• Nenhum resultado encontrado

Grazielli LIMA

N/A
N/A
Protected

Academic year: 2021

Share "Grazielli LIMA"

Copied!
8
0
0

Texto

(1)

ENTRE TEXTOS: LEITURA, LITERATURA E MÍDIAS

Grazielli Alves de LIMA1

RESUMO: As considerações aqui expostas partem de reflexões partilhadas, primeiramente, na oficina

denominada “Literatura, artes e mídias: contribuições para a formação do leitor literário”, no curso Formação de mediadores em leitura, ofertado pelo Comitê Proler de Dourado/MS, em 2013. Posteriormente, o curso foi oferecido como oficina no VIII Encontro Proler: Ler o mundo, ocorrido em Dourados, MS. As reflexões propostas dialogavam sobre as práticas intertextuais e intermidiáticas vistas como alicerces para a mediação do leitor literário. Ressaltamos que essas relações são apontadas como outras formas de interação entre os vários sistemas semióticos (textos, mídias, artes) e os leitores. Desse modo, almejamos apresentar alguns aspectos teóricos da intertextualidade para, posteriormente, vislumbrarmos alguns exemplos de leituras intermidiáticas.

PALAVRAS-CHAVE: Leitura; Literatura; Intermidialidade.

Introdução

Toda leitura é necessariamente intertextual, pois, ao ler, estabelecemos associação desse texto do momento com outros já lidos. Essa associação é livre e independe do comando de consciência do leitor, assim como pode ser independente da intenção do autor. Os textos, por isso, são lidos de diversas maneiras, num processo de produção de sentido que depende do repertório textual de cada leitor, em seu momento de leitura (PAULINO, 2005, p. 54).

Conforme podemos observar na citação que inaugura essas reflexões, a leitura de uma obra literária pode nos rememorar a outras histórias, promovendo uma série de relações que ampliam o nosso leque de leitura. Essa rede intertextual pode auxiliar no processo de construção do repertório do leitor, pois que ao se deparar com uma obra que remete a outra, esse pode se sentir convidado a explorar novas literaturas.

É importante ressaltar que, quando nos referimos à leitura, lembramos que “o ato de ler não se restringe ao verbal, ao lingüístico. (...) São passíveis de leitura o visual, o sonoro, o gestual, o tátil, o gustativo, o olfativo, formas de comunicação anteriores à verbal” (RIBEIRO, 2004, p. 65).

Por essa perspectiva de leitura, lembramos que as relações intertextuais também acontecem com as outras esferas artísticas: por vezes assistimos a um filme que foi baseado em uma obra literária, ou vemos na televisão uma personagem falando do seu

1Mestre em Letras pelo Programa de Pós-Graduação da Faculdade de Comunicação, Artes e

Letras da Universidade Federal da Grande Dourados (PPGL/FACALE-UFGD.

(2)

gosto pela leitura. Essas relações são denominadas intermidiáticas, ou seja, estabelecem aproximações entre diferentes esferas midiáticas e artísticas.

Com o olhar voltado para as relações intermidiáticas, o leitor amplia o seu olhar para outras literaturas, bem como para o espaço artístico, possibilitando encontros com novas histórias, outras artes e outras mídias. Aliás, com relação ao leitor, é importante frisar que:

O novo leitor, revelado pela perspectiva do século XXI, além de ter acesso às obras contemporâneas e expressivas do segmento, demanda a configuração e a consolidação de centros culturais multimidiais. Atualmente, ao lado do livro, da revista e das histórias em quadrinhos, devem ser incluídos outros suportes de leitura, tais como a televisão, o vídeo, o DVD, o computador, o e-book, entre outros, de forma que o leitor possa adotar uma perspectiva hipertextual no ato de ler, através de uma perspectiva crítica e cidadã. Mais do que isso: além de possuir o hábito de ler, espera-se que o novo leitor desenvolva uma cultura da leitura (LUFT, 2011, p. 3).

Ao refletir sobre esse “novo leitor” propomos possibilitar outras formas de leitura por meio da prática intermidiática. Desse modo, pretendemos apresentar algumas possibilidades de inter-relações que contribuem diretamente para a ampliação do horizonte do leitor e que estabelecem travessias entre outros meios midiáticos, como o cinema e a televisão.

1 Leitura intertextual/intermidiática: algumas definições

A intertextualidade é um termo desenvolvido por Julia Kristeva, que, seguindo as reflexões de Bakthin, afirma que toda obra é um mosaico de citações. Deste modo, todo texto traz, de forma implícita ou explícita, traços de outros, que juntos, compõem um imenso diálogo literário (apud PAULINO, 2005. Grifos nossos).

Ao compor uma obra literária, o escritor fará uso de seu repertório de leituras que, de alguma forma, o inspira para sinalizar uma nova história, permeada por resquícios de suas leituras anteriores. Desse modo, essas redes intertextuais promovem o conhecimento de outras obras, ampliando o conhecimento literário do aluno. Assim, podemos afirmar que a intertextualidade é uma grande aliada no processo de formação do leitor.

Com as outras esferas artísticas não é diferente. Não raro ouvimos uma música que cita poemas ou assistimos a um filme baseado em uma obra literária. A união delas

(3)

nos permite ampliar o nosso conhecimento, uma vez essa junção desencadeia uma série de outras relações. As leituras intertextuais que podemos fazer dessas esferas artísticas podem ser denominadas de relações intermidiáticas, pois:

Teorias de intertextualidade resultaram na percepção de que intertextualidade sempre também implica intermidialidade, porque pré-textos, inter-textus, pós-textos e para-textos sempre incluem textos em outras mídias. Um só texto pode ser objeto rico para estudo da intermidialidade. (CLÜVER, 2008, p. 222)

Com efeito, poderíamos afirmar que os estudos intermidiáticos tratam das relações entre artes/mídias, postas num mosaico contínuo de relações e de releituras que ganham significativa relevância ao serem abordadas em novas estruturas linguísticas, sejam estas verbais ou não-verbais.

A intertextualidade se torna um fundamental aparato teórico-crítico para o campo dos estudos intermidiáticos, uma vez que é a partir das leituras realizadas que o leitor construirá interferências, associações e mediações entre um texto e outro, promovendo as marcas implícitas na obra e nos gestos que o autor deixa nas entrelinhas de seu enunciado. A importância do ato da leitura é corroborada à medida que as relações são construídas, pois o leitor/espectador é quem estabelecerá processos capazes de relacionar uma determinada obra às outras, reconhecendo também as leituras do próprio autor.

Diante do exposto, corroboramos que as obras literárias têm usado recursos diversos, que pressupõe certa relação intertextual, bem como outras esferas midiáticas tem explorado o livro e a leitura para sua composição. A seguir, apresentaremos alguns exemplos de obras que se apropriam dessas fronteiras intermidiáticas e que podem ampliar o olhar do leitor.

2 Literatura e suas inter-relações: possibilidades de leitura

Conforme já mencionamos acima, as infinitas relações entre as artes e mídias podem estabelecer outras possibilidades de leitura e, consequentemente, despertar o interesse dos leitores.

As obras literárias têm usado recursos diversos que pressupõem certa relação intertextual/intermidiática. Assim, citam outras obras, músicas, peças teatrais, entre outras esferas artísticas, que podem contribuir para a formação do leitor. À guisa de

(4)

exemplo, podemos citar a obra de Ana Maria Machado, Tropical sol da liberdade (2005) que cita trechos de letras de músicas, compostas na época da ditadura militar brasileira (mesmo contexto da obra), não só no corpo do texto, mas também em citações que abrem cada capítulo da obra.

Figura 1 - Capa da obra Tropical sol da liberdade (2005)

Nessa mesma perspectiva intertextual, elencamos a obra A bailarina fantasma (2009), de Socorro Acioli, que promove um significativo diálogo entre música, dança e literatura. A obra conta a história de Anabela, cujo pai, arquiteto especializado nas construções do século XIX, participa da restauração do Teatro José de Alencar, localizado em Fortaleza, no Ceará. Desde o primeiro momento em que Anabela adentra ao espaço teatral, ela se depara com uma bailarina que só ela pode ver. No decorrer da trama, o leitor conhece mais intimamente Clara, a bailarina fantasma que ronda os vários espaços do Teatro José de Alencar e que conta com a ajuda de Anabela para solucionar os problemas que ainda a prendem nessa esfera, ou nesse mundo.

(5)

Figura 2- Capa do livro A bailarina fantasma (2009)

A história, muito envolvente, remete ao leitor a diversas esferas artísticas, que figuram como ambientes primordiais para a narrativa. Ao adentrarmos no universo da narrativa, observamos de imediato que essa é dividida em atos, ao invés de capítulos, o que nos remete já à atmosfera teatral. Ainda, nos deparamos com várias imagens do Teatro José de Alencar, alegoria importantíssima para o decorrer da narrativa, uma vez que esse é palco de todo o desenrolar das histórias intermidiáticas que ali acontecem.

Logo no início, a história reporta a imagens centralizadas em outras mídias. Um espetáculo de dança intitulado Giselle2 ocorre antes do início das obras de restauração

do Teatro, para os funcionários e os demais envolvidos na obra de recuperação do prédio. É nesse momento que Anabela vislumbra, pela primeira vez, a bailarina fantasma:

[...] Arrepiante! As bailarinas conseguiam dançar com tanta leveza que pareciam flutuar. Havia um pouco de fumaça no palco. As luzes, a música, a bruma de gelo-seco... era mágico. Em meio a tudo isso, olhar de Anabela foi atraído por uma bailarina com tutu azul entre as outras, todas de branco, das sapatilhas aos arranjos de cabelo.

2

Obra de balé alemã, Giselle é considerada a mais famosa peça da era romântica. O espetáculo “conta a história de donzelas (Wilis) que morriam na véspera do casamento devido à infidelidade dos maridos.Enterradas na floresta, seus espíritos se materializam sempre, entre a noite e o início das manhãs, para se vingar de qualquer homem que invadisse o território”. Mais informações: http://www.jornaltudobh.com.br/tudo-mais/cia-brasileira-de-ballet-apresenta-o-classico-giselle/

(6)

Ela era diferente. Dançava melhor, com mais leveza. Tanta leveza que... voava. Dançou um tempo a mesma coreografia que as Willis também dançavam, mas depois veio até a extremidade do palco e levantou os pés em meia-ponta; depois, em ponta completa, deu um pulinho e levantou voo até o grande lustre do teatro, uma metade de lua azul enfeita de pontos de luz (ACIOLI, 2009, p. 39).

Os exemplos acima assinalados nos mostram como as obras literárias exploram outras artes, como a música, a dança e o teatro, proporcionando ao leitor o encontro com outras esferas no ato da leitura. Mas é importante ressaltar que outras mídias também se apropriam do livro, da literatura e da leitura para estabelecer relações e proporcionar ao expectador outro olhar sobre a obra.

Nesse sentido, é possível visualizarmos no cinema e na televisão representações da literatura e do leitor, bem como reflexões acerca da importância da leitura. Sobre este último, são propagandas que tratam da relação do livro e da leitura, programas televisivos que abordam a temática da doação do livro, etc. Esses exemplos ainda aparecem em número reduzido, diferentemente do que acontece com a apropriação de obras literárias e a adaptação da mesma, seja no cinema, seja na televisão.

Quando pensamos na representação dessas obras literárias em outros meios midáticos, são vários os exemplos que podemos citar. Entre elas, rememoramos o filme

Coração de tinta (2008), que foi inspirado na obra homônima, publicada em 2006. O

filme tem como eixo central a inserção de outras histórias (contos de fadas) dentro de seu enredo.

Tal como Coração de tinta (2008), vários outros filmes, baseados em obras literárias ou que remetem à literatura e ao seu fazer artístico, exploram as inter-relações advindas das leituras comparativas. Outro exemplo disso é a constante releitura dos contos de fadas, que ganham novos contornos a cada produção.

Nessa mesma linha, um seriado da televisão estadunidense, Once upon a time3, se apropria das histórias clássicas, para recontextualizá-las no mundo moderno. Segundo o enredo da série, todos os personagens dos contos de fadas foram transportados para uma cidade no “mundo real” e não se lembram de seu passado em

3A série trata da história de Emma, moradora de Boston, que é procurada por seu suposto filho, Henry,

que acredita que as histórias dos contos de fadas são verdadeiras e que os moradores da cidade onde vive com sua mãe adotiva, Regina, são na verdade, personagens dessas histórias fantásticas, que amaldiçoados pela Rainha Má, Regina, perderam a memória e vivem com outras identidades, relacionadas ao mundo real. Ao constatar que o menino é mesmo a criança que outrora abandonará, Emma resolve levá-lo para casa e lá permanece, diante da ligação que sente com Henry. É nesse contexto que as história de Emma e Henry se cruzam e se interligam com as histórias de Branca de Neve, seu príncipe, Encantado, bem como com outros conhecidos personagens, como Pinóquio, Cinderela, Chapeuzinho Vermelho, entre outros.

(7)

reinos distantes e encantados. Ao contemplar cada capítulo, o espectador vislumbra as histórias de Branca de Neve, Encantado, Chapeuzinho Vermelho, Bela, entra outros, que se cruzam e se inter-relacionam.

O interessante é que nessa produção, o desenrolar da trama é conduzido pelas leituras de Henry, que, em posse de um livro que reúne todos os contos de fadas, consegue desvendar os mistérios que cercam os personagens da trama.

Figura 3 - Folder de divulgação da série estadunidense Once Upon a time (2011)

Dado o exposto, salientamos a importância desses recursos intertextuais e intermidiáticos para a formação do leitor. Ao se deparar com uma obra que traz em seu bojo aspectos de outras esferas artísticas, o leitor pode se sentir aguçado a explorá-la, reformulando, assim, o seu repertório, não só literário, mas cultural também. Além disso, essas relações intermidiáticas estabelecem novas formas de leitura e de práticas, promovendo um profícuo diálogo.

Considerações finais

Não raro, ao nos depararmos com uma obra literária, temos em nossas mãos um mundo que nos conduz além-fronteiras. Essas fronteiras podem ser territoriais, imaginárias, entre artes. Algumas obras oferecem ao leitor outras histórias, outras

(8)

imagens, outras percepções já vividas anteriormente, no universo literário, compondo uma vasta rede intertextual.

Ao apresentarmos uma possível leitura de elementos que se intertextualizam, salientamos que essa pode ser outra possibilidade de formação de leitor, uma vez que os textos se abrem para novos horizontes que seguem além-palavras, refletem em suas entrelinhas outras concepções e linguagens estéticas, relacionadas às mais diversas artes/mídias.

Referências

ACIOLI, Socorro. A bailarina fantasma. São Paulo: 2009.

CLÜVER, Claus. Inter textus/ Inter artes/ Inter media. In: Revista Aletria. Belo Horizonte. Programa de Pós-Graduação em Letras - Estudos Literários. v. 6, p. 1-32,

jul.- dez, 2006. p. 11 – 41. Disponível em:

http://www.letras.ufmg.br/poslit/08_publicacoes_txt/ale_14/ale14_cc.pdf. Acesso em: 6 setembro 2010.

LUFT, Gabriela Fernanda Cé. Práticas leitoras multimidiais e formação de leitores: a leitura como ato criativo, participativo e dialógico. In: XII Congresso Internacional da

ABRALIC – Centro, Centros – Ética, Estética. Anais... UFPR: Curitiba, 2011.

PAULINO, Graça; WALTY, Ivete; CURY, Maria Zilda. Intertextualidades: teoria e prática. São Paulo: Formato, 2005.

RIBEIRO, Antonieta Jaci Machado. Leitura e Leituras. In: GOMES, André Luís. (org.)

Entre textos: ensaios sobre literatura, cinema, semiótica, educação e música. São Paulo:

Referências

Documentos relacionados

Sendo a governança corporativa uma forma de elevar a probabilidade de retorno aos investidores, fez-se necessário discutir sobre os diferentes níveis utilizados pelas empresas de

Os testes de desequilíbrio de resistência DC dentro de um par e de desequilíbrio de resistência DC entre pares se tornarão uma preocupação ainda maior à medida que mais

Pretende-se apresentar e pormenorizadamente descrever no presente relatório todo o trabalho realizado no âmbito do estágio profissionalizante integrado como

Neste trabalho, mostraremos os resultados de imobilização e estabilização em diferentes condições da lipase tipo B de Candida antarctica em quitosana ativada com

A pesquisa pode ser caracterizada como exploratória e experimental em uma primeira etapa (estudo piloto), na qual foram geradas hipóteses e um conjunto de observáveis, variáveis

CLÁUSULA QUINTA - DOS RECURSOS FINANCEIROS DO CONVENENTE O CONVENENTE, por imposição legal ou por acordo com a FUNASA, se obriga a aplicar, a título de contrapartida,

Como cita Mirian (2005), o desejo incessante dos jovens em alcançar o padrão de beleza imposto pela sociedade atravessa diversas questões físicas e emocionais. Depois que os

1 – O CCA reúne-se em momentos determinados para o seu âmbito de acção. b) Na 1.ª quinzena de Março, para validação das propostas de avaliação com menções de