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PONTIFÍCIA UNIVERSIDADE CATÓLICA DE SÃO PAULO PUC-SP ALMIR GRIGORIO DOS SANTOS

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Academic year: 2018

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PUC-SP

ALMIR

GRIGORIO

DOS

SANTOS

As mudanças linguísticas nas crônicas do livro “amor

é prosa, sexo é poesia: crônicas afetivas” de Arnaldo

Jabor

MESTRADO EM LÍNGUA PORTUGUESA

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PUC-SP

ALMIR GRIGORIO DOS SANTOS

As mudanças linguísticas nas crônicas do livro “amor

é prosa, sexo é poesia: crônicas afetivas” de Arnaldo

Jabor

MESTRADO EM LÍNGUA PORTUGUESA

Dissertação

apresentada

à

Banca

Examinadora da Pontifícia Universidade

Católica de São Paulo, como exigência parcial

para obtenção do título de MESTRE em

LÍNGUA PORTUGUESA, sob a orientação

da Professora Doutora Dieli Vesaro Palma.

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Banca Examinadora

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Dedico esta dissertação a minha mãe, ao meu tio, a minha mulher, ao meu filho, a minha orientadora e a

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A DEUS, por estar sempre ao meu lado, renovando minhas forças dia após dia durante a Especialização e agora durante o Mestrado.

A minha mãe Sebastiana, pelo carinho, respeito e compreensão.

A minha mulher Fernanda, por não separar de mim.

Ao meu tio Geraldo, que desde cedo ensinou que devemos estudar.

Aos advogados Dr. Paulo de Souza Campos, Dra. Hedila e Dr. Josué Albuquerque, por corrigirem meus deslizes de Língua Portuguesa, despertarem e incentivarem o gosto pela leitura.

Ao meu chefe Paulo Rogério (Paulinho), por possibilitar minha participação nos eventos acadêmicos que acontecessem durante meu horário de trabalho.

À minha orientadora e mentora professora Dieli Vesaro Palma, por acreditar nesse aluno que a ela se apresentou cheio de falhas e imperfeições, mas com vontade de aprender a pesquisar.

À banca de qualificação, Jeni Silva Turazza e Elisa Guimarães pelas sugestões e observações enriquecedoras para a elaboração deste trabalho.

À secretária do Programa de Língua Portuguesa, Lourdes pela disposição e gentileza para solucionar problemas e esclarecer minhas dúvidas.

À secretária da professora Dieli, Tânia pela gentileza.

Às professoras, Leonor Lopes Fávero e Neusa Barbosa Bastos (Neusinha) e ao professor Jarbas pelo apoio e o carinho.

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O tema desta dissertação é sobre as mudanças linguísticas nas crônicas do livro “amor é prosa, sexo é poesia: crônicas afetivas” de Arnaldo Jabor. Nesse contexto, chama a atenção os movimentos que ocorrem na língua em uso comum durante as interações comunicativas, mas não são abordados pelas gramáticas normativas e a habilidade que cada falante tem de interagir socialmente com a língua, pois, é o falante quem organiza o discurso.

Dessa maneira, é um estudo que focaliza a língua em uso comum no dia a dia, questionando quais seriam as ocorrências de gramaticalização que o cronista usa em seus textos para manifestar suas intenções comunicativas com seus leitores e quais seriam os efeitos de sentidos que essas ocorrências, como marcas da língua em uso, possibilitam. Para isso, devemos considerar dois processos de criação linguística, a gramaticalização e a lexicalização, abordando o primeiro a mudanças dos itens lexicais nas construções linguísticas e o segundo é definido como um processo criador de novos elementos lexicais, modificando ou combinando os elementos já existentes.

Conforme os resultados obtidos, pode-se afirmar que a maneira como o autor escreve seus textos é como se estivesse conversando com alguém, ele trás a língua em uso comum no dia a dia para os textos escritos com a intenção de construir sentidos e manter a interação comunicativa com o seu leitor, uma língua que não é abordada pelas gramáticas normativas. É a gramática de base funcionalista, a gramaticalização e a lexicalização que servem de fundamento para essa abordagem, por envolver as relações lexicais, semânticas, gramaticais, discursivas e estudo da língua em uso real de comunicação.

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The topic of this dissertation is about the linguistic change in the chronicles of the book "amor é prosa, poesia é sexo: crônica afetiva" by Arnaldo Jabor. In this context, it draws attention to the movements that occur in the language in common use during communicative interactions, but are not approached by normative grammars and skill that each speaker has to interact socially with the language because it is the speaker, who organizes the speech.

Therefore, it is a study that focuses on the language in common use in day by day, questioning what would be the occurrence of grammaticalization the chronicler uses in his texts to express their communicative intentions with your readers and what are the effects of these occurrences meaning that, as language marks in use, enable. For this, we consider two processes of linguistics creation, grammaticalization and lexicalization, addressing the first to change the lexical items in the language constructs and the second is defined as a process of creating new lexical elements, modifying or combining existing elements.

According to the results, it can be said that the way the author writes his texts is like talking with someone, it brings the language in common use in day by day to texts written with the intention of building senses and maintaining the communicative interaction with its reader, a language that is not approached by normative grammars. It is the functionalist basis grammar, the grammaticalization and lexicalization that fit the principles for this approach, for it involves lexical relations, semantic, grammatical, discursives and language study in real use of communication.

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INTRODUÇÃO... 01

CAPÍTULO I. GRAMATICALIZAÇÃO... 08

1.1 HISTÓRICO E CONCEITO DE GRAMATICALIZAÇÃO... 10

1.2 PRINCÍPIOS DE GRAMATICALIZAÇÃO... 21

1.3 CARACTERÍSTICAS DA GRAMATICALIZAÇÃO... 24

1.4 MECANISMOS DE GRAMATICALIZAÇÃO... 28

1.5 CRITÉRIOS DE ANÁLISE... 33

CAPÍTULO II. FUNCIONALISMO LINGUÍSTICO E LINGUÍSTICA COGNITIVA... 36

2.1 CONCEITO DE LINGUÍSTICA FUNCIONAL... 38

2.2 PRINCÍPIOS DA TEORIA DO FUNCIONALISMO... 40

2. 2. 1 GRAMÁTICA E COGNIÇÃO... 47

2.3 CONCEITO DE LINGUÍSTICA COGNITIVA... 47

2.4 PRINCÍPIOS DA TEORIA DO COGNITIVISMO... 52

2. 4. 1 CATEGORIZAÇÃO... 52

2. 4. 2 TEORIA DOS PROTOTIPOS... 53

2. 4. 3 ICONICIDADE... 54

2. 4. 4 FRAMES E SCRIPTS... 55

2. 4. 5 TEORIA DOS ESPAÇOS MENTAIS... 56

2. 4. 6 LINGUAGEM CORPORIFICADA... 57

2.5 METÁFORA... 58

2.6 ENUNCIAÇÃO... 60

CAPÍTULO III. ANÁLISE DO CORPUS... 64

3.1 ANÁLISE... 66

3.1.1GRAMATICALIZAÇÃO DOS SUBSTANTIVOS... 66

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3.1.4 GRAMATICALIZAÇÃO DOS ADVÉRBIOS... 80

3.1.5 GRAMATICALIZAÇÃO DOS PRONOMES... 84

3.1.6 GRAMATICALIZAÇÃO DOS NUMERAIS... 85

3.1.7 GRAMATICALIZAÇÃO DAS PREPOSIÇÕES... 87

3.2 EXPRESSÕES LEXICAIS... 88

3.3 DISCURSIVIZAÇÃO... 97

3.4 DISCUSSÃO DOS RESULTADOS... 100

CONCLUSÃO... 107

BIBLIOGRAFIA... 113

(10)

INTRODUÇÃO

O tema desse trabalho é as mudanças linguísticas nas crônicas do livro “Amor é prosa, sexo é poesia: crônicas afetivas” de Arnaldo Jabor. Ele insere-se na linha de pesquisa História e Descrição da Língua Portuguesa do Programa de Estudos Pós-Graduados em Língua Portuguesa da Pontifícia Universidade Católica de São Paulo. Quando falamos em língua, imaginamos a fala de um grupo, às vezes dizemos que uma língua é mais difícil do que a outra, ou que a língua espanhola é mais fácil, pois é mais parecida com a língua portuguesa. Nosso conceito de fácil ou difícil é baseado sempre na gramática da língua, mas nunca no movimento que ocorre durante o processo de interação comunicativa.

A gramática funcional define a língua como sendo um instrumento de interação social, cuja principal função é a comunicação. Dessa forma, a competência comunicativa é a habilidade que cada falante tem de interagir socialmente com a língua. As pessoas valorizam demasiadamente a norma culta, esquecendo-se de prestarem atenção ao meio social em que estão situadas, ao meio social do qual fazem parte. Elas não observam a língua em uso no dia a dia, cheia de expressões, funções e sentidos que fornecem a descrição do funcionamento da língua num dado contexto.

A estrutura de uma língua é motivada pelas diversas situações comunicativas. O usuário é quem organiza seu discurso de acordo com a aceitação ou não de seu interlocutor. O objetivo do falante é, em geral, fazer com que o ouvinte mude seu ponto de vista em relação à informação que está sendo transmitida pelo falante, em outras palavras, nada mais é do que buscar convencê-lo em relação a algum ponto de vista, fazendo uso de meios criativos para alcançar seu objetivo, rompendo com as estruturas existentes e criando novas estruturas, para conseguir mudar o conhecimento do ouvinte. De acordo com Coseriu (2004, p. 101), “constitui aspecto fundamental da linguagem o manifestar-se ela sempre como língua: conquanto criação, isto é, produção contínua de elementos novos, e, portanto, neste sentido, „liberdade‟...”

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maioria das pessoas os rejeitam, não lhes dão valor, valorizando em contra partida uma língua que existe, nos manuais de gramática normativa e no imaginário dos usuários, porque, nas situações quotidianas, o falante desconsidera as mudanças que ocorrem na língua em uso.

Para Coseriu (1979, p. 33), “a língua não existe senão no falar dos indivíduos, e o falar é sempre falar uma língua. Como já dizia Platão, o falar é o ato que utiliza palavras postas à sua disposição pelo „uso‟. E é necessário acrescentar que o ato manifesta concretamente o uso e, ao manifestá-lo, supera-o e modifica-o.”

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Nas palavras de Bechara (2004, p. 13),

cada modalidade da língua tomada homogênea e unitariamente, ou em outros termos, toda língua funcional – como entende o lingüista Eugenio Coseriu – tem a sua gramática como reflexo de uma técnica lingüística que o falante domina e que lhe serve de intercomunicação na comunidade a que pertence ou em que se acha inserido.

Continua o autor (2004), afirmando que antigamente o professor somente aceitava como língua a modalidade culta, não levava em consideração a língua que o aluno aprendia em casa com seus pais e familiares, repudiando o saber linguístico prévio do aluno.

Conforme podemos observar nas palavras de Evanildo Bechara (2004), os professores de Língua Portuguesa devem saber que seus alunos têm conhecimentos prévios da Língua, que foram adquiridos em seus lares com sua família e que não devem ser deixados de lado, mas que deve, sim, ser respeitado e considerado nas aulas de Português.

Nosso trabalho é mais abrangente do que o de Amadora Vilar Fraiz, pois tem como objetivo estudar todas as ocorrências de gramaticalização no nível da Morfologia no livro: Amor é Prosa, Sexo é Poesia: Crônicas Afetivas, de Arnaldo Jabor. Isso significa não somente estudar os numerais que sofreram o processo de gramaticalização, mas também estudar os substantivos, os pronomes, os verbos, os advérbios, as preposições que sofreram gramaticalização, além de expressões lexicais que sofreram os processos de gramaticalização e dos casos de discursivização encontrados nos textos de Aranaldo Jabor.

A língua é renovada diariamente e esse é o objetivo deste trabalho, mostrar a renovação que ocorre na língua e que não é registrada pela gramática tradicional. As mudanças na língua acontecem com muita frequência, de forma gradativa e são o resultado de um longo e contínuo processo histórico. Elas estão ocorrendo, embora imperceptíveis aos falantes, somente são perceptíveis aos pesquisadores que dedicam horas e horas de pesquisa voltada para a língua em uso no dia a dia, em situação real de comunicação.

De acordo com Luft (2008: 22),

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Gramática completa de uma língua viva deveria registrar sua variabilidade e as tendências evolutivas das regras gramaticais.

Gonçalves et alii (2007) dizem que a constante renovação do sistema linguístico – percebida, sobretudo, pelo surgimento de novas funções para formas já existentes e de novas formas para funções já existentes – traz à tona a noção de “gramática emergente” (Hopper, 1987), uma concepção assumida de modo explícito por diversos estudiosos da gramaticalização.

Foi Antoine Meillet (1912) quem primeiro empregou o termo gramaticalização

definindo esse processo como a atribuição de um caráter gramatical a uma palavra anteriormente autônoma. Esse estudioso também observou em suas pesquisas que, em todos os casos de gramaticalização, era possível chegar-se à fonte primária de uma forma gramatical.

Hopper (apud GONÇALVES 2007: 15),

entende a gramática das línguas como constituída de partes cujo estatuto vai sendo constantemente negociado na fala, não podendo em princípio ser separado das estratégias de construção do discurso. Subjazem a esse entendimento uma concepção de língua como atividade em tempo real e a postulação de que, a rigor, não há gramática como produto acabado, mas sim em constante processo de gramaticalização.

Para Martelotta (2011, p. 92), por sua vez, “a gramaticalização é definida como um processo de mudança linguística unidirecional, segundo o qual itens lexicais e construções sintáticas, em determinados contextos, passam a assumir funções gramaticais e, uma vez gramaticalizados, continuam a desenvolver novas funções gramaticais”.

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Nosso interesse pelo tema surgiu quando a elaboração da monografia no Curso de Especialização em Língua Portuguesa da PUC/SP. Nesse momento, estudamos o tema o processo de gramaticalização dos advérbios nas crônicas jornalísticas, que resultou no trabalho O Processo de Gramaticalização dos Advérbios no Gênero Jornalístico Crônica. No curso de Mestrado, demos continuidade a essa investigação, agora focalizando as ocorrências de gramaticalização na obra Amor é prosa, sexo é poesia: crônicas afetivas, de Arnaldo Jabor.

As questões que direcionaram nosso estudo foram:

- Nas crônicas de Arnaldo Jabor, na obra Amor é prosa, sexo é poesia: crônicas afetivas, quais seriam as ocorrências de gramaticalização de que ele faz uso para manifestar suas intenções comunicativas e que caracterizariam o gênero jornalístico crônica?

- Quais seriam os efeitos de sentido que essas ocorrências, como marcas da língua em uso, possibilitam?

Com base nessas questões, o trabalho tem como objetivos:

- Aprofundar conhecimentos, com base nas crônicas de Arnaldo Jabor, sobre os diversos tipos de ocorrências de gramaticalização presentes no gênero jornalístico crônica.

- Identificar as ocorrências de gramaticalização nas crônicas de Arnaldo Jabor, como marcas da língua em uso.

- Analisá-las de acordo com os princípios de gramaticalização, propostos por Castilho (1997) e critérios de gramaticalização, levantados por Gonçalves et alii (2007), a fim de estabelecer um quadro tipológico dessas ocorrências.

- Verificar qual a intenção comunicativa do autor ao utilizar essas ocorrências e qual o efeito delas na construção de sentidos do texto.

Para que possamos entender melhor parte da mudança que ocorre na língua em uso, precisamos de um corpus para análise e o que melhor se enquadra na língua falada é a crônica.

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simples e espontânea, relatam fatos do cotidiano e o cronista tenta aproximar-se ao máximo possível da língua em uso comum no dia a dia.

Quando lemos as crônicas do escritor Arnaldo Jabor às terças-feiras no jornal “O Estado de São Paulo”, no Caderno2, ou os livros que foram publicados pelo autor, por exemplo, a obra focalizada neste trabalho, que é uma coletânea de crônicas publicadas na imprensa escrita e que o autor resolveu reunir em um livro. Nessa obra, notamos que ele faz uso de um grande número de ocorrências de gramaticalização, mostrando a instabilidade da língua e as características próprias da língua em uso. Lembra a língua do dia a dia, da conversa de bar, da fala descontraída sem preocupações com correções gramaticais, ou seja, é uma linguagem livre das barreiras dos puristas. Assim, foi considerando essa quantidade de casos de gramaticalização que escolhemos o livro

Amor é Prosa, Sexo é Poesia: Crônicas Afetivas como nosso corpus para análise. Não é nosso objetivo desenvolver um estudo aprofundado de cada ocorrência selecionada, mas, sim, descrevê-lo e a partir de sua descrição chegar ao ponto de alcançar os efeitos de sentido que a gramaticalização proporciona, explicando-os tendo como base teórica as teorias da gramaticalização, da linguística funcional e da linguística cognitiva. O autor frequentemente faz o uso da língua falada em seus textos escritos. Arnaldo Jabor assume posições diferentes nos textos, ou seja, não escreve sempre do mesmo jeito e, em decorrência do posicionamento que assume, vai escolher determinados elementos gramaticalizados que darão destaque à posição que ele assume como interlocutor, construindo, assim, os sentidos do texto. O cronista valoriza a expressão coloquial, livre de preocupações gramaticais, pois, no fim das contas, ele se comunica de acordo com a língua em uso e de acordo com o meio social com quem interage.

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da língua, prescrevendo como correto somente o que está nela, ou seja, aquilo que segue as regras de bom uso, sem levar em consideração que a língua é um instrumento vivo e que as pessoas estão sempre interagindo umas com as outras de forma espontânea. A gramática tradicional não reconhece esse caráter mutável da língua. Notamos, muitas vezes, que as classes gramaticais, em muitos textos escritos, não exercem de fato a sua função segundo a gramática normativa, ou seja, advérbios não exercem a função de advérbio, adjetivos não exercem a função de adjetivo e assim por diante. Esse caráter de instabilidade de uma língua viva, como veremos na análise, caracteriza um dos casos de gramaticalização, o dos advérbios, no gênero jornalístico “crônica”.

Para atingirmos os objetivos propostos, este trabalho está organizado em três capítulos. No capítulo 1, caracterizamos a gramaticalização, abordando sua conceituação e seu percurso histórico. Tratamos também dos princípios de gramaticalização, das características da gramaticalização, dos mecanismos de gramaticalização e dos critérios de análise.

No capítulo 2, focalizamos em primeiro lugar o funcionalismo linguístico, seu conceito e os princípios da teoria do funcionalismo, em segundo lugar a linguística cognitiva, seu conceito e os princípios da teoria do cognitivismo, a metáfora e, por último, focalizamos a enunciação.

No capítulo 3, com base nos conceitos estudados nos capítulos 1 e 2, analisamos as crônicas jornalísticas do livro de Arnaldo Jabor, com o objetivo de discutir as ocorrências de gramaticalização presentes na obra citada. É importante lembrarmos que ao selecionarmos os textos para a análise, optamos por fazer uma análise no nível morfológico. Devido à quantidade de ocorrências de gramaticalização repetidas que encontramos ao longo de nossa leitura, selecionamos os exemplos que apareceram com maior frequência nos textos.

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CAPÍTULO I

GRAMATICALIZAÇÃO

É fato que todas as Línguas têm suas particularidades. A Língua Portuguesa tem suas particularidades, a Língua Inglesa tem suas particularidades, a Língua Espanhola também tem suas particularidades etc. e elas podem ser melhor observadas no seu uso comum, no dia a dia, nas situações de interação comunicativa em tempo real. Todas as línguas têm uma gramática que prescreve o uso da norma culta, entretanto podemos perceber que, na língua usada nas conversas diárias, nos bares, nas rodas de amigos, nas falas descontraídas, espontâneas e dinâmicas, nenhum usuário comunica-se como está prescrito na gramática normativa. Ele comunica-se de forma que o entendam, ou seja, na comunicação diária não existe a necessidade de falar de acordo com as regras gramaticais normativas, mas somente em determinadas situações comunicativas que assim o exijam, pois, fora desses casos especiais, o usuário não tem necessidade de fazer uso de um conjunto de regras gramaticais prescritivas para se comunicar.

A gramática normativa, quando foi criada, ela tinha o objetivo de registrar o uso da língua, de preservá-la de alterações e de mostrar as regras para bem falar e escrever, com bases nos textos clássicos da Literatura. Essa tradição de se preservar o bem escrever encontra-se, por exemplo, em Machado de Assis e Olavo Bilac, pois esses autores brasileiros escreviam de forma conservadora, ou seja, eles idealizavam uma Língua Portuguesa que seria perfeita, sem alterações, sem variações no seu uso falado ou escrito, sem se preocuparem com o usuário. Hoje, estamos mudando essa visão, pois sabemos que a língua só existe por causa do usuário, do falante e é ele quem a muda, transforma e adapta de acordo com o contexto em que está inserido. O usuário da língua adapta sua maneira de falar de acordo com o meio social do qual faz parte para ser entendido e entender e compreender o que outros usuários estão falando, qual é a mensagem que eles pretendem transmitir.

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gramática normativa, mas sim fazer uso da língua de tal forma que seja compreendido por quem o está ouvindo. O falante durante um processo comunicativo faz adaptações praticamente o tempo todo para ser entendido, para que aquilo que está falando seja entendido, porque ele tem uma mensagem a ser transmitida e, por trás dela, há uma intenção que também deve ser percebida pelo ouvinte. Por isso, ele faz adaptações o tempo todo em sua maneira de falar.

A gramaticalização tem por objetivo estudar essas mudanças, alterações e transformações que ocorrem na língua em uso no dia a dia, mas que não fazem parte e não são citadas em nenhum momento pelas gramáticas normativas, ou seja, elas ocorrem somente na língua em uso. Entretanto, essas ocorrências podem ser percebidas em alguns textos escritos, pois, de tanto aparecerem na língua falada, estão também começando a aparecer nos textos escritos, por exemplo, crônicas, tirinhas de jornal, ou seja, em quadrinhos e em anúncios publicitários. As mudanças e transformações da língua não acontecem da noite para o dia, elas levam algum tempo para fazer parte do uso comum de vários usuários para então serem consideradas de fato uma mudança linguística e poderem ser objeto de estudo, ou seja, após institucionalizada, aquela mudança linguística pode ser estudada por pesquisadores da linguagem que estão interessados em saber como determinada alteração se deu na língua em uso, o que motivou essa mudança e quando, ou melhor, em que época teve início determinada mudança linguística por meio de registros escritos.

Nas palavras de Martelotta (2011, p. 92),

a gramaticalização é definida como um processo de mudança linguística unidirecional, segundo o qual itens lexicais e construções sintáticas, em determinados contextos, passam assumir funções gramaticais e, uma vez gramaticalizados, continuam a desenvolver novas funções gramaticais. Seguindo esse processo, o elemento deixa de atuar no nível representacional, característico dos elementos que fazem referência a dados mais objetivos associados ao nosso mundo biossocial, para atuar no nível interpessoal, que engloba as expressões de valor processual, ou seja, aquelas cujas funções estão relacionadas aos processos através dos quais o falante elabora seu enunciado para um determinado ouvinte em um contexto específico de uso.

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mecanismos e sua contribuição para a construção de sentidos, propostos pelos estudiosos da Gramaticalização, Antonie Meillet (1948); Mário Eduardo Martelotta (1996, 2011); Sebastião Carlos Leite Gonçalves, Maria Célia Lima-Hernandes e Vânia Cristina Casseb-Galvão (2007); Maria Helena de Moura Neves (1997, 2000, 2009, 2012); Ataliba T. de Castilho (1997), entre outros. A seguir abordamos o histórico e o conceito de gramaticalização.

1.1. HISTÓRICO E CONCEITO DE GRAMATICALIZAÇÃO

Até o ano de 1980, os estudiosos da linguagem não davam tanta importância para desenvolver os estudos linguísticos levando em consideração o falante, ou seja, a fala em tempo real e suas ocorrências espontâneas em função das necessidades comunicativas. Eles simplesmente acreditavam que a língua era homogênea, perfeita, a língua que, por exemplo, encontramos nos romances clássicos com sua linguagem rebuscada. Pensando dessa maneira esses pesquisadores deixavam de lado um elemento importante para a comunicação sem o qual ela não ocorre, o usuário, o falante. O falante é o elemento mais importante do processo comunicativo, sem ele não existe língua, não existe a fala, não podemos afirmar também que há interação, pois sabemos que a interação ocorre entre pessoas que se comunicam, compartilham informações e experiências vividas no dia a dia, e é isso que chamamos de interação. Nos dias atuais não podemos imaginar um estudo sobre a linguagem que não considere o falante.

Somente a partir da década de 80, a gramaticalização passou a ser objeto de interesse de muitos estudiosos da Língua, algo que não acontecia até o momento, pois a Língua sempre foi vista de forma ideal, ou seja, os gramáticos e escritores da época praticamente idolatravam e cultuavam-na como um objeto valiosíssimo, um objeto que não apresentava falhas, algo perfeito, haja vista, a ideia que Chomsky tinha de Língua quando escreveu sua gramática gerativa, acreditando no princípio do inatismo, que diz “que existe uma estrutura inata, ou seja, existe um conjunto de princípios gerais que traça limites entre as línguas de forma universal, estão presentes em todas as línguas do mundo”.

De acordo com Martelotta (2008, p. 60),

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distinção entre competência e desempenho. O autor define “competência” como a capacidade – em parte inata e em parte adquirida – que o falante possui de formular e compreender frases em uma língua e caracteriza o “desempenho” como a utilização concreta dessa capacidade. Apenas no conhecimento se encontra o “módulo de linguagem”, já que no desempenho (o único que é observável diretamente) podemos notar vários módulos em interação, como linguagem, memória, emoção, concentração, entre outros. Cabe mencionar que Chomsky assume uma posição semelhante à de Saussure ao sustentar que o objeto da linguística deve ser a competência, e não o desempenho. Isso significa que mais uma vez o sujeito, como usuário real da língua, e suas habilidades sociointerativas ficam de fora dos estudos linguísticos. Chomsky propõe, portanto, uma noção idealizada de competência, característica de um falante/ouvinte igualmente idealizado, que usaria de modo regular seu conhecimento linguístico, independente das diferentes situações reais de comunicação.

A partir da década de 80 os estudiosos da linguagem começaram a observar que não existe língua ideal, língua perfeita, mas sim uma língua que se adapta e se adequa de acordo com as necessidades comunicativas, ou seja, a língua é produto do homem, ele é que a constrói, faz as adaptações e as divulga, sendo assim, com o passar do tempo determinados termos e expressões cristalizam-se e passam a fazer parte da língua de um povo, os estudiosos da linguagem começam a prestar mais atenção no papel desempenhado pelo falante durante o processo comunicativo. Quando determinados termos ou expressões que são usados constantemente pelas pessoas em situações cotidianas, ou seja, no uso real são registradas, elas passam a fazer parte daquela língua e merecem ser estudadas. A gramaticalização passou a ser objeto de estudo.

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situações reais de comunicação, ou seja, nas interações entre os falantes no dia a dia. Foi esse caráter espontâneo, dinâmico e mutável da Língua que levou ao aumento do interesse dos estudiosos da linguagem pelos estudos de gramaticalização nos estudos linguísticos mais recentes.

Do ponto de vista histórico, Maria Helena de Moura Neves (2004) postula que as pesquisas e os estudos que foram feitos sobre gramaticalização tiveram seu início no século X na China e, a partir do século XVII, ocorreram na França, Inglaterra, Alemanha e Estados Unidos. No século XX, foi Antonie Meillet (1912) o primeiro estudioso da linguagem a empregar o termo gramaticalização caracterizando esse processo como a atribuição de um caráter gramatical a uma palavra anteriormente autônoma. Esse pesquisador da linguagem também observou em seus estudos que, em todos os casos de gramaticalização, era possível chegar-se à fonte primária de uma forma gramatical. De acordo com Moura Neves (2004), Meillet observou que, em todos os casos em que se podia conhecer a fonte primeira de uma forma gramatical, essa fonte era uma palavra lexical, e que a transição é sempre uma espécie de continuum. Segundo Poggio (2002), Meillet demonstrou, em seus estudos, que, além de procurar a etimologia da palavra, procurava também encontrar as transformações das formas gramaticais. Para o pesquisador, a gramaticalização pode afetar cada palavra, estendendo-se à sentença, inclusive podendo afetar também a ordem das palavras nas sentenças. Para ele, existiam três classes de palavras: as principais, as acessórias e as gramaticais e entre elas ocorre uma transição gradual. Continua Poggio (2002) afirmando que Meillet deu realce aos fatores de expressividade e uso. Cada vez que um elemento linguístico é empregado, seu valor expressivo diminui e a repetição torna-o desgastado. Devido à necessidade de falar com maior força expressiva, são criadas novas formas gramaticais, em decorrência do desgaste progressivo das palavras.

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base lexical, em determinados contextos linguísticos, passam a exercer funções gramaticais e, se já gramaticalizadas, podem vir a desenvolver funções ainda mais gramaticais.

Para nomear esse processo e chegar finalmente a um consenso sobre qual nome seria o mais adequado para designar o que hoje conhecemos como “Gramaticalização”, não foi uma tarefa muito fácil conforme veremos a seguir. Alguns pesquisadores desse processo sugeriram vários nomes, inclusive nomes que são características do processo de gramaticalização, por exemplo, esvaziamento semântico e reanálise, que na verdade fazem parte do processo de análise das ocorrências de gramaticalização. Em outras palavras, para que possamos analisar as ocorrências de gramaticalização, devemos considerar alguns princípios de análise desse processo e entre os vários princípios e parâmetros de análise do processo de gramaticalização existem o esvaziamento semântico e a reanálise. A seguir veremos exemplos dos nomes que foram sugeridos para nomear esse processo.

Neves (2004), afirma que não há um acordo para nomear esse processo: gramaticalização, gramaticização e gramatização. Poggio (2002), por sua vez, vai um pouquinho mais longe dizendo que há diversas perspectivas sobre a designação desse processo. Afirma haver uma confusão para nomeá-lo: gramaticização, gramatização, gramaticalização, apagamento semântico, condensação, enfraquecimento semântico, esvaimento semântico, morfologização, reanálise, redução e sintaticização.

Apesar de toda essa discussão, a maioria dos teóricos parece concordar em utilizar o termo “gramaticalização” que foi empregado primeiramente pelo Linguista Francês Antoine Meillet em 1912.

Outra questão que gera um pouco de desconforto entre os estudiosos da linguagem é saber definir o conceito de gramaticalização. A única informação referente a esse processo que é compartilhada por todos os pesquisadores das ocorrências de gramaticalização é a de que esse processo se dá e é renovado na língua em uso comum no dia a dia, ou seja, é fato comprovado por meio de pesquisas que é o falante o responsável pelas transformações que ocorrem na língua. Nos próximos parágrafos mostramos que não há consenso em relação à definição desse processo.

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gramaticalizados, continuam a desenvolver novas funções gramaticais. Seguindo esse processo, o elemento deixa de atuar no nível representacional, característico dos elementos que fazem referência a dados mais objetivos associados ao nosso mundo biossocial, para atuar no nível interpessoal, que engloba as expressões de valor processual, ou seja, aquelas cujas funções estão relacionadas aos processos através dos quais o falante elabora seu enunciado para um determinado ouvinte em um contexto específico de uso”.

Poggio (2002), com base em Castilho (1997b, p.31 e 32), define gramaticalização como o trajeto empreendido por uma forma, ao longo do qual, ela muda de categoria sintática (= recategorização), recebe propriedades funcionais na sentença, sofre alterações semânticas e fonológicas, deixa de ser uma forma livre e até desaparece como consequência de uma cristalização extrema. Em sentido mais amplo, o autor define gramaticalização como o processo de codificação de categorias cognitivas em formas linguísticas, aí incluindo a percepção de mundo pelas diferentes culturas e o processamento da informação.

Para Moura Neves (op.cit.), o estudo da gramaticalização põe em evidência a tensão entre a expressão lexical, relativamente livre de restrições, e a codificação morfossintática, porém sujeita a restrições, não esquecendo de levar em consideração a indeterminação relativa da língua e o caráter não-discreto de suas categorias.

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suas falas de acordo com o meio em que estão inseridos, usando da criatividade para tal.

Esse tipo de mudança linguística requer do pesquisador ou estudioso da linguagem uma concepção não-estática da gramática das línguas humanas. Nesse sentido, ele deve saber que o sistema linguístico está em constante renovação e não pode pensar que fazer uso ou bom uso da Língua significa saber falar e escrever da forma como prescreve a Gramática Normativa, pois, sabe-se que o usuário tem liberdade no emprego da Língua e que ele fala e escreve sem nenhum tipo de impedimento, mas, é obvio, fazendo as adequações para que não seja ignorado pelos outros falantes. Esse aspecto só serve para reforçar a afirmação de que os sistemas linguísticos passam por uma constante renovação.

Desse modo, não podemos afirmar que existe gramática como produto acabado, finalizado e que as pessoas falam e escrevem de acordo com o que está prescrito nela, mas devemos entendê-la como em movimento constante de mudança, contribuindo para essa situação a gramaticalização. Assim, esse processo nos prova e mostra que a língua é viva, é espontânea e está em constante processo de transformação e evolução que se dá por meio do processo interacional entre as pessoas na convivência diária em sociedade. Viver em sociedade significa interagir a todo instante com pessoas, trocar ideias, informações, descontrair praticando algum tipo de atividade física etc. Nas palavras de P. Bange (apud KOCH 2006, p.75), “um ato de linguagem não é apenas um ato de dizer e de querer dizer, mas, sobretudo e essencialmente um ato social pelo qual os membros de uma comunidade inter-agem”.

Todo esse movimento de renovação da Língua em uso no dia a dia pode ser explicado pela teoria da interação social da qual a gramática funcional faz parte porque seu objeto de estudo é a Língua em uso, ou seja, a língua em seu estado puro, espontânea, dinâmica sem estar presa ou ligada às regras e correções gramaticais que os gramáticos tanto prezam e cultuam.

De acordo com Neves (2004, p. 15),

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usar e interpretar essas expressões de uma maneira interacional satisfatória.

Essa modalidade de gramática concebe a língua como um instrumento de ação social entre as pessoas, entendendo que ela é usada principalmente para estabelecer relações de interação comunicativa entre os usuários nas diversas situações comunicativas. Ela possibilita estabelecer contato com diferentes pessoas que fazem uso de elementos linguísticos diferentes dos demais falantes para se comunicar e estes, por sua vez, aprendem outras formas da Língua em uso que eram desconhecidas, porém, por meio do contato, tornaram-se também conhecidas. Essa situação repete-se inúmeras vezes até que um número grande de falantes faça uso dessas formas linguísticas e passem a usá-las com frequência. No decorrer do tempo, esses novos usos institucionalizam-se, vindo a fazer parte dos dicionários e do Vocabulário Ortográfico de Língua Portuguesa.

Para Martelotta (2011), os usuários durante o processo de interação manipulam termos e expressões disponíveis em sua língua para usar as diferentes estratégias comunicativas, marcando sua posição subjetiva em relação ao conteúdo que querem transmitir e sua preocupação em relação à forma como será recebida esse conteúdo pelos seus ouvintes de acordo com as condições contextuais em que ocorre o processo comunicativo.

De acordo com Brait (2003, p. 220, 222),

o processo da interação é um componente do processo de comunicação, de significação, de construção de sentido e que faz parte de todo ato de linguagem. É um fenômeno sociocultural, com características linguísticas e discursivas passíveis de serem observadas, descritas, analisadas e interpretadas. Os falantes não somente trocam informações e expressam ideias, mas também, durante um diálogo, constroem juntos o texto, desempenhando papéis que, exatamente como uma partida de um jogo qualquer, visam à atuação sobre o outro.

Como interação e gramática apresentam estreita relação, para Martelotta (2011, p.64,65),

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Em face do exposto podemos afirmar que o texto é um lugar de interação com os próprios interlocutores negociando a todo o momento os sentidos de maneira interativa. Os falantes adaptam suas formas e maneiras de expressarem-se aos diferentes contextos textuais de acordo com sua intenção e com a aceitação e reação do ouvinte em relação a tudo o que está ouvindo do falante. Para que haja o caráter interacional, é necessário que haja essa troca, ou melhor, essa resposta ou reação do ouvinte em relação a tudo que é dito pelo falante. Somente dessa maneira, o locutor poderá alterar seu discurso, sempre de acordo com as reações expressas pelo ouvinte, mostrando que a fala se dá por meio do caráter interacional. Isso ocorre porque a Língua é um fenômeno sócio-histórico-cultural, ou seja, faz parte da cultura de determinado país ou nação, não podendo ser imaginada separada do usuário, pois é ele quem dá vida à língua, aos falares, às transformações e criações linguísticas, ou seja, é o falante que faz com que haja um grande movimento na língua.

A gramaticalização é um processo que pode ser situado numa perspectiva sincrônica, diacrônica e também pancrônica as quais são maneiras de se estudar a língua. A sincronia refere-se a um recorte no tempo para estudo da língua, a diacronia refere-se ao eixo histórico e a comparação evolutiva da língua, a pancronia, corresponde à união da sincronia e diacronia. Por um lado, quando verificamos como determinado elemento linguístico é usado na língua em uso nos dias atuais, fazemos uma análise sincrônica, por exemplo, quando analisamos o uso da expressão “a gente” como pronome pessoal do caso reto “nós”, percebemos que, nos dias atuais, em situações de língua real, usada no dia a dia, o pronome pessoal do caso reto “nós” está sendo substituído na língua oral e também na escrita pela expressão “a gente”.

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dias atuais, não podemos mais afirmar que esse verbo tem apenas o sentido original, pois ele adquiriu outros sentidos totalmente diferentes do primeiro.

Nas palavras de Alencar (2009, p.35),

o estudo de gramaticalização numa perspectiva sincrônica, objetiva estudar o fenômeno do ponto de vista de padrões fluidos do uso linguístico, já a linguística diacrônica incorpora a gramaticalização como um meio para analisar a evolução e reconstruir a história de uma determinada língua ou grupos de língua, além de relacionar as estruturas linguísticas do momento com padrões anteriores e de uso linguístico e por último a perspectiva pancrônica que nada mais é do que a união da sincronia e da diacronia mostrando que uma não pode ser entendida sem a outra, que a gramaticalização é impraticável se houver separação rígida entre sincronia e diacronia.

A gramaticalização é um processo que faz parte da cognição humana, conforme afirma Givón (apud NEVES 2006), que a considera como um processo instantâneo, envolvendo um ato mental pelo qual uma relação de similaridade é reconhecida e é explorada. Por meio dele, um item primitivamente lexical gramaticaliza-se pelo uso como uma unidade gramatical em um novo contexto. Vê-se, portanto, que os atos mentais são capazes de criar e construir novas formas linguísticas para os elementos linguísticos nos mais variados contextos, ou melhor, nas diversas situações comunicativas.

Para Alencar (2009), o estudo da gramaticalização, numa perspectiva histórica, tem como objetivo as origens das formas gramaticais, as transformações pelas quais passaram as línguas ao longo do tempo, bem como as mudanças típicas que as afetam nesse percurso temporal, pois nenhuma língua é estável, sempre sofre alterações e transformações em sua estrutura, daí todas as línguas serem mutáveis e sofrerem transformações com o passar do tempo. A. Meillet (apud ALENCAR 2009) afirma que, havendo gramaticalização em todos os casos em que se podia conhecer a fonte primeira de uma forma gramatical, essa fonte era uma palavra lexical e que a transição do lexical para o gramatical é sempre uma espécie de continuum.

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gramaticalização de expressões de ideias concretas. Poggio (2002), a partir dessas ideias, mostra que a evolução da gramática ocorreu por diferentes estágios, a saber: pragmático, sintático, aglutinação e morfológico:

1º estágio: pragmático (sentido denotativo/ objetos concretos).

2º estágio: sintático (palavras oscilam entre sentido concreto e o formal).

3º estágio: aglutinação (palavras funcionais afixadas às palavras materiais).

4º estágio: morfológico (pares aglutinados fundem-se em uma só palavra/ raiz e afixos contêm significado material e gramatical).

Antonie Meillet conseguiu com seus estudos, suas pesquisas mostrar, provar e demonstrar as transformações das formas gramaticais. De acordo com Poggio (2002, p. 66), para esse autor, as novas formas gramaticais surgem através de dois processos: a analogia e a gramaticalização. Já para autores contemporâneos como Mário Eduardo Martelotta (2011) e Sebastião Carlos Leite Gonçalves, Maria Célia Lima-Hernandes e Vânia Cristina Casseb-Galvão (orgs.) (2007), os principais motivadores da gramaticalização são o processo metafórico e o processo metonímico que serão abordados mais adiante. Enquanto a analogia renova as formas e deixa o sistema intacto, ou seja, sem criar novas formas, sem criar novas funções, não levando em consideração a gramática emergente da língua, a gramaticalização cria novas funções para formas já existentes e novas formas para funções já existentes, que nada mais é do que evidenciar a noção de gramática emergente, resultando em mudança no sistema de comunicação social, na fala em seu estado real de comunicação.

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O processo de gramaticalização objetiva mostrar que o sistema linguístico, por mais que os falantes e usuários não prestem atenção ao que estão fazendo com a língua, ela está em constante transformação, mudança e renovação que são negociadas na fala em momento real, ou melhor, em tempo real de comunicação. Nesse processo, as novas formas ou expressões linguísticas podem, em alguns casos conviver com as antigas sem que, necessariamente devam sumir ou ser apagadas do sistema linguístico. Ela é percebida, sobretudo pelo surgimento de novas funções para formas já existentes e de novas formas para funções já existentes, aspecto que está, em princípio, ligado às estratégias de construção do discurso e também que nos traz à tona a noção de gramática emergente da língua.

Ainda, segundo Poggio (2002), há três grupos de conceitos de gramaticalização, a partir de épocas e perspectivas diferentes. O primeiro grupo trata do léxico e da gramática e a gramaticalização é vista como um processo por meio do qual uma unidade léxica ou uma estrutura lexical assume uma função gramatical. O item lexical vai de uma classe aberta para uma classe fechada. De acordo com a autora, os pesquisadores J. Kurylowicz, G. Sankoff e J. Bybee entendem que a gramaticalização é decorrente de alterações morfológicas. Essa concepção se estendeu até a década de 70.

O segundo grupo trabalha com o discurso e a gramática: a partir de meados de 1970, o discurso pragmático foi considerado como um parâmetro para o entendimento da estrutura linguística e para o desenvolvimento de estruturas sintáticas e categorias gramaticais. Essa nova forma de se conceber a relação do usuário com a linguagem compreende a gramaticalização como reanálise dos moldes do discurso para os moldes gramaticais.

O terceiro grupo que é o dos cognitivistas, desenvolvido por E. Sweetesr (1988), Heine, Claudi e Hünnemeyer (1991), S. Svorou (1933), entre outros que vê a gramaticalização como um fenômeno externo à estrutura da língua e que pertence ao domínio cognitivo. Esses linguistas enfatizam também que a gramaticalização é proveniente de alterações semânticas.

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gramaticalização pode ser encarada como um processo pancrônico que apresenta uma perspectiva diacrônica, porque envolve mudança, e uma perspectiva sincrônica, porque implica variação, podendo ser descrita como um processo em referência ao tempo. Em face do que foi exposto até agora, podemos verificar que a gramaticalização faz parte do nosso dia a dia nos processo de interação comunicativa com as pessoas de nosso convívio social. Constatamos esse movimento da língua quando fazemos adaptações, a fim de que entendamos e nos façamos entender por nossos ouvintes. Nesse trabalho, entendemos que o conceito de gramaticalização que está mais próximo das questões ligadas à língua em uso e que deve ser seguido ao longo dele é o proposto por Martelotta (2011).

Não podemos esquecer que Martelotta (2011, p. 24) faz observações também sobre o processo de interação dos usuários como podemos observar na seguinte afirmação desse autor, “basicamente, a mudança língua, de acordo com a concepção centrada no uso, motiva-se a partir do ato de comunicação. Ou seja, é na interação que os usuários manipulam os termos e as expressões disponíveis em sua língua, a fim de veicular estratégias comunicativas, que marquem sua posição subjetiva em relação ao conteúdo que querem transmitir ou sua preocupação com a recepção desse conteúdo por seus interlocutores, dadas as condições contextuais em que se dá a comunicação”. A seguir abordamos os princípios de gramaticalização.

1.2. PRINCÍPIOS DE GRAMATICALIZAÇÃO

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Poggio (2002) afirma que, entre os autores, não há unanimidade, no que se refere ao estabelecimento dos princípios de gramaticalização e apresenta aqueles apontados por C. Lehmann, P. J. Hopper e Ataliba T. de Castilho.

C. Lehmann (apud POGGIO 2002, p. 72) aponta cinco princípios de gramaticalização:

1- Princípio da paradigmatização: há integração de construções sintáticas como formas perifrásticas em paradigmas morfológicos, o que as conduz a paradigmas pequenos e homogêneos.

2- Princípio da obrigatoriedade: a escolha entre os membros do paradigma submete-se a regras gramaticais.

3- Princípio da condensação: com a gramaticalização do signo, os constituintes, com os quais ele se pode combinar, tornam-se menos complexos.

4- Princípio da coalescência: junção de partes; vai da justaposição para uma alternância simbólica.

5- Princípio da fixação: quando os elementos se gramaticalizam, ocupam uma posição fixa, primeiro na sintaxe e depois na morfologia, como preenchedor de espaços gramaticais.

P. J. Hopper (apud POGGIO 2002, p.72-73) também aponta cinco princípios de gramaticalização:

1- Princípio da estratificação: novas camadas emergem num domínio funcional amplo; há gramáticas que convivem, isso é a base e consequência da variação linguística; quando uma forma se gramaticaliza passa a coexistir com outras formas similares; assim, há formas diferentes para codificar o mesmo significado. Por exemplo, a expressão “a gente” que era inicialmente substantivo feminino e passou exercer a função de pronome pessoal do caso reto “nós”. 2- Princípio da divergência: trata-se da bifurcação de um item; quando

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3- Princípio da especialização: quando há gramaticalização, dá-se o estreitamento da variedade de escolhas formais com nuances semânticas diferentes; nesse caso, um menor número de formas assume significados semânticos gerais; há possibilidade de que um item se torne obrigatório.

4- Princípio da persistência: quando uma forma se gramaticaliza, alguns traços do significado lexical original aderem à nova forma gramatical; portanto, há permanência de vestígios do significado lexical original. 5- Princípio da descategorização: as formas podem perder ou neutralizar

as marcas morfológicas e propriedades sintáticas das categorias plenas N e V e assumir os atributos das categorias secundárias (adjetivo, particípio, preposição etc). Há uma perda de marcadores opcionais e perda de autonomia discursiva, isto é, diminuição do estatuto categorial de itens gramaticalizados. Por exemplo, o adjetivo “claro” que além da função de adjetivo expressa valor de modalizador.

Para Ataliba T. de Castilho (apud POGGIO 2002, p. 73-74), apenas quatro princípios podem dar conta dos processos e estágios de gramaticalização:

1- Princípio da paradigmatização e analogia: a analogia opera no eixo paradigmático.

2- Princípio da sintagmatização e reanálise: desenvolvimento de novas estruturas a partir de estruturas antigas. Por exemplo, o advérbio “aí” que de acordo com a perspectiva funcionalista está funcionando como conectivo no começo das orações, dando seqüência aos acontecimentos.

3- Princípio da continuidade e gradualismo: a gramatização tende à inovação da estrutura das línguas. Por exemplo o item lexical “bem” que do ponto de vista gramatical é um advérbio que nos dias atuais passou a desenvolver a função de marcador discursivo.

4- Princípio da unidirecionalidade: a gramaticalização é unidirecional, isto é, irreversível, desenvolvendo-se apenas da esquerda para a direita.

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Neste trabalho, usamos como base para nossas análises os princípios de gramaticalização propostos por P. J. Hopper (apud POGGIO 2002) que são: - Princípio da Estratificação; - Princípio da Divergência; - Princípio da Especialização; - Princípio da Persistência; - Princípio da Descategorização e os princípios propostos por Ataliba T. de Castilho (apud POGGIO 2002) que são: - Princípio da Paradigmatização; - Princípio da Sintagmatização e Reanálise; - Princípio da Continuidade e Gradualismo e o Princípio da Unidirecionalidade. Escolhemos esses autores, pois a nosso ver, são os que contemplam de forma mais concreta as ocorrências de gramaticalização que ocorrem na língua em uso no dia a dia e seus princípios estão muito ligados aos parâmetros de gramaticalização que aparecem no item seguinte.

O pesquisador C. Lehmann (apud POGGIO 2002) teve uma contribuição muito importante para o desenvolvimento dos estudos de gramaticalização. Seus estudos visam a analisar os estágios já avançados de gramaticalização e parecem ser abstratos e sem relação com o início do processo das ocorrências de gramaticalização que encontramos na língua em uso no dia a dia em situação real de comunicação, ou seja, durante o processo de interação comunicativa entre os usuários da língua, e que nos dias atuais constatamos estarem presentes também na língua escrita.

Por esse motivo, escolhemos os pesquisadores contemporâneos P. J. Hopper e Ataliba T. de Castilhos ao pesquisador C. Lehmann (apud POGGIO 2002). Com base em suas pesquisas, concluímos que eles lograram maior êxito propondo princípios para analisar as ocorrências de gramaticalização em seu início, ou seja, eles não analisam o estágio já avançado de gramaticalização, mas, sim, procuraram analisar todo o processo das ocorrências de gramaticalização desde seu estágio inicial tentando encontrar o que motivou esse processo e as mudanças na língua e também percebemos que seus princípios estão muito ligados aos parâmetros de análises que caracterizam os elementos de gramaticalização. A seguir abordamos as características de gramaticalização.

1.3. CARACTERÍSTICAS DA GRAMATICALIZAÇÃO

Alguns autores adotam como parâmetros alguns elementos que caracterizam a gramaticalização, como por exemplo:

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A- Manipulação conceitual: a gramaticalização implica alteração do significado da forma fonte;

B- Unidirecionalidade: a direção da mudança se dá das formas lexicais para as gramaticais ou das menos gramaticais para as mais gramaticais e não no sentido contrário;

C- Assimetria forma/significado: as formas fontes, isto é, os itens que deram origem à forma gramaticalizada não desaparecem necessariamente após o surgimento da nova forma. Isso leva a casos de polissemia com uma mesma forma passando a codificar dois ou mais significados.

D- Descategorização: as formas em processo de gramaticalização passam de uma categoria para a outra, deixando de ser modificadas pelos processos morfossintáticos da classe original;

E- Perda de autonomia: as formas acabam por perder sua autonomia morfossintática em consequência da fusão ou dependência de palavras vizinhas, causadas pelo enfraquecimento de tonicidade ou erosão fonética;

F- Erosão: vai-se dando a perda do material fonético, o que torna as formas reduzidas.

G- Recategorização: dá-se, então, a constituição de morfemas específicos, restaurando a simetria forma/significado.

Heine e Kuteva (apud MARTELOTTA 2011) propuseram quatro parâmetros de gramaticalização demonstrando a tendência à unidirecionalidade, quando vistos atuando juntos no fenômeno da mudança. São eles:

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2- Dessemantização (ou bleaching, redução semântica): caracteriza-se pela perda de conteúdo semântico. Os elementos envolvidos no processo de gramaticalização perdem valor representacional, e, ao assumir a nova função gramatical, adquirem funções de natureza pragmático-discursiva.

3- Decategorização (ou mudança categorial): caracteriza-se pela perda de propriedades típicas das formas fontes, com aquisição de novas características morfossintáticas ou discursivas.

4- Erosão (ou redução fonética): caracteriza-se pela perda de substância fonética. O elemento tende a sofrer coalescência (fusão de formas adjacentes) e condensação (diminuição de formas).

Não se pode deixar de considerar também outro aspecto na gramaticalização: são as suas diferentes fases. Deve-se caracterizar o início, seu desenvolvimento e seu término. Heine & Reh (apud NEVES 2004) mostram que os três níveis da estrutura linguística afetados pela gramaticalização – o funcional, o morfossintático e o fonético – em geral se organizam na gramaticalização, nessa mesma ordem cronológica: os processos funcionais (como dessemantização, expansão e simplificação) precedem os morfossintáticos (como permutação, composição, cliticização e afixação), que precedem os fonéticos (como adaptação, fusão e perda). Além disso, as alterações em um nível são acompanhadas de alterações em outros níveis, assim os autores Heine & Reh (apud

NEVES 2004) destacam que quanto mais gramaticalizada uma forma se torna:

A – mais perde a complexidade semântica, significação funcional ou valor expressivo;

B – mais perde em significação pragmática e ganha em significação sintática;

C – mais reduzido torna-se o número de membros que pertencem ao mesmo paradigma morfossintático;

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E – mais obrigatório torna-se seu uso em certos contextos e mais agramatical em outros;

F – mais funde-se semântica, morfossintática e foneticamente com outras unidades;

G – mais perde em substância fonética.

Hopper (apud NEVES 2004) afirma que, se levarmos em conta o estudo de mais de uma língua, é possível chegarmos a regularidades emergentes que têm potencial para ser instâncias de gramaticalização:

1 – categorias como aspecto, número, tempo e caso, entre outras, ocorrem frequentemente, nas línguas, na morfologia afixal. Todavia podem ocorrer também sob formas livres, como, por exemplo, elementos adverbiais.

2 – certos tipos de itens lexicais evoluem, tipicamente, para clíticos gramaticalizados e para afixos. Alguns exemplos são os casos de verbos de cópula e de verbos de movimento que se tornam, eventualmente, afixos causais.

Vilar (2004) afirma que Hopper e Traugot, ao focalizarem a gramaticalização, reconhecem que a reanálise e a analogia é que são responsáveis pelo processo de mudança morfossintática. Entretanto a reanálise é considerada por eles como o mais importante mecanismo na gramaticalização, ficando a analogia num plano secundário. Ainda segundo Vilar (2004), eles também concebem a reanálise como sendo um processo por meio do qual os falantes mudam sua percepção de como os constituintes de sua língua são ordenados no eixo sintagmático, isto é, novas estruturas são geradas a partir de estruturas antigas e a abdução é a operação mental que permite isso. De acordo com Andersen (1973), (apud Hopper e Traugott, 1997, p.39-40), a abdução provém de um resultado observado, invoca uma lei e infere, então, o que poderia ser o caso. Assim, dada a situação que Sócrates morreu, podemos correlacionar esse fato com a lei geral de que todos os homens são mortais, e, portanto, Sócrates era um homem.

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porém a conclusão a que se chega não precisa ser: uma das premissas pode competir para a conclusão errada de acordo com a lei. A afirmação “talvez Sócrates não seja um homem e, sim uma lagartixa”, é uma conclusão errada, porém é compatível com uma das duas premissas: a lagartixa também é mortal assim como o homem.

Por meio da abdução os limites entre determinados constituintes são apagados, estabelecendo-se outros limites, sem alterar a manifestação superficial da unidade com a qual está se operando, desencadeando um processo em que, futuramente, surgirá uma nova categoria gramatical. A seguir abordamos os mecanismos de gramaticalização.

1.4. MECANISMOS DE GRAMATICALIZAÇÃO

Para Martelotta (2011, 110-115), a gramaticalização apresenta alguns tipos de motivações, como a motivação comunicativa e a motivação associada ao contato linguístico. As motivações mais fortes não apenas para a gramaticalização, mas também para a mudança linguística de modo geral estão em fatores de natureza comunicativa, os quais, aliás, também se manifestam como motivadores da unidirecionalidade da mudança. São eles:

1- A necessidade de expressar domínios abstratos da cognição em termos de domínios concretos.

2- A negociação do sentido por falante e ouvinte no ato da comunicação. 3- A tendência dos ouvintes para selecionar estruturas ótimas.

4- A tendência dos falantes para usar expressões novas e extravagantes. 5- A iconicidade, a marcação e a frequência.

A motivação associada ao contato linguístico mostra que a gramaticalização de um termo pode ser acionada pelo contato com outra língua.

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Heine, Claudi e Hünnemeyer (apud MARTELOTTA 2010) afirmam que os principais processos subjacentes à gramaticalização são metaforicamente estruturados, sendo a transferência metafórica uma das principais forças motoras do desenvolvimento das categorias gramaticais: para expressar funções abstratas, são recrutadas entidades concretas. Segundo os autores, a noção de metáfora, interpretada como uma estratégia cognitiva, ajuda a compreender – mas não a explicar – a gramaticalização ou o comportamento gramatical. Sendo assim, os autores propõem a noção de metáfora categorial, afirmando que muito do que acontece quando conceitos mais concretos se desenvolvem em conceitos mais gramaticais pode ser descrito em termos de algumas categorias básicas, que, de acordo com seu grau relativo de abstração metafórica, pode ser arrumado em uma escala com a seguinte configuração:

PESSOA > OBJETO > ATIVIDADE > ESPAÇO > TEMPO > QUALIDADE.

Taylor (1989) (apud CARVALHO) 1 fez observações importantes para compreender a metáfora como um mecanismo de categorização e como muitos conceitos abstratos podem ser expressos por conceitos concretos. Essa rede de transferência metafórica é fundamentada na experiência dos falantes, que criam seus esquemas de imagens baseados nas experiências corporais básicas ou nas experiências culturais, o que contribui para a diversidade de metáforas nas línguas.

Em Traugott e König (apud MARTELOTTA 1996), lê-se que o tipo de mecanismo que efetua a gramaticalização depende da natureza particular da função envolvida no processo. Os autores afirmam ainda que a inferência metafórica ocorre principalmente no surgimento de marcas de tempo, aspecto, caso, enquanto a inferência por pressão de informatividade, que é um mecanismo de natureza metonímica, predomina no surgimento de conectivos.

Já em Hopper e Traugott (apud MARTELOTTA 1996), vê-se uma tendência de considerar a transferência metonímica, e não a metafórica, e a reanálise, e não a analogia, os mecanismos que predominam maciçamente na mudança por gramaticalização. Givón (apud MARTELOTTA 1996), por sua vez, ao analisar o grau de integração entre cláusulas, cita o processo de reanálise.

1CARVALHO, Maria C. M. de “A Metáfora como Mecanismo Motivador da Gramaticalização”.

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Martelotta (1996) não diminui a importância da metáfora no processo, pois considera que a gramaticalização envolve vários níveis:

A – Nível cognitivo: a gramaticalização (pelo menos no que se refere ao nível morfológico) segue, como parece ocorrer com os processos de mudança metafórica em geral, a tendência de usar elementos do mundo concreto para o mundo abstrato. O elemento do léxico é mais concreto que a gramática: é mais fácil conceptualizar substantivos do que relações textuais.

B – Nível Pragmático: a gramaticalização envolve uma intenção genérica do falante de usar algo conhecido pelo ouvinte para fazê-lo compreender melhor o sentido novo que ele quer expressar. Pode-se também ver nessa passagem concreto > abstrato uma intenção comunicativa de facilitar a compreensão do ouvinte a partir da utilização de conceitos mais concretos e mais conhecidos para a expressão de ideias novas que surgem no decorrer do processo comunicativo.

C - Nível Semântico: a gramaticalização, como processo de mudança ocorrida no léxico, envolve o conhecimento por parte dos interlocutores dos significados de origem das palavras envolvidas; caso contrário, o sentido novo corre o risco de não ser detectado pelo ouvinte.

D – Nível Sintático: a gramaticalização ocorre basicamente em contextos que a estimulem, o que significa que não só existem aspectos sintáticos que propiciam a gramaticalização, mas principalmente, que esses aspectos são responsáveis pelo fato de a mudança tomar efetivamente este e não aquele caminho.

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processos de mudança por contiguidade, no sentido de que são gerados no contexto sintático.

O processo metafórico tem sua trajetória no espaço > discurso e, segundo Heine

et alii (apud MARTELOTTA 1996), os conceitos espaciais são usados, por processo analógico, para designar pontos do texto já mencionados ou por mencionar. O elemento espacial é, nesses casos, o dado mais concreto, que serve de base para o surgimento de novos usos de valor menos concreto, que funcionam como elementos de organização interna do texto. A metáfora espaço > discurso constitui um dos primeiros passos dos circunstanciadores espaciais no sentido de se gramaticalizarem em operadores argumentativos.

Hopper e Traugott (apud MARTELOTTA 1996) afirmam que apenas a reanálise é um fenômeno ligado ao processo cognitivo da metonímia. Ele pode criar novas formas gramaticais, embora não se deva deixar de lado o papel da analogia na gramaticalização. Seguindo a tradição, o termo metonímia é usado para designar mudanças por contiguidade no mundo extralinguístico. Com essa acepção, a metonímia constitui um processo que, de acordo com Dubois et alii (apud MARTELOTTA 1996), ocorre, quando uma noção é designada por um termo diferente do usual, sendo as duas noções ligadas por uma relação de causa a efeito (como por exemplo, a colheita pode designar o produto da colheita e não apenas a própria ação de colher), por uma relação de matéria a objeto ou de continente a conteúdo (por exemplo, beber um copo), por uma relação da parte ao todo (exemplo, uma vela no horizonte).

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