterizando-se pelo estudo dos nomes próprios em geral e possui duas subáreas de investigação: a Toponímia e a Antroponímia” (MELO, 2014, p. 97-98). E mais, nas palavras de Dick (2007, p. 144), o estudo onomástico

é muito mais do que um mero fator auxiliar do agir e do viver individual ou coletivo; é indício de rumos tomados pelos falares ao longo dos períodos históricos, de comportamentos presentes no cotidiano e de atitudes morais ou operosas valorizadas pela população.

Neste artigo, utilizaremos como ponto de apoio teórico a Toponímia em interlocução com a área da Metalexicografia no contexto escolar.

A Toponímia consiste numa disciplina dinâmica e de caráter multidisciplinar, do ponto de vista linguístico, pode ser compreendida como um recorte do léxico de uma língua. Ela apresenta como eixo central de seus estudos o signo toponímico, investigando seus significados, sua etimologia, sua formação, sua variação e mudança, como também

4 Empregamos, neste artigo, referência no sentido de que o usuário consulta o dicionário, sem que seja

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os aspectos históricos, socioculturais e ambientais que motivaram a escolha e/ou criação de um nome a partir da intencionalidade que impulsiona o sujeito-nomeador.

Sob esse ponto de vista, Melo (2012, p. 66), explica-nos que os estudos toponímicos podem ser compreendidos “como um indicador cultural, uma vez que o modo como a língua retrata a visão de mundo de um povo evidencia a inter-relação que se estabelece entre língua, cultura e sociedade”. Logo, quando se nomeia cidades no Brasil de forma primitiva e/ou quando se muda estas denominações ao longo do tempo, diferentes fatores podem motivar, influenciar e até determinar a escolha e/ou a mudança do topônimo, tanto de ordem físico-ambiental quanto antropocultural.

Segundo Dick (1990, p. 19) apud Siqueira (2011, p. 194) a Toponímia “reflete a vivência do homem como membro do grupo que o recebe”. De fato, o ser humano, desde o princípio de sua vivência, procura erguer ou encontrar lugares onde possa fixar-se e dar início a aglomerados sociais (vilas, aldeias, cidades), nomeando as localidades onde firmam suas moradias.

Os estudos toponímicos compõem um caminho para o conhecimento do modo de vida das comunidades linguísticas que ocupam ou já ocuparam um determinado ambiente geográfico, histórico e cultural, no momento que um sujeito-nomeador determina um nome a um acidente humano ou físico revelam-se aí, tendências sociais, políticas, religiosas, culturais, entre outras.

Além disso, estas pesquisas viabilizam a compreensão de traços linguísticos e do homem denominador e, consequentemente, permite a percepção de vestígios das contribuições relativas aos aspectos do meio geofísico e sociocultural em que os topônimos foram gerados e suas transformações ao longo do tempo.

Daí a importância do dicionário escolar monolíngue impresso em língua portuguesa, enquanto veículo de armazenagem e recuperação dos fatos linguísticos e extralinguísticos, além de obra de referência para professores e aprendizes no contexto de sala de aula, registrar os topônimos que vão surgindo na Toponímia Brasileira, especialmente os nomes de cidades, e que se incorporam à língua geral.

Já no campo da Lexicografia, podemos destacar que a elaboração de dicionários sempre foi apreciada ao longo dos tempos. Embora a produção de obras de cunho lexicográfico date de muitos séculos, é apenas no século XX que se expandem teorizações sobre a produção dos dicionários.

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Trata-se de uma área do conhecimento linguístico que se “ocupa de todas questões relativas aos dicionários, tanto no que diz respeito a seu conteúdo científico [estudo do léxico], quanto à sua elaboração material e técnicas adotadas em sua realização” (DAPENA, 2004, p. 24).

Com efeito, podemos concebê-la em duas perspectivas:

(i) como técnica de montagem de dicionário, ocupa-se de critérios para seleção de nomenclaturas ou conjunto de entradas, de sistema definitórios, de estrutura de verbetes, de critérios para remissões, para registro de variantes etc; (ii) como teoria, procura estabelecer um conjunto de princípios que permitam descrever o léxico (total ou parcial) de uma língua, desenvolvendo uma metalinguagem para manipular e apresentar as informações pertinentes (BORBA, 2003, p. 15).

Sendo assim, a Lexicografia também consiste numa subárea da Linguística e divide-se em dois grupos – o primeiro, a Lexicografia Prática que se refere à produção dos dicionários e, o segundo a Lexicografia Teórica (doravante Metalexicografia) que tem por finalidade o exame do dicionário já pronto.

Sob esse olhar, torna-se possível, então, a realização do estudo do léxico toponímico por meio da interface entre a Toponímia e Metalexicografia Pedagógica com a finalidade de incluir nos dicionários escolares os topônimos.

Não há dúvida de que o dicionário – não apenas o escolar – possui um propósito pedagógico, no sentido de ser um material de referência.

Ainda que não haja um consenso entre alguns teóricos acerca do que deveria ser um dicionário escolar, recorreremos a Biderman (2001, p. 131-132) que o define como um dos tipos do chamado dicionário geral da língua, explicando que o aspecto diferenciador destes é “o total de entradas, ou verbetes reunidos”. Enquanto o dicionário-padrão apresenta geralmente mais de 50.000 palavras-entrada podendo ultrapassar o número de 70.000, o dicionário escolar apresenta, aproximadamente, 25.000 entradas, sendo trabalhos lexicográficos direcionados ao espaço educacional.

Desde do início desde século XXI, os dicionários escolares de língua portuguesa têm sido objeto de intenso interesse no Brasil. Eles consistem em um valioso instrumento de aquisição e ensino/aprendizagem do léxico.

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Ao abordar questões lexicográficas na confecção de dicionários escolares no Brasil, Gomes (2011, p. 153), afirma que

o século XXI inaugura uma etapa de pesquisa e labor lexicográfico inéditos na tradição brasileira; começa-se a delinear critérios e paradigmas para construção de propostas lexicográficas adequadas ao público e à realidade brasileiros, oferecendo como produto final dicionários, de fato, escolares e não meros recortes de obras mais amplas da língua portuguesa.

É nesse contexto que se encontra a Metalexicografia Pedagógica no território brasileiro, compreendida como a análise teórica que visa fornecer subsídios conceituais e técnicos para o fazer dicionarístico no âmbito escolar. Ela engloba os estudos descritivos, críticos e históricos, como também, a teoria da organização do trabalho lexicográfico, as reflexões sobre a metodologia de elaboração e sobre a classificação tipológica das obras lexicográficas direcionadas à sala de aula e ao processo de ensino/aprendizagem de uma Língua Materna ou de Língua Estrangeira.

Em suma, esse ramo da Lexicografia Teórica, no ambiente escolar, ganha cada vez mais espaço no Brasil e tem como finalidade o fazer crítico de obras lexicográficas escolares existentes com o intuito de gerar reflexão linguística e metodológica sobre o próprio objeto de estudo, o dicionário escolar, específico por seu público-alvo, configuração gráfica, discurso lexicográfico e finalidade pedagógica.

2. O signo toponímico e o texto lexicográfico pedagógico: uma proposta de inclusão do léxico toponímico como palavra-entrada de verbetes em dicionários escolares

O signo toponímico é o signo linguístico na função onomástica designativa de um espaço geográfico e/ou humano, estudá-lo é compreendê-lo em suas diversas potencialidades, identificando as razões que fazem com que o falante escolha um determinado nome, dentro de um eixo de possibilidades sêmicas para nomear um lugar, desvendando pontos de convergências entre léxico toponímico e mundo exterior.

Para a reflexão aqui apresentada, interessa-nos apenas os topônimos relativos a nomes de cidades brasileiras. Nesse contexto, é importante não confundirmos o nome do lugar com o local propriamente dito, ou seja, o signo toponímico não é a localidade em

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si, mas uma representação em termos linguísticos, trazendo em sua estrutura sêmica uma convergência de um complexo de fatores na construção de sentidos.

Estes signos toponímicos adquirem sentidos por meio de intersecções línguo-culturais que estão atreladas a um sistema de práticas e valores, crenças e interesses coligados aos sujeito-nomeadores e continuam firmados nos topônimos mesmo no momento que a motivação toponímica, presente no ato de nomear, não mais exista de fato.

Sendo assim, estes locativos fazem parte de um vocabulário sócio-histórico, no qual podemos reconhecer informações que se inter-relacionam com a Toponímia e o mundo biossocial no qual o signo toponímico está inserido.

Quanto aos processos de formação lexical, eles podem ser caracterizados como elemento específico simples, elemento específico composto e elemento composto híbrido conforme sua estrutura morfossintática.

O topônimo é formado por dois termos: o primeiro chamado de elemento genérico que é relativo à entidade geográfica que irá receber a denominação identificando-a e singularizando-a dentre outras semelhantes e o segundo termo é o elemento específico, que é o topônimo propriamente dito, é o que particulariza a noção espacial.

Quanto ao seu valor semântico, é interessante destacarmos, ainda, que o signo toponímico se contrapõe ao signo linguístico pela sua motivação, porém não há uma relação direta entre linguagem e mundo, e sim um trabalho social designando o mundo por um sistema simbólico cuja semântica vai se construindo situadamente. Assim, é por meio da língua que dados são fornecidos para que se possa recuperar simbolicamente a realidade sociocultural e histórico-geográfica de um povo na construção do significado linguístico.

Por conseguinte, os signos toponímicos são veículos de cultura, marcam influências, atitudes, tradições e falares. Eles atuam na construção de sentidos, em seus objetivos pragmáticos e discursivos, ressaltando a relação simbólica existente entre linguístico e seu contexto extralinguístico na ação de nomear lugares.

Daí percebemos, pois, o valor patrimonial destes locativos, conforme assinala Dick (1996, p. 337), o topônimo “vai deixando de ser apenas um instrumento de marcação ou de identificação de lugar para se transformar em um fundo de memória, de natureza documental tão valiosa e significativa como os textos escritos”. Portanto, deveriam estar

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inclusos no corpus lexicográfico dos dicionários escolares, sobretudo nos usados em sala de aula do Ensino Médio.

No aprendizado de uma língua e, conseguintemente na aquisição do léxico, o que se adquire não é pura e simplesmente um código, com suas regras especificamente linguísticas, mas todo um sistema de práticas e valores, crenças e interesses a ele associados.

Portanto, estas obras lexicográficas direcionadas para sala de aula devem ser compreendidas como um gênero textual específico de suma relevância na prática pedagógica. Nelas, encontramos não apenas informações linguísticas, mas também conhecimentos enciclopédicos, científicos e ideológicos que podem auxiliar na leitura e produção textual em diferentes práticas sociais.

Cumpre salientarmos que o atual PNLD/Dicionários, em sintonia com os instrumentos oficiais que regulam o ensino de língua no país, elegeu o Português do Brasil e a língua contemporânea como objetos por excelência dos dicionários escolares.

Ao tratar sobre o dicionário de uso escolar, Rangel (2011, p. 38) explica-nos que

um produto cultural como este é objeto de discussões em ao menos quatro esferas distintas: a acadêmica (no âmbito da lexicologia pedagógica, por exemplo), a prática didático-pedagógica, a da produção editorial (e/ou o da prática lexicográfica) e das políticas públicas voltadas para o livro didático e a leitura, em especial as do âmbito educacional.

Os dicionários monolíngues de uso escolar envolvem conhecimentos não apenas linguísticos, mas também conhecimentos extralinguísticos na construção de sentidos. No que diz respeito aos topônimos, Dick (1990, p. 365) afirmar que “identificar acidentes geográficos, significando, é, sem dúvida, a primeira qualidade que se infere do signo toponímico”. Assim, eles podem viabilizar a compreensão de possíveis relações da língua com elementos internos e externos ao sistema linguísticos.

Dentro desta perspectiva, o texto lexicográfico pedagógico adquiri sentidos que podem ser atribuídos aos nomes de lugares na produção e/ou recepção textual, assim como desvelar possíveis discursos vinculados a essas materialidades linguísticas e que não são levados a cabo em nossos dicionários escolares monolíngues impressos em língua portuguesa.

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Da mesma forma que os dicionários de língua geral, os de uso escolar, também dispõem de dois eixos básicos: macro e microestrutura. Assim sendo, a não-inclusão dos topônimos nestas obras lexicográficas causa um problema macro e microestrutural, como também quanti-qualitativo nos dicionários que, provavelmente, repercute nos aprendizes e professores em suas práticas de linguagem, no processo de ensino-aprendizagem de língua portuguesa e na produção e recepção de texto, visto que nessas obras de cunho pedagógico também não serão identificados os diversos saberes e dizeres que se materializam em signos toponímicos.

Vale apenas assinalarmos que a seleção macroestrutural da obra escolar deve buscar suprir as necessidades de aprendizagem de seu público alvo, incluindo palavras que façam parte das áreas do conhecimento com as quais ele tem contato nas diversas disciplinas escolares. Nesse sentido, os topônimos, em sua construção de sentido, se vinculam aos contextos tanto linguísticos como socioculturais. Dessa forma, dialoga com diferentes áreas do conhecimento.

Nessa perspectiva, Coroa (2011, p. 67) chama-nos atenção para o fato de como integrante de práticas discursivas, o dicionário “constitui-se em produtivo instrumento de fazer linguístico: é mais um dos elementos simbólicos de que cidadãos leitores e produtores de textos dispõem para construir, e reconstruir, redes de significações e constituir sujeitos”. Assim, torna-se de fundamental relevância um trabalho com dicionário escolar que possibilite desvendar de forma crítica que sentidos possíveis podem ser atribuídos a dados verbetes, podendo desvelar as dimensões discursivas que configuram e caracterizam os efeitos de sentidos no fazer dicionarístico pedagógico.

Na atividade docente de leitura e construção de sentidos, devemos ultrapassar o plano da forma, uma vez que a linguagem se pensada pelo viés discursivo, oportuna a apreensão de que a língua não serve unicamente como instrumento para comunicação; ela veicula, também, posições políticas e ideológicas na sociedade de classes da qual faz parte, provocando um deslocamento na rede de filiação dos sentidos, pois os sujeitos e os sentidos se deslocam, realizam suas próprias trajetórias.

Cumpre lembrarmos, ainda, que o nomeador é um sujeito situado sócio-historicamente inserido num tempo e num espaço determinado e os nomes por ele escolhidos para designar uma localidade remetem à intencionalidade do ser humano, em um determinado contexto línguo-cultural.

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Assim, os topônimos adquirem valores que transcendem o próprio ato de nomear lugares, pois podem designar várias iniciativas, como também, podem ser utilizados para propósitos muito diferentes e proceder de diversas intencionalidades.

Sob esse olhar, advogamos que topônimos não servem apenas para identificar lugares, ou seja, eles não teriam apenas uma função de referencialização espacial, mas uma representação intencional e objetiva na qual o nomeador, por meio da língua, faz conhecer a partir da atividade linguística uma demarcação expressiva de poder, de posse, de identidade de domínio geográfico de dados grupo(s), portanto são de suma relevância no léxico da língua e, consequentemente no contexto do dicionário escolar.

Além disso, pensando no quesito de frequência lexical, concordamos que não seja desejável que o dicionário escolar apresente registros raros de uso da língua, mas sim focar o que é comum, típico e frequente. Nesse sentido, os topônimos são usados na língua geral, estando presentes na vida diária quando se utiliza a língua em diferentes práticas sociais. Logo, deveriam ser alçados à categoria de palavra-entrada de verbetes nestas obras lexicográficas pedagógicas já que não são registros raros de uso da língua, tanto em sua modalidade oral como escrita, mas pelo contrário, são vocábulos comuns e frequentes. Visto que estas obras lexicográficas de caráter pedagógico consistem em um produto linguístico, mas também, um produto histórico, cultural, social, temporal, econômico e ideológico. E mais, seu repertório lexicográfico está condicionado ao momento histórico no qual elas são produzidas; à situação cultural em que elas são geradas; ao valor de autoridade que lhe são atribuídas; à vigência das informações nelas contidas; ao custo econômico que implica em sua elaboração e aquisição; e à representação do mundo que elas oferecem.

Considerações finais

Os aspectos abordados no presente artigo, envolvendo questões sobre o signo toponímico e o texto lexicográfico do dicionário escolar monolíngue impresso em língua portuguesa direcionado ao Ensino Básico. Permite-nos tecer algumas considerações finais.

Primeiramente, destacamos que os topônimos recebem influências internas e externas à língua que podem ser únicas ou combinadas. Essas motivações toponímicas

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etimológicas, semânticas, entre outras. Com efeito, os nomes de cidades brasileiras trazem informações diretas ou indiretas referentes à história do lugar ou e/ou do grupo social que constitui o local nomeado e seus significados resultam dos diferentes contextos sócio-históricos em que esses signos toponímicos surgem.

No entanto, a partir de uma análise comparativa entre os dicionários escolares monolíngues impressos em Português Michaelis (2014), Biderman (2012), Bechara (2011), Silveira Bueno (2007), Tufano (2005), Cegalla (2005), Mini-Aurélio (2001) atestamos o não-acolhimento de topônimos que designam cidades do Brasil como entradas de verbetes no corpus lexicográfico dessas ferramentas de consulta utilizadas pelos professores e aprendizes da Língua Portuguesa.

Sendo assim, em virtude desses materiais didáticos assumirem diversos papéis respondendo a questões linguísticas, mas também sociais, pragmáticas, culturais, ideológicas, didáticas, entre outras, eles devem ser vistos sob novas perspectivas.

Portanto, torna-se fundamental desvendarmos os efeitos de sentidos constituídos no léxico toponímico e registrá-los no corpus lexicográfico pedagógico e, consequentemente incluir o signo linguístico em função onomástica como palavra-entrada de enunciado-verbete nestas obras lexicográficas direcionadas à sala de aula de Língua Portuguesa no Ensino Básico, sobretudo no Ensino Médio.

Isso se torna possível, quando levamos em consideração a interface entre Toponímia e Metalexicografia Pedagógica.

É nesse cenário que devemos considerar a proposta de inserção dos topônimos que designam cidades brasileiras como entradas de verbetes no dicionário de uso escolar, visto que o verbete lexicográfico pedagógico deve se constituir de informações semânticas, pragmáticas, discursivas e ideológicas que se integram e se complementam na construção do sentido com todas as suas implicações.

Cumpre ressaltarmos ainda que, nessa reflexão, concordamos que não é desejável nos dicionários didáticos a presença de registros raros de uso da língua, mas sim unidades lexicais corriqueiras. Portanto, também seguindo o critério de frequência lexical, defendemos a inserção dos topônimos com a justificativa de que estes signos toponímicos não são registros raros de uso da língua, tanto em sua modalidade oral como escrita, pelo contrário, eles estão presentes na vida diária quando se usa a língua em diferentes práticas

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sociais. Logo, deveriam ser alçados à categoria de palavra-entrada de enunciado-verbetes nestas obras lexicográficas pedagógicas.

Por fim, quanto ao uso do dicionário escolar nas aulas de Língua Portuguesa no Ensino Básico, defendemos sua utilização como práticas pedagógicas discursivamente situadas, visto que a linguagem não se constitui somente de formas linguísticas ou de uma enunciação monológica isolada, mas sim, da interação verbal no fenômeno social. Ela deve, dessa forma, ser estudada e entendida dentro da esfera da relação social organizada. Com efeito, a prática pedagógica com dicionários de uso escolar e a construção de sentidos nesse processo não poderiam estar desvinculadas desse princípio, uma vez que o texto lexicográfico enquanto objeto simbólico produz efeitos de sentidos e estão investidos de significância para os sujeitos e pelos sujeitos.

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SCHOOL DICTIONARY: PLACE NAMES IN TEXT

LEXICOGRAPHICAL OF PORTUGUESE LANGUAGE

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This article aims to discuss the non-reception of place names in lexicographical texts of monolingual school dictionaries printed in Portuguese, in the light of interdisciplinary areas of Toponymy and Metalexicografia, advocating the relevance of these toponymic signs in the pedagogical lexicographical corpus on the grounds that these words do not They are rare records of the use of language, both oral and written mode, they are also not only used with the identifying function as spatial referencialização elements, but rather as pragmatic and discursive element of social and spatial organization. Thus should be included as entries of word-entry in these lexicographical works.

Keywords: linguistics, metalexicography, toponymy, school dictionary.

Recebido em 28/03/2015. Aprovado em 23/05/2015.

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