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O PROCESSO AQUISITIVO DA ESCRITA DA LÍNGUA PORTUGUESA POR SURDOS

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Academic year: 2020

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O PROCESSO AQUISITIVO DA ESCRITA DA LÍNGUA

PORTUGUESA POR SURDOS

Soraya Tatiara Costa Lopes 1

RESUMO

A observação atenta da escrita da língua portuguesa por alunos surdos é importantíssima, pois estes educandos muitas vezes são segregados nas salas de aulas por não possuírem um domínio da escrita tal como é solicitado pelos professores, algo que os acompanha em sua vida escolar desde as séries iniciais até aos níveis superiores de formação acadêmica. Essa não compreensão por parte dos educadores se dá pela desinformação acerca da língua de sinais e suas peculiaridades. Para tanto, este artigo ressalta a importância da Língua Brasileira de Sinais para o ensino da Língua Portuguesa, de modo a facilitar o processo de aprendizagem pelo aluno, onde se enfatizou o papel preponderante do professor no processo de aquisição da escrita pelo educando surdo, assim como as dificuldades mais visíveis na escrita destes, salientando propostas para que o educador tenha um olhar diferenciado sobre a produção textual do alunado surdo percebendo-se como parte integrante no processo de inclusão deste no contexto escolar. Afinal, incluir requer ressignificar o meio em que se vive, onde as instituições estejam incondicionalmente abertas para todos os alunos que por ela procurarem e seus educadores engajados em um ensino participativo, respeitando capacidades, talentos e diferenças na perspectiva da educação realmente inclusiva.

Termos para indexação: Surdos; Aquisição da escrita; Língua de Sinais; Professores.

1 Graduada em Pedagogia; Especialização em Psicopedagogia, em Educação Especial e Práticas Inclusivas,

Intérprete de Libras – Proficiente em Língua de Sinais.

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ACQUIRING PROCESS OF PORTUGUESE WRITTEN

LANGUAGE BY DEAF STUDENTS

ABSTRACT

Careful observation of Portuguese written language by deaf students is something very important because these are students who are often segregated in classrooms because they have a lack in writing as requested by teachers, something that is presented in their whole school lives, since the starting series up to higher levels of academic education. This misunderstanding by educators is caused by the fact of the absence of information about the sign language and its peculiarities. Therefore, this article emphasized the preponderant teachers’ role in the acquisition of Portuguese written language by deaf and their difficulties. The most visible of these subjects, pointing proposals that the educator has a different result in text production of deaf students perceiving themselves as an integral part of the process of inclusion in the school context. Including is, to give a new meaning to those students ad their way they live, where institutions are ,unconditionally, opened to all of the students who need them and their teachers preset a participative characteristic, respecting skills, talents and differences in perspective of truly comprehensive education.

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INTRODUÇÃO

O ensino da Língua Portuguesa para os alunos surdos, muitas vezes, torna-se um verdadeiro desafio para os seus professores. Ao focalizar neste trabalho a produção escrita destes alunos em particular, observou-se a enorme dificuldade que os mesmos têm com o Português. Erroneamente, muitas pessoas pensam que um surdo por não ter nenhum problema relativo à visão pode ler, compreender e escrever um texto. Mas como se sabe, aptidão ou habilidade visual não é condição suficiente para a aprendizagem da escrita, pois se trata de um processo complexo e que exige estratagemas que vão além da decifração de letras ou palavras e do simples fato de saber falar a língua, pois, como afirma o autor:

A compreensão e a produção de um texto escrito requerem estratégias lingüístico-cognitivas complexas que vão além da decodificação das palavras e do simples ato de saber falar a língua-alvo da escrita, porque senão não teríamos analfabetos ouvintes, falantes do português que não conhecem as letras do alfabeto. (RINALDI apud BRASIL, 1997, p.148).

Especialmente para os surdos, a aprendizagem da escrita torna-se ainda mais complexa em razão de vários fatores, dentre os quais se destacam: a tardia aquisição da língua de sinais pelos surdos - o que resulta, muitas vezes, em atrasos linguístico-cognitivos - e as práticas pedagógicas pautadas no aspecto fônico da língua majoritária. Segundo Silva (2001, p. 43-44):

É necessário enfatizar que as condições de aprendizagem da leitura e da escrita no processo de escolarização do aluno surdo dependem, por via de regra, do modo pelo qual são encaradas suas dificuldades e as diferenças ocorridas no processo educacional pelas instituições, levando-o a adquirir confiabilidade nas dificuldades encontradas. Nessa mesma ótica é preciso destacar que o surdo, antes de ter dificuldades na escola, apresenta dificuldades de aquisição da língua, instalando-se a grande diferença de escolarização entre o surdo e o ouvinte.

Observando a realidade do surdo no contexto escolar brasileiro, o problema enfrentado por ele é este: em virtude da sua surdez, ele não adquire a língua oral, ou seja, o Português falado de forma espontânea e natural e, assim, seu desempenho nessa modalidade é, em geral, limitadíssimo e insuficiente. Como as metodologias de ensino/aprendizagem da escrita, no Brasil, são baseadas, na maioria dos casos, no aspecto fonológico da língua e as palavras, geralmente, são apresentadas de forma descontextualizadas e mecânicas, sem ênfase no significado, o desempenho do surdo em Português escrito, que poderia ser muito bom, acaba sendo ineficaz e insuficiente, pois como afirma McCleary (2008):

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Nenhuma língua pode ser ensinada ou até mesmo aprendida por partes através de palavras isoladas ou textos sem sentido; a língua é um instrumento de comunicação, de expressão e de elaboração do pensamento, e é aprendida através do seu uso comunicativo e expressivo.

Sendo assim, o que na verdade dificulta a leitura e escrita de textos por alunos surdos não é a sua surdez em si, mas o atraso linguístico em virtude do retardamento da aquisição da sua primeira língua, além do uso de metodologias de ensino/aprendizagem da escrita portuguesa pautadas na oralidade.

Considerando que grande parte dos alunos surdos, especialmente aqueles que têm pais ouvintes, tem o seu primeiro contato com a LIBRAS na escola, e que o desempenho dele em uma segunda língua dependerá da aquisição de uma primeira, é importante que a escola proporcione aos alunos surdos o acesso à interação social e linguística e para isso, ela precisa estar também mais envolvida com a cultura surda e ser mais presente e participativa nas atividades da comunidade surda. Isso significa que os professores e todos que estão envolvidos na educação de surdos, principalmente nas séries iniciais, precisam ter maior fluência em LIBRAS. Além disso, a escola precisa também incentivar a comunicação entre estes pais ouvintes e seus filhos surdos, apoiando o uso da língua de sinais em atividades como contar histórias, externar os sentimentos e pensamentos. Uma medida bem simples e muito valiosa que pode ser tomada pela escola inclusiva seria criar e oferecer oficinas de LIBRAS para os pais dos surdos, os alunos ouvintes e também a comunidade. Atividades como essas contribuem muito para o desenvolvimento e crescimento do aluno.

O PAPEL DA LIBRAS NO ENSINO DE LÍNGUA PORTUGUESA PARA SURDOS

Parafraseando Paulo Freire “a leitura da palavra é precedida pela leitura do mundo”, ou seja, é a interpretação que o indivíduo faz do seu universo sócio-histórico-cultural. Sendo assim, as palavras e as demais estruturas da Língua Portuguesa somente serão compreendidas e apreendidas pelo surdo se, antes, sua linguagem viabilizar a estruturação do seu conhecimento, as experiências vividas, onde para a maioria deles, a linguagem evolui através da língua de sinais, pois, dificilmente essa leitura de mundo poderá ser realizada através de uma língua oral. Logo, é de suma importância que outra língua, não pautada em aspectos oral-auditivos e sim vísuo-espaciais, seja a mediadora desse processo: a Língua Brasileira de Sinais (LIBRAS).

Conforme o próprio Rinaldi (apud BRASIL, 1997, p.150):

A LIBRAS, para os surdos, assim como o português falado, para os ouvintes, fornecerá todo o aparato lingüístico-cognitivo

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necessário à utilização de estratégias de interpretação e produção de textos escritos: ativação de esquemas e conseqüente criação de expectativas, inferências, configuração de hipóteses; contextualização e explicações metalingüísticas das estruturas lingüísticas do texto, principalmente daquelas especificas da língua portuguesa, de difícil apreensão pelo aluno.

Dessa maneira, quanto mais precoce e efetivo for o acesso do surdo à língua de sinais, maiores chances ele terá de apropriar-se da escrita de forma eficaz e consistente, uma vez que, ela será o instrumento facilitador que auxiliará o surdo na interpretação e produção de palavras, frases e textos da língua escrita, assumindo função semelhante ao que a oralidade cumpre quando se trata da apropriação da escrita pelo ouvinte.

Ao uso das línguas de sinais em sala de aula faz-se apenas uma ressalva: jamais se deve pensar que é suficiente apenas o uso da LIBRAS para passar informações. Segundo McCleary (2008):

Apesar da comunicação através da língua de sinais ser fundamental para o aprendizado do aluno, não é o suficiente; os professores devem se empenhar em desenvolver uma didática mais apropriada, garantindo a contextualização e a significação das atividades e criando oportunidades para a comunicação e para a auto-expressão dos alunos.

Assim como para os ouvintes a aula - que não se resume em apenas exposição oral - se torna mais interessante e produtiva através de discussões e atividades que o estimulem a participar ativamente, assim também, a aula com exposição em LIBRAS do conteúdo associada à reflexão ou discussão sobre o assunto e a estímulo, principalmente visual, será mais interessante e produzirá melhores resultados.

O PAPEL DO PROFESSOR

A evolução do processo educacional dos surdos dependerá não exclusivamente, mas, principalmente, da qualidade com que se fará o uso da LIBRAS em sala de aula, torna-se clara a seguinte conclusão: é fundamental que o professor de Português seja bilíngue e conheça as estruturas e peculiaridades da LIBRAS. Conforme Rinaldi:

[...] todo o processo depende da interação efetiva do professor com o aluno, em razão disso, o professor deve ser bilíngüe. Sem uma comunicação efetiva, ou seja, se o professor não se comunicar com o seu aluno, utilizando inclusive a língua brasileira de sinais, o processo estará completamente comprometido (RINALDI apud BRASIL, 1997, p.176).

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Conhecendo a estrutura gramatical e as características particulares da LIBRAS, o professor terá melhores condições de trabalhar suas práticas pedagógicas em sala de aula na perspectiva de encontrar, juntamente com seus alunos surdos, novos rumos em direção ao ensino/aprendizagem da Língua Portuguesa escrita de forma eficaz e produtiva.

O professor que se dedica à educação dos surdos deve ter em mente essa estrutura peculiar da LIBRAS, para poder adequar suas técnicas de ensino aos problemas enfrentados pelo aluno na aprendizagem de uma outra língua, reconhecendo e explorando, inclusive, os mecanismos de compensação que ele utiliza para estruturar seu pensamento (CAETANO, 2008).

O professor de Português bilíngue, por conhecer as diferenças estruturais entre as gramáticas da Língua Portuguesa e da LIBRAS, terá mais facilidade em entender as produções escritas de seus alunos. Além disso, seu trabalho não se resumirá em apontar os “erros” das sentenças escritas, mas em identificar com os seus alunos as diferenças entre as duas línguas e mostrar-lhes os caminhos mais eficientes para a elaboração mais estruturada e coerente de frases e textos em Português.

[...] Em vez de apontarem as diferenças estruturais, procurando identificar e revelar os mecanismos de projeção/adequação processados na passagem da LIBRAS para o português, os educadores podem limitar-se à atitude prescritiva de apontar certo/ errado, este último sempre aplicado ao uso da estrutura da LIBRAS na tentativa de elaboração do português escrito (CAETANO, 2008).

É com o auxílio do professor bilíngue que o surdo terá condições de trabalhar melhor e fazer os ajustes necessários às construções do tipo: EU ANDAR( Eu ando) e NÓS FALAR (Nós falamos), ou ainda, EU EMPRESTAR EL@ DINHEIRO (Eu emprestei dinheiro a ele) e EL@ EMPRESTAR EU DINHEIRO( Ele me emprestou dinheiro). Construções como aquelas em LIBRAS, o verbo vem sempre no infinitivo, não ocorrendo a flexão verbal; já no verbo EMPRESTAR, a relação semântica da preposição e do pronome exigidos por esse verbo,em LIBRAS, é marcada pela direcionalidade ou flexão verbal. Cabe ao professor explicar ao aluno surdo a diferença substancial existente entre o Português e a LIBRAS, realizando uma comparação entre ambas ou uma explicação sobre as estruturas das sentenças portuguesas através do uso metalinguístico da LIBRAS a fim de ensinar a estrutura mais adequada em Português, bem como, as flexões verbais da Língua Portuguesa.

Trazendo esse fato para a realidade educacional maranhense que é de escolas inclusivas, ou seja, em uma mesma sala há surdos e ouvintes, ter um professor de Português bilíngue em sala de aula não significa que ele dispensará a presença do

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intérprete de LIBRAS e ministrará as aulas em línguas de sinais, até porque ministrar, simultaneamente, aula em Português e LIBRAS é completamente inviável. O professor deve ter o apoio do intérprete em sala de aula. A necessidade dele ser bilíngue é para possibilitar uma melhor preparação de suas aulas e elaborar atividades mais eficazes e adequadas às necessidades de seus alunos surdos. Pois como afirma o autor:

[...] o uso de intérprete não significa que as aulas devam transcorrer ‘normalmente’, como se as pessoas fossem todas não surdas, e o conteúdo esteja chegando aos alunos de forma satisfatória. Muito pelo contrário, como a Língua de Sinais se apresenta numa modalidade distinta das línguas orais [...], ela está centrada no ‘ver’, e o professor deve realizar estratégias de ensino com base no visual (MARQUES apud QUADROS e PERLIN, 2007, p.141).

Considerando ainda que a Língua Portuguesa para o aluno surdo funciona como segunda língua e por isso requer mais diligência no seu ensino, outro cuidado que o professor deve ter é de não abreviar as palavras, pois tal atitude dificulta ainda mais a assimilação das palavras portuguesas pelo surdo, assim como também, quando for realizar o registro escrito do conteúdo das aulas expositivas no quadro magnético que o faça da forma mais organizada possível, pois o surdo como sujeito visual depende destas experiências e informações visuais para acessar o conhecimento e compreendê-lo. Desta forma, é de suma importância que essas informações estejam dispostas organizadamente.

Lamentavelmente, a realidade educacional maranhense e de seu corpo docente revela que a maioria das pessoas envolvidas com educação inclusiva desconhecem as estruturas e particularidades linguísticas da LIBRAS, salvo alguns poucos que possuem uma noção básica ou são fluentes em língua de sinais. Tal fato dificulta o bom desempenho na preparação das aulas a serem ministradas e também na escolha e utilização de recursos educacionais eficazes e produtivos.

Nesta situação, sugere-se então que professor e intérprete trabalhem juntos de forma dialógica e cooperativa, para assim atenderem melhor o aluno surdo, cada qual sabedor de seu papel e função na sala de aula. Pois como afirma o autor:

O ideal seria o intérprete e o professor estarem engajados no planejamento das aulas, pois a troca de experiências será muito produtiva, estarão criando estratégias pedagógicas que mais se aproximem do jeito da pessoa surda aprender, e conseqüentemente, a interpretação se apresentará mais qualificada (MARQUES apud QUADROS e PERLIN, 2007, p.145).

Dessa forma, o professor deverá, então, contar não só com a presença do intérprete em sala de aula, mas também com o seu apoio. Afinal, seria errôneo pensar que apenas a presença do intérprete, seja o professor fluente em LIBRAS ou não, é suficiente

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e garante a aprendizagem do aluno surdo, tornando desnecessário o uso de recursos pedagógicos que facilitem esse ensino/aprendizagem.

DIFICULDADES MAIS EVIDENTES NOS TEXTOS ESCRITOS POR SURDOS Segundo Fernandes (1990), os problemas mais evidentes nos textos produzidos por alunos surdos são: dificuldades com o léxico, desconhecimento dos processos de formação de palavras, não contração de preposição com o artigo; o uso dos verbos geralmente no infinitivo sem as suas conjugações em tempos e modos, uso inapropriado das preposições, ausência de conectivos em geral e de verbos de ligação nas sentenças, troca do verbo ser por estar, uso inadequado dos verbos estar e ter, colocação indevida do advérbio na frase, falta de domínio e uso limitado de outras estruturas de subordinação. Em virtude disso,

Pode-se afirmar, portanto, que o grande problema enfrentado pelo surdo na aquisição da língua portuguesa em sua modalidade escrita, a par dos bloqueios fonoaudiólogos, consiste no domínio da estruturação sintática e da organização textual. Não porque o portador de deficiência auditiva esteja incapacitado para aprendizagem da língua portuguesa, mas porque desenvolveu suas potencialidades cognitivo-perceptivas num outro sistema de linguagem (CAETANO, 2008)

Considerar então, como foi mencionado por Caetano, que o surdo desenvolve seu potencial linguístico e percebe o mundo de maneira diferente do ouvinte porque utiliza o canal visual-espacial e não o oral-auditivo para construir e expressar seus pensamentos é, sobretudo, reconhecer que a estruturação desse pensamento que se dá em LIBRAS, também ocorre de forma diferente e que a transposição do mesmo para o Português não é uma tarefa tão simples devido à complexidade e diferenças estruturais existentes entre as duas línguas em questão. No entanto, seria errôneo pensar que tal tarefa é inviável ou até impossível de se realizar, na verdade, ela é perfeitamente possível, basta apenas o estudo e a busca de métodos que facilitem esse processo ensino/aprendizagem. Sendo este o próximo tema abordado no capítulo subsequente.

PROPOSTAS PARA PRODUÇÃO TEXTUAL NA LÍNGUA PORTUGUESA POR ALUNOS SURDOS

Educadores, em geral, são unânimes em dizer que a leitura e a interpretação de textos contribuem para o desenvolvimento linguístico do aluno. Quem tem o hábito de ler descobre, naturalmente, as diferentes maneiras de se expressar, comparando as idéias e estilos, tornando-se crítico, num sentido bem positivo. Segundo Salles (2005, p. 45):

As experiências pedagógicas e as práticas têm mostrado que a leitura é um ponto fundamental para a escrita; na verdade ela é o ponto basilar. Por um lado, o hábito de ler possibilita a internalização

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na mente das regras próprias da língua escrita; por outro, fornece informações do universo que circunda o homem, ampliando seu conhecimento.

Assim sendo, torna-se evidente que a modalidade escrita permite não somente a transmissão, mas também a aquisição de conhecimento que se dá por meio da leitura de textos escritos. Por isso, é importante que o aluno surdo desenvolva sua capacidade de leitura, interpretação e escrita de textos em Língua Portuguesa, pois, é dessa forma que ele obterá informações e conhecimentos a respeito do mundo que o cerca e também poderá internalizar as regras desta língua, além de expressar através de escritura de textos suas idéias e pensamentos, podendo assim, interagir não apenas com outros surdos, mas também com ouvintes.

No discorrer deste trabalho ficou evidente que a LIBRAS instrumentaliza o surdo para a aprendizagem da escrita, uma vez que, ela orienta, fomenta e facilita o acesso ao texto. Em razão disso, algo muito importante e que deve ser muito explorado e desenvolvido nos alunos surdos, antes mesmo até da leitura, é a narração de histórias em LIBRAS, pois tal fato produzirá no aluno a curiosidade e o desejo pelo aprendizado da leitura, o que, consequentemente, facilitará esse processo. De acordo com McCleary (2008):

A habilidade de compreender e de contar uma história é um aprendizado fundamental para preparar o aluno para qualquer trabalho com texto; essa habilidade é mais facilmente desenvolvida em sua língua materna e fluente, a língua de sinais; sua compreensão da forma da narrativa como um gênero contribui, depois, para sua compreensão da leitura em português.

Argumenta-se que o Português escrito pode ser perfeitamente compreendido pelo surdo se estratégias vinculadas a aspectos visuais e não sonoros, forem utilizadas. E aqui se ressalta, além do uso de recursos visuais, a importância do uso da LIBRAS em sala de aula.

O professor precisa conversar em língua de sinais e discutir com seus alunos o tema ou assunto abordado no texto, pois, conforme Quadros e Schmiedt (2006, p. 41):

Provocar nos alunos o interesse pelo tema da leitura por meio de uma discussão prévia do assunto, ou de um estímulo visual sobre o mesmo, ou por meio de uma brincadeira ou atividade que os conduza ao tema pode facilitar a compreensão do texto.

Isso significa conversar sobre o assunto e trazer o texto para dentro do contexto das atividades desenvolvidas em sala de aula e não somente realizar uma leitura-interpretação do texto em sinais. Além disso, o professor deve discutir sobre alguns elementos linguísticos e trabalhar com palavras-chave, porém, esse trabalho deve ser realizado não com uma mera listagem do vocabulário presente no texto e sim

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com discussões, estimulando os alunos a buscarem o significado dessas palavras, desde que não se utilize esse recurso para todo o texto, caso contrário, a atividade se tornaria cansativa e fastidiosa.

Sugerindo algumas atividades

Segundo Quadros e Schmiedt (2006, p. 42) o professor deve analisar as seguintes questões antes de preparar uma atividade de leitura em sala de aula:

• Qual o conhecimento prévio que os alunos têm do assunto abordado no texto?

• De que maneira esse conhecimento prévio pode ser analisado e discutido na sala antes que se apresente o texto a ser trabalhado?

• O que motivaria os alunos a lerem o texto?

• Quais as palavras-chave para a compreensão do texto?

• Que elementos linguísticos favoreceriam e viabilizariam a compreensão textual?

Outro aspecto importante, segundo a autora, são os tipos de textos apresentados aos alunos. Segundo ela, os textos devem ser textos autênticos, ou seja, não devem ser simplificados e sim adequados para cada faixa etária. É perfeitamente possível trabalhar, com o aluno surdo, vários tipos de textos. Para o ensino fundamental podem ser utilizados contos, histórias infantis e em quadrinhos. Além destes, podem ser trabalhados também textos jornalísticos, trechos de livros didáticos dentre tantas outras opções. É bom apenas frisar que a motivação para ler um texto é algo indispensável. O surdo precisa saber o porquê e para que vai ler. Por esta razão, a leitura do texto deve fazer sentido para ele, tanto no contexto escolar como para sua vida também.

De acordo com Quadros e Schmiedt (2006, p. 42-43) a leitura, no contexto do aluno com surdez, passa por diversos níveis:

a) Concreto-sinal: ler o sinal que refere coisas concretas, diretamente relacionadas com a criança;

b) Desenho-sinal: ler o sinal associado com o desenho que pode representar o objeto em si ou a forma da ação representada por meio do sinal;

c) Desenho-palavra escrita: ler a palavra representada por meio do desenho relacionado com o objeto em si ou a forma da ação representada por meio do desenho na palavra

d) Alfabeto manual-sinal: estabelecer a relação entre o sinal e a palavra no português soletrada por meio do alfabeto manual;

e) Alfabeto manual-palavra escrita: associar a palavra escrita com o alfabeto manual;

f) Palavra escrita no texto: ler a palavra no texto.

Outra maneira bem eficiente de trabalhar com os alunos, sejam surdos ou ouvintes, é por meio de vivências. Através das vivências o aluno pode experimentar, criar e descobrir novos conceitos de forma enriquecedora, produtiva e também muito

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prazerosa. Lembrando que a vivência deve ser uma atividade planejada com antecedência e com objetivos bem definidos. Tais atividades podem ser desde a produção de jogos e livros até a organização ou participação em eventos na sala de aula, na instituição escolar ou fora dela. Toda a vivência ocorre em um contexto oral, porém, com os surdos deve acontecer em sinais, para depois se realizar o registro escrito em Língua Portuguesa. CONSIDERAÇÕES FINAIS

Examinando a educação hoje, nota-se que há uma progressiva diminuição do valor dado à normatização do surdo. Dessa forma o surdo, gradualmente, está sendo visto como alguém com identidade, língua e cultura próprias, e principalmente, diferentes das do ouvinte. Em virtude dessa progressiva mudança nas concepções que se tinham acerca da pessoa surda é possível avistar um mundo onde essa diferença linguística não seja mais vista como uma deficiência, mas como uma peculiaridade que em nada diminui as pessoas que a tem. Mas para que este país tenha uma educação de fato inclusiva, não basta apenas promover mudanças em paradigmas educacionais: é necessário que a sociedade como um todo reflita, profundamente, sobre os discursos a respeito dos surdos. Não se pretende criar aqui um manual, nem método universal. Há argumentos epistemológicos que podem orientar as atividades realizadas em sala de aula, mas é sempre bom analisar cada situação e realidade buscando refletir, sobretudo, quem é essa pessoa surda e quais suas diferenças individuais. Como ressalta McCleary (2008):

Não existe um único método de ensino de leitura e escrita para o surdo e muito menos existe a possibilidade de achar [...] uma técnica que resolva todos os problemas de ensino-aprendizagem; as maneiras dos alunos lidarem com a língua oral e a língua escrita são muito variadas e exigem do professor uma grande atenção ao comportamento do aluno e uma flexibilidade de atuação dentro do movimento da aula.

Pelo exposto, entende-se que é perfeitamente possível organizar um espaço escolar de maneira que melhore o aprendizado dos alunos surdos, um espaço onde eles possam realmente construir o conhecimento com base em suas experiências visuais. Para tanto, é preciso buscar entender a língua de sinais não só como o meio mais adequado de transmissão de conhecimentos, mas também de construção de conhecimentos relacionados à cultura surda e às suas formas de aplicação. Dessa forma, as propostas educacionais devem adaptar-se à situação especial dos surdos e não fazê-lo adaptar-se aos padrões estabelecidos para os ouvintes. O canal visual é o principal meio para a aquisição do conhecimento e é neste sentido que o uso de recursos visuais e de interação torna-se uma ferramenta importante e indispensável, pois, transforma o aprendizado mais atrativo e,

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consequentemente, produz melhores resultados.

O surdo, como foi estudado, possui dificuldades em associar valores sonoros à língua escrita, por isso, necessita de outras estratégias para a aquisição da mesma e essas estratégias e metodologias podem ser elaboradas pelos próprios professores juntamente com os alunos surdos e por que não também com os intérpretes de LIBRAS? Nesse ambiente dialógico, cooperativo e interativo muito pode ser feito e melhorado. Acredita-se que inclusão escolar denota mais do que integração física de pessoas, mas integração social, reconhecimento e respeito das diferenças culturais e linguísticas que devem ser patentes em ações concretas dos educadores, pois, sabe-se que:

A educação de surdos continua sendo polêmica e exigindo dos profissionais da área uma constante reflexão sobre os caminhos a serem percorridos e as possíveis atuações do professor no contexto escolar (GESUELI apud SILVA, KAUCHAKJE e GESUELI, 2003, p.147).

Incluir o aluno surdo na escola regular exige o uso de estratégias e recursos pedagógicos adequados e profissionais capacitados, sejam eles professores bilíngues fluentes ou na falta destes, intérpretes fluentes, como também instrutores surdos, todos juntos e cooperando entre si, respeitando e convivendo igualitariamente com diferentes culturas e modos linguísticos, buscando na escola um caminho para o conhecimento, um futuro melhor e uma sociedade mais justa. Tomando emprestada a ideia desenvolvida por Silva (1997, p.4).

que tal se passássemos a ver não o surdo, mas o discurso sobre o surdos como um problema (...)? Em geral, a norma tende a ser invisível e é essa própria invisibilidade da norma que faz com que ela seja questionada, problematizada.

Se a sociedade conseguir se libertar dessa visão de conceber o diferente como um anormal ou deficiente e admitir uma concepção de surdez não pela perda ou ausência da audição, mas tendo em vista a afirmação de suas possibilidades na diferença, a inclusão do surdo não se realizará apenas no ambiente escolar, mas também na sociedade como um todo e tal fato alcançará melhores resultados escolares e transformará a sociedade etnocêntrica e uma mais igualitária.

Sendo assim, é preciso definitivamente deixar de tratar a questão da surdez como uma questão problemática, afinal, o problema não é o surdo, mas a oratória sobre ele.

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REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS

BRASIL. Secretaria de Educação Especial: a educação de surdos. Brasília: MEC/ SEESP, 1997.

CAETANO, K.E. Pressupostos lingüísticos sobre a aquisição da língua escrita na educação de surdos. Disponível em http://elis.npd.usp.br/abralin/boletim21/sum.html. Acesso em: 27 dez. 2008.

FERNANDES, E. Problemas lingüísticos e cognitivos do surdo. Rio de Janeiro: Agir, 1990.

MCCLEARY, L.E. Tecnologia e Letramento. Disponível em:<http://especial.futuro. usp.br/resumo.html.>. Acesso em: 20 de dezembro de 2008.

QUADROS, R.M. de; PERLIN, G. (orgs). Estudos Surdos II (Série Pesquisas). Petrópolis, RJ: Arara Azul, 2007.

QUADROS, R.M. de; SCHMIEDT. M.L.P. Idéias para ensinar português para alunos surdos. Brasília: MEC, SEESP, 2006.

SALLES, H.M.M.L. Ensino de língua portuguesa para surdos: caminhos para a pratica pedagógica. Brasília: MEC/SEESP, 2005.

SILVA, K.GESUELI (orgs). Cidadania, surdez e linguagem: desafios e realidade. São Paulo: Plexus, 2003.

SILVA, M. da P.M. A construção de sentidos na escrita do aluno surdo. São Paulo: Plexus, 2001.

Referências

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