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O PODER NORMATIVO DAS AGÊNCIAS REGULADORAS NA ORDEM CONSTITUCIONAL-ECONÔMICA BRASILEIRA

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UNIVERSIDADE FEDERAL DO CEARÁ FACULDADE DE DIREITO

CURSO DE DIREITO

JOÃO VICTOR SERRA AZEVEDO

O PODER NORMATIVO DAS AGÊNCIAS REGULADORAS NA ORDEM CONSTITUCIONAL-ECONÔMICA BRASILEIRA

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JOÃO VICTOR SERRA AZEVEDO

O PODER NORMATIVO DAS AGÊNCIAS REGULADORAS NA ORDEM CONSTITUCIONAL-ECONÔMICA BRASILEIRA.

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Trabalho de Conclusão de Curso apresentado ao Curso de Direito da Faculdade de Direito da Universidade Federal do Ceará, como requisito parcial para obtenção do Título de Bacharel em Direito.

Orientador: Prof. Dr. William Paiva Marques Júnior.

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JOÃO VICTOR SERRA AZEVEDO

O PODER NORMATIVO DAS AGÊNCIAS REGULADORAS NA ORDEM CONSTITUCIONAL-ECONÔMICA BRASILEIRA.

Trabalho de Conclusão de Curso apresentado ao Curso de Direito da Faculdade de Direito da Universidade Federal do Ceará, como requisito parcial para obtenção do título de Bacharel em Direito.

Aprovado em ____ / ____ / ____

BANCA EXAMINADORA

_______________________________________ Prof. Dr. William Paiva Marques Júnior (Orientador)

Universidade Federal do Ceará (UFC)

_______________________________________ Profa. Msc. Fernanda Cláudia Araújo da Silva

Universidade Federal do Ceará (UFC)

______________________________________ Brunna Bastos de Oliveira

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AGRADECIMENTOS

A Deus, pai todo poderoso, por me proporcionar essa oportunidade e conquista recheada de bênçãos e por todos os instrumentos de fé concedidos.

Aos meus pais, Marta Maria e Marco Aurélio, por todo o apoio, força e acompanhamento que recebi durante a vida, e por nunca terem medido esforços para garantir minha formação e minha felicidade. Eu não tenho palavras suficientes de agradecimento para esses dois.

À minha irmã Larissa (Nonon) por amar tanto o irmãozinho chato dela, por ser um símbolo de alegria e amor pra toda vida.

À minha esposa e companheira Karol (morena), presente dado por Deus, sendo meu caminho para essa conquista ao fazermos o ENEM 2011. Minha companheira e inspiração para a vida emãe dos meus futuros filhos.

Às minhas sobrinhas Liz e Lunna, que o titio ama incondicionalmente.

Bonner, Túlio, Maria Isabel (Belinha), Melzinha e Nina, por serem atemporais e amores essenciais de quatro patas.

AoProf. William Marques, por suas sugestões e disponibilidade em orientar-me. Agradeço, principalmente, por seu altruísmo, descontração, presteza e amor em acolher e assistir atodos os seus alunos, seja em sala de aula, nos tempos de coordenação e agora cumprindo brilhante papel junto a Reitoria da nossa querida UFC, e sem perder a criatividade das piadas clássicas e histórias da vida.

À Profa.Fernanda Cláudia e à Brunna Bastospor terem aceitado participar da banca examinadora deste trabalho.

Aos meus colegas de trabalho daVISA Fortaleza e do setor de Farmácia do HGCC. Realizar uma graduação exercendo duas funções públicas foi muito desafiador para mim. Gratidão por todo o incentivo e admiração dispensados.

A todos os meus colegas da turma Direito UFC 2017.1, em especial, aos colegas

Felipe Teixeira Costa, Carlos Eugênio Ferreira e Lilian Pâmela Silva. Cada um deles com um papel especial nessa jornada, incluindo o estágio curricular, o exame da ordem e a elaboração deste trabalho.

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RESUMO

A evolução do Estado Liberal, marcada pela crise do Estado Absolutista, representou um marco importante para a expansão da atividade econômica interna e externa. Esse fenômeno promoveu a formação do Estado contemporâneo, abrigado pelo pensamento liberal consolidado politica e economicamente, o qual passou da condição de prestador de serviço para ser o fiscalizador e regulador da atividade econômica. Ao seguir uma tendência político-econômica mundial iniciada na década de 1980 revelada por mecanismos de desestatizações, privatizações, concessões, parcerias e uma regulação desburocratizada, o Brasil adotou o modelo de Estado Regulador, uma vez que a exploração direta de atividade econômica se concentra nas mãos do setor privado e desta forma caberia ao Estado normatizar, fiscalizar e incentivar essa atividade. Nesse contexto, criaram-se as Agências Reguladoras. Analisa-se, no presente projeto, o poder normativo de tais agências, oriundo de autonomia jurídica garantida pela lei instituidora, notadamente quanto a sua compatibilidade com o ordenamento constitucional pátrio, tendo em vista a mudança no cenário econômico estabelecido pela Constituição Federal de 1988, que atribuiu aos particulares a função de atuar no mercado, ficando reservada ao Estado a posição tão somente de agente normativo e regulador da atividade econômica.Após análise da atuação das Agências Reguladoras em conformidade com o Texto Constitucional, restou marcada a prevalência de entendimentos jurisprudenciais favoráveis aos atos proferidos por essas agências quando no exercício de suas atribuições legais.

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ABSTRACT

The evolution of the Liberal State, marked by the crisis of the Absolutist State, represented an important milestone for the expansion of domestic and foreign economic activity. This phenomenon promoted the formation of the contemporary state, sheltered by liberal thinking politically and economically consolidated, which changed from being a service provider to being the inspector and regulator of economic activity. In following a global political-economic trend that began in the 1980s revealed by mechanisms of privatization, privatization, concessions, partnerships and de-bureaucratized regulation, Brazil adopted the model of Regulatory State, since the direct exploitation of economic activity is concentrated in the private sector, and it would be up to the State to regulate, supervise and encourage this activity. In this context, the Regulatory Agencies were created. In this project, the rulemaking of these agencies, derived from the legal autonomy guaranteed by the institutional law, notably as to its compatibility with the constitutional order of the country, is analyzed in view of the change in the economic scenario established by the Federal Constitution of 1988, which attributed to private individuals the function of acting in the market, being reserved to the State the position of only a normative agent and regulator of the economic activity. After analyzing the performance of the Regulatory Agencies in accordance with the Constitutional Text, the prevalence of jurisprudential understandings was favorable to the acts pronounced by these agencies when exercising their legal attributions.

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SUMÁRIO

1INTRODUÇÃO ... 11

2AGÊNCIAS REGULADORAS: HISTÓRICO, DELIMITAÇÃO CONCEITUAL, CARACTERÍSTICAS, PRERROGATIVAS E TIPOLOGIA ... 14

2.1 A evolução histórica e a delimitação conceitual das Agências Reguladoras ... 14

2.2 Características, prerrogativas das Agências Reguladoras e sua base legal ... 20

2.3 Tipologia das Agências Reguladoras ... 24

3PODER REGULATÓRIO NO ÂMBITO DA ADMINISTRAÇÃO PÚBLICA ... 26

3.1 Poder normativo e poder regulamentar ... 26

3.2 Espécies de regulamentos e atos normativos ... 30

3.3 A descentralização ou deslegalização normativa ... 33

4PODER NORMATIVO DAS AGÊNCIAS REGULADORAS NA ORDEM CONSTITUCIONAL-ECONÔMICA BRASILEIRA ... 38

4.1 Análise da ordem constitucional-econômica brasileira e a ação regulatória proferida pelas Agências Reguladoras ... 38

4.2 Tendência quanto à confirmação judicial dos atos regulatórios proferidos pelas Agências Reguladoras ... 41

5CONSIDERAÇÕES FINAIS ... 45

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1. INTRODUÇÃO

No âmbito do processo de desestatização, materializou-se o afastamento do Estado, ou de suas pessoasdescentralizadas, do âmbito de alguns serviços públicos, agora transferidos para o setor privado, o qual provocou a criação de mecanismos estatais de controle dos novos prestadores de serviço. Na verdade, os serviços continuaram a ser públicos; os prestadores é que passaram a ser do setor privado.

Durante o referido processo, iniciado noBrasil na década de 1990, as Agências Reguladoras foram recepcionadas pelo sistema jurídico brasileiro. Logo após a transferência de atividades estatais à iniciativa privada, essas agências foram criadas para regular o exercício das referidas atividades.

Nesse contexto, o Brasil passou a adotar um modelo gerencial de Administração Pública, adotando papel preponderante na fiscalização e regulação de atividades econômicas, ao invés de explorá-las diretamente. Foram, então, criadas as Agências Reguladoras.

Sendo assim, surgia a necessidade de que o Estado se aparelhasse para exercer o devido controle sobre aqueles aos quais fora cometida a atribuição de executar serviços públicos. Anteriormente, o controle era basicamente interno, porquanto executado dentro da própria Administração, mesmo que por estruturas administrativas diversas. Logo, no âmbito da desestatização, o controle passou a ser externo, sendo o Estado o controlador e os controlados os prestadores de serviços, todos agora do setor privado.

As Agências Reguladoras correspondem a entidades autárquicas dotadas de independência frente ao aparelho central do Estado, com especialização técnica e autonomia normativa, capazes de direcionar as novas atividades sociais na senda do interesse público juridicamente definido.

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O Estado utilizou-se do modelo das Agências Reguladoras para promover uma forte intervenção enérgica na ordem econômica e social, corrigindo as falhas do mercado, dentre elas o abuso do poder econômico, a assimetria de informações entre produtor e consumidor e a provisão insuficiente de bens coletivos. O Estado age como verdadeiro árbitro, numa posição de exterioridade relativa ao jogo econômico com o fim de proceder aos ajustes necessários. Buscava-se, com este modelo, especializar a atuação estatal e neutralizar ou amenizar a influência políticana regulação de setores sensíveis da previsão de estabilidade aos dirigentes.

As referidas agências gozam de prerrogativas conferidas por suas respectivas leis criadoras, que as distinguem das demais entidades da Administração Pública detentoras da atribuição de regular determinado setor, quais sejam a autonomia decisória, administrativa e econômico-financeira. A autonomia normativa é tratada com destaque neste trabalho.

Para a compreensão do tema referente ao poder normativo das Agências Reguladoras na Ordem Econômica Brasileira, buscar-se-á investigá-lo por meio de pesquisa bibliográfica e documental, com o uso de referências teóricas, como livros, artigos científicos e monografias, de documentos conservados em arquivos de instituição pública.

Quanto à utilização dos resultados, a pesquisa será pura, por ter como finalidade precípua a ampliação dos conhecimentos sobre a temática. Quanto à abordagem, a pesquisa é qualitativa, enfatizando a compreensão e a interpretação do tema, atribuindo significado descritivo às informações coletadas.

Dada a relevância do tema em apreço, em conformidade com a evolução dos modelos econômicos existentes na história, e com os princípios e diretrizes da ordem econômica presentes no Texto Constitucional, o presente estudo trata de forma geral das Agências Reguladoras, desde a abordagem dos fatos históricos que culminaram na sua criação e delimitação conceitual, de suas características e de seu poder normativo, sem, contudo, cuidar especificamente de uma só entidade, pois no Brasil já existem inúmeras Agências Reguladoras, que são de suma importância para a ordem econômica nacional.

Ademais, analisa-se o poder regulatório da Administração Pública, onde diferenciam-se os conceitos de poder regulamentar e poder normativo e aborda-se o estudo do fenômeno da “deslegalização” normativa.

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brasileira, o qual reflete em diversos setores exploradores de atividade econômica, somada à tendência à confirmação judicial dos atos regulatórios proferidos por tais agências, quando do exercício de suas atividades de normatização.

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2. AGÊNCIAS REGULADORAS: HISTÓRICO, DELIMITAÇÃO CONCEITUAL, CARACTERÍSTICAS, PRERROGATIVAS E TIPOLOGIA

As Agências Reguladoras surgiram nos Estados Unidos da América ao final do século XIX no sentido de estabilizar a economia e proteger os menos favorecidos contra as oscilações dos mercados regulados, marcadas pela crise do modelo liberal da época (GODOI JÚNIOR, 2008).

A ideia de Estado regulador surgiu no Brasil nos anos 1990, marcada pela expansão de setores econômicos que dependiam de investimentos estrangeiros, cujas captações conceberam a ideia de criação de agências de regulação inicialmente como política pública para esse propósito (ARANHA FILHO, 2013).

Considerando esse fenômeno, no presente capítulo, optou-se por demonstrar a evolução histórica para a criação e formação do conceito de tais agências, delimitando-o em relação à sua essência e propósito constitutivo, apresentar suas características, bem como os aspectos legais presentes no ordenamento pátrio. Em seguida, são apresentadas as espécies deAgências Reguladoras, definidas em seu contexto tipológico, e exemplos dessas criadas, de acordo com a área de atuação definida na respectiva lei de criação.

2.1. A evolução histórica e a delimitação conceitual das Agências Reguladoras

A evolução do Estado Liberal, marcada pela crise do Estado Absolutista, representou um marco importante para a expansão da atividade econômica interna e externa. Esse fenômeno promoveu a formação do Estado contemporâneo, abrigado pelo pensamento liberal consolidado politica e economicamente, o qual passou da condição de prestador de serviço para ser o fiscalizador e regulador da atividade econômica.

A concepção liberal do Estado nasceu de uma dupla influência, segundo Alberto Venâncio Filho (1990, p.03), tendo:

... de um lado, o individualismo filosófico e político do século XVIII e da Revolução Francesa, que considerava como um dos objetivos essenciais do regime estatal a proteção de certos direitos individuais contra os abusos da autoridade, de outro lado, o liberalismo econômico dos fisiocratas e de Adam Smith, segundo o qual a intervenção da coletividade não deveria falsear o jogo das leis econômicas, benfazejas por si, pois que esta coletividade era imprópria para exercer funções de ordem econômica.

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judiciário;o direito inalienável à propriedade, a livre iniciativa e a concorrência como princípios básicos capazes de harmonizar os interesses individuais e coletivos para gerar o progresso social (SANDRONI, 1989).

Em outras palavras, havia a ideia de Estado mínimo, onde o predomínio da atividade econômica volta-se ao setor privado. Visava-se proteger a liberdade individual e a propriedade e assim predominava o pensamento econômico liberal do laissez-faire (deixar

fazer). Com o desenvolvimento da produção capitalista, o laissez-faire evoluiu para o

Liberalismo econômico, que condenava a intervenção do Estado na Economia.

Dentre os efeitos do Estado Liberal, houve a fixação do Estado em dupla faceta, uma em relação aos poderes, formando o estado de Direito; e a outra em relação às funções, produzindo o Estado mínimo, representando uma separação entre a atividade política e a econômica.

Portanto, pode-se dizer que o Estado Liberal teve como particularidade desobrigar ao máximo a presença do Estado, sendo que na Economia transferiu em particular, à Burguesia, oferecer produtos e serviços para a sociedade. E sob as leis de mercado foi que houve grande avanço econômico e o Estado liberal foi considerado o grande propulsor da sociedade moderna (GODOI JÚNIOR, 2008).

A despeito dos elementos narrados anteriormente, procedeu-se a decadência do Liberalismo, pois a valorização do indivíduo e a proteção da liberdade somente beneficiou a burguesia, a detentora da força econômica.

Nas palavras de Alberto Venâncio Filho (1990, p.04):

... durante todo o transcorrer do século XIX, importantes transformações econômicas e sociais vão profundamente alterar o quadro em que se inserira esse pensamento político-jurídico. As implicações cada vez mais intensas das descobertas científicas e de suas aplicações, que se processam com maior celeridade, a partir da Revolução Industrial, o aparecimento das gigantescas empresas fabris, trazendo, em conseqüência, a formação de grandes aglomerados urbanos, representam mudanças profundas na via social e política dos países, acarretando alterações acentuadas nas relações sociais, o que exigira que paulatinamente, sem nenhuma posição doutrinária preestabelecida, o Estado vá, cada vez mais, abarcando maior número de atribuições, intervindo mais assiduamente na vida econômica e social, para compor os conflitos de interesses de grupos e de indivíduos.

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intervencionista ou Estado social, desencadeado após a quebra da bolsa de valores de Nova Iorque em 1929 que, por sua vez, ocasionou uma crise de mercado e do Estado liberal.

O Estado do Bem-Estar Social ou WelfareStateera o sistema econômico baseado

nalivre-empresa, porém com acentuada participação do Estado na promoção de benefíciossociais, e seu objetivo era proporcionar aos cidadãos padrões de vida mínimos, desenvolver aprodução de bens e serviços sociais, controlar o ciclo econômico e ajustar o total da produção,considerando os custos e as rendas sociais (SANDRONI, 1989).

Nesse sentido, o Estado investiu-se no cuidado da economia e do social, tomando setores que antes eram dominados pela iniciativa privada. Nesse contexto surge o New Deal(novapolítica).

Essa proposta manifestava-se na intervenção estatal sobre o processo produtivo, cujo plano buscou atingir o pleno emprego, em contraposição a forte tradição liberal estadunidense. Desta forma aumentar-se-ia o consumo, o que aumentaria a produção industrial e agrícola, reintegrando, assim, mais pessoas ao sistema e o capitalismo voltaria a prosperar.

Para a implantação de uma nova ordem econômica e social nos Estados Unidos da América, formularam-se leis que estabeleciam amplas delegações de competências, numa tentativa de adaptação constante às mutações da realidade fática. Originam-se as chamadas Agências especializadas nas respectivas áreas de atuação, cujos dirigentes já gozavam de estabilidade (DALLARI, 2002).

Nesse ínterim, observa-se uma tendência intervencionista do Estado, sem necessariamente promover a estatização de empresas privadas, mas agindo por vezes como parceiro ou estabelecendo regras de conduta mercadológica na tentativa de fomentar e minimizar os problemas sociais.

Ainda no século XX, nos países que adotaram o modelo intervencionista, o Estado demonstrou sua incapacidade, revelada pelo “inchaço” do aparelho estatal e o esgotamento de sua condição financeira ao pretender cuidar de todos os setores da sociedade. As atividades exercidas diretamente pelo Estado conduziram a uma situação de insolvência governamental, na qual não se cumpriam as obrigações assumidas e não se avançavam em projetos mais ambiciosos. Houve o aumento de despesas e diminuição de receitas, o que ocasionou enorme dívidainterna e externa ao Estado.

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A crise fiscal do Estado de Bem-Estar conduziu a perspectiva de redução das dimensões do Estado e de sua intervenção direta no âmbito econômico. Passou-se a um novo modelo de atuação estatal, que se caracteriza preponderantemente pela utilização da competência normativa para disciplinar a atuação dos particulares.

Como consequência dessa crise fiscal e por não ter condições de atuar diretamente na economia, o Estado passou a ser regulador. Surge a partir de então o pensamento neoliberal.

O Neoliberalismo constitui-se numa doutrina político-econômica que representa uma tentativa deadaptar os princípios do Liberalismo econômico às condições do Capitalismo moderno. Os neoliberais, como a escola liberal clássica, acreditam que a vida econômica é regida por uma ordem natural formada a partir das livres decisões individuais e cuja mola-mestra é o mecanismo dos preços. O disciplinamento da ordem econômica seria realizado pelo Estado, para combater os excessos da livre concorrência. No plano social, defende a limitação da herança e das grandes fortunas e o estabelecimento de condições de igualdade que possibilitem a concorrência (SANDRONI, 1989).

Em decorrência dos fenômenos históricos e econômicos ora descritos, as constituições que surgiram no século XX sofreram forte influência de suas doutrinas, influenciando inclusive a vida econômica brasileira. A Constituição brasileira de 1988 possui normas, integradas ao seu corpo, que sistematizam a disciplina da economia.

Nas palavras de Kildare Gonçalves Carvalho (2004, p.731):

Pode-se dizer que o Brasil tem uma “Constituição econômica”, pois se assenta em um

complexo de normas fundamentais que instituem de forma jurídica elementos estruturais para uma forma concreta de um sistema econômico. E a ordem econômica é fixada ou presumida pela ordem jurídica, e pode ser diretamente pela constituição ou por regras fundamentais do direito privado e administrativo.

Segundo José Afonso da Silva (2014, p.689), a ordem econômica na Constituição Federal de 1988 contempla a Economia de mercado, distanciada todavia do modelo liberal puro e ajustada à ideologia neoliberal. A Constituição arreda o dirigismo, mas agasalha o intervencionismo econômico, o qual não se faz contra o mercado, porém a seu favor. E ainda, a Constituição é capitalista, mas a liberdade apenas é admitida enquanto exercida no interesse da justiça social e confere prioridade aos valores da Economia de mercado.

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normativo e regulador da atividade econômica, por isto o Estado pode ser umagente econômico e um agente disciplinador da Economia.

Ao seguir uma tendência político-econômica mundial iniciada na década de 1980 revelada por mecanismos de desestatizações, privatizações, concessões, parcerias e uma regulação desburocratizada, o Brasil adotou o modelo de Estado Regulador, uma vez que a exploração direta de atividade econômica se concentra nas mãos do setor privado e desta forma caberia ao Estado normatizar, fiscalizar e incentivar essa atividade. Nesse contexto, criaram-se as Agências Reguladoras.

Nesse contexto muito bem explana Aranha Filho (2013, p.15):

Essa nova forma de atuação do Estado pressupõe, além da participação privada na prestação dos serviços públicos, a regulação da exploração da atividade econômica, buscando a defesa do interesse público e o equilíbrio nas relações de consumo no setor regulado, de modo que o Estado deve atuar num ponto equidistante entre os interesses dos usuários, dos prestadores dos serviços concedidos e do próprio Poder Executivo, para evitar eventuais pressões políticas.

Segundo Sérgio Guerra (2004), o surgimento das Agências Reguladoras brasileiras começa, basicamente, paralelamente ao lançamento, pelo Governo Federal, do denominado Plano Diretor da Reforma do Aparelho do Estado, sob a motivação de reconstruir o Estado de forma a resgatar sua autonomia financeira e sua capacidade de implementar políticas públicas. O referido plano foi inspirado em dois fatores: a responsabilização por resultados e a autonomia de gestão.

Desta forma, as Agências Reguladoras foram criadas em decorrência do Plano Nacional de Desestatização – PND, implantado na Administração Pública pátria a partir da promulgação da Lei n° 8.031/90, posteriormente revogada pela Lei n° 9.491/97, a qual alterou os procedimentos relativos ao PND, aproveitando, entretanto, algumas das normas anteriormente traçadas por aquela, dando-as, contudo, melhor redação, a fim de conferir maior completude ao sistema.

Nesse compasso, a Constituição da República Federativa do Brasil de 1988 foi sendo paulatinamente alterada, a fim de viabilizar o implemento do projeto de descentralização administrativa, que se alicerçou na autonomia e profissionalização, vinculada também à eficiência e à economicidade administrativa (AGUIAR, 2011).

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desestatizados, no decorrer do processo de revolução estrutural que vinha experimentando a Administração Pública, que passou cada vez mais a buscar a eficiência de sua atuação, a fim de atender aos anseios sociais. As aludidas entidades são conhecidas hoje como Agências Reguladoras.

Neste sentido são as palavras de Carlos Roberto Siqueira Castro (2011, p.429):

“A Emenda Constitucional n° 8 foi o primeiro ato legislativo formal noBrasil,

conquanto de nível constitucional, que expressamente aludiu à ideiade órgão regulador, o que gerou a instituição da ANATEL, na qualidade deentidade autárquica criada pela Lei Geral de Telecomunicações, isto é, a lei n° 9.472 de 1997.”

Nessa esteira, o art. 21, XI da Constituição Federal de 1988 estabelece que compete à União:

explorar,diretamente ou mediante autorização, concessão ou permissão, os serviços de telecomunicações, nos termos da lei, que disporá sobre a organização dos serviços, a criação de um órgão regulador e outros aspectos institucionais.

Sendo assim, o próprio Texto Constitucional passou a expressar a necessidade de regulação das atividades públicas.

Buscou-se por meio dessa exposição de mudanças históricas e econômicas a partir do século XVIII, compreender os motivos que impulsionaram o surgimento das Agências Reguladoras no cenário brasileiro a partir dos anos 1990, cuja atuação na ordem econômica brasileira será posteriormente apresentada.

Segundo Aguiar (2011), entende-se como Agência Reguladora a entidade da Administração Pública Indireta, criada sob a forma de autarquia em regime especial, que tenha competência reguladora sobre serviços públicos delegados por concessão ou permissão à iniciativa privada, ou sobre atividades econômicas relevantes, quais sejam as atividades que em geral possuem uma especial sensibilidade para a coletividade; atividades a respeito das quais os interesses são fortes, múltiplos e conflitantes, notadamente as que possuem elevado potencial de comoção da opinião pública, entre as quais incluem-se, obviamente, os serviços públicos”.

O referido conceito coaduna-secom as palavras de Alexandre dos Santos de Aragão (2013, p.275):

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dirigidas por colegiado, cujos membros são nomeados por prazo determinado pelo Presidente da República, após prévia aprovação pelo Senado Federal, vedada a exoneração ad nutum.

Como exemplo de atividades relevantes de interesse coletivo, tem-se a regulação sobre a comercialização de medicamentos exercida pela Agência Nacional de Vigilância Sanitária - ANVISA, bem como a regulação sobre os planos de saúde, exercida pela Agência Nacional de Saúde Suplementar – ANS, ambas vinculadas ao Ministério da Saúde, ou seja, voltados a um segmento vital para a sociedade, dotado de projeção constitucional, qual seja a saúde.

Considerando a atribuição fundamental das Agências Reguladoras, que é o exercício da função regulatória, o ilustre professor Marçal Justen Filho (2007, p.39) assim define: “Agência Reguladora independente é uma autarquia especial, sujeita a regime jurídico que assegura a autonomia em face da Administração direta e que é investida de competência para a regulação setorial.”.

Dessa forma, conhecer a delimitação conceitual das Agências Reguladoras é premissa básica para apresentar suas características, suafunção e sua base legal.

2.2. Características, prerrogativas das Agências Reguladoras e sua base legal

Possuindo natureza autárquica, as Agências Reguladoras representam a atuação do próprio ente estatal exercendo atividade típica do Estado e, para tanto, precisam gozar de todas as prerrogativas públicas de que gozam os entes federativos, aplicando-se integralmente as regras atinentes ao Regime Jurídico Administrativo.

Matheus Carvalho (2017, p.174) define Autarquias como:

...pessoas jurídicas de direito público, criadas por lei, que desenvolvem atividade típica de Estado, com liberdade para agirem nos limites administrativos da lei específica que as criou. Assim como os demais entes da Administração Indireta, não estão hierarquicamente subordinadas aos entes federativos, mas se sujeitam a controle finalístico exercido pelos entes da Administração Direta responsável pela sua criação.

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subordinação a nenhum órgão do Estado, são apenas controladas e, apesar de terem personalidade jurídica própria e autonomia financeira, são despidas decaráter econômico, agindo tão somente na busca do interesse coletivo.

O Decreto-lei nº 200/67 traz, em seu conteúdo, a definição das autarquias, em seu art. 5°, inciso I, como: “serviço autônomo, criado por lei, com personalidade jurídica, patrimônio e receita próprios, para executar atividades típicas da Administração Pública, que requeiram, para seu melhor funcionamento, gestão administrativa e financeira descentralizada”.

O caráter especial atribuído ao regime das Agências Reguladoras significa que a leiinstituidora prevê algumas peculiaridades no regime jurídico aplicável à entidade, manifestada por determinadas prerrogativasque conferem uma margem de autonomia jurídica que não se encontra na maior parte das entidades autárquicas.

Nesse sentido, além das características aplicadas à natureza jurídica da autarquia comum, as Agências Reguladoras se destacam por possuir um regime diferenciado que oferece maior independência e autonomia que esta entidade goza em relação aos entes da Administração Direta, executando suas atividades com maior liberdade de atuação, embora ainda sujeita à supervisão ministerial.

O mencionado regime diferenciado (especial) se dá em razão das prerrogativas concedidas às Agências Reguladoras, inexistentes nas demais autarquias, como, por exemplo, mandato fixo de seus dirigentes (autonomia administrativa), visando aumentar sua autonomia frente ao poder centralizado.

As palavras de Alexandre Santos de Aragão (2013, p.275) corroboram tal entendimento:

As Agências Reguladoras são autarquias de regime especial tanto formal (as respectivas leis instituidoras as denominam como tal) como material (são asseguradas diversas prerrogativas que aumentam consideravelmente a sua autonomia em comparação com a das demais autarquias, em especial a vedação de exoneração ad nutum dos membros do seu colegiado dirigente, nomeados por prazo determinado).

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Os aludidos dirigentes são nomeados pelo Presidente da República, após aprovação pelo Senado Federal, nos termos do procedimento previsto nos artigos 4° a 10 da Lei n° 9.986/00, os quais estabelecem sua disciplina geral.

Complementando a explanação alhures, novamente se recorre às ilustres palavras de Alexandre Santos de Aragão (2013, p.325):

Quanto aos dirigentes das Agências Reguladoras sua disciplina, previstas nos arts. 4° a 10 da Lei n° 9.986/00, que estabelecem sua disciplina geral pela qual serão escolhidos entre brasileiros, de reputação ilibada, formação universitária e elevado conceito no campo de especialidade dos cargos, nomeados pelo Presidente da República para mandato de período certo, após aprovação pelo Senado Federal, nos termos da alínea f do inciso III do art. 52 da Constituição Federal (arts. 5° e 6°). A eles também é assegurada a vedação de exoneração ad nutum (art. 9°) e imposta uma série de limitações profissionais durante o período de quarentena (art. 8°).

A garantia de cumprimento de mandato certo significa que o dirigente não será exonerado livremente, por vontade do órgão de controle. Isso faz com que a agência tenha mais liberdade de atuação e esteja menos dependente dos entes da Administração Direta, além de garantir maior autonomia das decisões em detrimento de interferências externas.

Ademais, após o término do mandato, oex-dirigente deverá obedecer a um período de “quarentena”, o qual é previsto na lei de criação da respectiva agência, gozando de remuneração compensatória equivalente à do cargo de direção que exerceu e aos benefícios a ele inerentes para evitar que esse ex-dirigente seja contratado por uma empresa privada e ingresse em seus quadros funcionais com informações privilegiadas, causando transtornos e prejuízos à fiscalização, funcionando assim como mais um mecanismo de efetivação de independência (CARVALHO, 2017).

A autonomia econômica financeira atribuída às Agências Reguladoras, como prerrogativa,oferece a garantia de receitas vinculadas. Isso significa apossibilidade de manutenção de sua estrutura e de seu funcionamento sem dependência de disputas políticas sobre a distribuição de verbas orçamentárias (CARVALHO FILHO, 2015).

Além da existência de dotação orçamentária própria, as Agências auferem recursos próprios por meio das taxas de regulação, que são devidas em virtude da fiscalização e controledos serviços públicos delegados, bem como do poder de polícia exercido sobre os executores de atividades econômicas socialmente relevantes; denominados agentes regulados.

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...podemos constatar que de fato as leis instituidoras das agências lhes asseguram autonomia financeira, através da titularidade das chamadas taxas regulatórias (ex.: arts. 11 a 14 da Lei nº 9.427/96); e orçamentária, através do envio de proposta de orçamento ao Ministério ao qual é vinculado (ex.: art. 49 da Lei n° 9.427/96).

Em seu âmbito interno, as Agências Reguladoras gozam de autonomia decisória, cujos atos não são passíveis de recurso hierárquico endereçado ao Ministério a que está vinculada (recurso hierárquico impróprio), tampouco a qualquer outra autoridade, entidade ou ente da Administração Pública Direta ou Indireta, diferentemente do que ocorre em algumas Autarquias comuns como o INSS, devendo eventuais reanálises sobre a matéria objeto do ato decisório proferido serem revistas pela própria Agência Reguladora, por intermédio de seus órgãos internos.

Nesse sentido, José dos Santos de Carvalho Filho (2015, p.520) aduz que:

A autonomia decisória significa que os conflitos administrativos, inclusive os que envolvem as entidades sob seu controle, se desencadeiam e se dirimem através de seus próprios órgãos da autarquia. Em outras palavras, o poder revisional exaure-se no âmbito interno, sendo inviável juridicamente eventual recurso dirigido a órgãos ou autoridades da pessoa federativa à qual está vinculada a autarquia.

Alexandre Santos de Aragão (2013, p.347) sustenta que a impossibilidade de interposição de recurso hierárquico por si só bastaria, considerando a ausência de lei em sentido contrário e a consagração à autonomia decisória das Agências. Nas palavras do aludido autor:

O que se deve notar é que pouco importa se nesta ou naquela agência está ou não expressamente excluída a interposição de recurso hierárquico impróprio. Como já visto, não é a sua vedação que deve ser expressa, mas sim a sua admissão (pás de tutellesanstexte). O próprio decreto-lei n° 200/67, aplicável às Agências Reguladoras no que não contrariar as suas leis específicas, não inclui os recursos hierárquicos impróprios entre os mecanismos de supervisão ministerial disciplinados por seus arts. 19 a 29.

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Vale ressaltar que as Agências Reguladoras não podem editar atos que obriguem particulares que não têm relação com a prestação do serviço, apenas a lei pode obrigar a atuação do particular usuário do serviço.

Desta forma, o poder normativo concedido a estas entidades para execução de suafunção de controle e regulação não poderá extrapolar os limites da lei, substituindo-se ao textolegal, devendo ater-se a orientações de natureza técnica e providências inferiores e obedientesà lei, por meio de resoluções (CARVALHO, 2017).

2.3. Tipologia das Agências Reguladoras

Realizada a caracterização, explanadas as prerrogativas e a base legal das Agências Reguladoras, a doutrina faz a diferenciação quanto à existência de dois modelos destas entidades.

Maria Sylvia Zanella Di Pietro (2017) faz a seguinte diferenciação quanto aos dois modelos de Agências Reguladoras:

a) as que exercem, com base em lei, típico poder de polícia, com a imposição de limitações administrativas, previstas em lei, fiscalização, repressão; é o caso, por exemplo, da Agência Nacional de Vigilância Sanitária (Anvisa), criada pela Lei nº 9.872, de 26-1-1999, da Agência Nacional de Saúde Pública Suplementar (ANS), criada pela Lei nº 9.961, de 28-1-2000, da Agência Nacional de Águas, criada pela Lei nº 9.984, de 17-7-2000; b) as que regulam e controlam as atividades que constituem objeto de concessão, permissão ou autorização do serviço público (telecomunicações, energia elétrica, transportes, etc.) ou de concessão ou exploração de bem público (petróleo e outras riquezas minerais, rodovias, etc.).

Quanto ao primeiro modelo, o exercício do poder de polícia busca condicionar a liberdade e a propriedade ajustando-as aos interesses coletivos. Nas palavras de Celso Antônio Bandeira de Mello (2013, p.688):

...as intervenções, quer gerais e abstratas, como os regulamentos, quer concretas e específicas (autorizações, licenças, injunções), destinadas a alcançar o mesmo fim de prevenir e obstar ao desenvolvimento de atividades particulares contrastantes com os interesses sociais.

Desta forma, o poder de polícia é aatividade do Estado consistente em limitar o exercício dos direitos individuais em benefício do interesse público.

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aoparticular a atividade econômica, na qualidade de Poder Concedente, quando o objeto da concessão é a exploração de um serviço público de utilização da coletividade, excetuando-se, nesse caso o monopólio.

Em ambos os casos, busca-se proteger o interesse público, contribuindo no final, para o bem da coletividade.

Carvalho (2017, p.193), considerando que a atividade de regulação proferida pelas Agências Reguladoras envolve normatização de atividades deinteresse público, o que abrange o controle de prestação de serviços públicos, as atividades de fomento, bem como a exploração de atividades econômicas de interesse coletivo, classifica-as em quatro grupos:

a) “Agências que regulam a prestação de serviços públicos: atuam na fiscalização de serviços públicos propriamente ditos, prestados mediante delegação contratual ou, em algumas situações, prestados diretamente pelo ente estatal como, por exemplo, a ANEEL

–Agência Nacional de Energia Elétrica, criada a gerida pela lei 9.427/96, a ANTT –

Agência Nacional de Transporte Terrestre e ANTAQ -Agência Nacional de Transportes Aquaviários, reguladas pela lei 10.233/01, ANATEL -Agência Nacional de telecomunicações, disciplinada pela lei 9.472/97, ANA-Agência Nacional de Águas, criada e regulamentada pela lei 9984/00, bem como a ANAC -Agência Nacional de Aviação Civil, instituída pela lei 11.182/05. b) Agências que fiscalizam atividades de fomento: executam suas atividades na regulação de atividades eminentemente privadas que dependem de fiscalização estatal, por serem de interesse da coletividade, como é o caso da difusão de cultura e de manifestações artísticas. Pode-se citar como exemplo destas entidades a ANCINE -Agência Nacional de Cinema, criada pela MP 2.228/01 que dispõe acerca das políticas relativas à atividade cinematográfica no país. c) Agências que controlam a exploração de atividades econômicas: são autarquias especiais que atuam na normatização da exploração de atividades econômicas de interesse da coletividade. Nesse sentido, tem-se a ANP - Agência Nacional do Petróleo, instituída pela lei 9.478/97. d) Agências que regulamentam serviços de utilidade pública: essas Agências controlam serviços públicos não exclusivos de Estado, também denominados serviços de utilidade pública. Pode-se enumerar a ANS - Agência Nacional de Saúde Suplementar, criada pela lei 9.961/00 e também a ANVISA -Agência Nacional de Vigilância Sanitária, regulamentada pela lei 9.782/99, que tem a intenção de garantir a proteção à saúde de todos os membros da sociedade(Grifo no original).

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3. PODER REGULATÓRIO NO ÂMBITO DA ADMINISTRAÇÃO PÚBLICA

Para que se alcancem os objetivos deste trabalho, é importante haver uma noção geral acerca do poder normativo do Estado, instrumento utilizado pelo poder público para a edição de normas infra legais, tidas como regulamentos (atos derivados do poder legisferante), revestidos de denominações diversas, como decretos, resoluções, portarias, etc.. Essas normas secundárias, tidas como gerais e abstratas, atuam como complementadoras da lei, evêm sendo elaboradascotidianamente no exercício atípico do poder legisferante exercido pelo poder executivo. Essa percepção se torna evidente ao se observar o exercício da atividade administrativa, a qual possui como importante pilar a obediência ao princípio da legalidade.

Assim, ao longo do presente capítulo, almejam-se apontar as características do poder normativo, as espécies de regulamentos, e apresentar o fenômeno da descentralização normativa, que se apresenta como reflexo da prerrogativa de edição de atos normativos, exercidapelas Agências Reguladorascomo mecanismo de controle das atividades econômicas na busca pelo interesse público.

3.1. Poder normativo e poder regulamentar

Há poderes ou atribuições que são inerentes à atuação da Administração Pública, sem os quais não se conseguiria fazer mover a já tão complicada máquina estatal. Dentre esses, inclui-se a competência normativa ou regulamentar (Peixoto, 2005).

O conceito de regulação é bastante amplo e engloba, inclusive, a atividade normativa, onde se insere o fenômeno da regulamentação. Sobre o tema, bastante elucidativa é a lição de Di Pietro (2017, p.161):

"Regular significa estabelecer regras, independentemente de quem as dite, seja o Legislativo ou o Executivo, ainda que por meio de órgãos da Administração direta ou entidades da Administração indireta, trata-se de vocábuloamplo, que abrange, inclusive, a regulamentação, que tem um sentido mais estrito."

A regulação, portanto, é um termo mais amplo quando comparado à regulamentação.

(27)

interesses de outrem, no caso a sociedade e o Estado. Assim os ditos poderes, os quais lhe são outorgados, são meramente instrumentais, necessáriosà consecução dos fins aos quais está encarregado de atender.

Observa-se, portanto, que a regulamentação surge do exercício do poder regulamentar pela Administração Pública, no sentido de atribuir fiel cumprimento às leis e demais atos normativos.

Essa prerrogativa dada à Administração Pública de editar esses atos permite sua efetiva aplicação sempre limitada pela lei, de modo a facilitar a compreensão do texto legal, minudenciando seus termos. Na observação de José dos Santos Carvalho Filho (2015, p.46):

Ao poder regulamentar não cabe contrariar a lei (contra legem) sob pena de sofrer invalidação. Seu exercício somente pode dar-se secundumlegem, ou seja, em conformidade com o conteúdo da lei e nos limites que esta impuser.

O poder normativo (e não apenas regulamentar, que é uma de suas espécies), permite ao administrador editar normas gerais e abstratas, observados o princípio da legalidade e as regras de competência. Os atos normativos possuem pontos de contato com a lei, mas não se confundem com ela, conforme observa Maria Sylvia Zanella Di Pietro (2017, p.162):

Os atos pelos quais a Administração exerce seu poder normativo têm em comum com a lei o fato de emanarem normas, ou seja, atos com efeitos gerais e abstratos. São distintos da lei, porque os regulamentos não têm o condão de inovar, de forma primária, a ordem jurídica, enfim, de criar o direito novo.

Como traço específico do Estado Regulador, atribui-se às Agências Reguladoras o poder de criar normas substantivas (rulemaking), criando obrigações, direitos e sanções que não foram expressamente previstos pela legislação. Esse é o exercício do poder normativo. Tais normas possuem a mesma natureza jurídica de uma norma legal, pois elaboradas no exercício da função legislativa. Por serem fonte primária, gozam do mesmo status de uma lei, apenas tendo hierarquia inferior. Em outras palavras, não podem contrariar as normas contidas nas leis em sentido estrito, hipótese na qual o conflito de normas se resolve pela aplicação do critério hierárquico (LIMA, 2012).

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atosadministrativos normativos que não podem alterá-la ou desrespeitar os seus termos. Sendo assim, o ato administrativo normativo é fonte primária e inferior.

O caráter da supremacia legal possui base constitucional, haja vista que o texto da Constituição Federal prevê em seu art.5º, II, que: "ninguém será obrigado a fazer ou deixar de fazer alguma coisa senão em virtude de lei".

A referida previsão no próprio Texto Constitucional decorre do fato de que as leis emanam de um processo de elaboração complexo que lhes garante maior confiabilidade, uma vez que expedidas pelos representantes diretos do povo, titular maior do interesse público.

Portanto, o poder normativo é a capacidade de um órgão criar uma norma que, antes, não existia, ainda que essa norma seja limitada a outras normas de hierarquia superior e aos princípios e regras do respectivo ordenamento jurídico.

A doutrina tradicional refere-se a poder regulamentar como sinônimo de poder normativo. No entanto, modernamente, por se tratar de conceituação restrita (uma vez que abarca a edição de regulamentos apenas, excluindo os outros atos normativos próprios da atuação do Estado), o poder regulamentar vem sendo tratado como espécie do poder normativo. Afinal, além da edição de regulamentos, o poder normativo abarca a edição de outros atos normativos, tais como deliberações, instruções, resoluções (CARVALHO, 2017).

O art. 84, inciso IV da Constituição Federalrelaciona o exercício do poder regulamentar ao Presidente da República:

" Art.84- Compete privativamente ao Presidente da República: ( ... )

IV - sancionar, promulgar e fazer publicar as leis, bem como expedir decretos e regulamentos para sua fiel execução."

Diante da redação do preceito supra, induz-se que o poder regulamentar é privativo do Presidente da República, por assim dispor expressamente o Texto Constitucional.

Por simetria, estão investidos nesta prerrogativa os chefes dos executivos estaduais e municipais, por força da autonomia dos entes federados consagrada no art. 18 da CF/88.

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conferido às autoridades públicas de editarem normas gerais e abstratas, nos limites da legislação pertinente.

José dos Santos Carvalho Filho (2015, p.381), no entanto, apresenta posição contrária ao entendimento alhures, quando sustenta contra ser de exclusividade do Presidente da República a prerrogativa de exercício do poder regulamentar:

O processo de formalização do poder regulamentar se processa nos termos do art. 84, IV da CRFB/88, que dispõe que compete ao Presidente da República expedir decretos e regulamentos para a fiel execução das leis. Há também atos normativos que, editados por outras autoridades administrativas, podem caracterizar-se como inseridos no poder regulamentar, pois, veiculando normas gerais e abstratas para a explicação das leis, não deixam de ser, a seu modo, meios de formalização do poder regulamentar.

Conforme se observa, o aludido autor afasta a premissa de exclusividade de competência do Presidente da República no exercício do poder regulamentar, o qual, logo,não se distingue entre o praticado pelo Chefe do Poder Executivo e pelas demais autoridades administrativas integrantes das entidades e dos órgãos autônomos dotados de podernormativo, pois, se aquele é originário, concedido diretamente pela Constituição Federal, este é derivado, pois atribuído por leis formais, a quem o próprio Texto Constitucionalconferiu competência para disciplinar, normativamente, através da observância dos procedimentos nela estabelecidos, a liberdade dos indivíduos.

O que diferencia as Agências Reguladoras dos demais órgãos do Executivo é que elas não só possuem o poder regulamentar, mas, sim, um poder normativo, podendo elaborar atos normativos substantivos originais. O poder normativo não faz parte do exercício da função executiva e, sim, é o exercício por delegação de uma função legislativa. Assim, não se pode aplicar ao poder normativo a teoria do poder regulamentar, por serem institutos com natureza jurídica distinta e propósitos diferentes (LIMA, 2012).

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Em suma, o poder normativo é a capacidade de um órgão criar uma norma que, antes, não existia, ainda que tal norma seja limitada a outras normas de hierarquia superior e aos princípios e regras do respectivo ordenamento jurídico.

O poder regulamentar, por outro lado, não implica na criação de normas. Ele pressupõe a existência de uma legislação, permitindo ao executor tão somente o detalhamento da norma já criada, sem admitir que o ato regulamentar crie uma obrigação inovadora. A atividade normativa decorrente da delegação legislativa é atividade normativa primária. Os regulamentos, por outro lado, são característicos da atividade normativa secundária. O exercício da atividade normativa secundária independe de delegação, sendo decorrente, na verdade, da própria atribuição do órgão para o exercício da função executiva (LIMA, 2012).

Portanto, verifica-se que o poder regulamentar é inerente a qualquer órgão do executivo. O poder normativo, por outro lado, caracteriza o exercício de uma função legislativa, de uma atividade normativa primária. São institutos jurídicos distintos. Se as Agências Reguladoras somente exercessem a função regulamentar, nenhum traço distintivo haveria em relação a todo e qualquer outro órgão da Administração Pública.

No que tange aos atos administrativos que estipulam regras gerais e abstratas, dentro da estrutura organizacional do Estado, existe a possibilidade de expedição de diversos atos normativos, tais como as deliberações, instruções normativas, entre outros. Ademais, o ordenamento jurídico brasileiro reconhece duas espécies de regulamentos, que serão apresentadas no tópico a seguir.

3.2. Espécies de regulamentos e atos normativos

Admitem-se, no ordenamento jurídico brasileiro, dois tipos de regulamentos: o regulamento independente ou autônomo e o regulamento executivo. Nas palavras de Matheus Carvalho (2017, p.288):

(31)

Há uma grande divergência acerca da possibilidade ou não de serem expedidos regulamentos autônomos, em virtude do princípio da legalidade, estampado como corolário do Sistema Constitucional Brasileiro.

Parte considerável da doutrina mantém o entendimento de que os decretos devem ser expedidos somente para fiel execução da lei. O art. 84, IV da CF dispõe que, ao Presidente da República compete, privativamente, a expedição de decretos e regulamentos para fiel execução da lei, deixando evidente o caráter executivo desses atos normativos. No mesmosentido, o art. 25 do Ato das Disposições Constitucionais Transitórias – ADCT- revogou, a partir de 180 dias da promulgação da Constituição Federal, todos os dispositivos legais que atribuam ou deleguem ao Poder Executivo, competência assinalada, pelo texto da Constituição, ao Congresso Nacional (CARVALHO, 2017).

Ocorre que, a Constituição Federal, em seu art. 84, inciso VI, estabelece a competência do Presidente da República para, por meio de Decretos, determinar a extinção de cargo público vago e tratar da organização administrativa, desde que não implique em aumento de despesas e não crie órgãos públicos.

A partir da análise desse dispositivo, a doutrina majoritária vem se posicionando no sentido de que, com a inserção deste inciso, existem, no Brasil, duas únicas hipóteses de regulamentos autônomos constitucionalmente admitidos, quais sejam, as duas situações previstas no art. 84, VI da Carta Magna. São exceções à regra geral de que o chefe do Poder Executivo edita decretos para fiel execução da lei, sem o caráter de inovação da ordem jurídica (CARVALHO, 2017).

Esse entendimento doutrinário possui respaldo com base em orientação jurisprudencialno âmbito do Superior Tribunal de Justiça, ao analisar o REsp 584.798/PE - Primeira Turma, julgado em 04/11/2004 e publicado no DJ de 06/12/2004, estabeleceu que são: "os regulamentosautônomos vedados no ordenamento jurídico brasileiro, a não ser pela exceção do art. 84,VI da Constituição Federal".

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Decreto, portanto, é a forma por meio da qual são exteriorizados os atos individuais ou gerais, emanados do Chefe do Poder Executivo, tanto nas esferas federal e estadual, como também na esfera municipal. Trata-se de ato normativo derivado, uma vez que não é instrumento hábil para inovar, em regra, no ordenamento jurídico, criando direito novo, de modo que deve tão-somente estabelecer normas que permitam a explicitação do conteúdo e forma de execução das leis.

Assim como a lei, o decreto pode conter regras gerais e abstratas, dirigindo-se a todas as pessoas que se encontram na mesma situação, classificado como decreto geral, caracterizando-se como ato normativo típico; ou somente a uma pessoa ou grupo de pessoas determinadas, sendo um decreto individual, como no caso de uma desapropriação, não sendo considerado ato normativo (DI PIETRO, 2017).

Resoluções, instruções e portarias são formas de que se revestem os atos, gerais ou individuais, emanados de autoridades outras que não o chefe do executivo (DI PIETRO, 2017).

Assim, além da figura do decreto, que se manifesta no exercício do poder regulamentar, o poder normativo da administração pública pode também exteriorizar-se por meio de resoluções, portarias, deliberações, instruções, regimentos etc, os quais são atos normativos.

Segundo Celso Antônio Bandeira de Mello (2013, p.365), o que se refere a respeito dos regulamentos se aplica com a mesma razão às resoluções, instruções, portarias e quaisquer outros atos normativos da Administração Pública, muito embora estes não ostentem a qualificação de regulamento e ocuparem nível inferior:

... toda dependência e subordinação do regulamento à lei, bem como os limites em que há de se conter, manifestam-se revigoradamente no caso de instruções, portarias, resoluções, regimento ou normas quejandas. Desatendê-los implica inconstitucionalidade. A regra geral contida no art. 68 da Carta Magna, da qual é procedente inferir vedação a delegação ostensiva ou disfarçada de poderes legislativos ao Executivo, incide com maior evidência quando a delegação se faz em prol de entidades ou órgãos administrativos sediados em posição jurídica inferior à do Presidente e que vão se manifestar, portanto, mediante atos de qualificação menor.

(33)

técnicoda prestação do serviço e expedem os atos por meio de manifestação do seu Conselho Diretivo.

A teoria da deslegalização preconiza que o ato regulatório decorre diretamente da lei e será legítimo, desde que observe os preceitos gerais, parâmetros e limites fixados na lei.

3.3. A deslegalização ou descentralização normativa

O desenvolvimento de uma sociedade plural e complexa no mundo contemporâneo levou o legislador a elaborar regulamentaçõesespeciais destinadas a determinados setores da sociedade ou a certas relações jurídicas.

Na prática, verificou-se que não bastava a edição de leis especiais pelo Poder Legislativo. Impunha-se também a especialização das fontes do Direito e dos respectivos órgãos emanadores. O Poder Legislativo, essencialmente político e atuando mediante processos necessariamente lentos, viu-se incapaz de lidar com a complexidade, pluralidade e tecnicismo das matérias que demandavam a sua atuação (ARAGÃO 2011).

Esse pluralismo de atividades e atores sociais tornou imperiosa a edição de normas regulatórias, em virtude da especialização das matérias a serem reguladas, como também a criação de órgãos incumbidos da expedição das respectivas normas, que, para isso, gozariam de amplos poderes para exercê-los satisfatoriamente e com observância dos cânones do Estado de Direito e estarem, na medida do possível, livres das injunções políticas parciais.

O Interesse Público, em sua essência, deve ser instrumento legitimador dos direitos fundamentais, num processo dialógico-dialético, cidadão e democrático, quando do exercício das prerrogativas do poder público.

A Administração Pública, quando se organiza, tem como meta primordial proporcionar, com eficiência, o bem estar social e econômico à população, como elemento que plasma o interesse público informativo da Constituição (MARQUES JÚNIOR, 2015).

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pode fundamentar arbitrariedades perpetradas pelo Poder Público nem tampouco pode ser exercido de modo ilimitado (MARQUES JÚNIOR, 2015).

Portanto, com o avanço da pluralidade e complexidade, inclusive tecnológica, da sociedade, esse processo fragmentário da Administração Pública chegou a um ponto necessário do surgimento, por imposições práticas, teoricamente elaboradas, de órgãos e entidades independentes, ou seja, dotados de uma verdadeira autonomia.

No contexto da contemporaneidade verifica-se uma decadência da legalidade estrita, na qual emerge a constitucionalização das regras da Administração Pública com a construção de uma vinculação imediata ao critério da juridicidade (reserva vertical da Constituição), em uma dimensão mais efetiva do que em relação ao princípio da legalidade (MARQUES JÚNIOR, 2015).

Nesse sentido, deduz-se racionalmente que o princípio da separação dos poderes vem sendo gradualmente relativizado diante da ordem social modernamente estabelecida, onde a sociedade exige atuação mais eficientes da administração pública sobre seus anseios, o que torna necessária a disseminação das funções estatais, nelas incluída a normativa, a vários órgãos e entidades especiais e técnicos, dotados de independência funcional no exercício de suas funções, haja vista que, do contrário, estarão fadadas à falência por asfixia, dada a crescente e complexa demanda que é ao Estado submetida.

Alexandre Santos de Aragão (2013, p.284) acrescenta:

O que se verifica é a transformação dos modelos de administração pública, que passam a se situar no desenho organizativo e na gestão de recursos em função da natureza das tarefas, levando à fragmentação harmônica do aparato administrativo, à necessidade de novos instrumentos de integração e coordenação, e ao reconhecimento de novos graus do exercício autônomo de competências normativas, com a emergência de mecanismos de controle mais finalísticos que hierárquicos, sem haver levado à perda da unidade sistêmica do Direito.

Essa relativização clássica da separação dos poderes ganha compatibilidade quando determinado regulamento expedido pelas Agências Reguladoras não seria, na verdade, objeto exclusivo de lei em sentido estrito, quando se configuraria, neste caso, usurpação de poderes. A questão da compatibilidade suscitada perpassa, necessariamente, pelos conceitos de poder regulamentar e poder legiferante, ambos espécies de poder normativo, conforme já exauridos no presente projeto, e que nada obsta que sejam novamente trazidos à luz para efeitos de comparação e, logo, de distinção.

(35)

Nos limites da conceituação teórica, não há grande dificuldade em distinguir dois dos poderes fundamentais do Estado – o legiferante e o regulamentar. O primeiro é primário, porque se origina diretamente da Constituição na escala hierárquica dos atos normativos; o segundo é secundário, porque tem como fonte os atos derivados do poder legiferante. Portanto, como regra, afirma-se que o primeiro gera a lei (ou ato análogo com outra denominação) e o segundo o regulamento – caracterizado como ato administrativo e, frequentemente, revestido de denominações diversas (decretos, resoluções, portarias, etc.).

Desta forma, foram as próprias leis instituidoras que conferiram às Agências Reguladoras competência para expedir normas regulamentares acerca de seu mercado de atuação, ocorrendo pioneiramente com a promulgação da Lei n° 9.427, de 26 de dezembro de 1996, quando da criação da ANEEL – Agência Nacional de Energia Elétrica, conforme depreende-se do art.3º, I da referida lei:

Art. 3o Além das atribuições previstas nos incisos II, III, V, VI, VII, X, XI e XII do

art. 29 e no art. 30 da Lei no 8.987, de 13 de fevereiro de 1995, de outras incumbências

expressamente previstas em lei e observado o disposto no § 1o, compete à ANEEL:

I - implementar as políticas e diretrizes do governo federal para a exploração da energia elétrica e o aproveitamento dos potenciais hidráulicos, expedindo os atos regulamentares necessários ao cumprimento das normas estabelecidas pela Lei no 9.074, de 7 de julho de 1995.

Assim como ocorreu com a ANEEL, foi conferida competência normativa às demais Agências Reguladoras posteriormente criadas. Logo, infere-se que o fundamento do poder normativo das Agências Reguladoras está em suas próprias leis instituidoras, as quais, por sua vez, embasam-se na competência originária delegada pela Carta Magna ao Poder Legislativo, conforme depreende-se da análise do jurista Santhiago Dantas:

O poder de baixar regulamentos, isto é, de estatuir normas jurídicas inferiores e subordinadas à lei, mas que nem por isso deixam de reger coercitivamente as relações sociais, é uma atribuição constitucional do Presidente da República, mas a própria lei pode conferi-la, em assuntos determinados, a um órgão da Administração Pública ou a uma dessas entidades autônomas que são as autarquias.

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editar normas técnicas específicas sobre determinados setores da sociedade, notadamente os afetos à economia (AGUIAR, 2011).

De acordo com Aguiar (2011, p.49):

Neste ínterim as leis passaram a ser mais genéricas e abstratas, prevendo tão somente o essencial para que não se configure a abdicação normativa ou a delegação do poder legiferante a outro órgão ou entidade, deixando para o Poder Executivo, sempre no exercício do poder regulamentar, a tarefa de completar-lhe o sentido, dando densidade à norma, o que se convencionou chamar de discricionariedade do Administrador Público.

A rigidez e complexidade do procedimento legislativo estabelecido pela Constituição impede que o Poder Legislativo acompanhe a evolução e o surgimento de tantas relações e condutas humanas, de modo que se torna imprescindível atribuir determinadas matérias à competência de órgãos e entidade técnicos e autônomos, capazes de produzir normas jurídicas com a dinâmica necessária para regular as relações econômico-sociais, o que contribuiu para o fenômeno da deslegalização normativa.

As respectivas leis criadoras das Agências Reguladoras lhes conferiram, com maior ou menor amplitude, competência para expedir normas e regulamentos destinados a disciplinar seus respectivos mercados regulados, definidos nas próprias leis instituidoras.

Esta atribuição normativa conferida às Agências Reguladoras se deu por meio do fenômeno conhecido como deslegalização normativa ou deligificação, que consiste na retirada, pelo próprio legislador, de certas matérias do domínio da lei passando-as ao domínio do regulamento (ARAGÃO, 2011).

Nesse fenômeno, o próprio legislador transfere a regulação de determinada matéria parauma outra sede normativa inferior.

A lei de deslegalização é uma lei que limita seus efeitos a abrir aos regulamentos a possibilidade de entrar em uma matéria até então regulada por lei, sendo esta também chamada de degradadora, a qual rebaixa o grau hierárquico deste mesmo assunto, atribuindo-o à competência de entidade da Administração Pública (AGUIAR, 2011).

(37)

Os princípios da legalidade, do congelamento do grau hierárquico e da precedência da lei não impedem, salvo matérias reservadas à lei (tributos e crimes), que se adote uma

“maior flexibilidade através da deslegalização ou degradação do grau hierárquico.

Neste caso, uma lei, sem entrar na regulamentação da matéria, rebaixa formalmente o seu grau normativo, permitindo que essa matéria possa vir a ser modificada por regulamentos.

O referido autor (2013, p.423) ainda sustenta que:

...não há qualquer inconstitucionalidade na deslegalização, que não consistiria propriamente em uma transferência de poderes legislativos, mas apenas na adoção, pelo próprio legislador, de uma política legislativa pela qual transfere a uma outra sede normativa a regulação de determinada matéria .

Com efeito, não há delegação legislativa quando o Poder Legislativo “deslegaliza”determinada matéria, degradando-a ao grau de regulamento, uma vez que a competência a ser exercida pelo órgão ou entidade do Poder Executivo será regulamentar, como normalmente o é nos demais casos, de modo que simplesmente se prestará a dar densidade, maior completude ao que for estabelecido na lei “deslegalizadora”, a qual definirá os parâmetros dentro dos quais tal poder regulamentar se realizará (AGUIAR, 2011).

Em suma, cabe ao Poder Legislativo legislar sobre diferentes tipos de matéria, sendo de forma ampla e geral ou outra específica. Dessa forma, entende-se que, quando estiver agindo no exercício do poder amplo e geral sobre qualquer espécie de relações, nada obsta que se promova a degradação hierárquica da norma, ou seja, a deslegalização, pois não se estará promovendo qualquer delegação legiferante ou legislativa, o que seria inconstitucional. Em contrapartida, quando se tratar de matéria reservada exclusivamente à lei, como é o caso dos tributos e dos crimes, não se poderá cogitar de deslegalização ou rebaixamento de grau hierárquico (AGUIAR, 2011).

Portanto, o instituto da deslegalização se volta a atribuir competência normativa, com natureza regulamentar, hierarquicamente inferior às leis e regulamentos de primeiro grau, às entidades da administração pública indireta dotadas de prerrogativas especiais de autonomia normativa, no caso as Agências Reguladoras.

(38)

4. PODER NORMATIVO DAS AGÊNCIAS REGULADORAS NA ORDEM CONSTITUCIONAL-ECONÔMICA BRASILEIRA

Verificou-se que a associação entre a política e a economia esteve sempre presente no processo de construção de uma nação, de modo que qualquer alteração efetivada em um desses dois campos provoca reflexos no outro. Aintervenção estatal na economia sofre algumas variações, de acordo com a política econômica adotada.

A implantação de um Estado que atua de forma a regular a atividade econômica propiciou o estabelecimento de regras jurídicas reguladoras da ordem econômica dentro do Texto Constitucional, o qual aborda, dentro deste contexto, a regulação econômica em capítulo específico "Da Ordem Econômica e Financeira”, a partir do art. 170da CF/88, dando estatura de norma supralegal às disposições que tratam deste tema (CARVALHO, 2017).

Assim, almeja-se, nesse capítulo, apresentar as normas presentes no Texto Constitucional que regulam a atuação do Estado no domínio econômico, no âmbito de atuação das Agências Reguladoras, cujos mecanismos interventivos estão frequentemente compatibilizados com as ideias políticas, sociais e econômicas da época, sempre com o fito de adequá-los à ordem social, à qual está atrelada à ordem econômica.

4.1. Análise da ordem constitucional-econômica brasileira e a ação regulatória proferida pelas Agências Reguladoras

O mercado globalizado pugna por uma lógica de ampla liberdade de ações econômicas, como o livre comércio e circulação de bens, a eliminação de obstáculos que possam macular a livre concorrência e uma absoluta ausência de ações limitadoras do Estado à atividade econômica. De outro lado, o Estado Democrático de Direito tem de saber equilibrar essa liberdade pretendida pelo mercado, eis que sujeito está a uma série de princípios destinados a proteger os seus cidadãos e a conferir-lhes direitos econômicos, trabalhistas, sociais e culturais, que, por inúmeras vezes, contrariam aquela lógica do mercado.

Referências

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