A execução de programas e concessão de
benefícios sociais em ano eleitoral
A execução de programas e
concessão benefícios sociais em ano eleitoral
deve ser realizada pela Administração Pública
com parcimônia e cautela frente às vedações
da lei eleitoral.
Com efeito, a Lei nº 9504, de 1997,
que estabelece as normas para as eleições,
dispõe o seguinte no inciso IV e no § 10 do
art. 73:
Art. 73. São proibidas aos agentes públicos, servidores ou não, as seguintes condutas tendentes a afetar a igualdade de oportunidades entre candidatos nos pleitos eleitorais: [...]
IV - fazer ou permitir uso promocional em favor de candidato, partido político ou coligação, de distribuição gratuita de bens e serviços de caráter social custeados ou subvencionados pelo Poder Público;
[...]
§ 10. No ano em que se realizar eleição, fica proibida a distribuição gratuita de bens, valores ou benefícios por parte da Administração Pública, exceto nos casos de calamidade pública, de estado de emergência ou de programas sociais autorizados em lei e já em execução orçamentária no exercício anterior, casos em que o Ministério Público poderá promover o acompanhamento de sua execução financeira e administrativa.
Ou seja, é vedado em ano eleitoral,
como será 2014, a distribuição gratuita de
bens, valores ou benefícios por parte da
Administração Pública, cujo objetivo é evitar o
uso da máquina pública em favor de um ou
outro candidato à reeleição.
Sobre a vedação prevista no inciso IV
do art. 73, o Tribunal Superior Eleitoral - TSE
já se manifestou no seguinte sentido:
Recurso Especial. Conduta vedada (art. 73, IV, da Lei n2 9.504/97).
Não-caracterizada. Reexame.
Impossibilidade. Verbetes n— 279 e 7 das Súmulas do STF e STJ, respectivamente. Divergência jurisprudencial que não se evidencia. Para a configuração do inc. IV do art. 73 da Lei n- 9.504/97, a conduta deve corresponder ao tipo definido previamente. O elemento é fazer ou permitir uso promocional de distribuição gratuita de bens e serviços para o candidato, quer dizer, é necessário que se utilize o programa social - bens ou serviços - para dele fazer promoção.
Agravo Regimental conhecido, mas desprovido.
AGRAVO REGIMENTAL NO
RECURSO ESPECIAL ELEITORAL N° 25.130 - CLASSE 222 - SANTA CATARINA (33a Zona - Tubarão). Relator: Ministro Luiz Carlos Madeira.
A regra do art. 73 estabelece
exceções. São as seguintes:
I – casos de calamidade pública e
situações de emergência;
II – programas sociais autorizados em
lei e já em execução orçamentária no exercício
anterior.
A referida norma não limita a sua
aplicação à circunscrição do pleito, como faz,
por exemplo, o art. 73, V, da Lei nº 9504, de
1997
1.
Desta feita, o melhor entendimento é
que mesmo se tratando de eleição para cargos
da Administração Pública Federal e Estadual,
1
Art. 73. São proibidas aos agentes públicos, servidores ou não, as seguintes condutas tendentes a afetar a igualdade de oportunidades entre candidatos nos pleitos eleitorais:
[...]
V - nomear, contratar ou de qualquer forma admitir, demitir sem justa causa, suprimir ou readaptar vantagens ou por outros meios dificultar ou impedir o exercício funcional e, ainda, ex officio, remover, transferir ou exonerar servidor público, na circunscrição do pleito, nos três meses que o antecedem e até a posse dos eleitos, sob pena de nulidade de pleno direito, ressalvados:
aplicam-se as vedações da lei eleitoral em
âmbito municipal.
Este, inclusive, é o entendimento do
Tribunal Regional Eleitoral da 4ª Região,
conforme demonstra ementa, in verbis:
Consulta. Eleições 2010. Duplo questionamento sobre a abrangência do disposto no art. 73, § 10, da Lei n. 9.504/97 e sua aplicação a agentes públicos municipais, em ano de eleições gerais, para fins de concessão de descontos em créditos tributários por meio de lei de iniciativa do Executivo Municipal. Não conhecimento da primeira indagação.
Formulação que permite
interpretações diversas, por comportar termos muito amplos. Impossibilidade de projetar todas as consequências práticas da situação hipotética versada. A restrição imposta pelo art. 73, § 10, da Lei das Eleições alcança o agente público em
período vedado,
independentemente da
circunscrição do pleito em que pretenda concorrer. (Cta - Consulta nº 43534 - torres/RS Acórdão de 17/06/2010 Relator(a) DRA. LAÍS ETHEL CORRÊA PIAS Publicação: PSESS - Publicado em Sessão, Data 29/06/2010) (grifou-se).
Não se olvida que a questão é
controvertida na doutrina e jurisprudência dos
tribunais
eleitorais,
considerando,
por
exemplo, o entendimento divergente, do
Tribunal Regional Eleitoral de Goiás, na
Consulta nº 37
2, que se filiou à corrente de
2
CONSULTA ELEITORAL. ABRANGÊNCIA DO § 10, DO ART. 73, DA LEI 9.504/97. CONHECIDA E RESPONDIDA POSITIVIMENTE. 1. A consulta preenche os pressupostos necessários para o seu conhecimento, uma vez que formulada em tese e por pessoa legitimada. 2. Consulta que se responde positivamente nos seguintes termos: "Em princípio, as administrações
públicas municipais poderão realizar no ano de 2.010 - ano de eleições estaduais, federais e presidencial - a distribuição gratuita de bens, valores ou benefícios além dos casos excetuados no artigo 73, § 10, da Lei 9.504/97. Entretanto, devem os administradores observar a legislação eleitoral em conjunto para não infringir outros dispositivos ao fazer uso
acordo com a proibição do art. 73, § 10, que
seria restrita à circunscrição do pleito, contudo,
o certo é que o TRE-RS adotou
posicionamento estendendo a vedação do §10
do art. 73 da Lei nº 9504, de 1997, a todos os
entes da Federação independentemente da
circunscrição do pleito.
Dessa forma, ciente da controvérsia
doutrinária e jurisprudencial sobre o assunto,
porém privilegiando o entendimento do
Tribunal Eleitoral gaúcho, reputa-se adequado
orientar os agentes públicos da Administração
Municipal a observarem a restrição prevista no
art. 73, § 10, da Lei nº 9.504, de 1997, durante
o ano das eleições gerais de 2014.
O entendimento ora externado visa
proteger e garantir a moralidade na disputa
eleitoral.
Por isso, independentemente seja a
eleição em âmbito federal, estadual ou
municipal, a regra é sempre aplicável e válida
desde 1º de janeiro.
Outra
questão
interessante,
diz
respeito às exceções referidas no § 10 do
art. 73 da Lei nº 9504, de 2007, sendo que
neste caso importa ponderar acerca do
conceito
jurídico
para
a
expressão
"distribuição gratuita", que deve ser entendida
como qualquer ato administrativo desonerado
de benefícios a terceiros, tal como ocorre com
as doações sem encargo, subvenções sociais,
contribuições, entre outras. Ou seja, a
distribuição gratuita de bens, valores ou
benefícios pressupõe benevolência por parte
da Administração Pública.
Mas, não é qualquer distribuição
gratuita de bens, valores ou benefícios que
enseja o descumprimento da regra eleitoral.
Há que influenciar na disputa eleitoral. Em
promocional dos programas sociais a determinada candidatura". (CONS - CONSULTA nº 37 - goiânia/GOAcórdão nº 10245 de 11/11/2009, Relator(a) ILMA VITORIO ROCHA, Publicação: DJ - Diário de justiça, Volume 176, Tomo 1, Data 16/11/2009, Página 8) (grifo
outras palavras, a conduta vedada deve ser de
tal intensidade que possa comprometer a
isonomia de chances entre os candidatos.
Portanto, somente a distribuição
gratuita tendente a ofender a igualdade de
oportunidades entre os candidatos ao pleito
eleitoral, se insere na referida vedação
eleitoral. É necessário que a conduta
impugnada comprometa a disputa eleitoral.
Da mesma forma, é preciso diferenciar
as situações onde há contraprestação por
parte do beneficiado com os valores, bens ou
serviços públicos. Todas as situações que
envolvem contraprestação por parte do
beneficiado não se enquadram no comando
legal
supramencionado,
por
não
se
caracterizarem como "distribuição gratuita".
É o caso dos convênios firmados pela
Administração Pública. Disciplinado pelo artigo
116 da Lei nº 8.666, de 1993, o convênio
pressupõe a existência de obrigações de
ambas as partes convenentes, com o intuito
de atingir objetivo comum.
Nesse sentido, decisão do Tribunal
Superior Eleitoral - TSE:
RECURSO ORDINÁRIO.
INVESTIGAÇÃO JUDICIAL
ELEITORAL. CONDUTA VEDADA. ART. 73, § 10, DA LEI N° 9.504197. SENADOR. DEPUTADO ESTADUAL.
REPASSE. RECURSOS
FINANCEIROS. SUBVENÇÃO
SOCIAL. ENTIDADES PRIVADAS. FOMENTO. TURISMO. ESPORTE.
CULTURA. CONTRATO
ADMINISTRATIVO.
CONTRAPARTIDA. GRATUIDADE. DESCARACTERIZAÇÃO.
DESPROVIMENTO.
1. Em virtude do disposto no art. 18, II, h, da LC n° 75193, a fluência do prazo recursal do MPE inicia-se com a sua intimação pessoal. In casu, o Parquet teve vista dos autos em 29.8.2011, sendo tempestivo o recurso interposto em 11.9.2011, observado o tríduo legal.
2. A assinatura de convênios e o repasse de recursos financeiros a
entidades privadas para a realização de projetos na área da cultura, do esporte e do turismo não se amoldam ao conceito de distribuição gratuita, previsto no art. 73, § 10, da Lei n° 9.504197.
3. Compete à Justiça Eleitoral apreciar a ocorrência de abuso do poder político ou econômico com interferência no equilíbrio das eleições. As práticas que consubstanciem, tão somente, atos de improbidade administrativa, devem ser conhecidas e julgadas pela Justiça Comum.
4. Recurso a que se nega provimento. RECURSO ORDINÁRIO N° 17172-31.20106.24.0000 - CLASSE 37 -
FLORIANÓPOLIS - SANTA
CATARINA, Relator: Ministro Marcelo Ribeiro.
Ou seja, em ano eleitoral não é
vedada a celebração de convênio, pelo
Município, se houver contraprestação por
parte dos convenentes.
Na mesma esteira,
a continuação de
programa social instituído por lei e executado
no ano anterior ao eleitoral não constitui
conduta vedada, ainda que a execução do
programa ocasione incremento na concessão
dos benefícios, conforme entendimento do
próprio TSE, in verbis:
AGRAVO REGIMENTAL. RECURSO ESPECIAL.AIJE. ART. 73, § 10, DA LEI N° 9.504197. PROGRAMA SOCIAL. CESTAS BÁSICAS.
AUTORIZAÇÃO EM LEI E
EXECUÇÃO
ORÇAMENTÁRIA NO EXERCÍCIO
ANTERIOR. AUMENTO DO
BENEFÍCIO. CONDUTA VEDADA NÃO CONFIGURADA.
1. A continuação de programa social instituído e executado no ano anterior ao eleitoral não constitui conduta vedada, de acordo com a ressalva prevista
no art. 73, § 10 da Lei n°9.504/97. 2. Consta do v. acórdão recorrido que o "Programa
de Reforço Alimentar à Família Carente" foi instituído e implementado
no Município de Santa Cecília/SC em 2007, por meio da Lei Municipal no 1.446, de 15 de março de 2007, de acordo com previsão em lei orçamentária de 2006. Em 19 de dezembro de 2007, a Lei Municipal n° 1.487 ampliou o referido programa social, aumentando o número de cestas básicas distribuídas de 500 (quinhentas) para 761 (setecentas e sessenta e uma).
3. No caso, a distribuição de cestas básicas em 2008 representou apenas a continuidade de política pública que já vinha sendo executada pelo município desde 2007. Além disso, o incremento do
benefício (de 500 para 761 cestas básicas) não foi abusivo, razão pela qual não houve ofensa à norma do art. 73, § 10 da Lei n o 9.504197.
4. Agravo regimental desprovido.
AGRAVO REGIMENTAL NO
RECURSO ESPECIAL ELEITORAL N° 9979065-51.2008.6.24.0051 - CLASSE 32 - SANTA CECÍLIA – SANTA CATARINA
Relator: Ministro Aldir Passarinho Junior
Por outro lado, se amolda à vedação
eleitoral a concessão isolada de benefícios
fiscais e tributários, apartada de programa
municipal instituído por lei e em execução
orçamentária em ano anterior porque constitui
típica distribuição gratuita de benefícios.
Este é o entendimento do TSE, conforme demonstra a ementa a seguir colacionada:
DÍVIDA ATIVA DO MUNICÍPIO - BENEFÍCIOS FISCAIS - ANO DAS ELEIÇÕES. A norma do § 10 do artigo 73 da Lei n° 9.50411997 é obstáculo a ter-se, no ano das eleições, o implemento de benefício fiscal referente à dívida ativa do Município bem como o encaminhamento à Câmara de Vereadores de projeto de lei, no aludido período, objetivando a previsão normativa voltada a favorecer inadimplentes.
CONSULTA N°
1531-69.2010.6.00.0000 - CLASSE 10 -
BRASÍLIA - DISTRITO FEDERAL, Relator: Ministro Marco Aurélio
No mesmo sentido, já decidiu o
Tribunal Regional Eleitoral da 4ª Região,
entendimento
externado
na
Consulta
nº 10.2008, nos seguintes termos:
Eleições 2008. Consulta: 1) possibilidade de Poder Executivo municipal, em ano eleitoral, atrair instalação de empresa mediante oferecimento de vantagens e benefícios, tendo em vista o disposto no § 10 do art. 73 da Lei n. 9.504/97; 2) possibilidade de enquadramento da situação decorrente da não-concretização do investimento por falta de incentivo no conceito de estado de emergência previsto no aludido preceito legal, de modo a permitir a concessão de algum benefício temporário para a fixação do empreendimento; 3) pena a ser cominada à administração municipal que conceder favores à revelia das exceções previstas no § 10 do art. 73 da Lei das Eleições, ante a não-previsão de qualquer sanção específica para a transgressão da citada norma.
Em resposta à dúvida expressa sob nº.1: a oferta de incentivos não é vedada, contanto que dela não advenha promoção de nenhum candidato, partido ou coligação. Com relação ao indagado sob nº 2: "estado de emergência" previsto no dispositivo não serve para legitimar a outorga de vantagens e benefícios para que a empresa não deixe de se localizar no Município. Quanto ao tópico 3: a pena aplicável é, em princípio, a prevista no § 4° do art. 73 da Lei n. 9.504/97, sem prejuízo das sanções estabelecidas na lei que regula a prática de abuso do poder econômico e demais penalidades assentadas nas legislações extra Direito Eleitoral.