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Processo 05B796 Data do documento 7 de abril de 2005 Relator Custodio Montes

SUPREMO TRIBUNAL DE JUSTIÇA | CÍVEL

Acórdão

DESCRITORES

Arrendamento para comércio ou indústria > Falta de forma legal > Abuso de direito

SUMÁRIO

1 . Para haver abuso de direito não é necessária a consciência de que se excedem os limites impostos pela boa fé, pelos bons costumes ou pelo fim social ou económico desse direito porque a concepção adoptada de abuso de direito é a objectiva e não a subjectiva.

2. No abuso de direito protege-se a tutela da confiança, base de toda a convivência pacífica e da cooperação entre os homens.

3. O abuso de direito pode operar excepcionalmente no caso de negócios formais, impedindo a procedência da arguição de falta de forma do negócio. 4. É o caso do arrendamento comercial de um prédio urbano, firmado por escrito particular, que perdurou onze anos, tendo até a arrendatária chegado a oferecer a preferência à arrendatária em caso de projectada venda do prédio arrendado.

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Acordam no Supremo Tribunal de Justiça

A "A", L.da, intentou contra "B"- Comércio de Produtos Alimentares, L.da, Acção com processo comum, sob a forma ordinária

Pedindo:

. a declaração de nulidade, por vício de forma, do contrato de arrendamento comercial celebrado com a R., em 2.1.92;

. a condenação da R. a restituir à A o prédio que descreve, livre e devoluto de pessoas e bens;

. e pagar à A a quantia de 3.163,58€ pela ocupação do referido prédio durante os meses de Março a Setembro/03, acrescida da quantias que, à razão mensal de 451,94 € se vencerem desde essa data até à restituição do prédio.

A R. contestou e deduziu reconvenção. Houve resposta.

Efectuado julgamento, foi a acção julgada procedente e provada e declarado nulo o contrato de arrendamento por inobservância da forma legal, condenando-se a R. a restituir o arrendado livre e devoluto de pessoas e bens, bem como a pagar as quantias peticionadas pela A., autorizando-se a esta a proceder ao levantamento das quantias depositadas por aquela.

Inconformada, a R. interpôs recurso de apelação, que foi julgada procedente, revogando-se a sentença, na parte recorrida, e improcedente a acção, absolvendo-se a R. do pedido e mantendo-se o mais decidido na sentença. Foi agora a vez da A. interpor recurso de revista, terminando as suas alegações com as seguintes

Conclusões:

a. Na sequência da declaração de falência da empresa "A", Ldª, em 20/Dezembro/1996, procedeu-se à diligência de arrolamento dos bens que constituíam a A, em 18/Fevereiro/1997.

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da falida, com as confrontações, identificação e demais elementos descritos sob a verba nº 1 do respectivo documento.

c. O prédio em causa, encontrava-se arrendado à empresa "B", Ldª, mediante contrato de arrendamento comercial, celebrado por escrito particular, conforme foi referido na altura, em esclarecimento complementar e consta de fls. 3 do auto de apreensão de bens.

d. Tal contrato terá sido celebrado em 2/Janeiro/1992, nele figurando como senhoria a empresa "A", Ldª, ora A e como arrendatária, a empresa B -Comércio de Produtos Alimentares, Ldª, ora Ré.

e. Não obstante tratar-se de duas empresas jurídica e legalmente distintas, foi constatado que à data da feitura do contrato, eram constituídas pelos mesmos e únicos sócios e gerentes, marido e mulher.

f. Entretanto, em 4/Fevereiro/1998, a empresa "B", Ldª, instaurou contra a A e Liquidatário Judicial, uns autos de acção com processo sumário (separação e restituição de bens) que correram termos por apenso.

g. Do que resultou douto despacho de sustação da liquidação do activo, que se manteve até 4/Março/2002, em que conforme douta sentença, foi reconhecido a então reivindicante "B", Ldª, o direito de propriedade a uma das verbas, do total das quarenta e uma que reivindicava.

h. Durante o período de cinco anos que mediou, entre a data do despacho de sustação e decisão do litígio, o Liquidatário Judicial, procedeu à cobrança mensal do montante que a ré "B", Ldª aceitara pagar, no referido contrato, pela ocupação das instalações da falida, no âmbito dos seus devedores (artº 134º, 141º, 145º, e 146º do Cod. Fal.).

i. Mal se compreende que o douto Acórdão da Relação enquadre tais actos de administração no âmbito do instituto de abuso de direito, sob pena de tal interpretação violar a lei (artº 668º nº 1 al. c) artº 754º nº 2, do C. P. C.).

j. Ainda que o período de 10 anos referido no douto acórdão, - viciado por erro de cálculo - correspondesse à realidade, tal facto jamais poderia fundamentar a

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decisão proferida.

l. Nos termos da lei e da jurisprudência daquele Superior Tribunal da Relação: .... " Só existe abuso, se o direito for exercido em termos clamorosamente ofensivos da justiça com manifesto excesso dos limites impostos pela boa fé, pelos bons costumes ou pelo fim económico e social". (Ac. de 8/Novº/1983, Col. Jurª - 1983 - 5º - 52).

m. A cláusula 7ª inserta no referido contrato de arrendamento, que não foi cumprida, por vontade ou acordo da empresa senhoria e da empresa arrendatária por força da declaração de falência, não vinculava a A contra o entendimento daquele douto Tribunal da Relação;

n. Sendo que igualmente o liquidatário não estava obrigado a celebrar a escritura pública, por força da lei e ainda da alteração do R.A.U. :

"A convenção das partes não pode afastar a exigência da forma estabelecida por lei (Ac. RC., de 15/Outuº/1991 - B. M. J. 410º - 892)."

0. A competência deste Venerando Supremo Tribunal de Justiça, para análise e decisão do presente recurso, emana da lei e da jurisprudência (artº 754º do C. P. C. e Ac. S. T. J., de 21/Setº/93 - C- J. - 3º - 19).

Termina, pedindo a revogação do Acórdão recorrido e a manutenção da douta sentença da 1ª Instância.

Contra alegou a R., concluindo pela manutenção do Acórdão recorrido. Corridos os vistos, cumpre decidir.

Fundamentação

Matéria de facto dada como provada:

1. No âmbito dos autos de Falência que, sob impulso de "C - Veículos Industriais e Comerciais, Lda.", correm termos neste Tribunal Judicial de Condeixa-a-Nova com o número 146/1996, foi declarada, falida por sentença de 20.12.96, "A", Lda.", com sede em Quinta Nova, Condeixa-a-velha, área desta comarca.

2. No auto de apreensão lavrado no Apenso C do processo referido em A) (Liquidação do Activo) consta um prédio urbano destinado a armazém, com

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cinco divisões assoalhadas, três casas de banho, uma arrecadação e garagem, com a área coberta de 1.087m2 e descoberta de 1.913 m2, a confrontar do norte com D, do sul com caminho, de nascente com E e outro, e de poente com F, inscrito na matriz predial urbana da freguesia de Condeixa-a-Velha sob o artigo 1.546 e descrito na Conservatória do Registo Predial de Condeixa-a-Nova com o número 00109/300486.

3. No prédio referido em B) funcionava a sede da falida "A", Lda.".

4. Por escrito datado de 2 de Janeiro de 1992, denominado "Contrato de Arrendamento Comercial", cuja cópia se encontra a fls. 9 e seguintes, a falida "A", Lda." declarou dar de arrendamento à ré o prédio referido em B) contra o pagamento da renda mensal de 100.000$00, acrescida da quantia correspondente a 25% do resultado líquido apurado pela arrendatária referente ao ano anterior ao do início do contrato).

5. O acordo referido em D) foi celebrado pelo prazo de um ano, com início em 1 de Janeiro de 1992 e termo em 31 de Dezembro de 1992, considerando-se renovado por iguais e sucessivos períodos de um ano enquanto não for denunciado por qualquer das partes intervenientes, com a antecedência mínima de trinta dias mediante carta registada com aviso de recepção.

6. No acordo referido em D) ficou ainda estipulado que a marcação da escritura definitiva ficaria a cargo da senhoria, a qual não poderia exceder a data de 31 de Dezembro de 1995, ficando, contudo e caso aquela não fosse realizada nesse prazo, a arrendatária com direito de notificar a senhoria para efectivação da escritura, indicando-lhe o dia, hora e cartório notarial, nos mesmos termos acordados para a denúncia.

7. À data da declaração de falência, a ré, que ocupava o prédio referido em B), pagava a "A", Lda.", por força do acordo referido em D), a quantia líquida de 85.000$00 mensais, já deduzida de 15% de I.R.C..

8. Em Fevereiro de 2003, a ré pagava, no âmbito do acordo referido em D), a quantia de €:451,91 (90.606$00), igualmente deduzidos de I.R.C..

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9. Desde Março de 2003 a ré deixou de pagar directamente à autora qualquer quantia pela ocupação do espaço referido em B), não lhe tendo pago directamente qualquer montante relativo aos meses de Abril, Maio, Junho, Julho, Agosto e Setembro de 2003.

10. Em 7 de Julho de 2003, a ré procedeu ao depósito da quantia de € 2.259,70, a título de rendas relativas aos meses de Março, Abril, Maio, Junho e Julho de 2003. Em 8 de Agosto de 2003, procedeu ao depósito da quantia de € 451,94, a título de renda relativa ao mês de Agosto. Em 8 de Outubro de 2003, procedeu ao depósito da quantia de € 451,94, a título de renda relativa ao mês de Outubro.

11. Por carta datada de 3 de Maio de 2003, o representante da autora comunicou à ré, para além do mais, que "A. "B", Lda. é arrendatária do referido armazém pelo que, nos termos da lei, terá preferência na compra, pela melhor oferta (...) A proposta em causa pressupõe a resolução, não só da venda do imóvel mas também da acção de reivindicação, com a desistência do recurso interposto para o Tribunal da Relação(...)".

12. Por carta datada de 27 de Fevereiro de 2003, a ré dirigiu-se ao representante da autora dizendo, para além do mais, "vem o ora arrendatária notificar a A. de "A", Lda., representada por V. Exa. como liquidatário, para realizar a escritura pública de contrato de arrendamento comercial celebrado em 2 de Janeiro de 1992. Para o efeito, desde já se indica que a realização da escritura marcada para o Cartório Notarial de Penela a realizar no próximo dia 4 de Abril pelas 16:horas

13. A escritura de arrendamento foi marcada pela ré na data hora e local referidos em L), e o representante da autora não compareceu.

O direito

Apesar de a recorrente ter formulado 14 conclusões, verdadeiramente, apenas suscita a seguinte questão: entende ela que a matéria de facto não permite se conclua pelo abuso de direito, obstaculizando a nulidade que a falta de forma

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legal do contrato determina.

Contudo, há que ter em conta que a matéria de facto a considerar é a que acima se deixou descrita e não também a que a recorrente insere nas suas alegações e conclusões, porque os recursos visam sindicar as decisões impugnadas e não criar decisões sobre matéria nova. (1)

Quer a sentença quer o Acórdão sob recurso discorrem acertadamente sobre os princípios teóricos que o caso demanda.

Dissentem, porém, quanto à solução dada ao litígio: enquanto a sentença da 1.ª instância declara a nulidade do contrato de arrendamento comercial por falta de forma, o Acórdão da Relação torna-a inoperante pela procedência do alegado abuso de direito.

Quanto à fundamentação teórica basta remeter para a decisão impugnada, limitando-nos aqui a recordar que o abuso de direito vem definido no art. 334.º do CC que dispõe que "é ilegítimo o exercício de um direito, quando o titular exceda manifestamente os limites impostos pela boa fé, pelos bons costumes ou pelo fim social ou económico desse direito."

Para haver abuso de direito não é necessária a consciência de que se excedem tais limites porque a concepção adoptada de abuso de direito é a objectiva e não a subjectiva.

O seu sentido é-nos explicado por P. L. e A. Varela (2) ao referirem que o normativo apenas permite aos tribunais fiscalizar a moralidade dos actos praticados no exercício de direitos ou as suas conformidades com as razões sociais ou económicas que os legitimam "se houver manifesto abuso", citando, a propósito, Manuel de Andrade que se refere aos direitos "exercidos em termos clamorosamente ofensivos da justiça".

Como diz Cunha e Sá (3) "o sujeito de direito deve actuar como pessoa de bem, honestamente e com lealdade" ou (4) "as pessoas devem ter um certo comportamento honesto, correcto, leal, nomeadamente no exercício dos direitos e deveres, não defraudando a legítima confiança ou expectativa nos

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outros."

É a tutela da "confiança", pois, "poder confiar é uma condição básica de toda a convivência pacífica e da cooperação entre os homens". (5)

"....A concepção geral do abuso de direito postula a existência de limites ...à actuação jurídica individual. Tais limites advêm de conceitos particulares como os de função, de bons costumes e de boa fé." (6)

E, pisados tais limites, nenhuma relutância deve haver em aplicar o abuso de direito, verificados os seus pressupostos, porque "o abuso de direito perdeu já o dramatismo e a natureza excepcional que o rodeara, vindo a tornar-se hoje num instrumento muito solicitado e usado pelos tribunais na realização da justiça." (7)

E na tipologia do abuso de direito sobressai o venire contra factum proprium, que, como se sabe, "se traduz, de um modo geral, na pretensão de alguém extinguir certa relação subjectiva, recorrendo ao direito de anular, resolver, revogar ou denunciar o negócio que lhe serviu de fonte, depois de fazer ver à parte contrária (...) que não exercia tal direito". (8)

Baptista Machado ( 9 ) aponta como pressupostos do venire contra factum proprium

a) a verificação de uma situação objectiva de confiança: a conduta de alguém que possa ser entendida como vinculante em relação a uma situação futura;" (10)

b) investimento na confiança e irreversibilidade desse "investimento": a outra parte, com base na situação criada, organiza planos de vida de que lhe surgirão danos se a sua confiança legítima lhe vier a ser frustrada;

c) Boa fé da contraparte que confiou: nos casos de divergência entre a intenção aparente do responsável pela confiança e a sua intenção real, a contraparte só é merecedora de protecção jurídica se estiver de boa fé "(por desconhecer aquela divergência) e tenha agido com cuidado e precauções usuais ao tráfico jurídico". (11)

(9)

No caso dos autos, foi com base nestes conceitos que se considerou operante o abuso de direito para neutralizar o direito abusivo à nulidade do contrato de arrendamento comercial, firmado apenas por escrito particular.

Mas, neste caso, quando a anulação deriva da invocação da inobservância de forma prevista para o negócio em causa, Meneses Cordeiro (12) chama-lhe "inalegabilidades formais".

Este A. afirma que "a figura das inalegabilidades não tem margem directa de concretização" porque "postularia a possibilidade de redução teleológica das normas formais, o que não é tecnicamente possível", referindo que a actuação contra a boa fé apenas obrigaria a indemnizar, admitindo que, no limite, "a indemnização" consistisse na "obrigação de convalidar o negócio". (13)

Reconhece, no entanto, este A. que a jurisprudência portuguesa, "remando contra a corrente", tem vindo "a admitir o bloqueio directo, ex bona fide, de normas formais".

De facto, no caso das nulidade formais a questão é delicada, porque pela relevância do abuso de direito, impede-se a arguição do vício de falta de forma, atribuindo eficácia plena a um negócio que a lei imperativamente fulmina de nulo. (14)

Contudo, como o próprio A. refere, a nossa jurisprudência vem entendendo ser operante a invocação do abuso de direito nos negócios formais não submetidos à forma prevista na lei, embora em casos excepcionais, a analisar caso a caso. (15)

E é, fundamentalmente, a questão de subsunção jurídica que importa aqui tratar, por ser essa a discordância da recorrente quanto ao Acórdão que impugna.

Ora, vem demonstrado que o arrendamento foi celebrado por escrito em documento denominado "Contrato de Arrendamento Comercial", pelo prazo de um ano, com início em 1.1.92 e termo em 31.12.92, renovável por iguais períodos.

(10)

Ficou estipulado ainda que a marcação da escritura definitiva ficaria a cargo da senhoria, a qual não poderia exceder a data de 31 de Dezembro de 1995, ficando, contudo, e caso aquela não fosse realizada nesse prazo, a arrendatária com direito de notificar a senhoria para efectivação da escritura, indicando-lhe o dia, hora e cartório notarial, nos mesmos termos acordados para a denúncia. A A. foi declarada falida por sentença de 20.12.96 e, a essa data, a R. ocupava o prédio referido em B), pagava a "A", Lda.", por força do referido acordo, quantia líquida de 85.000$00 mensais e em Fevereiro/03 pagava, no âmbito do mesmo acordo, a quantia de € 451,91 (90.606$00).

Desde Março/03 deixou de pagar à A. qualquer quantia pela ocupação do armazém, mas em 7.7.03 depositou a quantia de € 2.259,70, a título de rendas relativas aos meses de Março, Abril, Maio, Junho e Julho de 2003. Em 8 de Agosto de 2003, procedeu ao depósito da quantia de € 451,94, a título de renda relativa ao mês de Agosto. Em 8 de Outubro de 2003, procedeu ao depósito da quantia de € 451,94, a título de renda relativa ao mês de Outubro.

Em 3 de Maio de 2003, o representante da autora comunicou por carta à ré, para além do mais, que "A. "B", Lda. é arrendatária do referido armazém pelo que, nos termos da lei, terá preferência na compra, pela melhor oferta (...)". A R., por seu turno, por carta datada de 27 de Fevereiro de 2003, dirigiu-se ao representante da autora dizendo, para além do mais, "vem o ora arrendatária notificar a A. de "A", Lda., representada por V. Exa. como liquidatário, para realizar a escritura pública de contrato de arrendamento comercial celebrado em 2 de Janeiro de 1992. Para o efeito, desde já se indica que a realização da escritura marcada para o Cartório Notarial de Penela a realizar no próximo dia 4 de Abril pelas 16 horas

A escritura de arrendamento foi marcada pela ré na data, hora e local referidos em L), e o representante da autora não compareceu.

Da matéria de facto provada resulta, sem qualquer dúvida, que foi vontade das

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comprometendo-se a A. a marcar a escritura até 31.12.95 e, depois, podia a R. notificar a senhoria para comparecer no notário para efectivação da mesma. A A. não cumpriu tal compromisso e a R., depois de lhe ser deferido contratualmente tal prerrogativa, também o não fez até á declaração da falência da A.

Embora a culpa na não realização das escritura se divida entre as partes, não pode ela ser considerada de forma igual porque a A. permaneceu cerca de três anos sem cumprir o prometido e a R. apenas um ano, tendo, depois, sobrevindo a declaração da falência da A.

E, após esta ser declarada, a R. continuou a pagar a renda à A até Fevereiro/03 sem quaisquer incidentes, o que apenas começou a acontecer após essa data, altura em que a R. deixou de pagar a renda, procedendo depois ao seu depósito.

Mas mesmo após essa altura, a A. reconheceu a R. como sua arrendatária, oferecendo-lhe até a preferência na compra, pela melhor oferta.

Há, pois, um largo lapso de tempo em que as partes reconhecem mutuamente as suas qualidades de senhoria e arrendatária, tendo vindo a R a pagar a renda desde 1.1.92 até Fevereiro/03 sem quaisquer incidentes.

Acresce que, embora a lei aplicável seja a da altura da efectivação do contrato em que o art. 7.º do RAU exigia escritura pública para os arrendamentos comerciais, não deixa de poder considerar-se que já no domínio da lei nova (16) o contrato se renovou com o mero escrito que deu origem ao contrato e que, nessa altura, era o bastante para efectuar contratos da mesma natureza.

Esta conduta da A. tem que ser entendida como o reconhecimento da aceitação da situação do arrendamento, levando qualquer declaratário normal a firmar a convicção de que a A. nunca viria invocar a nulidade do contrato por falta de forma.

Neste circunstancialismo, parece-nos correcto afirmar, como se fez no Acórdão sob recurso, que o comportamento da A., no decurso da vigência do contrato, é,

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de todo, "contraditório com o exercício da acção agora em análise e violador da legítima confiança ou expectativa da R., já que o longo período que durou a situação foi de molde a, juridicamente, criar nela um estado de confiança merecedor de tutela".

Resta acrescentar que a referida alteração legislativa que veio dispensar a escritura pública, adaptando o direito, sempre mais lento, à evolução, sempre mais rápida, do pulsar da vida económica, esbate, de alguma forma, aquela segurança e certeza do direito que o formalismo legal visa alcançar.

Assim, entendemos ser de manter o Acórdão sob recurso. Decisão

Pelo exposto, nega-se a revista, confirmando-se o Acórdão sob recurso. Custas pela recorrente.

Lisboa, 7 de Abril de 2005 Custódio Montes,

Neves Ribeiro, Araújo Barros.

---(1) Arts. 684º, 2 e 3 e 690º, 1, ambos do CPC e, entre outros, os Acs. da RLx de 7.10.93, CJ XVIII, IV (2ª coluna); de 24.5.90, CJ XV, III, 126 (1ª coluna); STJ de 6.1.88, BMJ 373, 462; de 12.12.95, BMJ 452, 392 (ao fundo); Teixeira de Sousa, Estudos Sobre o Novo Processo Civil, pág. 395.

(2) CC Anot., Vol. I, 2.ª ed. Pág. 277. (3) Abuso de Direito, pág. 171.

(4) Como refere Coutinho de Abreu, em Do Abuso de Direito, 1983, pág. 55. (5) Batista Machado, Obra Dispersa, Vol. I, pág. 352.

(6)Passagem do Ac. do STJ de 25.5.99, CJ/STJ AnoVII, T2, pág. 117.

(7) Passagem do Ac. do STJ de 25.5.99, CJ/STJ Ano VII, T2, pág. 118 (1ª coluna) (8) A. Varela, Centros Comerciais, pág. 90.

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(10) ...o agente fica adstrito a não contradizer o que primeiro fez e disse" -Meneses Cordeiro, Tratado de Direito Civil Português, I, Parte Geral, Tomo I, pág. 200.

(11) Ob. cit., pág. 418.

(12) Tratado de Direito Civil português, vol. I, pág. 204. (13) Ob. e loc. cits.

(14) Vaz Serra., BMJ 85, 305 entende não ser defensável a invocação do abuso de direito nos negócios formais por as normas legais respeitantes à forma se "destinarem a um fim de segurança ou de certeza jurídicas inconciliáveis com a eficácia da declaração não formalizada" - Vaz Serra., BMJ 85, 305.

(15) Ver, a título meramente exemplificativo, os Acs. deste STJ de 28.11.02, de 30.10.03, in dgsi.pt.jstj; de 17.12.94, de 20.3.73, in, respectivamente, BMJ 242, 257 e 225, 196.

(16) Art. 7 do RAU, na redacção do DL 64-A/00, de 22.4.

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