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INSTITUTO BRASILEIRO DE DIREITO URBANÍSTICO

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Academic year: 2021

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NOTA TÉCNICA SOBRE O PLS 1.179/2020 – Regime Jurídico Emergencial e Transitório das relações jurídicas de Direito Privado (RJET) no período da

pandemia do Coronavírus (Covid-19)

INSTITUTO BRASILEIRO DE DIREITO URBANÍSTICO

SUMÁRIO

1. OBJETO: ANÁLISE JURÍDICA DE ASPECTOS DO REGIME JURÍDICO EMERGENCIAL E TRANSITÓRIO DAS RELAÇÕES JURÍDICAS DE DIREITO PRIVADO (RJET), PROPOSTO POR MEIO DO PLS N° 1.179, DE 30/03/2020, DE AUTORIA DO SENADOR ANTONIO ANASTASIA (PSD-MG) 2

2. CONTEXTO 3

3. PROPOSTA DE AMPLIAÇÃO DO ESCOPO DO PLS EM RELAÇÃO A SUSPENSÃO DAS REMOÇÕES COMPULSÓRIAS 5 4. BREVE ANÁLISE DAS DISPOSIÇÕES DO PLS nº 1.179/2020 RELACIONADAS AO DIREITO À MORADIA 4.1 DAS LOCAÇÕES DE IMÓVEIS URBANOS – ANÁLISE E PROPOSTA LEGISLATIVA IBDU 7

4.2 DA USUCAPIÃO – ANÁLISE E PROPOSTA IBDU 9

5. INSTRUMENTOS ESPECÍFICOS TEMPORÁRIOS PARA PROTEÇÃO DA MORADIA 12

ÍNDICEDEDISPOSITIVOSANALISADOSDOPLSNº 1.179/2020

1. REDAÇÃO ORIGINAL DO ARTIGO 9º, CAPUT E PARÁGRAFO PRIMEIRO 7 2. PROPOSTA DE EMENDA SUBSTITUTIVA DO CAPUT DO ARTIGO 9º 8 3. PROPOSTA DE EMENDA ADITIVA PARÁGRAFO PRIMEIRO DO ARTIGO 9º 9

4. REDAÇÃO ORIGINAL DO ARTIGO 10, CAPUT 9

1.

OBJETO: ANÁLISE JURÍDICA DE ASPECTOS DO REGIME JURÍDICO EMERGENCIALETRANSITÓRIODASRELAÇÕESJURÍDICASDEDIREITO PRIVADO(RJET),PROPOSTO PORMEIODOPLSN°1.179,DE30/03/2020, DEAUTORIADOSENADORANTONIOANASTASIA(PSD-MG)

O Instituto Brasileiro de Direito Urbanístico (IBDU), associação civil sem fins lucrativos constituída em 2000, atuante em todo o território nacional, que congrega profissionais, pesquisadores, professores e ativistas de diversas formações em torno da matéria jurídico-urbanística, atento aos impactos do COVID-19 sobre as condições de vida nas cidades brasileiras, especialmente

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da população de baixa renda, vem buscando contribuir com a adoção das medidas necessárias a fim de minimizar os impactos negativos, de ordem urbanística, socioeconômica e jurídica, suscitados pela pandemia.

Nesse sentido, partindo da apresentação da proposição legislativa mencionada em epígrafe, e tendo em conta a capacidade de contribuir com o seu aprimoramento, especialmente no que tange às questões que envolvem o direito à vida, à cidade, à moradia adequada e à superação da pobreza, a presente nota dirige-se ao parlamento e à sociedade brasileira.

Em que pese a inestimável contribuição de renomados magistrados e juristas na elaboração do aludido projeto, vemos como oportuna a manifestação dos profissionais e especialistas em direito urbanístico a respeito de pontos específicos nele versados, seja para reafirmar a importância da iniciativa legislativa e, portanto tecer considerações críticas, seja para agregar sugestões de aprimoramento, decorrentes das experiências teóricas e práticas de profissionais envolvidos com a consagração jurídica do direito à moradia e à cidade, matérias que serão afetadas diretamente pelo projeto de lei em questão, caso aprovado.

Ressalte-se que a presente nota não tem por fim analisar in totum o projeto de lei ora em discussão no Congresso Nacional, mas sim exclusivamente no que este se relaciona com a garantia do direito à moradia, durante o período de atenção e controle da pandemia.

Após uma breve contextualização, a presente nota está dividida em três partes. A primeira parte busca trazer argumentos para ampliação do escopo do projeto de lei no que concerne a suspensão das remoções compulsórias (incluindo despejos, reintegrações de posse etc.). A segunda parte traz uma sucinta análise e comentários aos dispositivos do PLS nº 1.179/2020, conforme a redação do substitutivo aprovado no Senado em 03/04/2020 e que passa a ser discutido agora na Câmara dos Deputados, que se referem à matéria versada na presente nota, acrescido de indicações de emendas que seriam adequadas aos mesmos, a fim de contemplarem as preocupações aqui trazidas à colação. A terceira parte tem como foco a sugestão de instrumentos temporários para proteção da moradia que, embora fujam ao escopo das relações de Direito Privado, configuram de suma relevância para contenção do novo coronavírus (Sars-Cov-2), responsável por provocar a Covid-19.

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2.

CONTEXTO

Em todo o mundo, por força da acelerada disseminação do COVID-19, observa-se a adoção de medidas excepcionais de proteção à moradia, como estratégia importante de controle da propagação da pandemia.

A título de exemplo, vale mencionar algumas das medidas adotadas em outras nações, segundo informações veiculadas pela imprensa mundial ao longo dos meses de março e abril / 2020:

● EUA: proibição de despejos;

● França: suspensão do pagamento de aluguéis;

● Venezuela: suspensão do pagamento de aluguéis, não somente de pessoas físicas, mas também de pequenas e microempresas;

● Reino Unido e Itália: suspensão do pagamento de hipotecas.

● Portugal: suspensão do pagamento de aluguéis por parte de quem perdeu rendimentos.

Em fevereiro deste ano, foi identificado o primeiro caso de contágio do novo coronavírus no Brasil. Desde então, registra-se a sua difusão no território nacional, tendo sido computados pelo último boletim epidemiológico do Ministério da Saúde, até o fechamento desta nota, mais de 1000 óbitos, com tendência de crescimento exponencial em face das evidências colhidas nas demais nações do globo.

Considerando que a República Federativa do Brasil é signatária de inúmeros tratados internacionais e o direito à moradia encontra-se assentado da Constituição Federal de 1988, o país não pode ficar de fora do bloco de sociedades que adotam política de reforço à segurança da moradia, sob pena de inviabilizar o chamado isolamento social, compreendido como providência fundamental no controle da velocidade da expansão do número de infectados e prevenção de situações de falência dos serviços de saúde, públicos e privados.

Não há exemplo mais rematado da chamada onerosidade excessiva do que ver-se compelido a desocupação de imóvel residencial sob situação de pandemia. Trata-se de situação em que se justifica, no mínimo, o afastamento temporário das possibilidades de retomada do imóvel. Em outras palavras, a prorrogação da vigência da locação ou da relação jurídica que rege o exercício da posse para fins de moradia é medida indispensável, ao menos enquanto perdurar a situação de risco à vida ou à saúde coletiva e de todos aqueles que

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residirem num determinado imóvel, admitindo-se que todas essas relações se constituam com o caráter "intuito familiae".

Vale ressaltar a tramitação de outros projetos referentes à suspensão de despejos e de outras formas de perda da moradia, tais como o PL nº 1.090/2020, apresentado pela Deputada Maria do Rosário, e o PL nº 872/2020, apresentado pelo Senador Jaques Wagner, sem falar de outros em tramitação nas Assembleias Legislativas estaduais, que somente reiteram o reconhecimento da importância do estabelecimento de medidas legais de proteção da moradia, de caráter excepcional e emergencial, no contexto da atual pandemia.

Na justificativa da proposição e do respectivo substitutivo sob exame, seus autores declaram que, dentre os princípios que orientaram a sua elaboração, encontra-se o reconhecimento da assimetria – acrescentamos: jurídica e material – das relações locatícias de imóveis urbanos. Contudo é importante destacar que quaisquer despejos e outras formas de deslocamento compulsório e perda da moradia de forma geral terão efeitos negativos na vida de locatários e suas famílias atingidos por decisões judiciais, embora não liminares, colocando-os em maior risco em meio ao atual cenário de pandemia do novo coronavírus.

É um diagnóstico que nos parece irreparável, razão pela qual tal matéria não somente deve ser mantida no PL em discussão, bem como aprofundada e ampliada.

3.

PROPOSTA DE AMPLIAÇÃO DO ESCOPO DO PLS EM RELAÇÃO À SUSPENSÃODASREMOÇÕESCOMPULSÓRIAS

A posição geral defendida pelo IBDU, expressa na presente nota, é a de se suspender no país toda e qualquer hipótese de retomada compulsória de imóveis utilizados para moradia enquanto não esteja superado o contexto de isolamento social recomendado pelas autoridades sanitárias.

Assim, visando evitar o agravamento da situação de exposição ao novo coronavírus, o que coloca em risco tanto as famílias sujeitas a estas decisões quanto os próprios agentes públicos encarregados de fazê-las cumprir, sustentamos que a legislação DEVE prever a suspensão do cumprimento de qualquer decisão de desalojamento de imóveis utilizados para fins de moradia, seja de caráter liminar ou definitivo, expedidas em qualquer tipo de processo, sobretudo aqueles que envolvem posse em litígio coletivo.

A preocupação do IBDU não se limita às ações de despejo advindas de relações locatícias, mas também às ações de reintegração de posse, ações

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reivindicatórias, ações de imissão de posse de imóveis públicos e privados, execução de dívida nas quais ocorra penhora de imóvel, e quaisquer outras nas quais sejam adotadas decisões que tenham o mesmo efeito prático das decisões de despejo, independentemente da data e procedimento de sua propositura.

A adequada defesa da moradia exige, ainda, que idêntica suspensão deva vigorar ante as medidas potestativas extrajudiciais, como a autotutela, admitida em lei no caso da alienação fiduciária, e a denúncia vazia das locações, amplamente praticada no caso de locação ou comodato ajustado verbalmente.

Neste último caso, se encontra um sem número de imóveis em favelas e periferias urbanas. Quanto a este último ponto, a edição de comando legal específico faz-se especialmente importante, tanto por sua eficácia simbólica, quanto por embasar juridicamente eventual pedido de assistência à Defensoria Pública por parte dos interessados, induzindo uma maior vigilância social e institucional sobre casos dessa natureza.

Em que pese o PLS 1179/2020 versar apenas sobre relações de direito privado, vale também frisar, na linha da proteção integral da moradia preconizada nesta nota técnica, que idêntica atenção devem merecer, no presente momento, os desalojamentos praticados pelo Estado, que se manifestam tanto pela via judicial, quanto extrajudicial, valendo-se de entendimento a respeito da autoexecutoriedade das decisões administrativas, que tem sido objeto de diversos questionamentos quando o bem jurídico ameaçado é a moradia, especialmente no caso da população de baixa renda. Também essas hipóteses devem ser alcançadas pela suspensão aqui advogada, entendimento reforçado tendo em conta o próprio primordial papel do Estado e das autoridades ocupantes de seus cargos políticos e de gestão, de zelarem, acima de tudo, pela vida e pela saúde coletiva da população. Em reforço, sustentamos que o Poder Judiciário de diversos estados brasileiros já vem emitindo decisões suspendendo remoções por conta da pandemia do novo coronavírus, podendo ser exemplificada das decisões do Tribunal de Justiça da Bahia (autos 051.3318.39.2017.805.0080) e do Tribunal de Justiça do Estado de São Paulo (autos 1114490-48.2019.8.26.0100 e 1007673-39.2014.8.26.0001), ambas proferidas em sede de ação de reintegração de posse, e respaldadas no argumento de significativo risco de infecção dos envolvidos e da recomendação para que as pessoas permaneçam em casa. Oportuno também citar, no intuito de reforçar a importância da proposta do referido projeto de lei, decisão de ação locatícia que decreta a rescisão

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contratual e o consequente despejo dos locatários, que, contudo, fixa o prazo de desocupação do imóvel a contar da notificação e da normalização dos serviços judiciários, que se encontram em regime excepcional em razão da

pandemia provocada pelo novo coronavírus (autos

1012820-58.2019.8.26.0005). No mesmo sentido, a decisão que condiciona a expedição de mandado de despejo após normalização do expediente jurisdicional (autos 1040710-05.2019.8.26.0576).

A preocupação do Poder Judiciário também é fundamental quando busca a melhoria das condições de habitabilidade. Cite-se a decisão em ação civil pública promovida pelo Ministério Público de São Paulo em face do Estado de São Paulo que determina o abastecimento diário de água potável, por qualquer meio em todas as favelas e aglomerados subnormais presentes nos municípios atendidos pela SABESP.

As citadas decisões reforçam a oportunidade de estabelecer legislação protetiva da moradia nas condições sanitárias e socioeconômicas atualmente impostas ao país por conta da pandemia, evitando a multiplicação de lides judiciais ou, pior, decisões que provoquem os danos sociais agravados pelas deficiências no acesso à justiça, sendo certo que as negociações privadas teriam limitado alcance nesse caso.

Sem razão, de outro lado, argumentos que veem nas medidas preconizadas ofensa ao direito de propriedade. Merecem ampla reconfiguração diante de situações como a presente, em que o exercício do direito de propriedade deve ceder diante do interesse na tutela de valores de mais alta hierarquia social e normativa. De se considerar que não se nega o direito à propriedade, mas, antes, e tão somente, difere no tempo o exercício da prerrogativa de reaver o bem.

À luz das premissas estabelecidas, identificamos uma série de matérias relevantes que gravitam em torno daquelas tratadas nos dispositivos do PLS nº 1.179/2020 ou que se relacionam intimamente com elas, as quais consideramos merecedoras de serem recepcionadas na legislação brasileira. Constituem pautas que podem dar ensejo a novos artigos ou capítulos do projeto de lei em tela, ou ainda a novos projetos de lei a respeito do tema. Buscamos, assim, relacionar tais matérias infra:

1. Moradia coletiva e individual em áreas públicas e privadas que importa na suspensão do cumprimento de decisões de reintegração de posse;

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2. Moradia de interesse social que importa na suspensão da retomada em caso de mora em parcelas de aquisição de imóveis, especialmente nos financiamentos habitacionais;

3. Vedação de imissão de posse em favor do arrematante ou adjudicante em execuções judiciais.

4.

BREVE ANÁLISE DAS DISPOSIÇÕES DO PLS 1.179/2020 RELACIONADASAODIREITOÀMORADIA

4.1DASLOCAÇÕESDEIMÓVEISURBANOS–ANÁLISEEPROPOSTALEGISLATIVA IBDU

O capítulo VI do substitutivo aprovado no Senado versa sobre as locações de imóveis urbanos e contém apenas o seguinte dispositivo:

Art. 9º Não se concederá liminar para desocupação de imóvel urbano nas ações de despejo, a que se refere o art. 59, § 1o, I, II, V, VII, VIII e IX, da Lei nº 8.245, de 18 de outubro de 1991, até 30 de outubro de 2020.

Parágrafo único. O disposto no caput deste artigo aplica-se apenas

às ações ajuizadas a partir de 20 de março de 2020.

Em um processo de despejo, as liminares podem ser dadas em 15 dias e independentemente de audiência para ouvir a parte contrária. Portanto, é acertado o dispositivo que suspende a possibilidade de se decidir sobre o despejo de maneira tão célere. No entanto, entendemos que um dispositivo como este limita o alcance da proteção da moradia que se deseja estabelecer, tornando-o aplicável apenas às decisões liminares, quando deveria alcançar também as decisões definitivas, além das hipóteses de rescisão imotivada, ou denúncia vazia, do contrato de locação, admitidas no art. 46 da Lei do Inquilinato, além de todas as hipóteses expostas na primeira parte da presente nota técnica.

De outro lado, importante frisar que o projeto de lei expressa preocupação com a expedição de decisão liminar para desocupação de imóvel locado, ou seja, privilegia uma abordagem de direito processual. Tal preocupação poderia ser mais bem traduzida estipulando-se uma garantia genérica aos locatários e possuidores diretos de imóvel utilizado para fim de moradia, numa abordagem de direito material. Tal garantia teria por conteúdo a prorrogação automática e 'ex lege' da vigência dos contratos de locação (ou de outra natureza, conforme o título jurídico da moradia), durante o período em que vigorar o estado de emergência, prazo este acrescido, se necessário, de período adequado para procura de novo imóvel permanente e condigno, findo aquele.

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Sugerimos, portanto, sejam oferecidas emendas aditivas e substitutivas, com o teor acima indicado e que contemple as considerações tecidas na primeira parte da presente nota técnica, conforme redação a seguir:

Art. 9º Fica suspensa a execução das decisões judiciais para desocupação de imóvel urbano nas ações de despejo, a que se refere o art. 59, § 1º, I, II, V, VII, VIII e IX, da Lei nº 8.245, de 18 de outubro de 1991, até 30 de outubro de 2020.

O parágrafo único do artigo 9º do texto aprovado pelo Senado, que pretende limitar temporalmente a suspensão da concessão de liminares de despejo nos termos do caput, deve ser objeto de emenda supressiva, uma vez que torna o projeto de lei praticamente despiciendo, frustrando o seu intuito de proteção da moradia e de prevenção do aumento da exposição de população vulnerável ao risco de contágio.

Como as Associações de Defensores Públicos estão aptas a demonstrar, há milhares de ações de retomada de imóveis em andamento no país, todas interpostas antes do dia 20/03/2020, e que podem chegar ao ponto de execução de liminar ou de sentença definitiva durante o período da pandemia, causando a indesejada exposição da saúde dos atingidos pela decisão e agentes públicos encarregados por sua execução, que devemos evitar nesse momento.

Assim, parece-nos não haver justa razão que justifique essa limitação temporal e que representa elemento contraditório com as intenções da norma e do projeto de lei em questão, razão pela qual propomos a inclusão do seguinte parágrafo único:

Parágrafo único. O disposto no caput deste artigo aplica-se também

nas seguintes hipóteses:

a) Qualquer decisão de desalojamento de imóveis utilizados para fins de moradia, seja de caráter liminar ou definitivo, expedida em qualquer tipo de processo, seja de ações de reintegração de posse coletiva e individual em áreas públicas e privadas, cujo bem seja destinado à moradia, bem como em procedimentos administrativos; b) Ações judiciais ou extrajudiciais que importem na suspensão da retomada em caso de mora em parcelas de aquisição de imóveis, especialmente nos financiamentos habitacionais;

c) Ações judiciais e extrajudiciais de imissão de posse em favor do arrematante ou adjudicante em execuções judiciais.

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4.2DAUSUCAPIÃO–ANÁLISEEPROPOSTAIBDU

O capítulo VII do projeto de lei contém um único dispositivo, que trata da suspensão do prazo de aquisição por usucapião, conforme segue:

Art. 10 Suspendem-se os prazos de aquisição para a propriedade imobiliária ou mobiliária, nas diversas espécies de usucapião, a partir da vigência desta Lei até 30 de outubro de 2020.

O conceito mais usual traduz-se na expressão de Caio Mário da Silva Pereira, em sustenta que “Usucapião é aquisição domínio pela posse prolongada”1

. Assim, dois elementos são essenciais à aquisição por usucapião: a posse e o tempo. Como é sabido, a posse deve ser exercida cum animus domini, afastando-se a mera detenção. Em relação ao requisito temporal, além de ser essencial para distinção das principais modalidades de usucapião, a saber, extraordinária, ordinária ou especial, é fundamental salientar que independentemente da modalidade, a posse deve ser ininterrupta por todo o tempo estendido pela lei2. Assim, não opera a aquisição da propriedade uma vez que ocorra qualquer das causas determinantes da interrupção ou suspensão dela.

Outros importantes elementos, ao lado da posse, do tempo e do animus

domini, conforme Sílvio Luis Ferreira da Rocha3, são: o cumprimento da função

social da propriedade e a paz social, sendo certo que a usucapião estabiliza uma situação que se prolongava no tempo, “transformando uma situação de fato numa situação de direito”.

O projeto de lei, de modo inédito, impõe suspensão do período aquisitivo, significando, por hipótese, que: se suspenso em 20 de março pp. até 30 de outubro de 2020, o prazo voltaria a ser contado a partir dessa última data subsequente.

Entendemos que essa norma em tese não resguarda qualquer espécie de “proteção” ao titular de domínio desidioso, sobretudo pelo não cumprimento da função social da propriedade por parte deste, portanto, não há razão lógica, sequer pertinente ao período excepcional imposto pela pandemia, que admita tal suspensão.

Decerto, tal situação gerada por meio desse dispositivo previsto no PLS nº 1.179/2020, além de não significar qualquer forma de apaziguamento jurídico

1

Instituições de Direito Civil, Direitos Reais, Vol. IV, 27ª ed. São Paulo, 2019, p. 168.

2

In op. cit. P. 171.

3

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por força da pandemia de COVID-19, decerto acarretará insegurança jurídica pela assimetria de trato da matéria, consistente em majoração da proteção jurídica do direito de propriedade em detrimento do princípio da função social da propriedade, ambos objeto de mesma tutela jurídica previstos no art. 5º da Constituição Federal.

Essa instabilidade é majorada ao considerarmos a modalidade de usucapião especial urbano, prevista no art. 183, da Carta Magna.

Sob o aspecto formal, lei ordinária não tem o condão de impor qualquer outro requisito para a declaração do direito, além daqueles previsto na Constituição Federal. Assim, qualquer norma de exceção, como a suspensão do prazo quinquenário a qualquer título, decerto deve ser efetivado por Emenda Constitucional, não se admitindo, sob pena de inconstitucionalidade, que seja introduzido por lei ordinária.

Pela tão somente análise formal, que conclui pela inconstitucionalidade da norma, a mesma deve ser suprimida do projeto de lei. Mas não é só.

Quanto ao plano material, na hipótese, a suspensão do mesmo prazo aquisitivo para todas as modalidades de usucapião, é medida assimétrica e injusta, maltratando o espírito jurídico:

Modalidade de

usucapião

Prazo da posse Proporção do prazo rf

“suspensão” do prazo suprimido pelo PLS 1.179/2020

Extraordinária 15 anos (180 meses) 3,89%

Ordinária 10 anos (120 meses) 5,83%

Especial (urbana ou rural)

5 anos (60 meses) 11,67%

Vale salientar que a população de baixa renda será, por certo, fortemente atingida pela pandemia de COVID-19, mas é justamente essa população que merece o socorro constitucional da USUCAPIÃO ESPECIAL.

Portanto, o dispositivo do PLS nº 1.179/2020, sob a ótica da pandemia, afetará dupla e negativamente essa população, violando princípios e objetivos fundamentais da República Brasileira, como a dignidade da pessoa humana e a erradicação da pobreza e redução das desigualdades: uma vez pela

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vulnerabilidade social ocasionada pelo adensamento populacional em que vivem nos grandes centros urbanos, propiciando serem alvos majoritários do novo coronavírus, e agora pelo art. 10 do PLS nº 1.179/2020, que suspende o prazo para a aquisição prescritiva em 11,67% do quinquênio necessário para a declaração do direito de propriedade.

Pelo exposto, entendemos que o art. 10 do PLS nº 1.179/2020 deve ser suprimido do projeto de lei, ou, alternativamente, que não seja aplicado à usucapião especial, posto que a mesma é de matriz constitucional, e não pode ser restringida por lei ordinária.

Em suma, a medida de suspensão do prazo aquisitivo imposta é assimétrica, na medida em que prejudica muito mais os possuidores de imóveis sujeitos à usucapião especial urbana do que os demais (modalidade extraordinária e ordinária), além de beneficiar os titulares de domínio descumpridores da função social da propriedade.

A aplicação da proteção do direito à moradia, inserto no art. 6º da Constituição Federal, é corolário jurídico aplicável à espécie, inadmitindo, em tempos normais, que a população de baixa renda reste sem a proteção e a paz social exigida pelo instituto, quiçá em tempos de isolamento social tal qual se apresenta agora, justamente o que motivou a propositura do PLS nº 1.179/2020.

Assim, além de inconstitucional e desproporcional no campo formal e material, é de rigor a compreensão que tal dispositivo certamente tem por consequência a instabilidade social, precipuamente considerando o seu principal alvo prejudicado fortemente, que é a população de baixa renda moradora dos centros urbanos. Não restando outra posição jurídica senão a eliminação total do presente dispositivo por meio da competente emenda supressiva.

5.

INSTRUMENTOS ESPECÍFICOS TEMPORÁRIOS PARA PROTEÇÃO DA MORADIA

Na hipótese de inviabilidade de inclusão das medidas preconizadas nessa nota no âmbito do PLS 1.179/2020, sugere-se alternativamente a edição de projeto de lei específico de proteção da do direito à moradia durante a pandemia, seja no âmbito do Congresso Nacional, seja das Assembleias Legislativas estaduais e que possam conter os seguintes instrumentos:

a) Dispositivos em favor do locador que comprovadamente dependa da renda de aluguéis para sua subsistência, fazendo estender a esse

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locador os benefícios que vêm sendo outorgados aos pequenos empresários, MEI, etc., em termos de acesso a renda emergencial ou a crédito subsidiado e adiamento de obrigações tributárias;

b) Condições especiais para o parcelamento de aluguéis em atraso durante o período da pandemia, extensivas às locações não residenciais e às comerciais, nos casos de locatários de pequenas, médias e microempresas, além dos MEI e dos trabalhadores autônomos;

c) Proibição de suspensão do fornecimento de água, energia elétrica, água, gás de cozinha encanado, serviços de telefonia e internet; d) Condições especiais para pagamento das contribuições condominiais

por parte dos moradores dos condomínios edilícios.

Brasília, 14 de abril de 2020.

Nota elaborada pelos Associados:

Adriana Vieira Lima (http://lattes.cnpq.br/1797614329766910)

Alex Ferreira Magalhães (http://lattes.cnpq.br/9383871504452656)

Débora Ungaretti (http://lattes.cnpq.br/0936567156690029)

Luciana Bedeschi (http://lattes.cnpq.br/9791935262172784)

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