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Wolfgang Iser. O Jogo Do Texto

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Academic year: 2021

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Texto

(1)

I11

0

JOGO

D 0

TEXT0

E

sensato pressupor que o autor, o texto e o leitor siio intimamente in- terconectados em uma rela@o a ser concebida como um processo em anda- mento que produz algo que antes inexistia.

Esta

concepgo do texto esti em conflito direto com a no#o tradicional de representa@o, h medida que a mi- mesis envolve a referencia a uma "realidade" p&-dada, que se pretende estar re- presentada. No sentido aristotdlico, a fungo

da

representaGo C dupla: tornar perceptiveis as formas constitutivas da nanuaa; completar o que a natureza deixara incompleto. Em nenhurn dos casos, a mimesis, embora de importan- cia fündarnental, nso se pode restringir h mera imita@o do que 6, pois OS pro-

cessos de elucid@o e de complementa#o exigem uma atividade pedomativa - se as ausencias aparentes hiio de se transformar em presenp. Desde o advento do mundo modern0

h i

urna tendencia clara em privilegiar-se o aspecto per- formativ0 da rela#o autor-texto-leitor, pelo qual o prk-dado ngo C rnais visto como um objeto de representeo, r m s sim como o material a partir do qual algo novo

e

modelado.

0

novo produto, entretanto, niio C predeterminado pe- los trasos, h @ e s e estruturas do material refendo e contido no texto.

Raz6es historicas explicam a mudaqa em foco. Sistemas fechados, co- mo o cosmos do pensarnento grego ou

da

imagem de mundo medieval, prio- rizavarn a representago como mimesis por considerarem que todo o existen- te - mesmo que se esquivasse

h

percepgo - dweria ser traduzido em algo tangivel. Quando, no entanto, o sistema fechado -

e

perfürado e substinildo por um sistema aberto, o componente mirnetico

da

representa#o declina e o aspecto performativo assurne o primeiro plano.

0

processo entao niio mais

(2)

implica vir aqudm das aparencias Para captar um mundo inteligivel, no sen- tido platbnico, mas se converte em um "modo de criaGo de mundo"

("way

of worId-makoig). Se aquilo que o texto realiza tivesse de ser equiparado com a feitura de mundo, surgiria a quest50 se ainda se poderia conunuar a fdar em <<

representaGo".

0

conceito podia ser mantido apenas se OS proprios "modos

de criago de mundo" se tornassem o objeto referencial Para a representagiio. Neste caso, o componente performativo teria de ser concebido como o prd- dado do ato performativo. Independente de se isso poderia ou n5o ser consi- derado tautologico, permanece o fato de que provocaria uma quantidade de problemas de que este ensaio niio pretende tratar.

Ha,

contudo, uma inferen- cia altamente relevante para a minha discuss~o: o que tem sido chamado o "fim da representagiio" pode, Anal de contas, ser menos a descrigzo do es- tado historico das artes do que a articulagiio de duvidas quanto & habilidade da representacao como conceito capaz de capturar o que, de fato, sucede na arte ou na literatura.

Isso n5o equivde a negar que a relaGo autor-texto-leitor contdm um am- plo n h e r o de elementos extratexniais que entram no processo, mas sao ape- nas componentes materiais do que sucede no texto e n5o representados um a um. Parece portanto justo dizer que a representacao, no sentido em que vie- mos a compreende-la, niio pode abarcar a operaeo performativa do texto co- mo uma forma de evento. Com efeito, d importante notar que niio ha teorias definidas

da

representaeo que de fato fixem as condi@es necesshias para a produGo da mimesis.

Entre as raras exce@es esta a iddia de representago de Gombrich: ele fragmentou a nogo recebida em fases claramente distintas de um processo, que comep com a interaeo entre o pintor e OS esquemas herdados, seguido

pela correeo destes na pintura e culmina com a atividade de deciframento pe-

10

espectador, cuja leitura dos esquemas corrigidos leva o objeto da representa-

ga.

a

Cf. Michel Foucault, The Order of thingr. An arcaeology of tbe human scimces, Londres, Tavistock, 1970, p. 2 17-49 e Jacques Derrida, Writigandd.jbence, trad. de Alan Bass, Londres, Routledge and Kegan Paul, 1978, especialmente o ensaio sobre Artaud. Para uma explorac50 mi-

nuciosa da questao, cf. Gabrieile Schwab, Szmuel Beckett Endspiel mit der Su6jetivität: Entwuf einer Psychoästhetik des modernen Theaters, Stuttgart, J. B. Meder, 198 1, p. 14-34.

E. H. Gombrich, Art and iIImion: A stzldy in the pychology ofpictod npresent;ation, Londres, Phaidon Press, 1962, especialmente p. 154-244.

(3)

0

presente ensaio k uma tentativa de dispor o conceito de jogo sobre a representagao, enquanto conceito capaz de cobrir todas as operaqoes levadas a cabo no processo textual. Ele apresenta duas vantagens heuristicas: 1. o jo- go niio se ocupa do que poderia significar; 2. o jogo niio tem de retratar nada fora de si pr6prio. Ele permite que a inter-relagiio autor-texto-leitor seja con- cebida como uma d i n h i c a que conduz a um resultado final.

Os autores jogarn com OS leitores e o texto k o carnpo do jogo.

0

pro-

prio texto 6 o resultado de um ato intencional pelo qual um autor se refere e in- tervkm em um mundo existente, mas, conquanto o ato seja intencional, visa a algo que ainda n50 k acessivel h consci2ncia. Assim o texto k composto por um mundo que ainda ha de ser identificado e que k esbofado de modo a incitar o leitor a imagina-10 e, por fim, a interpreta-lo. Essa dupla operago de imaginar e interpretar faz com que o leitor se empenhe na tarefa de visualizar as muitas formas possiveis do mundo identificavel, de modo que, inevitavelmente, o mundo repetido no texto comep a sofrer modificaq~ies. Pois niio importa que novas formas o leitor traz h vida: todas elas transgridem - e,

dai,

modificarn - o mundo referencial contido no texto. Ora, como o texto k ficcional, auto- maticarnente invoca a convenGo de um contrato entre autor e leitor, indicador de que o mundo textual ha de ser concebido, ngo como realidade, mas como se

fosse realidade. Assim o que quer que seja repetido no texto niio visa a denotar o mundo mas apenas um mundo encenado. Este pode repetir uma realidade identifidvel, rnas contkm uma diferenfa decisiva: o que sucede dentro dele nao tem as conseqüencias inerentes ao mundo real referido. Assim, ao se expor a si mesma a ficcionalidade, assinala que tudo k tiio-s6 de ser considerado como se

fosse o que parece ser; noutras palavras, ser tomado como jogo.

0

mundo repetido no texto 6 obviamente diferente daquele a que se re- fere, quando nada porque, como repetigo, deve diferir de sua existencia extra- textual - o que vale Para todos OS tipos de discurso, textual ou niio - por-

quanto nenhuma descri~iio pode ser aquilo que descreve.

Ha,

por conseguinte, virios niveis de diferenp que ocorrem simultaneamente no texto:

1. Extratextualmente:

a. Entre o autor e o mundo em que ele intervkm.

3 Peter Hutchinson, Ganzes authorsphy, Londres, Methuen, 1783, fornece um catd- logo dos virios jogos executados em textos literirios.

(4)

b. Entre o texto e um mundo extratextual, assim como entre o tex- to e outros textos.

2.

Intratextualmente:

a. Entre OS itens selecionados a partir de sistemas extratextuais.

b.

Entre constelacoes semhticas construidas no texto.

3.

Entre texto e leitor:

a. Entre as atitudes naturais do leitor (postas agora entre parente- ses) e aquelas que se lhe exige adotar.

b. Entre o que

6

denotado pelo mundo repetido no texto e o que essa denotago - agora a seMr como um andogo que guia - pretende transgredir.

Os niveis de diferenp siio bastante distintos mas todos eles constituem o espaqo vazio do texto, que p6e o jogo em movirnento.

0

movimento

6

o do jogo por tr2s diferentes aspectos:

1. Em cada nivel, posi~6es diferenciaveis siio confrontadas entre si. 2.

A

confionta~iio provoca um movimento de ida e vinda que 6 bki-

CO para o jogo e a diferenp resultante precisa ser erradicada Para

que almnce um resultado.

3.

0 movimento continuo entre as posif6es revela seus aspectos mui- to diferentes e como cada um traspassa o outro, de tal modo que as prdprias vhias posi~6es siio por fim transformadas. Cada uma dessas diferenps abre espaco para o jogo e, dd, Para a transforma- Go, que, mesmo no estigio prelirninar de meu argumento, pare- ceria descreditar a n o ~ a o tradicionai de representacao.

Os jogos visam a resultados e, se as diferenp niio siio transpostas ou mesmo removidas, o jogo chega ao fim. 0 resultado do jogo textual, no en- tanto, pode ser aitarnente reduuvo, pois OS lances do jogo fragmentam as po-

si@s em urna multiplicidade de aspectos. Se consideramos ser o significado o resultado do jogo textual, entiio este s6 pode provir da suspensZo do movi- mento do jogo que, com alta fi-eqüencia, envolve a tomada de decisoes. Mas qualquer decisiio eclipsara i n h e r o s aspectos provocados pela mudanp e in- tera@o constantes e, dai, pela reiteraGo variada de posicoes do jogo, de mo- do que este, por si mesmo, se contrapoe a chegar ao firn.

(5)

Ressalta-se assim a ddidade do jogo. Ele se dirige a ganhar alguma coi- sa, dd a se encerrar, ao mesmo tempo que remove a diferenp. Mas tambkm se contrapoe

i

remogo

da

diferenp e supera seus feitos de maneira a resta- belecer sua pr6pria liberdade como um movimento sempre descentrante. Em suma, o jogo preserva a diferenp que procura erradicar.

Estes traps muniamente excludentes se entremesclarn e assim conver- tem o significado do texto em uma espkcie de "'suplemento".

A

mdtiplicidade de diferenps que ocasionam o jogo e que tarnbkm resdtarn dele nunca pode ser totalmente removida mas pode, de fato, aumentar com as tentativas de er- radid-la. Em conseqüencia, o 'csuplemento77 deriva n50 SO do

ganhar

no jogo (isto

4,

do estabelecimento do significado) mas tambkm, e ao mesmo tempo, a partir do jogo livre - pois o pr6prio jogo livre permaneceria inapreensivel Se ngo tivesse alguma forma de manifesta@o. Se o "suplemento" k o produto desses Gaps contrapostos, podemos extrair duas concl&es:

1 . 0

"suplemen- to7', como o signilicado do texto, k engendrado atravks do jogo e, portanto, nso h i um sigrdcado previo ao jogo.

2. A

gerago do "suplemento" atravks do jo- go admite diferentes desempenhos por diferentes leitores no ato de recep@o - e iss0 mesmo na medida que pode ser jogado ou para que se alcance a vi- t6ria (0 estabelecimento do sigdcado) ou Para que se mantenha o jogo livre (a conserva@o em aberto do significado).

Esta dualidade do jogo

-

remover e manter a diferenp - desafia uma conceitualiza@o mais avanpda. Ela n5o pode ser fenomenologicarnente re- duzida por reconduzi-la a uma causa subjacente. Mesmo teorias unilaterais do jogo como a de HuiWiga afirmam que o jogo precede todas as suas possiveis explica@esP Por iss0 o jogo do texto s6 pode ser avaliado em termos de suas possibilidades, por meio das estratkgias empregadas no jogo e pelos jogos de fato realizados no texto.

Como o espap entre autor e leitor, o texto litedrio pode ser descrito em treS niveis diversos: o estrutural, o füncional, o interpretativo.Uma descrigo estrutural visar5 mapear o espap; a hcional procurar5 explicar sua meta e a interpretativa perguntar-se-i por que jogamos e por que precisamos jogar. Uma resposta

a

u I h a questao s6 pode ser interpretativa pois que o jogo, apa-

Johan Huizinga, Homo I&. Vam Urrpmng der Kultur im Spiel, Hamburgo, Ro-

(6)

rentemente, k hndado em nossa constitui@o antropol6gica e pode, com efei- to, nos a~udar a captar o que somos.

Devemos agora detahar melhor OS tres diversos niveis. Primeiro, o da

estrutura. Focaliza-se aqui o contramovimento como o trago bisico do jogo.

0

modo operacional do contramovimento converte o texto de um ato mi- metico em um ato performativo. Ele se manifesta por criar o que poderiamos charnar OS espaps do texto, que, deve ser lembrado, tanto repete como inclui

OS mundos extratextuais cujo retorno k indicativo de urna diferenga. Nas pa-

lavras de Gregory Bateson,

d

"uma diferen~a que faz diferenga"5 - pois gran-

des diferenqas derivam

da

diferenga inicial entre OS componentes do texto.

A

diferenga, como vimos, provoca o movimento Para diante e Para trk, que abre OS espaqos do jogo entre as posis6es que separa.

0

menor espago de jogo k produzido pelo significante fraturado, que perde sua h g i i o designante de modo a poder ser usado figurativamente, por efeito da indicagZio ficcional do texto, segundo a qual o que 6 dito h i de ser tomado como se pretendesse o que disse.

0

significante, portanto, denota ai- go mas, ao mesmo tempo, nega seu USO denotativo, sern que abandone o que

designava na primeira insthcia. Se o significante significa algo e simultane- manete indica que niio significa aquilo, funciona como um analogo Para a figura5Zio de algo mais que ajuda a esbogar. Se o que 6 denotado 6 transfor- mado em analogo tanto do ocasionar como do formar uma atividade-que- mostra, entao algo ausente 6 dotado de presenga, embora aquilo que est6 au- Sente niIo possa ser idsntico ao analogo que favorecia ser concebido. Assim o significante fraturado

-

simultaneamente denotativo e figurativ0 - in-

voca alguma coisa que nso

6

prk-dada pelo texto mas engendrado por ele, que habilita o leitor a doti-10 de urna forma tangivel.

Assirn o movimento do jogo converte o sigrilficante fiaturado em uma ma-

niz Para o duplo sqpdicado, que se manifesta no analogo como interpenetragio mhtua

das

h @ e s denotativa e figurativa. Em termos do texto, o analogo 6 um <C

suplemento"; em termos do receptor,

d

a pauta que o -

habilita

a conceber o que -

o texto esbop. Mas, no momento em que isso se toma concebivel, o receptor ten-

ta atribuir si&ca@o ao "suplemento" e todas as vezes que isso suceda o texto 6

traduzido nos termos

2

disposigio do leitor

individual,

que encerra o jogo do sig-

Gregory Bateson, S t e p to an ecology ofthe mind, San Francisco, Chandler, 1972,

(7)

d c a n t e fiaturado ao bloquei-10 mm um sigdcado.

Se

o s i i c a d o do texto, no entanto, niio C inerente mas 6 atribuido e alangado apenas por meio do mo- vbnento de jogo, entao o sigtuficado C um meta-enunciado acerca de enunciados ou mesmo uma metacomunica@o acerca do que Se sup6e ser comunicado (ito C, uma experiencia por meio do texto).

Outro espaco de jogo bhico no texto

e

aberto pelo esquema Um es- quema, como Piaget afirma em sua teoria do jogo, 6 o produto de nosso cons- tante empenho em nos adaptarmos ao mundo em que e~tarnos.~ - Sob este as- pecto, ele nao C dessemelhante da imitasiio, porquanto C motivado pelo desejo de sobrepujar a diferenp que marca nossa relagZo com o mundo.

An-

tes de tudo, C a percepgao que tem de exercitar esses esquemas de adaptaGo. Uma vez que estes esquemas tenham sido formados, o primeiro passo vitai Para eles esta em serem internaiizados, de modo que possam funaonar subconscientemente. Isso significa que tendem a se tornar ritualizados de um modo ou de outro e, quando iss0 sucede, separam-se dos pr6prios objetos que deram origem ?sua forma@o. i

As

conven@es da arte nao siio senao conjun-

tos de tais esquemas, que facilmente se prestam a novos USOS, sobretudo quan- do tenham sido separados do mundo de objetos.

Em v a de facilitar a adaptaciio ao mundo fisico, OS esquemas podem ser

usados Para moldar coisas doutro modo inapreensiveis ou de que queremos dispor dentro de nossas condig6es. Assim como OS esquemas nos capacitam a

nos acomodarmos a objetos, assim tambCm nos concedem assirnilar objetos de acordo com nossas pr6prias inclinas6es. Quando ocorre essa inversao, abre-se o espaso do jogo. 0 esquema 6 dissociado de sua h C a o de acomo- da@o e, ao se tornar subserviente ?i funGo assimilativa, permite que tudo que

C retido de n6s venha a ser encenado como presente e manejivel. Esse proces- so se mostra imediatamente evidente no jogo da criansa.

0

movimento do jogo sucede quando o esquema deixa de h c i o n a r como uma forma de aco- moda@o e, em vez de tornar sua forma do objeto a ser imitado, imp6e uma forma sobre aquilo que esti ausente. Nouuas palavras, o esquema de acomo- dasso copia o objeto, ao passo que o esquema de assimilago modela o obje- to de acordo com as necessidades individuais. 0 jogo, portanto, comep quando a assimilaGo desloca a acomoda@o no USO dos equemas e quando o

-

G Jean Piaget, Ndcbabmung. Spiel und Traum, Gesammelte Werke, n" 5, (Trad. Leo Montada, Stuttgart, Ernst Klett, 1975, p. 178-2 16.

(8)

esquema se converte em uma projeGo de maneira a incorporar o mundo em um livro e cartografi-10 de acordo com as condis6es hurnanas.

Um traso notivel do USO assimilativo dos esquemas estA em que eles se

tornam sujeitos i desfgurago. Isso realp a mudanp em sua ihnGo, bem co- mo a diferenp em sua aplicaGo.

E

uma dualidade inerente a todos OS esque-

rnas textuais, em que a h @ o original do esquema passa a segundo plano, embora mantenha sua forma e, em vez de imitar algo, serve Para representar o irrepresentivel.

A

este respeito, o esquema invertido apresenta uma estreita semelhanp com o significante fiaturado. Ambos formarn espaco de jogo do texto e p6em o jogo em movimento.

E,

em arnbos OS casos, uma h @ o bdsica 6 transfor-

mada em meio Para algo mais: com o significante, a h @ o denotativa se transforma no meio Para a figura~iio e, com o esquema, a fün@o de acomo- daGo se torna o meio Para a modelagem do Sem traps.

As

h g 6 e s originais, contudo, nunca sao totalmente suspensas e hi, assim, urna oscilaGo continua entre denotaGo e figura@o, e entre acomodaGo e assirnila@o. Essa oscilaGo ou movimento de ida e vinda 6 bhico Para o jogo e permite a coexistencia do mutuamente exclusivo. Tamb6m converte o texto em uma matriz geradora Para a produsiio de algo novo. Forp o leitor a realizar OS jogos do texto e ter-

minar o jogo ao alcanpr o que considera ser seu significado. Na andise final, a oscilaGo 4 urna modelagem do jogo livre - que pode ser um trago

da

na-

-

turaa ou mesmo

da

natureza hurnana mas que niio o 6 do texto.

A

oscilaGo, no entanto, tamb6m pode resuingir o jogo livre. Isso 6 evidente quando ve- mos mmo as estratigias do texto reestruturam a maneira como

4

executada a dualidade respectiva do significante fiaturado e do esquema invertido.

Ha

quatro estratdgias hindamentais, cada uma das quais perrnite um ti- po diferente de jogo. Siio eles agon, aha, m i m i q (mimeusmo) e

ilinu. A

mes- cla de termos gregos e latino pode ser irritante, rnas as express6es se tornararn termos padr6es na teoria dos jogos desde Caillois.7

Explico primeiramente OS termos e OS tipos de jogos que abrangem

de modo a verificar OS padr6es de jogo que organizam:

Roger Caillois, Man, phy, andgames, trad. de Meyer Barash, New York, Free Play of Glencoe, 1966, p. viii.

(9)

1. Agon C uma luta ou debate e 6 o padriio comum de jogo quando o texto se centra em normas e valores conflitivos. 0 debate envolve uma decisiio a ser tomada pelo leitor em rela@o a estes valores con- tririos, que se mostram internarnente em colisiio.

2.

Alea

C um padriio de jogo baseado na Sorte e na imprevisibilidade. Sua proposta bhsica

C

a desfdiariza@o, que C alcanpda pela es- tocagem e condensago de diferentes textos, assim despojando de significado OS seus segmentos respectivos e identifidveis. Pela sub-

versiio da semhtica familiar, ele atinge o atk entao inconcebivel e fmtra as expectativas guiadas pela conven@o do leitor.

3. Mimicry8

C um padrgo de jogo designado para engendrar ilusao.

0 que quer que seja denotado pelo significante ou prenunciado pelos esquemas deveria ser tomado como se fosse o que diz.

H&

duas raz6es Para isso: (a) quanto mais perfeita 6 a ilusiio, tanto mais real parece o mundo que pinta; (b) se, no entanto, a ilusiio k

perhirada e assim se revela o que 6, o mundo que ele pinta se con- verte em um espelho que permite que o mundo referencial fora do texto seja observado.

4. Ilinx

6 um padriio de jogo em que as vfias posi~6es sao subverti- das, recortadas, canceladas ou mesmo carnavalizadas, como se fos- Sem lanpdas umas contra as outras. Visa fazer ressaltar o ponto de vista dos fundos das posic6es assumidas no jogo.

Embora essas estratkgias admitam a realiza@o de jogos diversos, C fre- qüente que se liguem como modos mistos. Por exemplo, se

ilinx

joga contra ou 6 combinado com agon, pode haver dois tipos possiveis de jogo:

ilinx

do- mina, neste caso o debate entre normas e valores se torna ilusorio ou domina agon e entiio o debate se torna mais diferenciado. Essas estratkgias podem ser mesmo invertidas, jogando contra suas inteng6es subjacentes. Por exemplo, agon parece se dirigir

a

vit6ria no jogo, mas, na literatura p6s-moderna, k fre- qüentemente usado para um jogo em que se perde. Isso pode implicar que to-

<<

Como o pr6prio Caillois explicava, miminy [.

.

.] nomeia em ingles o mimetismo, sobretudo dos insetos, a fim de sublinhar a natureza fundamental e elementar, quase orghica, da impulsiio que suscita estas manifestac6esy', Roger Caillois, Les jewc et les hommes, Paris, Gal-

(10)

dos OS conflitos de normas e valores sejam deliberamente marcados como coi-

sas do passado, assim expondo a naturaa fechada dos sistemas que deram a eles fungo e validade. Pode tambdm mostrar que todas as formas de signifi- cado niio passam de mecanismos de defesa destinados a conseguir o fecha- mento em um mundo em que reina a abertura, a falta de conclu&o. -

Essas quatro estratdgias de jogo podem ser combinadas dos mais varia- dos modos e todas as vezes que sau combinadas cada uma assume um papel particular. Todos OS papkis - como temos de nos lembrar - se caracterizarn

por uma duplicidade intrinseca: representam algo que visam projetar e, con- tudo, simultanemanente carecem de controle total sobre a meta intenciona- da. Deste modo sempre h i um elemento no papel de jogo que escapa do do- minio do jogador.' Isso se aplica igualmente aos padr6es de jogo acima esboqados quando se tornam papkis. Assim o jogo pode ser realizado seja pa- ra ampliar, seja Para restringir o grau de incontrolabilidade.

Ora, qualquer tipo de jogo que resulta em aceitar-se a duplicidade do papel de jogo seri sempre governado por dois diferentes conjuntos de regras. Na teoria dos jogos, siio chamadas regm comerv~rac e regrac dis~ipativas.~~ Com relaqiio ao texto, podem ser chamadas repladoras (que funcionarn de acordo com as convenq6es estabilizadas) e aleairiac (que liberam o que tenha sido restringido pelas convenq6es). As regras aleatorias se aplicarn ao que niio pode ser controlado pelo papel em questso, enquanto as reguladoras organi- zam o que o papel representa em termos de relas6es hiedrquicas, causais, sub- servientes ou de apoio. As regras aletorias liberam o que as regras reguladoras amarraram e, assim, diio acesso ao jogo livre dentro de um jogo doutro mo- do restrito.

Resurno a descrigao estrutural apresentada atd aqui: o sigdcante fiatura- do e OS esquemas invertidos abrem o espaqo do jogo do texto.

0

movimento

para U& e para diante i dirigido por quatro estratkgias bdsicas de jogo: agon, aha, mimicy e

ilim.

hsas, de sua Parte, podem ser submetidas a inheras combina$ies, que, dai, se convertem em papiis. Os papiis siio bifaces, com uma representGo inevitavelmente escapando por sombreamentos incontroliiveis.

9 Irving Gofknan, The Presentantion of seqin eve?yddy

&,

Garden Cis; New York,

Doubleday, 1959, p. 8 ss, 141-66.

l0 Manfred Eigen e Ruthhild Winkler, Dar Spiel. Naturgesetze steuern den Zufall, Mu-

(11)

Os jogos resultantes de papeis podem ser produzidos de acordo com regras re- guladoras, que fazem o jogo basicarnente conservador, ou de acordo corn regras aleatbrias, que o k m basicamente inovador.

Todos estes tragos estruturais fornecem urna armago Para o jogo. Assi- nalam tanto OS limites e as Areas livres de jogo, assim representando as prk-

condigoes Para "suplemento~" - na forma de significado

-,

assim como pa-

<C

ra que esses suplementos" sejarn ludicarnnente desfeitos.

H i

assim um movimento de contrabalanqo em que o jogo se empenha por um resultado e o jogo livre rompe com qualquer resultado alcangado.

Os traGos estruturais, contudo, assumem significa@o apenas em relago

a

hinGo que se pretendeu ser realizada pelo jogo do texto.

Ern

virtude de que o jogo se empenha por algo, mas tambkm desfaz o que alcanp, continuamen- te o jogo produz diferenp.

A

diferenp, de sua Parte, pode-se manifestar tiio- s6 pelo jogo, pois que tiio-s6 o jogo torna concebivel a alteridade ausente que jaz do outro lad0 de todas as posiqoes. Assim o jogo do texto niio k nem ga- nho, nem perda, mas sim um processo de transforma@o das posig8es, que d i urna presenga d i n h i c a A ausencia e alteridade da diferenp. Em conseqüen- cia, aquilo que o texto atinge nao k algo prd-dado, mas urna transformagao do material prk-dado que contkm. Se o teM0 acentua a transformago, 6 ele obrigado a ter uma estrutura de jogo, pois doutro modo a transforma@o te- ria de ser subsumida a urna arma~iio cognitiva, com a destruigo de sua pr6- pria natureza. Se a nogo de representago tivesse de ser mantida, ter-se-ia de dizer que o texto "representa" o jogo,

a

medida que explica o processo indivi- dual de transforma@o como est& em curso no texto.

Este processo de transforma@o 6 comurn ao t m o literdrio e se desdo- bra por todas as fases interconectadas que esbop-nos atk agora - do signifi-

cante fraturado, atravks dos esquemas invertidos e OS papkis estratkgicos de agon, dlea, miminy e iliwr, atk a interferencia mutua das regras reguladoras e aleat6ria.s. Ainda que, por motivos analiticos, tenha separado estas fases, de fa- to elas se superpoem e inter-relacionam e por elas podemos observar a trans- forma~iio, por assim dizer, em dmera lenta, tornando perceptivel um proces- so de outro modo seria intangivel.

Mas a transforma@o chega & plena fiuigo pela participago imaginativa do receptor nos jogos realizados, pois a transformaGo k apenas um meio para um

fim

e nao um fim em si mesmo. Quanto mais o leitor k atraido pelos pro- cedimentos a jogar OS jogos do texto, tanto mais C ele tambkm jogadopelo tex-

(12)

to. Assim novos tragos de jogo emergem - ele assegura certos papCis ao leitor e, para fad-10, deve ter clararnente a presenp

potential do receptor como uma

de suas Partes componentes.

0

jogo do texto, portanto,

C

umapoj60nnance pa- ra um suposto auditorio e, como

tal,

niio 6 identico a um jogo cumprido na vida comum, mas, na verdade, um jogo que se encena Para o leitor, a quem C

dado um papel que o habilita a realizar o cen6rio apresentado.

0 jogo encenado do texto niio se desdobra, portanto, como um espeti- culo que o leitor meramente observa, mas C tanto um evento em processo co- mo um acontecimento Para o leitor, provocando seu envolvimento direto nos procedimentos e na encenag50. Pois o jogo do texto pode ser cumprido indi- vidualrnente por cada leitor, que, ao realid-10 de seu modo, produz um "su- plemento" individual, que considera ser o sipficado do texto. 0 significado

C um "suplementoJJ porque prende o processo ininterrupto de transforma@o e C adicional ao texto, Sem jamais ser autenticado por ele.

Dentro desta ordem de considerago, algo importante h i de ser revelado pelo jogo t d . Como um meio de transforma@o, o jogo nao s6 socava a posigo apresentada no texto;

faz

o mesmo com o d a q d o que a trans- formago converteu de ausencia em presenp, ist0 6, o "suplemento" que o lei- tor acrescentou ao texto. Mas a escava@o, mesmo que parep negativa, C de fa- to altamente produtiva, pois ocasiona a transforma@o e gera "suplementos". Donde essa operago, movida pela negatividade, C basicamente uma estrutura capacitadora. A negatividade esta, portanto, longe do negativ0 em seus efeitos, pois metarnorfoseia a ausencia em presenp, mas, por continuamente subver- ter aquela presenp, a converte em condutora para a ausihcia de que, de outra maneira, nada saberiamos. Atravds dessas m u d a n p constantes, o jogo do tex- to usa a negatividade de um modo que sintetiza a inter-relago entre audncia e presenp.

E

aqui esti a unicidade do jogo - ele produz e, ao mesmo tempo, possibilita que o processo de produGo seja observado.

0

leitor C, entiio, apa- nhado em uma duplicidade inexorivel: esta envolto em uma ilusiio e, simulta- neamente, esta consciente de que Puma ilusiio.

E

por essa oscilago incessante entre a ilu6o fechada e a ilusiio seccionada que a transforma@o efetivada pe-

10

jogo do texto se fm a si mesmo sentir pelo leitor.

A trasforma* de sua Parte, parece encaminhar a algurna meta a ser cumprida pelo leitor e, assim, o jogo do texto pode ser concluido de vhios modos: um deles C em termos de semhtica. Neste caso, 6 dominante nossa necessidade de compreensiio e nossa premencia de nos apropriarmos das ex-

(13)

periencias que nos siio dadas. Isso poderia mesmo indicar um mecanismo de defesa em operago dentro de n6s mesmos, como a busca de significado po- de ser nosso meio de nos demarmos do niio-familiar.

Outro modo como podemos jogar o texto consiste na obtenGo de ex- periencia. Ent5o nos abrimos Para o nao-familiar e nos preparamos para que nossos pr6prios valores sejam influenciados ou mesmo modificados por ele.

Um terceiro modo de jogo C o do prazer. Damos entiio precedencia ao deleite derivado do exercicio incomum de nossas faculdades, que nos capacita a nos tornarmos presentes a n6s mesmos. Cada urna dessas opgoes representa urna tendencia de acordo com a qual o jogo do texto pode ser realizado.

Chego agora ao ponto final: que C o jogo e por que jogamos? Qualquer resposta a esta quest50 fundamental seri uma interpretGo de natureza hipo- tdtica. Em termos filogentkicos, o jogo, no reino animal, comep quando se expande o espago do hiibitat.

A

principio, parece ser uma atividade que tem seu fim em si mesma, explorando OS limites do possivel, em vista do fato de

que tudo

6

agora possivel. Mas tambdm podemos V&-10 como uma suposta aga0 ou como urna experiencia que prepara o animal para enfrentar o impre- visivel por vir. Quanto mais se expande o territorio do animal, tanto mais im- portante e, certas vms, mais deliberado se torna D jogo como um meio de preparagao Para a sobrevivencia.

Em termos ontogenCticos, hii de se observar uma distingo, no jogo

da

criang, entre percepgo e significado. Quando uma crianp monta em um cavalo-de-pau, sua a@o mental - C bastante distinta daquilo que de fato perce- be. Naturalmente, niio percebe um cavalo real e, assim, o jogo consiste em de- compor o objeto (cavalo) e o significado daquele objeto no mundo real. Sua agiio C, portanto, uma a@o em que um significado desfamiliarizado

6

repre- sentado em urna situago real.

Estes dois exemplos de jogo tem em comum uma forma de encena60.

Mas em nenhurn dos casos a encenago C levada a cabo Para seu pr6prio

h.

No reino animal, ela serve para antecipar e preparar hturas a@es; no jogo in-

fantil, permite que limitas6es reais sejam ultrapassadas.

A

encenago, portan- to, d basicamente um meio de transpor fionteiras e isso C igualmente verdadei- ro para o jogo do texto, que encena urna transformaGo e, ao mesmo tempo, revela como se faz a encenago. Ersa dualidade deriva arnplarnente do fato de que, aqui, a transforma@o niio tem urna meta pragmiitica: niio conwrte uma

(14)

coisa em outra. Ela

6

antes uma finalidade que s6 pode ser propriarnente cum- prida se se exibem seus preparativos.

Qual

a natureza dessa finalidade?

A

transforma@o

6

um caminho de aces- so Para o inacessivel, mas a uansforma@o encenada nao s6 torna acessivel o ina- cessivel. Seu alcance talvez seja mais prazenteiro. Concede-nos ter coisas de dois modos: por tornar a q d o que

6

inacessivel tanto presente como ausente.

A

pre- senp acontece por meio da transforma@o encenada e a ausencia pelo fato de -

que a transforma#o encenada

4

tao-s6 jogo.

Dai

que cada ausencia apresenta- da

6

qualificada pelo aviso de que

6

apenas encenada na forma do fde-conta, pelo qual podemos conceber o que doutro modo escaparia de nossa apreensao.

Ai

esti a fapnha extraordiniria do jogo, pois parece satisfazer necessidades tan- to epistemol6gicas como antropol6gicas. Epistemologicarnente falando, im- pregna a presenp com uma ausencia esbopda pela negago de qualquer auten- ticidade quanto aos resultados possiveis do jogo. Antropologicarnente f h d o , nos concede conceber a q d o que nos 6 recusado.

E

interessante notar que as perspectivas epistemol6gica e antropol6gica niio entram em conflito, mesmo se parepm caminhar urna Contra a outra. Se houvesse um choque, o jogo se des- faria, mas como niio h i a irreconciliabilidade de fato revela-se algo de nossa pro- pria constitui@o humana. Por nos conceder ter a ausencia como presenp, o jo-

-

go se converte em um meio pelo qual podemos nos estender a n6s mesmos. - Essa extensao 6 um traso bhico e sempre fascinante da literatura. Inevitavel- mente, se p6e a questao por que dela necessitamos.

A

resposta a esta pergunta poderia ser o ponto de partida Para uma anuopologia literiria.

Referências

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