ISSN 21755396 1
XV Encontro de Iniciação à Docência
Universidade de Fortaleza 19 a 23 de outubro de 2015
O Uso das Tecnologias Digitais da Informação e Comunicação na Formação
Docente: A Experiência da Disciplina Tecnodocência
Gabriela Teles1* (ID), Ana Raquel Carvalho de Souza1 (ID), Gloubérlia Maria Bezerra de Souza1 (ID), Lucas Magalhães Crisóstomo1 (ID), Robson Carlos Loureiro² (PO), Luciana de Lima2 (PO). 1.Universidade Federal do Ceará – Programa de Formação Interdisciplinar Integrada às Tecnologias da Informação e Comunicação (PROFITIC)
2. Universidade Federal do Ceará – Pró-Reitoria de Graduação
gabiteles2s.as@gmail.com
Palavras-chave: Tecnologias Digitais da Informação e Comunicação. Formação Docente. Tecnodocência.
Resumo
O objetivo deste trabalho é descrever como o uso das Tecnologias Digitais da Informação e Comunicação (TDIC) pode auxiliar na formação docente, tendo como base a perspectiva construcionista utilizada na disciplina Tecnodocência, ofertada aos licenciandos da Universidade Federal do Ceará (UFC) no semestre 2015.1. Entende-se que, diante das transformações vivenciadas, faz-se necessário refletir sobre o uso das TDIC na formação docente, pensando-as como apoio para ultrapassar as práticas pedagógicas centradas no repasse de conteúdos e na figura do professor. Com o intuito de alcançar o objetivo proposto, o presente estudo foi desenvolvido por meio de pesquisa bibliográfica e de estudo de caso realizado a partir de observação espontânea das participações de vinte e quatro licenciandos envolvidos na disciplina Tecnodocência, tendo como foco os momentos em que tais atores refletiram e utilizaram as TDIC para/na ação docente. Constatou-se que os licenciandos compreenderam a relevância do uso das TDIC na atuação como docente, percebendo os limites e possibilidades que permeiam tal uso. A necessidade de pensá-lo como meio de instigar a curiosidade, participação e intervenção dos estudantes, partindo do entendimento de que o conhecimento é construído, e não meramente transmitido foi outro aspecto analisado. Salienta-se que este estudo está sendo aprofundado por meio da continuação da pesquisa durante o semestre 2015.2.
Introdução
No contexto atual, marcado pela globalização, observa-se o desenvolvimento de transformações nos diversos âmbitos da sociedade, fato esse que interfere diretamente no campo da Educação, requisitando que ela se modifique, no sentido de não mais se apoiar em práticas e metodologias que se pautam na mera transmissão de conhecimentos pelo professor e na aquisição destes conhecimentos pelo aluno.
Diante desse contexto, analisando-se especificamente a realidade da Educação Superior, tem-se observado a incorporação das TDIC no processo de formação docente como uma tentativa e uma possibilidade de dinamizá-lo, tornando-o mais conectado à realidade dos licenciandos.
Conforme Almeida (2008), essas tecnologias possibilitam elementos relevantes para o processo de ensino e aprendizagem como a ampliação dos espaços de interação, potencializando as trocas afetivas e os trabalhos coletivos, incentivando a produção compartilhada e colaborativa de conhecimentos.
Entretanto, considera-se relevante destacar que apenas a inserção dessas tecnologias no contexto educacional não consegue transformá-lo, diante de todas as problemáticas que o norteiam. Acerca desse fato, Alonso (2008, p.1) afirma que “[...] o uso de recursos tecnológicos sofisticados não tem assegurado transformações nas práticas pedagógicas nas escolas”.
Entende-se que mais do que inserir tecnologias é preciso transformar metodologias, práticas pedagógicas e isso envolve modificar currículos, garantir a formação docente sob novas bases, não mais as tradicionais, como apontam Coutinho e Lisbôa (2011). Diante disso, considera-se pertinente indagar: como o uso das TDIC pode auxiliar na formação docente de licenciandos, preparando-os para uma prática pedagógica voltada para a construção do conhecimento?
Como uma possibilidade para a transformação da situação supracitada, entende-se a relevância de pautar sob novas bases o processo de formação docente, de maneira que as TDIC sejam utilizadas como apoio para ultrapassar as práticas pedagógicas tradicionais, e não mais como um meio para perpetuá-las. Assim, considera-se relevante o desenvolvimento de uma formação docente fundamentada em uma proposta construcionista.
Essa proposta, conforme Valente (1999, p. 135), percebe o processo de construção do conhecimento ancorado “[...] na realização concreta de uma ação que produz um produto palpável (um artigo, um projeto, um objeto) de interesse pessoal de quem produz”.
Desta feita, entende-se que uma formação docente pautada na perspectiva construcionista, percebe o professor como um mediador do processo de construção do conhecimento, através do uso das TDIC, de modo a ofertar elementos para que os discentes aprendam por meio de um processo em espiral. Nessa perspectiva, os sujeitos aprendizes são compreendidos como participantes ativos de seus processos de aprendizagem.
Nesse sentido, o presente trabalho está pautado na análise da proposta metodológica da disciplina Tecnodocência. Ressalta-se que esta disciplina é voltada para a formação de licenciandos da UFC e apresenta como objetivo possibilitar a integração entre Docência e TDIC no sentido de formar docentes que atueminterdisciplinarmente, utilizandoas TDIC na perspectiva construcionista. Desse modo, o objetivo deste trabalho é descrever como o uso das TDIC pode auxiliar na formação docente, tendo como base a perspectiva construcionista utilizada na disciplina Tecnodocência, ofertada aos licenciandos da UFC no semestre 2015.1.
Metodologia
Com o intuito de alcançar o objetivo proposto, o presente trabalho foi desenvolvido a partir de um estudo de caso realizado por meio de observação espontânea das participações de vinte e quatro licenciandos da UFC, matriculados na disciplina Tecnodocência no semestre 2015.1. Ressalta-se que a observação desenvolvida teve como foco a atuação destes alunos em atividades em que aparatos e ferramentas tecnológicas foram utilizadas para a produção de conteúdo.
Acerca do contexto em que a pesquisa foi realizada, observou-se que os licenciandos são em maioria do sexo masculino (54%) e encontram-se na faixa etária entre 25 e 35 anos (63%). Com relação aos semestres dos licenciandos participantes da disciplina, constatou-se a presença de licenciandos de nove diferentes semestres, havendo a predominância dos que estão no oitavo (25%). Um aspecto interessante a ser destacado nos dados obtidos consiste na diversidade de cursos presentes na disciplina Tecnodocência, tendo sido constatada a existência de nove diferentes cursos de licenciatura e um de bacharelado. Destes, o que contou com mais representantes na disciplina foi o de Química (25%), seguido pelo de Matemática (17%) e pelo de Letras Inglês (13%).
A presente pesquisa foi subdivida em três etapas: planejamento, coleta de dados e análise de dados. O planejamento foi iniciado em março do ano de 2015 com o estudo dos instrumentos a serem utilizados na coleta de dados e por meio de diálogo com a professora da disciplina, no sentido de organizar a forma como tais instrumentos seriam utilizados.
A segunda etapa se deu com a observação espontânea de todas as atividades desenvolvidas na disciplina, tendo como foco principal os momentos em que as TDIC foram abordadas em sala de aula pelos licenciandos para realizar os trabalhos propostos, no sentido de pensá-las para a docência, através do planejamento, da realização e da avaliação de aulas voltadas a alunos de escola pública. Acerca deste tipo de observação, Gil (2010) afirma que nela o pesquisador somente observa os fatos, sem fazer intervenções no grupo estudado.
Ressalta-se que os dados obtidos foram registrados em diário de campo e foram, posteriormente, transferidos para o computador, com a elaboração de relatórios contendo informações detalhadas de cada aula observada, de modo que os instrumentos utilizados na pesquisa foram os protocolos de coleta e os relatórios.
A terceira etapa refere-se à análise dos relatórios, com foco na reflexão sobre o uso das TDIC na docência. Assim, tais documentos foram analisados pautando-se nas categorias tecnologia, docência, construcionismo e instrucionismo, no sentido de refletir sobre o modo como estas categorias foram abordadas na disciplina (reflexões teóricas), bem como elas foram trabalhadas pelos licenciandos.
Sobre os relatórios produzidos, ressalta-se que estes se referem a todas as aulas ocorridas no semestre 2015.1 (março a junho de 2015), às sextas-feiras à tarde (das 14h às 18h), contabilizando vinte e dois relatórios. Destes, optou-se por analisar três relatórios relativos a
períodos diferentes, fazendo-se uma triangulação de fontes de dados, de maneira a comparar a compreensão dos estudantes sobre as categorias estudadas nestes períodos (STAKE, 1998).
Resultados e Discussão
A partir da análise dos relatórios produzidos, constatou-se no primeiro que os licenciandos compreendiam a tecnologia de maneira associada apenas aos recursos e ferramentas tecnológicas, e não como algo relativo a sistematização do saber fazer, como enfatiza Kenski (2007).
Nesse sentido, na aula realizada no dia 27 de março de 2015, a professora solicitou que os alunos citassem palavras que os remetessem ao conceito de tecnologia e as palavras indicadas foram: aparatos, produto, ferramentas, trabalho, inteligência, auxiliar, preguiça, facilitar, suporte, contemporaneidade, inovação, aprimoramento e pesquisa.
Com relação à categoria docência, constatou-se no primeiro relatório analisado que ela foi trabalhada a partir da exibição de vídeos gravados na aula do dia 20 de março de 2015 em que os licenciandos realizaram a atividade de simulação de aula, de modo que eles avaliaram as suas atuações como docentes e a professora teceu comentários acerca disso.
O primeiro aspecto destacado sobre a atividade de simulação foi o de que é necessário que haja uma aproximação entre os conteúdos trabalhados e a realidade dos alunos, aspecto que foi abordado nesse momento apenas por um dos grupos. Outro ponto debatido foi o predomínio de aulas expositivas, de modo que a professora destacou a necessidade de que as aulas se dessem de maneira a instigar a participação dos alunos, de modo que eles tivessem condições de questionar, de refletir criticamente, construindo novos conhecimentos, apoiando-se no construtivismo.
Quanto aos conceitos construcionismo e instrucionismo, destaca-se que estes não foram trabalhados na aula em questão, mas que algumas bases que estão relacionadas a eles foram discutidas, principalmente quando foi apresentada a necessidade de que as aulas fossem desenvolvidas no sentido de incitar a participação, aguçando a curiosidade dos alunos, não centrando-se na figura do professor.
No segundo relatório, referente à aula realizada no dia 17 de abril de 2015, observou-se que a compreensão acerca do conceito de tecnologia por parte dos licenciandos havia se modificado, no sentido de que construíram com a mediação dos professores a ideia de que a tecnologia se refere ao “estudo sistematizado do emprego de ferramentas”.
Quanto à docência, percebeu-se que ela foi abordada nessa aula a partir da análise da experiência vivenciada na aula anterior (do dia 10 de abril de 2015) em que os professores iniciaram o debate acerca do construcionismo e do instrucionismo não por meio de uma aula expositiva, mas de uma experimentação, demonstrando a possibilidade de os licenciandos pensarem em atividades nesse sentido. Além disso, a questão da docência foi trabalhada ainda no momento em que os discentes debruçaram-se sobre o plano de aula, refletindo sobre os conteúdos debatidos e pensando-os para a prática.
Com relação ao construcionismo e ao instrucionismo, observou-se que tais conceitos foram abordados a partir da análise da atividade de experimentação realizada na aula anterior, em que os licenciandos utilizaram a Máquina de Ensinar de Skinner e o software Super Logo de Papert. Nesta atividade de análise os discentes citaram algumas das suas impressões sobre a utilização dessas ferramentas, afirmando que a Máquina de Ensinar é marcada pela competição, repetição, dependência entre questões e pelo conhecimento centrado no computador; enquanto o Super Logo é marcado pela necessidade de conhecimentos prévios e pelo conhecimento centrado na pessoa, de modo que os alunos identificaram a primeira como instrucionista e a segunda como costrucionista.
Além disso, foram trabalhados nesta aula os teóricos Skinner, Papert e Valente e foram citados alguns exemplos de atividades em que o professor pode realizar com os alunos à luz do construcionismo e/ou do instrucionismo, no sentido de fazer com que os alunos pensassem em atividades a serem realizadas com os alunos da escola pública utilizando as tecnologias digitais. Na análise do terceiro relatório, relativo à aula realizada no dia 26 de junho de 2015, constatou-se que a tecnologia foi abordada mais quanto ao uso do que quanto ao seu conceito, no sentido de que os licenciandos, ao avaliarem os trabalhos desenvolvidos nas aulas anteriores, concluíram que é fundamental que o docente conheça os aparatos tecnológicos que utilizará e que os pensem no sentido de ser algo acessível e de conhecimento dos alunos.
Quanto à docência, observou-se que os licenciandos dos seis grupos interdisciplinares indicaram que as aulas que não foram totalmente expositivas foram mais interessantes e que o planejamento se constitui como uma ferramenta fundamental, havendo-se a necessidade de se pensar em “planos B” para a docência. Além disso, observou-se a dificuldade em todos os grupos de pensarem em como se deu o processo de aprendizagem dos alunos, demonstrando que a maioria ainda pensa o processo de ensino e aprendizagem focado na figura do professor.
Com relação ao construcionismo e ao instrucionismo, obteve-se que em todos os grupos foram utilizadas atividades à luz das duas perspectivas, havendo um predomínio da primeira. Observou-se que os licenciandos compreenderam os conceitos das duas perspectivas, bem como as diversas maneiras que podem utilizá-las na Educação, o que, conforme os professores, se constituía como um dos principais objetivos da disciplina.
Conclusão
A partir da realização deste trabalho, concluiu-se que os licenciandos compreenderam o conceito de tecnologia, entendendo-a para além dos aparatos e recursos tecnológicos, sendo algo relacionado à racionalização e sistematização destes aparatos e recursos. Além disso, observou-se que eles conobservou-seguiram perceber, a partir de reflexões teóricas e experimentações práticas, alguns dos limites e possibilidades relativos ao uso da tecnologia digital na docência.
Constatou-se ainda que os licenciandos perceberam a importância de se pensar a docência em outro sentido, em que o professor deve ser mediador do processo de ensino e aprendizagem, incentivando a participação, o questionamento dos alunos, de modo que a maioria indicou que as
aulas em que os alunos atuaram mais, realizando trabalhos, foram mais satisfatórias e interessantes.
Por fim, observou-se que os licenciandos compreenderam as perspectivas construcionistas e instrucionistas, tendo condições de utilizá-las em suas atuações docentes, processo que se deu não somente em âmbito teórico, mas também por meio de atividades em que tais atores experimentaram e realizaram atividades sob as duas perspectivas.
Assim, considera-se que a metodologia da disciplina, pautada em elementos como a utilização das TDIC na docência sob a perspectiva construcionista, mostra-se interessante, tendo em vista que, propicia aos licenciandos um espaço de reflexão teórica e prática de questões fundamentais à ação docente, dando condições para que eles consigam planejar, executar e avaliar aulas que não se mantenham presas às amarras que marcam a Educação desde a sua origem.
Pretende-se dar continuidade à pesquisa com coleta de dados a ser realizada em 2015.2 na disciplina de Tecnodocência ofertada como optativa pela Pró-Reitoria de Graduação a todos os alunos da UFC, com ênfase para os alunos das Licenciaturas.
Referências
ALMEIDA, Maria Elizabeth Bianconcini de. Mapeando percepções de docentes no CHIC para análise da prática pedagógica. In: OKADA, A. (org.). Cartografia Cognitiva: Mapas do conhecimento para pesquisa, aprendizagem e formação docente. Cuiabá: KCM, 2008.
ALONSO, Katia Morosov. Tecnologias da informação e comunicação e formação de professores: sobre rede e escolas. Educação & Sociedade, Campinas, v. 29, n. 104, p. 747–768, out. 2008. COUTINHO, Clara Pereira; LISBÔA, Eliana Santa. Perspetivando modelos de formação de professores que integram as TIC nas práticas letivas: um contributo para estado da arte. In: PROCEEDINGS OF ICEM & SIIE’11 JOINT CONFERENCE, 1., 2011, Aveiro. Anais PROCEEDINGS OF ICEM & SIIE’11 JOINT CONFERENCE. Aveiro: Editora Universidade de Aveiro, 2011, p. 251-262.
KENSKI, Vani Moreira. Educação e Tecnologias: O novo ritmo da informação. Campinas: Papirus, 2007.
STAKE, Robert. E. Investigación com estúdio de casos. Madrid: Morata, 1998.
VALENTE, José Armando. O computador na sociedade do conhecimento. Campinas: UNICAMP/NIED, 1999.
GIL, Antônio Carlos. Como elaborar projetos de pesquisa. São Paulo: Atlas, 2010.
Agradecimentos
Agradeço a Universidade Federal do Ceará, a Pró-Reitoria de Graduação e ao Programa de Formação Interdisciplinar Integrada às Tecnologias da Informação e Comunicação pelo apoio concedido com a oferta dos recursos necessários à realização desta pesquisa. Agradeço a professora Luciana de Lima e ao professor Robson Carlos Loureiro pelas valiosas contribuições, sem as quais este trabalho não seria possível.
