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A FORMAÇÃO DE PROFESSORES DE MATEMÁTICA NA REGIÃO DE BAURU (SP) NAS DÉCADAS DE 1960 E 1970: ESBOÇO DE UMA PAISAGEM

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A FORMAÇÃO DE PROFESSORES DE MATEMÁTICA NA REGIÃO DE BAURU (SP) NAS DÉCADAS DE 1960 E 1970: ESBOÇO DE UMA PAISAGEM

Ivete Maria Baraldi Doutora em Educação Matemática – USC – Bauru (SP) ibaraldi@terra.com.br Antonio Vicente Marafioti Garnica Doutor em Educação Matemática – UNESP – Bauru (SP) vgarnica@travelnet.com.br

Introdução

Neste trabalho, mostramos alguns detalhes da investigação “Retraços da Educação Matemática na Região de Bauru (SP): uma história em construção”, cujo principal objetivo foi o de esboçar algumas respostas para a questão: “Como evidenciou- se, delineou-se, caracterizou-se a formação do professor de Matemática, nas décadas de 1960 e 1970, em seus variados aspectos, na região de Bauru?” e de traçar um perfil da região, através dos “retraços” da vida de alguns professores e professoras de Matemática.

Dessa maneira, para que atingíssemos o objetivo, trabalhamos com a História Oral (temática) como metodologia de pesquisa, utilizando tanto as fontes orais, na forma de depoimentos de professores de Matemática da Região de Bauru, como os documentos escritos (revisão bibliográfica). A partir dos depoimentos pudemos detectar algumas tendências referentes à formação de professores de Matemática na região e questão. Estas tendências são: a importância da ferrovia para a região e para os professores; a CADES (Campanha de Aperfeiçoamento e Difusão do Ensino Secundário) como possibilidade de formação; a Matemática Moderna e a Lei 5.692/71 nos anos 70.

Com o intuito de divulgar nossa pesquisa, neste trabalho dissertamos sobre

alguns aspectos referentes à história oral como metodologia de pesquisa e destacamos

as características das tendências descritas anteriormente, dando maior destaque à

CADES. Por fim, delineamos alguns traços sobre a formação do professor de

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matemática nas região e época enfocadas.

Possibilidades: História Oral e Educação Matemática

A História Oral, vista como metodologia, apresenta proximidade com os parâmetros gerais das abordagens qualitativas já utilizadas nas investigações em Educação Matemática. Ela surge como uma possibilidade de organizar a busca de traços dos cenários históricos relacionados à formação e às práticas dos docentes, bem como a compreensão de fatores e de significados das tramas constitutivas das práticas atuais, objetivos característicos das pesquisas situadas na tendência, ainda em configuração,

“História de Educação Matemática”.

Como metodologia, a História Oral possibilita tecer as tramas que nos fornecerão uma referência histórica e cultural, que até então estava inscrita apenas nas memórias dos professores ou de pequenos grupos. A vida, as experiências, as lutas e as visões de mundo adquirem um novo estatuto ao serem socializadas, sendo transformadas em documentos que podem apresentar, de maneira contextualizada, uma outra – nova ou complementar – versão da história.

A História Oral Temática, diferentemente da História de Vida, está vinculada ao testemunho e à abordagem sobre um determinado assunto específico. Ela é um recorte da experiência de vida do colaborador e, não obrigatoriamente, concorre com a existência de pressupostos já documentados, fornecendo, então, uma outra versão histórica.

Adotando a História Oral como metodologia de pesquisa para o nosso trabalho, seguimos alguns passos para o seu desenvolvimento. Tivemos como colaboradores professores de Matemática da região de Bauru que estavam em exercício do magistério nas décadas de 1960 e 1970 em escolas de ensino fundamental ou médio. Tal opção foi feita devido a nossa questão diretriz, esboçada na introdução. Este período foi escolhido, principalmente, por compreender uma época em que não havia centros (faculdades ou universidades) de formação de professores de Matemática em Bauru ou cidades próximas. Também ressaltamos que a região de Bauru foi escolhida porque é a que está diretamente ligada a nós, seja pela nossa naturalidade ou pela formação profissional.

Coletamos o depoimento de oito professores de matemática: Ana Maria Cardoso

Ventura, Antonio Augusto Del Preti, João Linneu do Amaral Prado, Milton de Oliveira,

Miriam Delmont, Rubens Zapater, Vera Macário e Vilma Maria e Silva Novaes da

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Conceição. Realizamos a entrevista, gravando-a em fitas cassetes de áudio. Assumindo que a História Oral concretiza-se somente quando chega ao texto, após a etapa da entrevista e da formação de arquivos, houve o processo de transcrição e textualização das entrevistas que nos forneceu um corpo documental a ser trabalhado.

A transcrição (ou de-gravação) de cada entrevista consistiu na passagem literal e rigorosa das palavras da fita para o papel. Essa passagem foi bastante demorada e exaustiva. Esse documento produzido foi também enviado aos colaboradores para conferência. No processo de textualização, passou-se a uma narrativa na qual pretendemos conservar “a voz” do colaborador, embora articulada pelo pesquisador. As perguntas e todas as nossas intervenções foram incorporadas à fala do entrevistado, com a finalidade de tornar essa textualização um texto mais fluente, muitas vezes, reorganizado e, em todos os casos, livres dos vícios da oralidade.

Nas textualizações procuramos ordenar o texto de forma que ficasse evidenciado o eixo temático deste trabalho. Desse modo, nossa articulação baseou-se na periodização e na contextualização sócio-política e econômica da história contada, de maneira que fossem destacadas características da formação profissional, da atuação docente, da vivência durante o regime militar e da importância de Bauru no âmbito da Educação Matemática. Nos textos, em notas de rodapé, procuramos explicitar informações adicionais sobre determinadas citações como, por exemplo, nomes de professores, de escolas, de cidades e outras características próprias da região em questão, que julgamos necessárias para situar o leitor, nunca como forma de checagem, de validação definitiva, de atribuir o carimbo da certeza, mas como forma de complementação, esclarecimento, compreensão de perspectivas e possibilidades.

Após essa etapa, enviamos os textos para a conferência pelo depoente.

Encerrada a conferência, que consistiu na alteração, retirada ou acréscimo de alguns dados, ou até mesmo na textualização refeita, fizemos as correções dos textos e novamente enviamos para os colaboradores apreciarem. Esse processo enriqueceu esses documentos escritos e, assim, a textualização final da entrevista, de nossa autoria, passou a ter como co-autor o colaborador. Depois da conferência, quando definitivamente aprovado o texto, os colaboradores nos cederam o direito de utilização do documento.

Em Educação Matemática, conforme Garnica (2003), verificaram-se maneiras

distintas de procedimentos de análise dos dados. Observamos que não existe, ainda, um

delineamento preciso para esta tarefa, se é que isto se faz necessário.

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No entanto, parece ficar evidente que a utilização de fontes escritas para auxiliar no esclarecimento e preenchimento de lacunas dos testemunhos orais é necessária, fornecendo também ingredientes para a composição do cenário que está sendo retraçado.

De modo geral, com base em Garnica (2003), podemos afirmar que a análise de dados numa pesquisa em Educação Matemática, utilizando a História Oral como metodologia, pode ser caracterizada como a forma de interpretar/identificar evidências ou tendências. Estas evidências ou tendências podem ser entendidas como os traços

“mais visíveis”, segundo o pesquisador e seu grupo, do cenário em composição e que, juntamente com outros registros escritos, fornecerão subsídios para o pesquisador encaminhar respostas para suas questões. São os aspectos divergentes e/ou convergentes, as lembranças e/ou os esquecimentos presentes nos testemunhos dos colaboradores que apontam quais são os elementos essenciais para o esboçar de compreensões e, a partir destas, de uma versão histórica.

Ultrapassado o momento das entrevistas e, conseqüentemente, as etapas de registro, começamos a identificar/interpretar tendências relacionadas à nossa pergunta diretriz.

Salientamos que em nosso trabalho de pesquisa todo foi dividido em três volumes, com o intuito de apresentar as textualizações integrais dos depoimentos, num dos volumes. Nos outros dois apresentamos o estudo bibliográfico referente às tendências detectadas e às definições de História Oral. No entanto, neste trabalho, apresentamos, ao considerar a tendência referente à formação do professor pela CADES, recortes das textualizações com o objetivo de ilustrar como esta foi constituída e percebida nos depoimentos.

1 – Tendência: Os trilhos de Bauru, para onde nos levam?

Nossa trama desenvolve-se a partir da cidade de Bauru. Ela entrelaça outras cidades: Jaú, Pederneiras, Botucatu, São Carlos, Duartina, Piratininga, ... . Damos o nome, portanto, a essa unidade de enredo de “a região de Bauru”, apoiando-nos em Arruda (2000) que afirma que a região é um espaço geográfico atravessado pela história que o institui enquanto referencial para os próprios homens. “(...) A região não existe a priori, é resultado de uma série de representações que possuem historicidade.”

(ARRUDA, 2000, p. 24)

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A “região de Bauru” não nos remete a um recorte geográfico ou econômico específico e instituído, nem a um agrupamento de elementos naturais com características comuns. A região é um contexto, uma paisagem elaborada por nossos olhos e mentes, carregada de lembranças e significados.

Por muito tempo, a única, mais vantajosa e segura maneira de viajar nesta região, seja partindo de Bauru, Pederneiras ou Jaú, era por meio da ferrovia. Pelos trilhos da Paulista, depois FEPASA, viajaram diversos educadores, parte da história da Educação Matemática da região de Bauru, que tiveram sua formação em Rio Claro.

Esses mesmos trilhos levaram para outras regiões do Oeste ou para São Paulo outros tantos educadores matemáticos. Infelizmente, os trilhos da região de Bauru não representam mais um caminho para a Educação Matemática. Estão fadados à iniciativa privada e ao transporte de cargas.

Em nosso trabalho, realizamos um pequeno resgate histórico do papel das ferrovias brasileiras que costuraram a região de Bauru (Companhia Paulista, Noroeste e Sorocabana), descrevendo algumas de suas características com o objetivo de traçar um esboço do que as linhas férreas representaram para os educadores que as utilizavam.

Nossas informações sobre a ferrovia vieram do estudo de bibliografia específica, da pesquisa virtual (Internet) e da tradição oral de nossos familiares, conhecidos e professores entrevistados.

Esse tema – a ferrovia em Bauru – apresentou-se de forma significativa nos depoimentos coletados para essa nossa pesquisa e obrigou-nos a delinear e aprofundar conhecimentos e referências sobre ele. Primeiramente, tornou-se importante, pois nossos entrevistados salientaram a relevância da ferrovia para a região; posteriormente, fascinou-nos a idéia de reconstituir uma história que nos despertava recordações do

“tempo de criança”, bem como a possibilidade de visualizar, com mais proximidade, o passado.

Percebemos, então, que sem a ferrovia, o traçado da Educação Matemática na Região de Bauru seria diferente, pois a formação profissional dos professores envolvidos nessa pesquisa e, conseqüentemente, de tantos outros que foram seus alunos e alunos de seus alunos, seria, praticamente, impossível.

2 - Tendência: Os anos 60 e a Matemática Moderna

Em nossa pesquisa, os professores-depoentes expressam claramente a sensação

de “perda de tempo” relacionada ao trabalho com a Matemática Moderna. Ainda,

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percebemos que a este movimento se constitui como um “modismo”, pois da mesma maneira que os professores empenhavam-se em divulgar a abordagem proposta, posteriormente, deixaram de se preocupar com o Movimento, retornando às práticas e abordagens usuais.

O Movimento da Matemática Moderna ocorreu, no Brasil, em momento sócio- político-econômico bastante conturbado. Nas décadas de 1960 e 1970, o Brasil sofria com uma economia instável resultante da desaceleração na produção das indústrias nacionais, da consolidação de empresas multinacionais e do crescente endividamento externo. Um forçoso silêncio foi imposto pelo regime militar implantado em 1964.

Como uma forma mista de idéias importadas de outras culturas e uma síntese de diferentes premissas feitas pelos próprios educadores matemáticos brasileiros, o Movimento da Matemática Moderna mostrava uma Matemática neutra e isenta de aspectos que pudessem favorecer uma análise crítica do cotidiano vivenciado por alunos e professores, contribuindo, pela conivência, com os desmandos do regime e impedindo que as experiências realizadas até então fossem avaliadas e compreendidas em profundidade até mesmo pelos seus protagonistas.

Segundo Búrigo (1989), a modernização do ensino de Matemática, “importada”

e adaptada de discursos estrangeiros, no Brasil, deu-se de forma fluida. Isso ocorreu devido à consonância com o discurso oficial identificado como progressista, refletindo, assim, um cenário nacional que valorizava a ciência como fator de progresso, numa economia em processo acelerado de internacionalização, cada vez mais carente de mão de obra tecnológica especializada.

A linguagem oficial era a adotada para a Matemática Moderna que, questionando o “tradicional”, pretendia impulsionar a formação de “cidadãos modernos”, operários melhor preparados. Em nenhum momento a função social e política do ensino de Matemática foi colocada em evidência.

Desse modo, a Matemática Moderna, embora nunca tenha sido explicitamente

adotada como política educacional do Estado, foi amplamente divulgada e incorporada

aos currículos escolares (via livros didáticos) sem maiores resistências oficiais ou por

parte de alunos, professores e pais. Mesmo dentro do território brasileiro, houve

problemas quanto à utilização das idéias da Matemática Moderna, pois o principal

agente divulgador, o GEEM, era um órgão paulista, ou seja, pertencia a um dos estados

economicamente mais poderosos, e com instituições de formação específica para

professores mais bem estruturadas em comparação aos outros estados (ainda que a

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necessidade de formação pela CADES aponte que, mesmo em São Paulo, a oferta dessas instituições era ainda insuficiente). Dessa maneira, como balizar a viabilidade da implantação da Matemática Moderna entre São Paulo e os demais estados do país?

3 - Tendência: Os anos 70 e a Lei 5.692/71

Até 1971 vigorava a Lei nº 4024/61, estabelecendo as Diretrizes e Bases da Educação Nacional referentes aos níveis de ensino do pré-primário ao superior. Os currículos não eram rigidamente padronizados, admitindo-se uma certa variedade, segundo as preferências dos estabelecimentos em relação às matérias optativas. O sistema de ensino era dividido em primário (quatro séries) e ensino médio (quatro séries do ginasial e três do colegial). A passagem do ginasial para o colegial não era automática, existindo a seleção através de exames de conhecimentos (exames de admissão). O mesmo acontecia do primário ao ginásio. O ginásio, nessa época, era profissionalizante (industrial, comercial, agrícola e normal). Com a Lei 5.692/71, o sistema de ensino ficou estruturado em primeiro grau (oito séries) e segundo grau (três séries), em regra geral. O ensino de segundo grau tornou-se todo ele profissionalizante, um grande engodo, segundo os professores-depoentes.

Essa lei também exige que os professores dos 1º e 2º graus possuíssem diploma de ensino superior. Dessa maneira, para os professores que já estavam em exercício e possuíam a formação por meio da CADES ou o curso normal, precisaram buscar formação de nível superior. Deu-se, então, o que podemos perceber através dos depoimentos dos professores, a corrida aos “cursos vagos” ou “de finais de semana”.

Os professores ressaltam, ainda, que com a nova estrutura do ensino surge a necessidade de planejamento. Os conteúdos de cada disciplina e de cada série passam a ser determinados pelas Secretarias Estaduais de Educação, mas cada escola, cada professor deveria planejar.

4 - Tendência: CADES – Campanha de Aperfeiçoamento e Difusão do Ensino Secundário

Dos professores entrevistados, cinco fizeram alguma referência à CADES, seja porque foram “alunos” ou professores nessa ocasião.

Nas décadas de 1950 e de 1960, todos os anos, acontecia o

‘curso’ CADES de reciclagem para professores, sob orientação

do MEC, e os alunos professores obtinham os registros para

exercerem o magistério. Lecionei em São Carlos, Londrina

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(Paraná), Ubá (Minas Gerais), Nova Friburgo (Rio de Janeiro).

No CADES, era incumbido de desenvolver o conteúdo do ginásio, com o nível um pouco mais elevado. Nas aulas, além do conteúdo, expunha os temas desenvolvidos no livro HOW TO SOLVE IT, de Polya. Mas também, naquela época, não tinha curso de licenciatura em Matemática. Então, por isso, existia o registro dado pelo Ministério da Educação. O professor era aprovado pela CADES e obtinha o registro para lecionar no curso secundário. Com a proliferação de cursos de licenciatura, o MEC extinguiu a CADES. (Professor João Linneu)

No entanto, a Campanha de Aperfeiçoamento e Difusão do Ensino Secundário (C.A.D.E.S), inicialmente, mostrou-se uma grande incógnita para nós, pois os livros de história da educação não a descreviam, quando muito citavam algumas datas apenas. As orientações que possuíamos eram os relatos dos professores, sendo que nenhum deles tinha muito conhecimento da legislação que a regia. Analisando o acervo de documentos da Biblioteca da Diretoria de Ensino de Bauru encontramos algumas referências em revistas e livros

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publicados nas décadas de 1950 e 1960.

Posteriormente, encontramos outros materiais referentes ao ensino de Matemática, principalmente os de Malba Tahan. Sendo assim, pudemos traçar algumas características da CADES e de suas publicações.

Com a criação do Ministério da Saúde, na década de 1950, o Ministério da Educação e da Saúde Pública passa a se chamar Ministério da Educação e Cultura – MEC. Vinculada a esse ministério existia a Diretoria do Ensino Secundário, dirigida por Armando Hildebrand, na era do governo getulista.

Neste governo, pregava-se a corrida à modernização e à industrialização e, conseqüentemente, a necessidade de elevar os padrões existentes à condição de padrões normais, ou seja, se fazia urgente, com o sentido de emergência real, completar as competências do ensino médio. As escolas surgiam e era imperioso treinar os professores até então leigos.

(...) na década de 1950, o problema era a falta de professor específico para cada disciplina, principalmente no interior.

Desse modo, o MEC - MINISTÉRIO DA EDUCAÇÃO - sentiu esse problema em termos de Brasil e, por volta de 1955, difundiu a Campanha de Aperfeiçoamento e Difusão do Ensino

1

Revista EBSA – Documentário do Ensino, publicação da Editora do Brasil sob a direção de Carlos

Pasquale e de Victor Mussumeci; e o livro “Cadernos de Orientação Educacional”, editado pela

CONQUISTA Empresa de Publicações Ltda, para a CADES.

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Secundário, designado pela sigla CADES. (...) O MEC contratava professores dos grandes centros: Rio e São Paulo, principalmente. No início de cada ano, em janeiro, em determinadas cidades, distribuíam cursos para os chamados Exames de Suficiência. Como havia a necessidade de contratação de professores e não havia professores formados, a condição para se dar aula no segundo grau e no ginásio era obter um registro definitivo através da CADES. Os professores contratados pelo MEC, durante um mês ou um mês e meio, davam cursos, e os ‘professores-alunos’ prestavam o Exame de Suficiência ao final do curso. (...) Normalmente, os professores de Didática Especial e de Conteúdo eram os que indicavam quem poderia fazer o exame de suficiência ou aconselhavam os que deveriam se preparar mais um ano. Nesse caso, o MEC fornecia autorização para lecionar apenas por mais um ano.

Para quem se destinava esses cursos? Para aqueles que tinham coragem de entrar numa sala para lecionar. Eram então egressos do curso científico ou clássico, conforme a necessidade. (...) Após ser aprovado, o professor recebia do MEC o registro de professor. (Professor Rubens)

Como nos alerta o Professor Rubens, surge a CADES, criada na gestão de Hildebrand na Diretoria do Ensino Secundário e no governo de Getúlio Vargas, a partir do Decreto nº 34.638, de 14 de novembro de 1953. A CADES tinha o objetivo de difundir e elevar o nível do ensino secundário, ou seja, tornar a educação secundária mais ajustada aos interesses e necessidades da época, conferindo ao ensino eficácia e sentido social, bem como criar possibilidades para que os mais jovens tivessem acesso à escola secundária.

Dessa maneira, nas décadas de 1950 e 1960, a CADES prestou serviços à educação brasileira, através da realização de cursos de treinamento para professores do ensino secundário, jornadas de diretores, simpósios de orientação educacional, encontros de inspetores do ensino secundário, cursos para secretários de estabelecimentos de ensino, bem como de publicações, entre elas a “Revista da Escola Secundária”. A coordenação da CADES ficava à Avenida Rio Branco 115, 9

º

andar, na cidade do Rio de Janeiro, nesse tempo Estado da Guanabara.

Existiam, à época, as Inspetorias Seccionais do Ensino Secundário espalhadas

por todo o país. Eram instâncias menores responsáveis pela administração do ensino nas

cidades, e subordinadas às Secretarias Estaduais da Educação. No Estado de São Paulo,

destacamos a existência de Inspetorias nas cidades de Itapetininga, São Carlos, Bauru,

Araçatuba, principalmente por serem referenciadas em nossa pesquisa.

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A partir de 1956, nessas inspetorias seccionais, a CADES passou a promover cursos intensivos de preparação aos exames de suficiência que, de acordo com a Lei nº 2.430, de 19 de fevereiro de 1955, conferiam aos aprovados o registro de professor do ensino secundário (atuais ensino fundamental – 5ª a 8ª série - e médio) e o direito de lecionar onde não houvesse disponibilidade de licenciados por faculdade de filosofia.

Esses cursos, geralmente, tinham a duração de um mês (janeiro ou julho) e eram elaborados a fim de suprir as deficiências dos professores, até então leigos, referentes aos aspectos pedagógicos e aos conteúdos específicos das disciplinas que iram lecionar ou que já lecionavam.

(...) A cada ano o curso de suficiência da CADES era numa cidade diferente. Um ano foi em Itapetininga, um ano já havia sido em Bauru, no outro ano Campinas. As cidades eram escolhidas conforme a necessidade da região. Naquele tempo, existia em Itapetininga, Araçatuba e em Bauru, as Inspetorias do Ensino Secundário. Eram as representações do MEC. Então, nas cidades onde existiam essas representações, se fazia esse curso. Como em Bauru já existia uma faculdade, que era a FAFIL, resolveram não fazer aqui e fizeram em outras cidades.

Era gente que não acabava mais. Juntavam-se, numa cidade, 600, 700 pessoas de fora, para fazer o curso. Esses cursos foram excelentes. (...) Também esse diretor me incentivou a inscrever-me no curso da CADES. Então, em Bauru, fiz a inscrição para o curso que aconteceria em 1959. Topei a parada! (...) Os professores de Didática Especial e de Conteúdo indicavam quem poderia fazer o exame e aconselhavam os que deveriam se preparar mais um ano, ficaram em dúvida no meu caso. Ou seja, fiquei no limite. (...) Fiquei, portanto, mais um ano trabalhando, com a autorização precária dada pelo MEC.

No começo de 1960, em Araçatuba, fiz os exames normalmente e fui aprovado, recebendo o registo definitivo para lecionar no ginásio, hoje da 5

ª

a 8

ª

série do 1

º

grau. Gostaria de ressaltar:

em 1960, tive como professor de Didática Geral um cidadão extraordinário: Júlio César de Mello e Souza (Malba Tahan).

(Professor Rubens)

No desenvolvimento de nossa pesquisa, encontramos algumas obras escritas e divulgadas, na área de Matemática, conforme a necessidade da CADES:

• BEZERRA, M. J. Didática Especial de Matemática. Rio de Janeiro:

MEC/CADES, s.d.

• CHAVES, J. G. Didática da Matemática. Rio de Janeiro: MEC/CADES,

1960

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• HILDEBRAND, A. et al. Como ensinar Matemática no curso Ginasial:

manual para orientação do candidato a professor de curso ginasial no interior do país. São Paulo: MEC/CADES, s.d.

• MELLO E SOUZA, J. C. de, (MALBA TAHAN). Didática da Matemática:

A Matemática; seus conceitos e sua importância. Rio de Janeiro: Gráfica Editora Aurora, 1957.

Não sistematizamos análise alguma sobre essas obras. Somente, em nossa pesquisa, apresentamos algumas considerações sobre a obra de Malba Tahan. No entanto, gostaríamos de esclarecer que muitos pontos dessa malha complexa – CADES – são, ainda, obscuros para nós. Não conseguimos vislumbrar claramente, sob uma perspectiva histórica ampla, o que esse movimento representou para a educação no Brasil, embora tenha sido fator fundamental para nossa região.

A educação brasileira possui, dentre muitos, o caráter de emergência. O Brasil sofre de carências em todos os setores. No setor educacional, apresenta, por exemplo, déficit na quantidade de professores formados ainda nos dias atuais, necessitando, assim, de programas de formação e de profissionalização que possam amenizar a carência de docentes. Esta situação deveria ser aceita como um padrão normal na formação de professores no Brasil? Como equiparar os conhecimentos desses professores aos dos formados em tradicionais centros acadêmicos?

A CADES se constituiu como uma campanha emergencial para

“profissionalizar” (ainda que, sobre isso, os materiais encontrados apontem paradoxos) o leigo que atuava como professor em escolas secundárias.

Embora seja ressaltado, nas falas dos professores, seu caráter inovador, fica-nos a impressão que a CADES não apresentava um compromisso político explícito. Sua legislação, seu financiamento, seu embasamento (político, social, educacional) não era conhecido pelos professores.

Considerações Finais

Começamos nossa investigação indagando sobre a formação do professor de

Matemática, numa época em que não existia, na cidade de Bauru ou numa localidade

próxima, centros formadores, isto é, “instituições” responsáveis tanto pelo processo de

discussão de conhecimentos específicos e pelo desenvolvimento das competências

didático-pedagógicas do professor, quanto por focar ingredientes teóricos que

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suscitassem discussões relativas à ética e à prática profissional. Não havia, também, um

“locus” no qual o professor em exercício no magistério pudesse discutir sua prática à luz da teoria e vice-versa.

Em nosso movimento de inquérito, no entanto, nos defrontamos, primeiramente, com “momentos” de formação de professores. Esses momentos, muitas vezes, se caracterizaram em situações remediais que viabilizavam a regulamentação da prática do professor a partir de uma prática já existente, ou seja, encontramos mecanismos que oficializavam o fazer docente de quem já estava atuando como professor, independente de sua formação inicial.

Ao longo deste nosso trabalho, percebemos que essa formação inicial do professor de Matemática, especificamente nas época e região abordadas, deu-se na prática cotidiana de uma sala de aula. Muitas vezes norteando-se pela prática de seus antigos professores, os docentes ministravam suas aulas tal como foram por eles vivenciadas anteriormente: (re)articulavam suas posições de alunos. Muitos dos conceitos matemáticos que precisaram ensinar, aprenderam sozinhos, “perguntando aqui e ali”.

Muitos professores saíram do Curso Normal e foram direto para a sala de aula de Matemática, tendo que adquirir conhecimento na prática e na ajuda de outros professores tido como gabaritados, alguns deles figurando dentre os poucos com formação superior específica.

De maneira localizada e contextualizada, percebemos que a formação do professor de Matemática do interior de São Paulo deu-se de modo diferenciado em relação àquela da Capital. Isso ocorreu, principalmente, devido às dificuldades impostas pelas dimensões brasileiras e pelas características rudes que “os sertões”

apresentavam num passado não tão distante. Desse modo, enquanto na Capital constituíam-se os grandes centros acadêmicos para formar o professor de Matemática, no interior somente a CADES era a alternativa. Ainda, resta-nos a dúvida: estariam o professores do interior em desvantagens? O que seria necessário para que pudessem ser equiparados aos padrões acadêmicos aceitos como “normais”?

“Tinha a impressão, diante de minha formação e dos demais

daqui do interior, que aquele que se formava em Matemática,

na capital, era um elemento de nível superior ao nosso. Pela

própria necessidade de ensino na capital, eles tinham uma visão

muito maior, um conhecimento e uma preparação, tanto de

conteúdo quanto de didática muito maior que a nossa. Vivíamos

arranhando aqui e ali e perguntando para todo mundo. A não

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ser em grandes centros e em casos excepcionais, como no caso do professor Cid Guelli, em Botucatu. Ele foi uma exceção.”

(Professor Rubens)

A formação do professor surgiu no ensino superior, como um apêndice, inicialmente por força da lei, como nos mostra do trabalho de Bernardo (1986). Dessa maneira, entendemos que a necessidade de um diploma para “oficializar” a prática docente também se fez devido a força da lei, principalmente da 5.692/71, que obriga o Estado a uma intensificação de esforços quanto à “formação” do professor secundário.

A faculdade surge, para alguns professores, como uma possibilidade/necessidade para o cumprimento de formalidades, apenas para regularizar a situação de quem não possuía formação específica para as aulas que ministrava. Primeiramente, no início da década de 1970, surgem os cursos de Licenciatura (curta) em Ciências. Alguns anos mais tarde, surgem as Habilitações, que complementariam a licenciatura curta e que dariam direito legal para o exercício da docência no ensino secundário.

Concomitantemente, surgem os conhecidos “cursos vagos”, cujas atividades, realizadas nos finais de semana, era contra-opção aos cursos de Licenciatura em Ciências com Habilitação em Matemática, com a duração de quatro anos e com aulas presenciais durante toda semana. Parece-nos “natural” a procura por esses cursos para uma “formalização” que se aparta de uma “formação”. A prática que o professor exercia – e que muitas vezes inviabilizava sua formação em cursos regulares – poderia ser tida, então, como suficiente para essa mesma prática, só restando ao professor a necessidade de adequação às exigências formais.

Os professores de Matemática na Região de Bauru, com algumas exceções, possuíam como possibilidade de formação, na época considerada, a Escola Normal, a CADES e, posteriormente, os cursos de Licenciatura em Ciências (regulares ou

“vagos”) das faculdades privadas. Essa constatação vem num sentido quase contrário

àquele que estabelece uma importância – que agora podemos ter como mítica, ao menos

para o interior do Estado de São Paulo – das Faculdades de Filosofia, Ciências e Letras

no que diz respeito à formação dos professores de Matemática. Não bastassem as

versões estabelecidas pelas memórias de nossos depoentes, há o trabalho de Bernardo

(1986) a considerar que a mais profunda inspiração para os programas de formação de

professores, o germe das Licenciaturas em Matemática, está radicada nas Escolas

Normais, uma estrutura educacional que, no Brasil, se constitui em meados do século

XIX. A constituição de nossa primeira universidade – a Universidade de São Paulo –,

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em 1934, contribui de modo menos significativo para essa formação. Dois de nossos depoentes são formados em Licenciaturas específicas. É interessante ressaltar que eles caracterizam uma exceção no panorama, longe de serem a regra. As Licenciaturas em Matemática foram instituídas em localidades distantes da região de Bauru, a julgar que isso ocorre numa época em que o transporte era deficitário e as condições de vida dificultavam – mais do que hoje – o acesso a esses locais.

Na cidade de Bauru, atualmente, existem três universidades que oferecem o curso de Licenciatura em Matemática: USC, UNESP e UNIP. Hoje em dia, também as cidades “aproximaram-se” umas das outras. Rio Claro é ainda grande centro formador.

Há Licenciaturas em Matemática em Avaré, São Carlos, Araraquara... Pensar a constituição desses cursos, nessas universidades, e a vinculação/interconexão entre seus docentes, seus fazeres, suas disposições, seus históricos, com o que pudemos, com essa pesquisa, reconstituir, é uma possibilidade que se abre. Outros caminhos, outros cenários, outras memórias a registrar.

Palavras-chave: formação de professores, história oral.

Referências Bibliográficas

ARRUDA, G. Cidades e sertões: entre a história e a memória. Bauru: EDUSC, 2000 BERNARDO, M.V.C. Re-vendo a Formação do Professor Secundário nas Universidades Públicas do Estado de São Paulo. 1986. Tese (Doutorado em Psicologia da Educação). PUC, São Paulo, 1986

BÚRIGO, E. Z. Movimento da matemática moderna no Brasil: estudo da ação e do pensamento de educadores matemáticos nos anos 60. 1989. Dissertação (Mestrado em Educação) – Faculdade de Educação, Universidade Federal do Rio Grande do Sul, Porto Alegre, 1989.

GARNICA, A.V.M. História Oral e Educação Matemática: do inventário à regulação.

In: Zetetiké. Campinas: FE/CEMPEM, 2003, v.11, n.19, p. 9-55.

Referências

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