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Academic year: 2021

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P A R E C ER

Referência: pedido de Procurador de Justiça ao Procurador Geral da República no sentido de ser formulado ao STF representação de intervenção federal no Rio Grande do Sul. Indicação nº 038/2009 pelo Sr. Presidente do IAB.

EMENTA: CRISE NO SISTEMA PENITENCIÁRIO DO ESTADO DO RIO GRANDE DO SUL. VIOLAÇÃO DE DIREITO HUMANOS DOS PRESOS. INTERVENÇÃO FEDERAL. ADMISSIBILIDADE, COM RESSALVA.

Parecer:

O ilustre Procurador de Justiça junto à 5ª. Câmara Criminal do E. Tribunal de Justiça do Estado do Rio Grande do Sul, com lastro no art. 34, VII, “b”, da Constituição Federal, encaminhou ao Exmo. Sr. Procurador Geral da República pedido no sentido de representação perante o Supremo Tribunal Federal pela intervenção federal no Estado do Rio Grande do Sul, respaldado no art. 36, III, da Carta Magna, (recusa à execução de lei federal).

Em síntese, relata a Representação que a crise prisional no Estado do Rio Grande do Sul chegou a tal ponto que juízes gaúchos, inclusive do próprio Tribunal de Justiça, passaram a se recusar a decretar prisões cautelares e a encaminhar condenados à prisão, e a determinar o cumprimento em prisão domiciliar de penas privativas de liberdade aplicadas em hipótese de crimes graves, até que as condições da Lei de Execuções Penais sejam cumpridas.

Reconhece o representante a situação de permanente violação dos direitos humanos dos presos e a ausência de vagas no sistema penitenciário, sustentando que a intervenção federal é medida adequada para a adoção das

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providências necessárias ao afastamento da reiterada afronta aos direitos da pessoa humana, uma vez que o Estado não acena com nenhum prognóstico de solução do problema ou mesmo de melhora.

Anota, ainda, que o problema acarreta também ameaça aos direitos humanos fundamentais à segurança dos demais gaúchos, dando exemplo de crime praticado contra o presidente do TCE/RS por foragidos do sistema penitenciário.

Por sugestão do Consócio Thiago Bottino, o Presidente da Comissão de Direito Penal desta Casa, Dr. Fernando Fragoso, entendeu que o IAB deveria produzir manifestação sobre a importante matéria. O douto Presidente Henrique Cláudio Maués, atento à relevância do tema, converteu o expediente em indicação, designando relator o signatário.

O art. 34 da Lei Fundamental dispõe:

“Art. 34. A União não intervirá nos Estados nem no Distrito Federal, exceto para:

...

VII – assegurar a observância dos seguintes princípios constitucionais: ...

b) direitos da pessoa humana”. Por seu turno, o art. 36 proclama:

“Art.36. A decretação da intervenção dependerá: ...

III – de provimento, pelo Supremo Tribunal Federal, de representação do Procurador-Geral da República, na hipótese do art. 34, VII, e no caso de recusa à execução de lei federal”.

É o relatório. Passo ao parecer.

Preliminarmente, esclareço que a Comissão de Direito Penal do IAB, da qual tenha a honra de fazer parte, vem trabalhando intensamente na análise do

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anteprojeto de reforma global do Código de Processo Penal, inclusive com reuniões semanais, para elaboração de complexo e relevante estudo sobre o tema, o que determinou o excesso de prazo na apresentação do presente parecer.

Para edificação dos eminentes Consócios, recomenda-se a leitura, na íntegra, do pedido do representante do Ministério Público do Rio Grande do Sul, encaminhado à douta Procuradoria Geral da República.

Trata-se do tormentoso problema atinente ao sistema penitenciário brasileiro.

Recentemente, a mídia noticiou o drama das prisões do Estado do Pará e destacou que uma menina, menor de idade, estava recolhida a cela superlotada de homens, na maior promiscuidade.

Por todo o País o fenômeno ou desgraça se repete e, mesmo assim, se multiplicam as leis penais, criando novos crimes, aumentando penas e autorizando que juízes, sem parcimônia, exerçam com menos restrições o poder de prender que o juiz francês M. Badoy qualificou de poder medíocre, em discurso intitulado “Arenga aos magistrados que estréiam”.1

Em Minas Gerais, no ano 2005, o juiz Livingsthon José Machado teve a coragem de determinar a soltura de 50 presos que cumpriam pena ilegalmente em delegacias superlotadas na comarca de Contagem, em condições subhumanas. Foi afastado pelo Tribunal local. Decidiu, então, abandonar a magistratura.

Digressões à parte, concordo com a possibilidade de intervenção federal para assegurar a observância dos direitos humanos dos presos. Não posso deixar de expressar, porém, data venia, a preocupação em relação à motivação real do pedido.

1 Apud Geraldo Mello Mourão, in “Discurso aos juízes”, publicado na Folha de São Paulo, em

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Os números, constantes do pedido de intervenção, segundo o mapa carcerário do Estado do Rio Grande do Sul, transcrito pelo representante do MP, são impressionantes. Existem 28.538 presos (homens) para 18.059 vagas, ou seja, uma deficiência de 10.479 vagas, compondo aquele quadro dantesco de pessoas empilhadas em cativeiros degradantes, que agride a Constituição da República e nega vigência à Lei de Execução Penal e aos princípios que informam as regras mínimas para o tratamento do preso no Brasil e no mundo.

Ocorre que a superlotação e o tratamento degradante, cruel, subhumano imposto aos presos, não só no Rio Grande do Sul, mas em todo o Brasil, não são novidade. Confundem-se com a própria história das prisões brasileiras. Sempre foi assim. A verdade é que poucos se importam com os direitos dos presos, inclusive, por motivos diversos, as autoridades.

Em tema de prisão, de direitos do preso, ensinam os doutos, “a interpretação que se deve buscar é a mais ampla, no sentido de que tudo aquilo que não constitui restrição legal, decorrente da particular condição do encarcerado, permanece como direito seu”.2

Os Poderes da República, nesta questão angustiante, devem agir com a mesma acuidade com que estabeleceram castigos incompatíveis e alvo de severas críticas de juristas respeitados, entre os quais o odioso Regime Disciplinar Diferenciado, que sofreu veemente oposição do Conselho Nacional de Política Criminal e Penitenciária.3 ( sobre o tema Renato Marcão, op. cit. p. 37, em

abordagem do Projeto que tramitou e foi convertido em lei modificadora da LEP e do Código Penal. (v. Lei 10792/2003).

Grifa o pedido do Ministério Público do Rio Grande do Sul:

“Por tudo isso, entendo que se está diante de concreta situação que enseja representação junto ao Supremo Tribunal Federal. Que os direitos

2 MARCÃO, RENATO. Curso de Execução Penal. 2ª. ed. São Paulo: Ed. Saraiva, 2005, p. 31.

3 Sobre o tema, Renato Marcão (op. cit., p. 37), em abordagem do Projeto que tramitou e foi convertido

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humanos dos presos estão sendo violados, não há dúvida alguma. Que estes são possuidores de dignidade, também não há dúvida, como muito bem já registrou o Min. Eros Grau: “Nas democracias mesmo os

criminosos são sujeitos de direitos. Não perdem essa qualidade, para se transformarem em objetos processuais. São pessoas, inseridas

entre aquelas beneficiadas pela afirmação constitucional da sua dignidade.” (HC 98.675/RS – grifos do texto).

O problema é que a iniciativa ministerial só se deu em decorrência da atitude dos magistrados gaúchos, no sentido de não decretarem prisões enquanto persistir esse quadro. E não se cogita do afastamento de todos esses desembargadores e juízes, de puni-los disciplinarmente, como foi feito com o juiz mineiro de Contagem.

Receio, data venia, que o objetivo da Representação seja muito menos o de garantir efetivamente o respeito à Lei de Execuções Penais, no que concerne aos direitos do preso, de assegurar os direitos humanos dos encarcerados, e muito mais de restabelecer a rotina anterior, inclusive com banalização das prisões cautelares, não raro efetivadas mediante operações pirotécnicas e midiáticas.

Há duas passagens bastante sintomáticas na Representação. A primeira, quando se refere a um suposto paradoxo: “quanto mais o sistema for eficiente no sentido jurídico de prender criminosos, mais fracassamos, na medida em que não há vagas no sistema”. Na verdade, não se trata de paradoxo, mas de consequência de uma política criminal equivocada contra a qual se opuseram historicamente a grande maioria dos penalistas. A segunda passagem diz respeito à assertiva de que “também não há dúvida de que os direitos humanos fundamentais à segurança dos demais gaúchos está sob risco”.

O quadro carcerário no Rio Grande do Sul – e não só naquele Estado, repito - exige, sem dúvida, urgente intervenção para assegurar o respeito aos direitos humanos. A atitude dos juízes, a meu ver, foi de respeito às normas constitucionais e aos Tratados internacionais dos quais o Brasil é signatário.

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• Nessas condições, é o parecer pelo apoio ao pedido do Procurador de Justiça do Estado do Rio Grande do Sul de intervenção federal, a fim de assegurar aos presos os direitos previstos na Lei de Execuções Penais e os direitos humanos de um modo geral, com a ressalva de que, enquanto não houver vagas suficientes e condições dignas de encarceramento, qualquer prisão é inconstitucional.

• •

Rio de Janeiro, 04 de agosto de 2009.

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