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Dinâmicas Regionais ganhadoras e perdedoras na União Europeia durante a globalização económica

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Academic year: 2021

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e PeRdedORAS nA UniãO eUROPeiA

dURAnTe A GLOBALiZAçãO ecOnÓmicA

1

WinninG And LOSinG ReGiOnAL dYnAmicS in THe eUROPeAn UniOn

dURinG THe ecOnOmic GLOBALiZATiOn

Paulo miguel madeira Madeira.paulo@gmail.com

Investigador do Centro de Estudos Geográficos, Edifício da Faculdade de Letras, Alameda da Universidade, 1600-214 Lisboa

ReSUmO/ABSTRAcT O novo contexto geoeconómico decorrente da

globaliza-ção trouxe alterações significativas face à era precedente, pelo que se torna útil tentar perceber como tem evoluído a dinâ-mica socioeconódinâ-mica nas regiões da UE. Dado que a globa-lização pode ser vista como produtora de desenvolvimento desigual entre territórios, foram identificadas as NUTS 2 que mais ganharam e as que mais perderam, em termos absolutos e relativos, a partir de um índice com 11 variáveis. Os resul-tados corroboram a ideia de que a integração económica de-corrente da globalização parece beneficiar as regiões centrais de cada país, gerando dinâmicas que se refletiram na UE de um modo que ajudou algumas regiões com economias mais fortes a ganhar e outras, sobretudo mais fracas, a perder. Palavras-chave: Desenvolvimento Socioeconómico, Globa-lização, Economia Política, Regiões, Europa

Códigos JEL: F59, F63, O18, R11, y40.

The new geo-economic context arising from the eco-nomic globalization induced significant changes vis a vis the previous era. It is therefore useful to try to understand how the EU regions’ socioeconomic dynamics has evolved. Since globalization may be seen as producing uneaven develop-ment between regions, in this study we identify the NUTS 2 regions that gained the most and that lost the most, in abso-lute and relative terms, drawing on an index that combines 11 variables. The results support the idea that the economic integration resulting from globalization seems to benefit the central regions of each country, generating dynamics that in the EU helped some strong economic regions to win and others – mainly with week economies – to loose.

Keywords: Socioeconomic Development, Globalization, Po-litical Economy, Regions, Europe

JEL Codes: F59, F63, O18, R11, y40.

1

1 O trabalho aqui apresentado resulta da dissertação de mestrado Regiões Europeias Ganhadoras e Perdedoras na Globalização

Eco-nómica da Transição do Século XX para o XXI, apresentada ao Instituto de Geografia e Ordenamento do Território da Universidade de Lisboa, sob orientação dos professores Jorge Malheiros e Mário Vale, a quem quero agradecer o enorme apoio que me deram em todas as etapas da minha investigação. Obviamente, as insuficiências ou os erros que ele possa conter são da minha exclusiva responsabilidade.

1. A ReLeVÂnciA de Um cOnTeXTO RecenTe Nas décadas mais recentes ganhou força a ideia de que vivemos num mundo «globalizado», ou «global». Esta ex-pressão tem uma conotação semântica que sugere a ideia de uma integração ou partilha ao nível mundial, ou de uma reunião geral do que antes estava disperso, e

nalgu-ma medida é disso que se trata. O que esteve na origem da consagrada palavra «globalização» foi um conjunto de pro-cessos de vária natureza, mas sobretudo de cariz político--económico, conducentes a uma «economia global», ou a um «capitalismo do mercado global», como lhe chama Má-rio Murteira (2003, 26). Isto é, uniram-se em grande medi-da os mercados (uns mais do que outros…).

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A globalização que nos é contemporânea não é cer-tamente um fenómeno apenas económico, podendo ser identificadas outras dimensões (Malheiros, 2001, 29), como a cultural, a informacional, a da crescente facilidade de transporte que fomenta a imigração e o turismo, tudo isto com consequências sociais de âmbito também global, mas territorialmente diferenciadas. Se é certo que a globaliza-ção das atividades humanas parece ser um dos processos mais marcantes do atual contexto socioeconómico (Stiglitz, 2002; Santos, 2006), é também claro que se tem revelado um fenómeno cuja principal força é a intensificação das relações económicas à escala planetária e o alargamento da escala de muitos mercados, sobretudo de mercadorias.

Este contexto geoeconómico coincidiu com alterações significativas face à precedente era de maior influência keynesiana, pelo que se revela útil tentar perceber como evoluiu a dinâmica socioeconómica nas regiões da União Europeia (UE) no período que se pode considerar de apo-geu desta globalização, aquele em que mais intensamente foram decididas e adotadas as políticas e medidas concre-tas que deram forma ao atual quadro de funcionamento da economia mundial. Esse período é delimitado por dois marcos: o fim do sistema soviético, em 1990 (simbolizan-do o início de um perío(simbolizan-do de hegemonia incontestada (simbolizan-do sistema capitalista), e o início da crise financeira e econó-mica desencadeada em 2007, a partir do sistema financeiro anglo-saxónico.

Justifica-se assim estudar as principais dinâmicas re-gionais europeias, tendo por método a medição das di-ferenças de desempenho socioeconómico. O objetivo foi identificar as dinâmicas mais salientes, para perceber se houve diferenças significativas de desempenho entre as várias regiões e quais foram as que mais ganharam e as que mais perderam, em termos absolutos e relativos, pro-curando identificar padrões geográficos. O interesse desta análise decorre ainda de, conforme nota Reis (2009, 24), «os estudos regionais e as análises dos impactos territoriais das políticas públicas, ao insistirem sobretudo na evolução dos espaços infranacionais», se terem vindo a preocupar «com o objetivo de avaliar os resultados alcançados na coe- são ou na competitividade», com uma lógica que parece contrapor o económico ao social. Ora, na análise aqui em-preendida vai-se além quer da lógica nacional, quer da di-cotomia económico vs. social – se bem que não se ignore a utilidade da distinção entre estas duas dimensões para identificar dinâmicas.

A escala regional das NUTS 2 da UE foi considerada a mais adequada para este tipo de análise, por permitir uma diferenciação significativa dentro da maioria dos seus Esta-dos-membros e por estar disponível no site do serviço esta-tístico da UE um conjunto de variáveis que permite realizar a análise pretendida – para a exequibilidade deste estudo, era fundamental ter o essencial da informação estatística disponível de forma comparável e num local de acesso fá-cil. No entanto, devido às grandes lacunas na informação estatística à escala das NUTS 2 relativa ao início da década de 1990, foi analisado apenas o período de 1995 a 2007.

2. GLOBALiZAçãO e deSenVOLVimenTO deSiGUAL Em função do que já foi exposto, a globalização é en-tendida neste estudo sobretudo como um processo de liberalização das regras que regulam as relações económi-cas internacionais (comerciais, financeiras, de investimen-to), a par de uma facilitação radical das telecomunicações nas suas várias formas (por telefone, televisão, Internet…) e uma forte queda dos preços dos transportes, fundamen-tais para potenciar o desenvolvimento das relações econó-micas e para o aumento da interdependência global das sociedades. Dado o caráter hegemónico que a globaliza-ção assumiu (Santos, 2006), considera-se que ela teve uma influência preponderante sobre as dinâmicas socioeconó-micas, o que, no caso da UE, coexistiu com uma Política de Coesão de envergadura passível de afetar também sig-nificativamente estas dinâmicas.

Para perceber a relação entre os processos da globa-lização económica contemporânea e os diferentes desen-volvimento e bem-estar nas regiões, é útil ter presente a evolução recente das perspetivas sobre o desenvolvimento e o bem-estar regional. As teorias iniciais sobre crescimen-to económico regional eram sobretudo extensões das teo-rias económicas neoclássicas sobre comércio internacional (de Heckscher-Ohlin) e o crescimento económico nacio-nal (Dawkins, 2003, pp. 134 e segs.; Comissão Europeia, 2009, pp. 23 e segs.) e previam uma tendência de fundo de convergência entre regiões em resultado de uma su-posta diminuição, ao longo do tempo, das diferenças entre os preços do trabalho e os de outros fatores de produção. Encontra-se aqui a origem de uma das ideias persistentes nas teorias de crescimento e desenvolvimento regional – a da existência de uma tendência, com o correr do tempo, para a convergência das economias e o desenvolvimento dos territórios no caso de haver comércio mais ou menos livre entre eles.

Em meados do século passado, esta ideia de tendên-cia de fundo para a convergêntendên-cia encontrou respaldo na teoria da base exportadora, desenvolvida quase em simul-tâneo por Charles Tiebout e Douglass North, e na teo-ria neoclássica do crescimento exógeno, desenvolvida por Roy Harrod e Evsey Domar, baseando-se nos efeitos do investimento na base produtiva regional, referindo-se o ad-jetivo «exógeno» a parâmetros exteriores ao modelo que o influenciam, e não a um crescimento com origem fora da região. Esta última teoria recorre a modelos baseados na oferta e no investimento na capacidade produtiva regional e prevê uma forma mais fraca de convergência – a conver-gência condicional (que respeita às taxas de crescimento em equilíbrio de longo prazo dos países e ao nivelamen-to de rendimennivelamen-tos por habitante dentro dos países) – mas também admite como possível nalgumas circunstâncias a convergência dita absoluta, levando à igualização de rendi-mentos entre países; a teoria de base exportadora conside-ra que haverá uma convergência de rendimentos regionais por habitante, à semelhança do que acontece no modelo de Heckscher-Ohlin.

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Após a Segunda Guerra Mundial, e perante a evidên-cia de que vastas regiões, sobretudo dos países do então Terceiro Mundo, não se comportavam de acordo com o padrão de convergência previsto pelos modelos neoclássi-cos, surgiram as primeiras teorias de desenvolvimento que explicavam diferenças persistentes ou mesmo padrões de divergência entre territórios – são os casos da teoria da causalidade cumulativa, de Gunnar Myrdal, e da teoria dos polos de crescimento, de Francois Perroux. Pela mesma altura e nas décadas subsequentes, emergiram várias ou-tras teorias, de tipo estruturalista, como a das etapas de crescimento (de Rostow), as de ciclos de produto e de lucro, as de reestruturação industrial, ou a da especializa-ção flexível, que enfatizam a dependência do crescimento económico de um conjunto de aspetos mais ligado a uma evolução dependente das trajetórias, que ajuda a explicar as diferenças entre territórios. A aplicação da teoria mar-xista aos estudos de desenvolvimento regional, de que Da-vid Harvey foi um dos autores iniciais, pode enquadrar-se também entre as estruturalistas. Harvey e Neil Smith veem a produção de desenvolvimento desigual entre territórios como inerente à lógica do sistema capitalista. As teorias estruturalistas alinham mais com a tese da tendência para a divergência, enfatizando a importância da dependência das economias regionais face às suas trajetórias anteriores, em vez de enfatizarem a importância dos fatores.

A divergência de fundo sobre uma eventual tendên-cia para a convergêntendên-cia ou para a divergêntendên-cia é sintetiza-da por Ricardo Mendez (1997, p. 337): «Segundo os tipos de factores considerados prioritários [internos ou exter-nos], pode estabelecer-se uma primeira dicotomia. Por um lado, as teorias neoclássicas destacam a influência domi-nante dos factores endógenos, internos ao próprio terri-tório, além de pressuporem uma tendência espontânea para a convergência, ainda que com matizes diversas, o que reduz a importância outorgada às políticas públicas de reequilíbrio. Por seu lado, as teorias estruturalistas dão prioridade às relações interterritoriais (factores externos) e interpretam que a lógica do mercado favorece um reforço das desigualdades, ainda que também neste caso essa opi-nião esteja submetida a numerosas matizações».

Se bem que com raízes anteriores, nas décadas mais recentes (já durante a fase mais intensa da atual globali-zação neoliberal) ganharam força quer uma perspetiva do desenvolvimento regional ligada à importância dos agen-tes regionais e das instituições políticas, quer uma outra ligada a novas teorias neoclássicas, que tenta responder às críticas às teorias anteriores desta corrente (Dwakins, 2003, pp. 146 e segs.). Centram-se mais em fatores endógenos do que exógenos, apesar de também darem atenção a es-tes últimos.

Nas perspetivas neoclássicas recentes, pode-se identi-ficar a teoria do crescimento endógeno e a nova geografia económica. A primeira destas teorias modifica vários pres-supostos dos anteriores modelos neoclássicos do cresci-mento exógeno, aumentando assim o leque de previsões possíveis quanto à trajetória das economias e ao

desen-volvimento dos territórios. Por exemplo, Nijkamp e Poot (1998, apud Dawkins, p. 147) alargam o enquadramento deste modelo a aspetos espaciais como a mobilidade dos fatores, a difusão espacial das inovações e o comércio in-ter-regional e demonstram que, quando estas interações entre regiões são incluídas num modelo de crescimento endógeno, tanto se poderá obter convergência absoluta como convergência condicional ou mesmo divergência en-tre regiões – dependendo das especificações que se atri-buam ao modelo.

Na nova geografia económica, cujo mecanismo-base subjacente foi explicado por Krugman (1991) num arti-go seminal, é adotado um modelo núcleo-periferia que o próprio autor reconhece como «sobressimplificado», para demonstrar que os baixos custos de transporte, bem como um maior peso das atividades industriais e maiores possibilidades de economias de escala, num ambiente de comércio livre, militam a favor da divergência regional. «Com custos de transporte mais baixos, uma maior quota da indústria, ou maiores economias de escala, a causali-dade circular instala-se, e a indústria vai concentrar-se na região que avançar primeiro» (Krugman, 1991, p. 497), mesmo que esse avanço inicial tenha acontecido por ra-zões casuais.

A ideia/hipótese de que, a partir de certo ponto, a que-da dos custos do comércio e a maior liberque-dade de troca que isso acarreta irão induzir a aglomeração das ativida-des é vista como «a marca» da nova geografia económica por Brakman et al. (2006, p. 629). Dado que a forte queda dos custos dos transportes foi uma das características mais salientes da atual globalização, bem como a liberalização do comércio internacional, esta teoria revela-se bastante adequada ao contexto de fundo da economia mundial, na qual a economia europeia se insere.

As várias teorias do crescimento/desenvolvimento eco-nómico têm manifestas insuficiências – por exemplo, as premissas dos modelos neoclássicos são demasiado sim-plistas e rígidas –, mas têm o mérito de nos apontarem uma série de mecanismos e processos que atuam, ou podem atuar, nos vários contextos regionais, inter-regionais e histó-ricos (que variam em função da evolução das tecnologias, dos arranjos institucionais e dos enquadramentos regulado-res em geral). A importância que aspetos como a dotação em (e preços dos) fatores, o comércio internacional, o in-vestimento na capacidade produtiva regional, o papel dos agentes e das instituições, os custos dos transportes, a ino-vação tecnológica e de processos, entre outros, podem ter no crescimento e no desenvolvimento de uma dada região ou conjunto de regiões, bem como o resultado em termos de convergência ou divergência a prazo ao nível inter-re-gional, dependem quer das características de partida e das dinâmicas que se gerarem em cada região, quer da inserção que elas lhes permitirem obter na economia inter-regional (ao nível nacional e ao nível internacional, no caso de ha-ver comércio externo mais ou menos livre).

Na UE da viragem do século XX para o XXI, sobressa-em o contexto de globalização da economia e de

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inova-ção, sobretudo tecnológica, a qual tem maior relevo nas regiões com economias à partida mais fortes. Na globali-zação atual, assumem relevo a liberdade de comércio e de circulação de capitais e a forte queda dos custos dos trans-portes e das comunicações, que concorrem mais para a divergência, ou pelo menos para a não-convergência, en-tre territórios, segundo uma das duas grandes linhas teó- ricas existentes – a qual se revela a mais adequada nesta análise, dado o atual contexto da economia política euro-peia e internacional.

Na UE, a existência de uma Política de Coesão de lon-ga tradição e com ênfase nas regiões não deixa de ser o reconhecimento de que, sem uma intervenção corretora, as forças de mercado dominantes poderiam levar a tendên-cias de divergência, ou pelo menos de não-convergência num prazo razoável. Ora, dado o contexto de forte libe-ralização associado às regras das relações económicas às várias escalas nas décadas mais recentes, não era à partida óbvio que forças tinham preponderado na UE, a diferentes escalas, durante o período de globalização mais intensa.

É ainda de referir que crescimento, normalmente asso-ciado a um aumento do PIB, nem sempre é sinónimo de desenvolvimento regional, o qual abrange outras dimen-sões da vida social não estritamente produtivas e implica um aumento do nível de bem-estar das populações cujas principais dimensões são especificadas no ponto seguin-te. Muitas vezes, o crescimento acarreta desenvolvimen-to, mas nem sempre tem de ser assim. Por outro lado, o desenvolvimento pode ser induzido a partir do apoio prestado por regiões economicamente mais fortes a ou-tras mais fracas – a lógica da solidariedade nacional ou europeia – e isso em princípio induzirá pelo menos algum dinamismo económico. Outra distinção poderá ser feita entre crescimento e desenvolvimento económico – este último pressupõe um aumento da qualificação da econo-mia de um território, o que nem sempre acontece quando há crescimento.

A relação entre globalização e desempenho socioe-conómico regional é explicada por David Harvey (2000), sem no entanto se referir especificamente à escala regio-nal. Este autor vê «o processo de globalização como um processo de produção de desenvolvimento desigual, tem-poral e geográfico» (p. 60)1, com a vaga neoliberal a

tor-nar «a violência da destruição criativa do desenvolvimento desigual (através, e.g., da reorganização geográfica da pro-dução) tão amplamente sentida nos centros tradicionais do capitalismo como nos outros locais» (idem, pp. 69-70)2.

Mais tarde, referiu-se no entanto à «extrema volatilidade» dos destinos através e entre espaços da economia mundial,

1 No texto original: «[we can, I think, better understand] the

process of globalization as a process of production of uneven temporal and geographical development».

2 No original: «[the efect is to make] the violence and creative

destruction of uneven geographical development (through, e.g., geographical reorganization of production) just as widely felt in the traditional heartlands of capitalism as elsewhere…».

«em todos os tipos de diferentes escalas» (Harvey, 2005, 55)3 – e portanto também à escala regional.

Uma evidência empírica que parece ir ao encontro da ideia de produção de desenvolvimento desigual pela glo-balização é o facto de, no Relatório Barca (Comissão Eu-ropeia, 2009, 4), ter sido notada, desde os finais da década de 1980, e com mais intensidade a partir do início da déca-da de 1990, uma forte tendência de divergência entre as re- giões da Europa Ocidental. E porquê? «A integração econó-mica e a globalização estão a libertar forças que parecem estar a beneficiar as regiões centrais de cada país, frequen-temente em detrimento da periferia. Isto está a acontecer virtualmente por todo o mundo» (id., ibid.) – o que é um forte argumento a favor do interesse do estudo do que se passou nas regiões europeias nos anos subsequentes.

A relação entre a integração económica decorrente da globalização neoliberal e tendências de concentração das atividades produtivas é também abordada por Allen J. Scott e Michael Storper (2003), que evocam explicações segun-do as quais, entre o final segun-do século XIX e o início segun-do sé-culo XX, a formação da economia atlântica se deu com base em fortes processos de aglomeração na Europa e na América, que foram possíveis em função das crescentes economias de escala decorrentes de um mercado alarga-do, o que deu margem aos principais centros de produção para manterem as suas posições dominantes. Para estes autores, a globalização atual parece ter por base processos semelhantes. Nesta linha, os processos globalizadores que geram concentração por efeito da mundialização de mui-tos mercados são justamente uma das forças que atua no sentido da divergência, no mínimo económica – a concen-tração da produção nalguns territórios implica algum esva-ziamento, pelo menos relativo, de outros.

Por outro lado, conforme lembra Mário Vale (2007, 467), a globalização «tem sido identificada por vários au-tores como um processo que favorece o crescimento das cidades, em grande medida devido às necessidades de centração, em nós do sistema urbano, de funções de con-trolo da economia global». Outra ideia que ajuda a explicar a importância crescente da concentração da atividade é a de que as dinâmicas de inovação, com importância cres-cente para as economias desenvolvidas num contexto de mercados planetários, beneficiam da diversidade caracte-rística dos centros urbanos. Estas vantagens adicionais (de caráter mais funcional, que se somam às de escala antes re-feridas) da localização nos centros urbanos reforçam as for-ças de divergência interterritorial, a que se somam ainda as dos contextos territoriais particulares em que as dinâmicas de inovação se geram e dão mais resultados. Isto porque a inovação que mais rendimentos gera é a que expande as fronteiras do saber e se aplica no topo das cadeias tecno-lógicas, o que é típico das regiões ou dos centros urbanos que à partida já estão entre os mais desenvolvidos. Ora,

3 No original: «The extreme volatility in contemporary

politi-cal economic fortunes across and between spaces of the world economy (at all manner of different scales)…»

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num espaço de escala continental como o europeu, é pra-ticamente impossível que a generalidade das suas regiões tenha economias com uma forte componente de inovação endógena que expanda continuadamente as fronteiras do conhecimento e da sua aplicabilidade – e portanto haverá aqui mais um processo atuante no sentido da divergência.

Apesar do significado mais ou menos óbvio do que é «ganhar» e «perder», é necessário estabelecer com rigor o que isso significa no contexto deste estudo, em termos de desenvolvimento regional, ou de dinâmica socioeconómica das regiões. Para isso, é útil o texto de O’Brien e Leichenko (2003) onde é explicitada a diferença entre ganhadores e perdedores, em termos absolutos e relativos, em processos de mudança estrutural em que a distribuição dos impactos é desigual.

Com base num trabalho de Gruber (2000), O’Brien e Leichenko explicam que «ganhos ou perdas absolutas são avaliados com base apenas na comparação do estado de um indivíduo (nação) antes e após o acontecimento. Se um indivíduo (nação) está melhor após o acontecimen-to, então o indivíduo ou nação deve ser considerado um ganhador absoluto. Ganhos e perdas relativos dependem da comparação com a situação dos outros» (O’Brien e Lei-chenko, 2003, p. 90).

Nesta segunda aceção de ganhar e perder, entre dois indivíduos, países ou – no caso presente – regiões que fiquem melhor no final do acontecimento, o que ganhar mais será o ganhador relativo; e o que ganhar menos será considerado o perdedor relativo. Estas classificação e con-ceção de vencedores e perdedores absolutos e relativos poderão ser adotadas para um conjunto alargado de uni-dades de análise, como é o caso neste estudo dos 27 Es-tados-membros e 264 NUTS 2 da UE (das quais só foram consideradas 259 por ausência de dados para as NUTS 2 da Dinamarca, analisada enquanto país).

3. mediçãO dO deSemPenHO SOciOecOnÓmicO ReGiOnAL ATRAVéS de Um Índice cOmPÓSiTO

A noção de desempenho socioeconómico regional, em relação à qual se avaliam aqui ganhos e perdas, tem implí-cita a ideia de que os níveis de bem-estar e de produção e a dimensão das sociedades – em territórios de escala regio-nal, mas também a outras escalas – podem variar ao longo do tempo, a ritmos diversos em regiões diferentes, e sabe--se que de facto isso acontece. O desempenho socioeco-nómico regional será assim, em grande medida, correlativo da ideia de desenvolvimento regional, mas numa perspe-tiva dinâmica, mais centrada na sua evolução no tempo.

A ideia de desenvolvimento regional não tem na sua ori-gem uma definição de desenvolvimento específica para esta escala de análise, decorrendo antes das ideias de desen-volvimento económico e de bem-estar social desenvolvidas genericamente, e aplicadas em primeiro lugar a Estados na-cionais. Nas últimas décadas, têm surgido abordagens cada vez mais abrangentes, que alargam as dimensões de bem--estar a considerar. Operacionalizadas geralmente também à

escala dos Estados soberanos nacionais, elas não deixam de ser transponíveis para outras escalas territoriais.

Por vezes, a noção de desenvolvimento mais limitada à produção económica é também desafiada a partir da área dos estudos regionais, onde durante muito tempo e para muita gente a definição do desenvolvimento económico regional «tem sido uma não-questão», tendo o significado e a substância da «economia» sido vistos como «autoevi-dentes» (Hudson, 2007, 1156). Talvez reflexo das perspe-tivas tradicionais restriperspe-tivas, as estatísticas disponíveis no Eurostat à data da realização deste estudo eram também bastante limitadas, como já foi dito, o que não permitiu construir um índice compósito com a pretendida abran-gência de indicadores que possibilitasse refletir todas as dimensões desejáveis.

A informação estatística relativa às regiões europeias disponível no sítio eletrónico do Eurostat incidia sobretu-do em medidas de produção económica e características da força de trabalho. Não havia dados com informação ambiental e sobre recursos naturais, nem sobre a dimen-são cívica e da satisfação das populações. Existiam ainda dados demográficos e outros relativos a alguns aspetos considerados mais «sociais». Esta informação permitiu a construção de um indicador-índice que corresponde ao estádio social da medição do progresso e bem-estar, o qual foi designado por «Índice de Desempenho Económi-co-Social» (IDES).

Parte dos dados teve ainda de ser transformada em in-dicadores para o cálculo do IDES (ver Quadro 1), os quais foram organizados tematicamente em três dimensões – de-mográfica, social e económica –, porque assim é mais fácil isolar as suas principais componentes e, ao mesmo tempo, dar coerência ao contributo de cada variável utilizada, fa-cilitando a posterior análise dos resultados.

Como o objetivo do índice elaborado a partir destes indicadores é perceber os desempenhos socioeconómicos das regiões num período circunscrito, e não tanto medir o seu nível de desenvolvimento e a sua sustentabilidade, a inclusão de indicadores ambientais não seria particular-mente útil, ao contrário do que aconteceria em relação à avaliação do bem-estar pelas populações. Outra lacuna importante é a ausência de dados sobre a distribuição de rendimentos e a sua evolução, bem como sobre outros as-petos que pudessem deixar perceber outras dimensões das desigualdades.

A escolha da informação a usar teve já em conta as várias limitações da base de dados regionais do Eurostat, quer quanto ao início das séries, quer quanto a lacunas de informação relativas às regiões de determinados países, ou a parte delas, nalguns anos ou na totalidade do perío-do abrangiperío-do. Estas considerações acabaram por condi-cionar também a escolha das variáveis a utilizar. Nalguns casos, isso levou a optar por uma variável em detrimento de outra que poderia ser mais apropriada para o que se pretendia medir. Foi o que aconteceu, por exemplo, com a escolha da população ativa que completou o ensino se-cundário superior e da população ativa que completou um

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nível de ensino superior, em detrimento de indicadores so-bre os estudantes por nível de ensino.

As referidas faltas de dados nas variáveis e no perío-do selecionaperío-dos obrigaram então à elaboração de estima-tivas, e nalguns casos também a buscar noutras fontes. Nalgumas variáveis, há poucas falhas, cujos valores po-dem ser estimados com relativa facilidade – são os casos da população e do PIB. Mas noutras as dificuldades são maiores, como no emprego em setores de alta tecnologia ou nas autoestradas.

Em vários países houve alteração de limites das suas NUTS 2, o que resultou em ausência de dados para essas regiões nalguns anos, obrigando a fazer estimativas. O princípio geral adotado para fazer estimativas foi o de as-sumir que, nos períodos para que não existem dados para uma dada NUTS 2, as dinâmicas terão sido iguais às dos períodos mais próximos para os quais existem valores, ou iguais às das regiões de nível superior em que estão inse-ridas (NUTS 1), ou mesmo às do seu país (no caso de não haver dados para as suas NUTS 1).

Nalguns casos, não existiam valores para um dos anos pretendidos nem para as regiões, nem para o país; assim, foi primeiro estimado o valor nacional com base na va-riação média ocorrida nos anos mais próximos para que há dados, num período correspondente ao número de anos decorridos entre o valor pretendido (1995 ou 2007) e o ano do primeiro valor disponível, e depois aplicado o mesmo método acima descrito para a obtenção dos valo-res regionais a partir dos valovalo-res nacionais4.

Passou-se então à construção do Índice de Desempe-nho Económico-Social (IDES), segundo uma metodologia idêntica à que o Programa das Nações Unidas para o De-senvolvimento (PNUD) utiliza para o cálculo do seu Ín-dice de Desenvolvimento Humano (IDH) (PNUD, 2011). Assim, cada indicador obtido foi transformado num índice com valores entre 0 e 1, que traduz uma medida norma-lizada da posição de cada região em cada uma das di-mensões que esses indicadores representam, funcionando cada um desses índices como um subíndice do indicador sintético final.

Com esse objetivo, foram estabelecidos valores má-ximos e mínimos (balizas) para cada variável, que per-mitiram transformá-la em índice. Os valores máximos e mínimos escolhidos foram o máximo e mínimo registado para cada uma delas entre o conjunto dos valores obtidos, em cada variável, para todas as regiões nos dois anos que balizam este estudo. Como o objetivo primeiro é a compa-ração das dinâmicas regionais no período de 1995 a 2007, não se torna relevante para as comparações a realizar sa-ber quais são os valores máximos ou mínimos em cada um dos anos do período em análise ou obter valores mínimos que retratem o percurso feito num período mais prolonga-do (com início antes de 1995).

4 Para uma descrição completa dos procedimentos de recolha

e tratamento da informação e de elaboração das estimativas, ver Madeira, 2012, 65 e seguintes e Anexo I.

Definidos os máximos e mínimos para cada indicador, o subíndice é calculado segundo a seguinte fórmula:

Valor observado valor mínimo Índice do indicador

Valor máximo valor mínimo

=

− (1)

Como a transformação de rendimento em bem-estar se dá em princípio segundo uma função côncava (ver Pickett e Wilkinson, 2009; PNUD, 2011), para o PIB e os rendi-mentos dos agregados utilizou-se o logaritmo natural dos valores indicados na fórmula acima, que assim se trans-forma em:

(

)

(

)

Ln ln( )

Ln ln( )

valor observado valor mínimo Índices de PIB

e de rendimentos valor máximo valor mínimo

=

(2)

Concluída esta tarefa, as variáveis foram agrupadas nas respetivas dimensões temáticas, com vista ao cálculo dos subíndices demográfico, social e económico (tal como consta do Quadro 1), que foram depois utilizados para cal-cular o Índice de Desempenho Económico-Social (IDES) geral nos dois anos. As ponderações com que cada variá-vel entrou no cálculo dos subíndices e as ponderações dos subíndices para o cálculo do IDES estão assinaladas na co-luna da direita.

A construção/conceção de indicadores sintéticos desta natureza reflete sempre uma determinada perspetiva sobre a(s) realidade(s) que estão em estudo, pelo que importa explicitar sucintamente as razões que conduziram às pon-derações (ou aos pesos) indicados no Quadro 1. Taxa de crescimento da população, densidade populacional e peso da população com menos de 65 anos são variáveis de índo-le estritamente demográfica, que por isso foram agrupadas num subíndice. O menor peso atribuído à densidade po-pulacional resulta de a sua variação ser uma função da va-riação populacional num dado período, aspeto que já está incorporado numa outra destas variáveis – a taxa de cresci-mento da população.

Um teste de sensibilidade a diferentes pesos das vari-áveis que compõem o subíndice demográfico aponta ali-ás nesse sentido. O subíndice demográfico foi calculado com peso igual das três variáveis que o compõem (um terço, ou 33,33%, para cada) e com o peso que acabou por ser adotado no IDES (40% para a taxa de crescimento da população, 20% para a densidade populacional e 40% para a população com menos de 65 anos). No primeiro caso, os valores da sua variação entre 1995 e 2007 têm um padrão de 0,058, e no segundo caso um desvio--padrão de 0,070, e valores muito próximos dos respeti-vos coeficientes de variação. Para o cálculo do subíndice social, a utilização da esperança de vida à nascença e dos médicos/100 000 habitantes resulta da natureza deste tipo de indicadores, vistos em geral como eminentemen-te sociais. A utilização da população ativa com o ensino secundário superior e da população ativa com um grau de ensino superior pretende ser uma aproximação dos ní-veis de instrução/qualificação da população, para os quais

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não havia dados regionalizados. Entendeu-se também que a utilização destes dois níveis de qualificação seria mais adequada do que apenas um deles, por permitir entrar em consideração com realidades de qualificação bastante diversas entre os países da UE, sem beneficiar

despropor-cionadamente perfis de evolução mais específicos. Por re-presentarem a mesma dimensão social – qualificação da população –, estas duas variáveis têm no seu conjunto o mesmo peso no subíndice social que cada uma das outras duas utilizadas.

QUAdRO 1. A eSTRUTURA dO ideS

Índices Variáveis/índices incorporados Primeiro ano dos

dados utilizados

Peso da variável

Subíndice demográfico – Taxa de crescimento da população (%) no triénio anterior

– Densidade populacional

– População com menos de 65 anos (%)

1995 1995 1995 40% 20% 40%

Subíndice social – Esperança de vida à nascença

– Médicos/100 000 habitantes

– População ativa com o ensino secundário superior – População ativa com um grau de ensino superior

1995 1995 1999 1999 33,33% 33,33% 16,66% 16,66%

Subíndice económico – Emprego (%) em setores de alta tecnologia

– Rendimento disponível líquido dos agregados (PPC) – PIB/habitante a preços correntes de mercado PPC

– Km de autoestradas por 1000 km2 1995 1995 1995 1995 40% 20% 20% 20% Índice de Desempenho Económico-Social (IDES) Subíndice demográfico Subíndice social Subíndice económico --30% 30% 40%

O emprego em setores de alta tecnologia foi incorpo-rado no subíndice económico com o dobro do peso atri-buído às outras variáveis utilizadas (rendimento disponível líquido dos agregados, PIB/habitante PPC e quilómetros de autoestradas por 1000 km2) porque representa um

as-peto fundamental das economias europeias nos anos mais recentes – a intensidade da sua especialização tecnológica, crítica para a produtividade e a inovação das economias mais desenvolvidas. Havia algum risco de que as variáveis rendimento disponível líquido dos agregados e PIB/ habi-tante PPC fossem redundantes para a medição da evolução no período de 1995 a 2007, por representarem em parte a mesma realidade. No entanto, a correlação linear entre a variação dos dois índices neste período tem um valor de R2 de 0,5048, o que exclui essa hipótese.

Finalmente, a rede de transportes é um dos aspetos da infraestrutura física que é indispensável ao funcionamento da economia, e por essa razão a densidade de autoestradas foi incluída neste subíndice. No entanto, por as infraestru-turas, e em particular as autoestradas, não refletirem neces-sariamente o dinamismo económico (podem por exemplo assegurar em grande parte uma função de simples atraves-samento), este indicador entrou no subíndice com metade do peso do emprego em alta tecnologia, ficando a dimen-são da infraestrutura com metade do peso das outras duas – intensidade tecnológica e produção/consumo.

Neste caso, a ponderação escolhida para o peso das quatro variáveis no subíndice permite uma maior

dife-renciação da evolução do valor do índice das regiões no período em análise do que dando igual peso às quatro va-riáveis – desvio-padrão de 0,050 e coeficiente de variação de 0,643, face a, respetivamente, 0,040 e 0,3855.

Passou-se depois à construção do índice global (o Ín-dice de Desemprenho Económico-Social), para o que a ponderação do peso de cada um dos três subíndices foi também definida atendendo a várias considerações e a tes-tes de sensibilidade.

A opção por um peso da dimensão demográfica idên-tico ao da social e ao da económica justifica-se atenden-do a que o envelhecimento da população e a dramática quebra de natalidade nalguns países europeus, para ní-veis substancialmente inferiores ao limiar da substituição de gerações, podem comprometer o bem-estar em muitos territórios se persistirem prolongadamente. Num contex-to de potencial retração demográfica e significativo enve-lhecimento, a demografia vai condicionar o mercado de trabalho, a sustentabilidade da produção e do consumo e o bem-estar geral das populações, sendo de admitir que os seus efeitos entronquem quer na dimensão económi-ca, quer na dimensão social do bem-estar, mas sobretudo nesta última. Esta é uma das razões por que se atribuiu um peso um pouco maior ao subíndice económico.

5 Foram testadas outras combinações de peso das variáveis,

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Houve quatro testes com diferentes ponderações dos três subíndices do IDES, conforme consta do Quadro 2.

QUAdRO 2. TeSTeS de SenSiBiLidAde PARA POndeRAçãO dO ideS

Teste 1 Teste 2 Teste 3 Teste 4

Peso do Subíndice Demográfico 33,33% 20% 30% 30% Peso do Subíndice Social 33,33% 40% 35% 30% Peso do Subíndice Económico 33,33% 40% 35% 40% IDES 100,00% 100% 100% 100% Desvio-padrão da variação dos valores regionais 0,034 0,032 0,033 0,038 Coef. da variação dos valores regionais 0,532 0,288 0,486 0,486

Seguindo o mesmo critério adotado para a definição do peso de cada variável utilizada no cálculo dos três su-bíndices, optou-se por utilizar o IDES com a ponderação que mais permite diferenciar a variação dos seus valores para o conjunto das regiões europeias entre 1995 e 2007 – o que resultou do Teste 4.

Para a análise dos resultados (os valores do IDES e da sua variação entre 1995 e 2007), e em função do que foi explicado no ponto anterior, «ganhar» em termos absolutos é ter em 2007 um valor do IDES superior ao de 1995, e «perder» em termos absolutos será ter em 2007 um valor in-ferior ao de 1995. Em termos relativos – a perspetiva mais relevante – «ganhar» será, para uma dada região, ter uma variação deste indicador entre 1995 e 2007 superior à da média das regiões consideradas. Inversamente, as regiões «perdedoras» em termos relativos serão as que tiverem uma variação do IDES inferior à da média do conjunto das re-giões entre 1995 e 2007.

Com base nos valores obtidos, foi cartografada a varia-ção do IDES e dos seus três subíndices entre 1995 e 2007, e também os seus valores neste último ano (nem todos os mapas constam deste artigo; ver Madeira, 2012, pp. 88 e segs.), o que permite visualizar espacialmente o desempe-nho relativo das regiões no período em estudo, e também as suas posições quanto ao bem-estar em 2007. Os mapas foram elaborados num programa de cartografia eletróni-ca (o ArcMap10), utilizando-se 260 unidades de análise, atendendo aos condicionamentos e especificidades já ex-postos. Para efeitos de representação em cada um destes mapas, o ArcMap dividiu as regiões em cinco classes, com base no respetivo diagrama de dispersão, segundo o méto-do de agrupamento na rutura natural de Jenks.

A opção pela análise da variação do valor dos índices, em vez da sua variação percentual, como medida da evo-lução da situação socioeconómica nas regiões, foi vista

como mais adequada porque o que se pretende compa-rar é a evolução das diferenças entre regiões num perío-do relativamente longo, e não a velocidade relativa de alteração dessas diferenças com base no ponto de partida de cada uma delas (nesse caso, sim, seria mais indicado utilizar a variação percentual no período, ou uma taxa média anual). Utilizar a variação dos valores do índice tem a vantagem de eliminar o efeito de, em regiões com pontos de partida muito baixos, pequenos aumentos ou recuos dos valores dos índices poderem corresponder a variações percentuais muito significativas, que no entanto traduzem variações absolutas menores do que em regiões com pontos de partida mais elevados e menor crescimen-to percentual.

4. deSemPenHOS nAciOnAiS e ReGiOnAiS O valor do IDES subiu 15,5% nos 12 anos que vão de 1995 a 2007, de 0,340 para 0,393 pontos, mostrando que este foi um período de desempenho geral positivo em ter-mos de bem-estar, se considerarter-mos que ele está de algum modo refletido neste índice. A subida do IDES resulta da evolução das suas componentes económica e social, onde se registam subidas de respetivamente 37,2% e 26,0%, ao invés do que se regista na dimensão demográfica, com uma descida de 9,2%.

Os avanços mais significativos do IDES neste período ocorreram na maioria dos casos em países que em 2007 estavam com os melhores valores, sendo a Espanha a úni-ca exceção óbvia, pois em 2007 registava um valor ape-nas ligeiramente acima da média europeia, apesar de ter uma das maiores subidas nacionais do IDES. Por outro lado, as melhores evoluções ocorreram também em países que em 1995 já tinham situações relativamente mais fa-voráveis, como são os casos do Luxemburgo e da Irlanda (ver Quadro 3), ou próximas da média da atual UE com 27 Estados-membros. Entre o grupo inicial de países que mais recebiam fundos europeus (Irlanda, Espanha, Grécia e Portugal) com vista à coesão económica e social, Portu-gal e a Grécia tiveram uma evolução pouco superior à do conjunto da UE neste período, chegando assim a 2007 com valores do IDES abaixo da média da União.

Ao nível regional, houve diminuição dos valores do ín-dice em 13 NUTS 2, sobretudo italianas e também alemãs, o que faz delas perdedoras em termos absolutos. Estão nesta situação também Malta (país que corresponde a uma NUTS 2), uma região francesa e outra romena. Todas as outras podem ser vistas como ganhadoras em termos ab-solutos, embora com situações muito diversas – pois algu-mas são perdedoras em termos relativos. As regiões mais ganhadoras e mais perdedoras em termos absolutos são também as mais ganhadoras e mais perdedoras em ter-mos relativos. Quanto às outras, as dinâmicas ganhadoras e perdedoras podem diferir, conforme registem subidas ou descidas no IDES substancialmente superiores ou inferio-res à média.

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QUA d RO 3. Í ndice de de Sem P en HO ec O n Ó mic O-SO ci AL e SUBÍ ndice S POR P AÍS Índice total ( ide S) Índice demográfico Índice social Índice económico Ind 1995 Ind 2007 Variação Ind 1995 Ind 2007 Variação Ind 1995 Ind 2007 Variação Ind 1995 Ind 2007 Variação UE (27 países) 0,340285 0,393033 0,052748 0,426659 0,387618 -0,03904 0,432993 0,545693 0,112701 0,205973 0,282599 0,076625

UE (sem territórios extra eur

opeus) 0,340263 0,393128 0,052865 0,425896 0,386869 -0,03903 0,433273 0,54617 0,112898 0,206281 0,283041 0,07676 Bélgica 0,382538 0,444642 0,062104 0,413648 0,398922 -0,01473 0,478722 0,603673 0,124951 0,287067 0,359658 0,072591 Bulgária 0,242943 0,275952 0,033008 0,364908 0,320602 -0,04431 0,316549 0,4305 0,113951 0,096266 0,126553 0,030287 República Checa 0,342264 0,392375 0,050112 0,450013 0,43243 -0,01758 0,422125 0,535614 0,113489 0,201556 0,254905 0,053349 Dinamarca 0,371673 0,42637 0,054697 0,418188 0,415532 -0,00266 0,462382 0,557767 0,095385 0,268755 0,335951 0,067196 Alemanha 0,382437 0,416432 0,033995 0,429926 0,293821 -0,13611 0,468932 0,608841 0,139909 0,281948 0,364082 0,082134 Estónia 0,226869 0,31563 0,088761 0,29885 0,342664 0,043814 0,310404 0,467613 0,157209 0,110232 0,181367 0,071135 Irlanda 0,382483 0,509043 0,12656 0,510672 0,639581 0,128909 0,34441 0,554233 0,209823 0,314897 0,377247 0,062351 Grécia 0,309585 0,366222 0,056637 0,458136 0,34795 -0,11019 0,461523 0,626481 0,164958 0,084218 0,184732 0,100514

Espanha (sem poss. Marr

.) 0,299568 0,415844 0,116276 0,417708 0,469189 0,051481 0,393455 0,573614 0,180158 0,140547 0,257509 0,116962 França (metr opolit.) 0,379881 0,428579 0,048699 0,425686 0,413503 -0,01218 0,474005 0,587147 0,113141 0,274933 0,320961 0,046028 Itália 0,364908 0,392007 0,027099 0,375066 0,339251 -0,03582 0,542516 0,567791 0,025275 0,224083 0,299736 0,075653 Chipr e 0,347293 0,428628 0,081335 0,635033 0,598934 -0,0361 0,400563 0,555409 0,154846 0,091536 0,205813 0,114277 Letónia 0,200987 0,26934 0,068353 0,326426 0,321939 -0,00449 0,289584 0,393433 0,103849 0,040461 0,136822 0,096361 Lituânia 0,266194 0,28814 0,021946 0,430567 0,35333 -0,07724 0,288936 0,42473 0,135794 0,125859 0,136805 0,010946 Luxembur go 0,391347 0,528065 0,136717 0,513016 0,522295 0,009279 0,401665 0,508864 0,107199 0,292357 0,546792 0,254435 Hungria 0,27749 0,340715 0,063224 0,416322 0,372309 -0,04401 0,316584 0,38876 0,072177 0,144047 0,280984 0,136937 Malta 0,404435 0,40217 -0,00227 0,572859 0,496564 -0,0763 0,316672 0,459838 0,143166 0,343939 0,288124 -0,05582 Países Baixos 0,391954 0,467574 0,07562 0,489646 0,433953 -0,05569 0,455005 0,617142 0,162136 0,271396 0,380614 0,109217 Áustria 0,382541 0,43579 0,05325 0,439792 0,396695 -0,0431 0,491569 0,647486 0,155917 0,257832 0,30634 0,048509 Polónia 0,285211 0,317358 0,032146 0,509049 0,435655 -0,07339 0,321272 0,409956 0,088684 0,090287 0,159186 0,068899 Portugal 0,26346 0,319956 0,056496 0,420473 0,377866 -0,04261 0,301081 0,454667 0,153586 0,117485 0,17549 0,058005 Roménia 0,222994 0,250193 0,027199 0,414326 0,392698 -0,02163 0,237728 0,331527 0,093799 0,068444 0,082313 0,013869 Eslovénia 0,31659 0,376588 0,059998 0,459062 0,397689 -0,06137 0,350798 0,508576 0,157778 0,18408 0,261771 0,077691 Eslováquia 0,357288 0,429332 0,072045 0,520612 0,478865 -0,04175 0,484286 0,638185 0,153899 0,139546 0,235544 0,095998 Finlânida 0,332686 0,433969 0,101282 0,449751 0,391485 -0,05827 0,385328 0,567988 0,18266 0,205406 0,365317 0,15991 Suécia 0,387737 0,450101 0,062364 0,387494 0,380672 -0,00682 0,53999 0,648698 0,108708 0,273731 0,353226 0,079495 Reino Unido 0,323709 0,427274 0,103565 0,403161 0,421219 0,018057 0,369941 0,545695 0,175754 0,229446 0,343 0,113554 Nota: Os valor es sombr

eados a cinzento incorporaram no seu cálculo pelo menos um valor estimado ou de outra fonte que não o Eur

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A Figura 1, relativa à variação do IDES, mostra que o desempenho socioeconómico foi mais forte na generalidade das regiões espanholas e britânicas, na Irlanda, na Finlândia, na Estónia e em Chipre. Além destes países, destacam-se também a maioria das regiões das cidades capitais. Pelo

con-trário, a maior parte das regiões do Leste Pós-Soviético aca-bam por ser perdedoras relativas, bem como a maioria das regiões italianas e alemãs (especialmente dos novos Länder) – apesar de, na maioria dos casos, a subida do valor do IDES mostrar que foram «ganhadoras» em termos absolutos. FiGURA 1. VARiAçãO dO Índice de deSemPenHO ecOnÓmicO-SOciAL (ideS), 1995-2007

0,110 - 0,193 0,074 - 0,109 0,047 - 0,073 0,020 - 0,046 -0,223 - 0,019 Variação do índice ! ! ! ! ! ! !Acores Guyane Madeira Réunion Canarias Martinique Guadeloupe 0 250 500 km

FiGURA 2. Índice de deSemPenHO ecOnÓmicO-SOciAL (ideS), 2007

! ! ! ! ! ! ! Acores Guyane Madeira Réunion Canarias Martinique Guadeloupe 0,493 - 0,632 0,417 - 0,492 0,365 - 0,416 0,301 - 0,364 0,199 - 0,300 Índice

Em Portugal, o fraco desempenho da maioria das regiões na componente económica (com exceção de Lisboa) en-tre 1995 e 2007 refletiu-se numa fraca subida do seu índice geral, apesar de um avanço relativamente forte na compo-nente social. Curiosamente, as variações dos valores regio-nais em Portugal apresentam um padrão territorial bastante

semelhante ao grego. Aliás, os dois países chegaram a 2007 com um padrão regional também semelhante no que res-peita à posição no IDES.

Os valores do índice em 2007 mostram, por seu lado, que os níveis de bem-estar nas regiões da União Europeia (UE) refletiam sobretudo uma lógica espacial de centros e

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periferias, quer à escala da Europa, quer à escala nacional (Figura 2). A isto somava-se uma diferenciação Norte-Sul e outra Leste-Oeste. Os valores mais elevados do IDES ocor-rem nos países mais centrais e nos do Norte; e dentro de cada país destacam-se positivamente as regiões das capitais e de outros grandes centros urbanos. Nota-se também que os países do Norte apresentam valores superiores aos do Sul e que há uma forte desvantagem das regiões do Leste, sobretudo das mais periféricas, face às mais ocidentais.

A variação dos três subíndices que compõem o IDES (demográfico, social e económico) evidencia que tipos de dinâmicas contribuíram mais para as diferentes evo-luções regionais neste período. A parte ocidental da UE apresentou uma evolução demográfica bastante menos desfavorável do que a média geral, que foi negativa. A Alemanha e a Grécia destacam-se aliás pelo vincado re-cuo neste domínio.

No índice social, a evolução foi claramente positiva por quase toda a UE, com a Itália a evidenciar-se pela negativa em relação aos restantes países, tendo algumas das suas regiões evidenciado mesmo recuos absolutos. Os avanços mais fortes aconteceram nas ilhas Britânicas e na penín-sula Ibérica, bem como em Finlândia-Estónia, Grécia-Chi-pre, Áustria-Eslovénia e algumas regiões alemãs. Por outro lado, no Leste a variação é menos positiva do que na UE em geral (exceto na Itália, onde foi muito fraca).

A variação do subíndice económico não apresenta um padrão tão claro como a dos outros dois. Os avanços nas ilhas Britânicas e na península Ibérica não se destacam tanto quanto nas dimensões demográfica e social, sendo que na Grécia, na Irlanda e em Portugal são mesmo re-lativamente sofríveis. Na Alemanha, a evolução foi ten-dencialmente mais forte na antiga RDA, e particularmente intensa nas regiões de Munique e Alto Palatinado. Na di-mensão económica, o efeito de capitalidade é

particular-mente nítido na Grécia e em Portugal, mas também em Espanha, Bélgica, Eslováquia, Hungria, Bulgária, Finlândia e Suécia. Parece ser mais forte aqui do que nas dimensões demográfica e, sobretudo, social.

No caso da Grécia, Irlanda e península Ibérica, cons-tata-se que houve evoluções bastante fortes do subíndice social (acima da média da UE), o que não se verifica no subíndice económico na maioria das regiões, com avan-ços menores. Nos casos da Irlanda, de Portugal e de mui-tas regiões gregas, a evolução da componente económica fica mesmo abaixo da variação desta componente no con-junto dos 27 Estados-membros, apesar de no período em análise estes países terem beneficiado de substanciais fun-dos estruturais. Em Espanha e na Grécia, o subíndice eco-nómico avançou acima da média europeia, mas avançou bastante menos do que o subíndice social.

Esta diferente evolução dos subíndices social e eco-nómico nos países da Coesão reflete provavelmente uma tendência do Estado para suportar custos sociais no pe-ríodo analisado. Em Portugal, o fraco desempenho da maioria das regiões na componente económica (com a evidente exceção de Lisboa) reflete-se na sua medíocre subida no índice geral, apesar de uma variação relativa-mente forte no índice social. Na Grécia, a progressão da região de Atenas no subíndice económico também se des-taca muito da do resto do país, onde os avanços foram fracos nesta componente.

Nestes dois subíndices (figuras 3 e 4), o padrão terri-torial do conjunto da UE era em 2007 semelhante ao do IDES, mas com algumas diferenças significativas. Na di-mensão social, a diferença mais evidente era que as re-giões gregas, ibéricas e do Sul de Itália não estavam tão mal como no índice geral; no caso da Espanha e, sobre-tudo, da Grécia havia mesmo uma forte proximidade dos níveis das regiões centrais da União.

FiGURA 3. SUBÍndice SOciAL, 2007

! ! ! ! ! ! !Acores Guyane Madeira Réunion Canarias Martinique Guadeloupe 0,277 - 0,405 0,406 - 0,504 0,505 - 0,577 0,578 - 0,652 0,653 - 0,770 Índice Social

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FiGURA 4. SUBÍndice ecOnÓmicO, 2007 ! ! ! ! ! ! ! Acores Guyane Madeira Réunion Canarias Martinique Guadeloupe Índice económico 0,411 - 0,631 0,311 - 0,410 0,241 - 0,310 0,152 - 0,240 0,024 - 0,151

No subíndice económico, nalgumas regiões espanholas (sobretudo mediterrânicas) e também gregas, os valores eram relativamente mais desfavoráveis do que no IDES. Por outro lado, o Norte de Itália aparece aqui com uma posição mais forte, tal como o Centro de França e o Sul da Alemanha. De resto, a coincidência é muito forte. Isto significa que a diferença centro-periferia era substancial-mente mais fraca na dimensão social do que na dimensão económica do IDES, sobretudo no Sul.

É também de notar que, entre 1995 e 2007, se registou uma ligeira subida das disparidades dos valores regionais no conjunto da UE, que se traduziu num aumento próxi-mo de 2% do coeficiente de variação do IDES relativo às suas NUTS 2. Houve um grande aumento das disparida-des territoriais no Leste, mas a Grécia também se disparida-destaca (quase +19%).

Os países ibéricos estão entre os poucos onde se regis-ta uma diminuição das disparidades regionais, se bem que pequena: o coeficiente de variação do IDES das suas re- giões recuou 2,0% em Espanha e 1,82% em Portugal. Mes-mo assim, Portugal tinha o segundo maior coeficiente de variação do IDES regional em 2007: 0,251, face a uma mé-dia de 0,200 na UE. Só a Roménia tinha um valor superior ao português: 0,284.

5. ReFORçO dOS GRAndeS cenTROS e RecUO dAS ReGiÕeS mAiS déBeiS

A variação dos valores do IDES das regiões das capitais europeias entre 1995 e 2007, que segundo o critério aqui adotado faz de quase todas elas ganhadoras em termos relativos (além de serem sempre ganhadoras em termos absolutos), constitui uma forte evidência de que a globali-zação neoliberal deverá ter desempenhado um importante

papel na dinâmica socioeconómica das regiões europeias neste período, de acordo com a lógica de reforço da ten-dência de concentração decorrente da maior integração dos mercados mundiais nas décadas mais recentes. Isto é consentâneo com a tendência de crescimento do PIB mais forte nas regiões metropolitanas do que nas restantes, identificada pela Comissão Europeia (2010, p. 14), e com a ideia de que a lógica da globalização liberta forças que be-neficiam as regiões centrais em cada país, em detrimento das periferias (Comissão, 2009, p. 25), o que promove as disparidades intranacionais, na linha do que prevê a nova geografia económica.

A Comissão Europeia (2007, pp. 37-39) identificou aliás a existência de regiões beneficiadas economicamente pela globalização e outras que lhe eram mais vulnerá-veis, devido sobretudo à industrialização dos países em desenvolvimento. Entre as regiões vulneráveis estavam as especializadas em setores em que os países em desenvol-vimento mais investiram de início, como têxteis, vestuário e produtos de couro, produção de aço ou equipamento elétrico, audiovisual e de TIC. Estavam nesta situação de vulnerabilidade muitas regiões do Leste, mas também o Norte de Portugal, que sofreram fortes perdas relativas em termos socioeconómicos, tendencialmente mais fortes jus-tamente na dimensão económica do IDES.

Foi também detetada pela Comissão (ibid.) uma rela-ção entre a globalizarela-ção (na sua vertente de abertura co-mercial) e perdas económicas e de emprego em diversas regiões europeias mais centradas na produção de baixo custo em vários daqueles setores, o que aponta para que as regiões com níveis de bem-estar menores ou intermé-dios possam ter sido justamente as principais penalizadas pelo processo de abertura dos mercados. Assim, não sur-preende o facto de a maioria das regiões perdedoras da UE em termos relativos no período de globalização mais

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intensa corresponderem a territórios à partida economica-mente mais débeis (o Leste Pós-Soviético, quase todas as regiões da Grécia, o Norte de Portugal e o Alentejo, e ain-da o Sul de Itália). Isto significa que a globalização ajudou muitas das regiões europeias mais débeis a perderem em termos socioeconómicos.

Por outro lado, «muitas das regiões especializadas em sectores vulneráveis, mas de forma alguma todas, conse-guiram subir na cadeia de valor, para actividades de maior valor acrescentado, como a produção topo de gama, os mercados de nicho ou os produtos de alta tecnologia. Em muitos casos, esta ascensão permitiu-lhes manter o empre-go e aumentar a produção» (Comissão, 2010, 3). Parece ser este o caso das regiões do Sul da Alemanha e também do Sul da Irlanda (D.G. Regio, 2008, 54).

Este quadro permite pensar que as dinâmicas da glo-balização se refletiram sobre as economias regionais da UE de um modo que potenciou o alargamento das diferenças de desempenho entre elas, pois permitiu que as detento-ras de economias mais qualificadas, que se podiam dife-renciar pela qualidade dos produtos e o valor associado, beneficiassem das oportunidades decorrentes de mercados alargados, cujas ameaças podiam transformar em oportu-nidades. Constata-se assim que as lógicas inerentes à glo-balização económica se refletem, a este nível, de modo diferente em regiões e países europeus diferentes, perce-bendo-se que as regiões à partida mais bem dotadas em fatores que lhes permitiam uma especialização mais in-tensa e valorizada puderam obter mais facilmente ganhos, enquanto as mais fracas à partida se viram numa situação mais propensa a perdas económicas e sociais. Ou, dito de outro modo, a globalização ajudou várias regiões ricas a ganhar e várias regiões pobres a perder. Em Portugal, a Região Norte pode ser dada como um exemplo típico das dinâmicas perdedoras.

Isto é também consistente com a ideia de que os ga-nhos e perdas dos territórios têm estado muito associa-dos à «competitividade», entendida como «competitividade territorial» associada à «atratividade» de uma região, vista como a sua capacidade para se tornar mais interessante do que outras para a entrada e a retenção de capital e trabalho especializado, num mundo de fronteiras mais ou menos abertas à sua circulação. Em virtude das características das regiões mais vulneráveis e das daquelas que conseguem superar os desafios de competitividade decorrentes da glo-balização, somos levados a dizer que a resiliência está mais do lado das mais desenvolvidas, atendendo a que aquelas que conseguiram manter emprego e aumentar produção o fizeram subindo na cadeia de valor e com recurso a maior intensidade tecnológica.

Os desempenhos regionais e o nível de bem-estar so-cioeconómico em 2007 deixam perceber que, apesar dos avanços em Espanha e na Irlanda, o mapa do bem-estar (Mapa 2) mantinha as manchas de prosperidade europeia a que estávamos habituados. A manutenção da maior par-te da Espanha, de Portugal e da Grécia entre os par-territórios com valores reduzidos do IDES levanta a questão da

eficá-cia da política de coesão, cuja compreensão não era con-tudo um objetivo deste trabalho.

Por outro lado, a constatação de que o desempenho na dimensão social foi bastante mais favorável no grupo dos quatro países da coesão do que na generalidade dos restantes (só as regiões do Reino Unido e da Finlândia têm desempenhos ao mesmo nível) revela uma situação compatível com um quadro em que os recursos disponi-bilizados pelos fundos estruturais e/ou as transferências intranacionais tenham sido aplicados de um modo que se refletiu mais intensamente, pelo menos nesta fase, no bem-estar social do que no desempenho económico. Isto levanta no entanto interrogações sobre o futuro bem-estar dessas populações, num contexto de acrescidas dificulda-des orçamentais, quer dos Estados do Sul, quer à escala da UE, e na sequência da crise iniciada em 2007-2008, a que se sucedeu a crise do euro. Este novo contexto exacer-bou as tensões que já existiam, identificadas neste estudo, dando origem a uma clara «trajetória de desenvolvimento desigual, expressa numa nova relevância de uma divisão centro-periferia»6 (Rodrigues e Reis, 2012, 189).

Finalmente, deve-se referir que a falta de dados regio-nais no Eurostat foi a maior dificuldade encontrada para a realização deste estudo. Estatísticas europeias com desa-gregação regional de maior qualidade (com menos valores em falta do que os encontrados nas variáveis utilizadas) e mais abrangentes quanto às variáveis disponíveis permiti-riam melhorar a qualidade de índices deste tipo, facilitan-do a sua eventual utilização para analisar dinâmicas em períodos mais recentes.

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FiGURA 1. VARiAçãO dO Índice de deSemPenHO ecOnÓmicO-SOciAL (ideS), 1995-2007
FiGURA 3. SUBÍndice SOciAL, 2007
FiGURA 4. SUBÍndice ecOnÓmicO, 2007 ! !!! ! ! ! Acores GuyaneMadeira RéunionCanariasMartiniqueGuadeloupe Índice económico 0,411 - 0,6310,311 - 0,410 0,241 - 0,3100,152 - 0,2400,024 - 0,151

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