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Atenção domiciliar e as práticas de saúde bucal na estratégia saúde da família em Florianópolis-SC

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UNIVERSIDADE FEDERAL DE SANTA CATARINA CENTRO DE CIÊNCIAS DA SAÚDE

PROGRAMA DE PÓS-GRADUAÇÃO EM ODONTOLOGIA

RENATA MARQUES DA SILVA

ATENÇÃO DOMICILIAR E AS PRÁTICAS DE SAÚDE BUCAL NA ESTRATÉGIA SAÚDE DA FAMÍLIA EM FLORIANÓPOLIS-SC

FLORIANÓPOLIS 2018

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RENATA MARQUES DA SILVA

ATENÇÃO DOMICILIAR E AS PRÁTICAS DE SAÚDE BUCAL NA ESTRATÉGIA SAÚDE DA FAMÍLIA EM FLORIANÓPOLIS-SC

Dissertação de Mestrado em Odontologia – Área de concentração de Odontologia em Saúde Coletiva, apresentada para obtenção do título de Mestre em Odontologia em Saúde Coletiva.

Área de concentração: Odontologia em Saúde Coletiva.

Orientadora: Prof.a Dr.a Daniela Lemos Carcereri

FLORIANÓPOLIS 2018

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Este trabalho é dedicado a minha família, em especial aos meus pais, Rosemara Damasceno Marques e José Erilson da Silva, aos meus irmãos José Lucas e Pedro Luciano, que são meu suporte e minha maior dádiva nessa vida.

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AGRADECIMENTOS

À Universidade Federal de Santa Catarina (UFSC), pela estrutura e oportunidade de formação acadêmica de excelência.

À entidade financiadora Conselho Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico (CNPQ) e à Pró-reitoria de Pós-graduação da UFSC, pelo importante financiamento dos meus estudos.

À Residência Multiprofissional em Saúde da Família da UFSC, em parceria com a Prefeitura Municipal de Florianópolis, pela experiência prévia ao mestrado, capaz de despertar em mim uma paixão por estudar e refletir sobre a Odontologia em Saúde Coletiva. Certamente, essa base sólida de prática reflexiva foi decisiva na escolha do desafio de trilhar o caminho da docência.

Ao Programa de Pós-graduação em Odontologia da UFSC e seu corpo docente, pelo compromisso com a qualidade das disciplinas ofertadas, da produção científica e da transparência com os mestrandos ao longo desse processo. Um agradecimento especial à Ana Maria, da secretaria do Programa de Pós-graduação, pela disponibilidade e atenção aos mestrandos.

Às professoras da área de concentração de Odontologia em Saúde Coletiva, pelo incentivo, construção coletiva e, fundamentalmente, por servirem de inspiração na luta incansável pela saúde bucal enquanto direito de cidadania em cada espaço em que atuam. Vocês realmente ensinam pelo exemplo!

Ao Grupo de Estudos e Pesquisas sobre Interdisciplinaridade, Educação e Saúde (GIS), pelo espaço de integração de saberes e projetos.

Aos colegas do mestrado da turma 2016/2, pelas discussões nas disciplinas, o compartilhamento de alegrias, angústias e palavras de incentivo.

À Secretaria de Saúde da Prefeitura Municipal de Florianópolis equipe de Saúde da Família e Equipe de Saúde Bucal participantes da pesquisa, por permitirem de maneira tão generosa que eu me inserisse no contexto de seus processos de trabalho e, mesmo na posição de pesquisadora, me sentisse acolhida.

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Ao Centro de Saúde do Jardim Atlântico, ao preceptor Rafael Sebold e ao residente Joaquim Couto, por me receberem no semestre de estágio de docência e, como bons ex-residentes que somos, procurarmos o fazer coletivo em mais essa experiência.

Ao Projeto de Extensão ―Promoção da Saúde Bucal no Colégio de Aplicação‖ por ter proporcionado, nesses dois anos, contato com alunos de graduação de diferentes fases, colegas de pós-graduação e comunidade escolar do Colégio de Aplicação. Os desafios de organizar um serviço odontológico com equidade, contribuir na formação de cada graduando que por lá passou, produzir conteúdo científico coletivamente e buscar desenvolver práticas/reflexões interdisciplinares e intersetoriais como requer o trabalho embasado na Promoção da Saúde em cada encontro, fizeram com que eu expandisse o meu olhar sobre a docência na área de Odontologia em Saúde Coletiva.

À minha orientadora, Prof.ª Dr.ª Daniela Lemos Carcereri, por ter um cuidado singular comigo. Ter indicado os caminhos com sensibilidade, sempre ouvindo o que eu tinha a dizer. Ter sido um ombro amigo nos meus momentos mais difíceis, uma ouvinte acolhedora. Pela compreensão, inspiração e sobretudo por sempre depositar confiança nos meus processos. Muito obrigada por fazer de cada encontro nosso, por mais simples que tenha sido, um espaço de aprendizagem tão rico!

Aos meus amigos, que de perto ou de longe, oxigenaram a minha vida com tanto amor e carinho. Um agradecimento mais do que especial à Ana Carolina Oliveira Peres, por essa amizade que compartilha tanto: casa, angústias, publicações, incentivos, risadas, histórias, viagens, congressos... Que o Autor da Vida nos reserve mais memórias ainda. À amiga Maria Del Rosario, a Charo, a peruana mais doce que eu conheço, que com sua amizade compartilhou de alegrias e me suportou em amor nessa etapa final. À minha família, meu maior presente, minha base, meu sustento e refúgio. Obrigada por acreditarem nos meus sonhos e me incentivarem. Em cada momento de saudade, obrigada por terem me amado e orado por mim. Honro vocês por tudo isso e agradeço à Deus por ter nos mantido unidos, mesmo em meio a tantas lutas. Essa conquista é por vocês!

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E finalmente, agradeço à Deus, por ter me feito sonhadora e ter aberto caminhos para que realizasse esses sonhos. Quem vive na Esperança, não perde por esperar!

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―Ninguém pode construir em teu lugar as pontes que precisarás passar, para atravessar o rio da vida - ninguém, exceto tu, só tu. Existem, por certo, atalhos sem números, e pontes, e semideuses que se oferecerão para levar-te além do rio; mas isso te custaria a tua própria pessoa; tu te hipotecarias e te perderias. Existe no mundo um único caminho por onde só tu podes passar. Onde leva? Não perguntes, segue-o!‖

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MARQUES, Renata Marques. Atenção Domiciliar e as práticas de saúde bucal na Estratégia Saúde da Família em Florianópolis-SC. Dissertação (Mestrado em Odontologia) - Programa de Pós-Graduação em Odontologia, Universidade Federal de Santa Catarina, Florianópolis, 2018. 148p.

RESUMO

A Atenção Domiciliar (AD) desenvolvida na Estratégia Saúde da Família (ESF) configura-se em uma atribuição comum aos profissionais da Equipe de Saúde da Família (EqSF), porém sua organização ainda é um desafio para a Equipe de Saúde Bucal (ESB). O presente estudo objetivou compreender como se realiza a AD com ênfase nas práticas de saúde bucal, no âmbito da ESF, no município de Florianópolis-SC, subdividindo-se na apresentação de dois manuscritos. O primeiro apresenta um aprofundamento na temática por meio de uma revisão integrativa com o objetivo de analisar a atuação da ESB na AD no contexto da ESF, após a publicação das Diretrizes da Política Nacional de Saúde Bucal. O segundo manuscrito consiste em um estudo de caso intrínseco, com abordagem qualitativa, que visa compreender como se realiza a AD com ênfase nas práticas de saúde bucal, no âmbito da ESF, em Florianópolis-SC. A revisão integrativa evidenciou que a frequência de visita domiciliar pela ESB é baixa, registrou a falta de priorização e sistematização das ações e pouca interação com a EqSF. Os protocolos de AD e os instrumentos de priorização de visitas domiciliares indicaram potenciais caminhos para superar o enfoque clínico restrito ao consultório odontológico. Os resultados do estudo de caso apontaram que frente aos desafios do território e à pressão da demanda por atendimentos odontológicos dentro da Unidade Básica de Saúde, a AD foi capaz de gerar inovações tecnológicas no cuidado. Pelas características de integração entre os processos de trabalho dos profissionais, as práticas de saúde bucal não se restringiram ao cirurgião-dentista. Concluiu-se que a AD contribui na operacionalização das práticas de saúde bucal na ESF, fortalecendo a interprofissionalidade no processo de trabalho da ESB. A partir da proatividade na substitutividade das práticas centradas no procedimento, a AD mostra-se capaz de deslocar a produção do cuidado em saúde (bucal) para a centralidade do usuário e da família.

Descritores: Saúde Bucal. Sistema Único de Saúde. Visita Domiciliar. Cuidado Domiciliar. Saúde da Família.

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SILVA, Renata Marques da. Home Care and oral health practices in the Family Health Strategy in Florianópolis-SC. Dissertation (Master‘s Degree in Dentistry). Dentisry Graduate Program, Federal University of Santa Catarina, Florianopolis, 2018. 148p.

ABSTRACT

Home Health Care (HHC) developed in the Family Health Strategy (FHS) is a common assignment for professionals of the Family Health Team (FHT), but its organization is still a challenge for the Oral Health Team (OHT). The present study aimed to understand how HHC is performed with emphasis on oral health practices, within the scope of the FHS, in the city of Florianópolis-SC, subdividing the presentation of two manuscripts. The first presents a deepening of the theme through an integrative review with the objective of analyzing the performance of the OHT in the HHC in the context of the FHT, after the publication of the National Oral Health Policy Guidelines. The second manuscript consists of an intrinsic case study, with a qualitative approach, which aims to understand how HHC is performed with emphasis on oral health practices, within the scope of the FHS, in Florianópolis-SC. The integrative review showed that the frequency of home visits by the OHT is low, registered the lack of prioritization and systematization of the actions and little interaction with the FHT. HHC protocols and home visitation prioritization tools indicated potential ways to overcome the clinical approach restricted to the dental office. The results of the case study pointed out that faced with the challenges of the territory and the pressure of the demand for dental care within the Basic Health Unit, HHC was able to generate technological innovations in care. Due to the characteristics of integration among the work processes of the professionals, oral health practices were not restricted to the dental surgeon. It was concluded that HHC contributes to the operationalization of oral health practices in the FHS, strengthening interprofessionality in the work process of the OHT. From the proactivity in the substitutability of practices centered on the procedure, the HHC shows itself capable of shifting the production of health care (buccal) to the centrality of the user and the family.

Descriptors: Oral Health. Unified Health System. Home visit. Home care. Family Health.

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LISTA DE FIGURAS

Figura 1 – Marco histórico-legal da Atenção Domiciliar no Brasil ... .... 35 Figura 2 – Representação esquemática da Atenção Domiciliar e suas respectivas modalidades ... .... 38 Figura 3 – Tipologia do trabalho em equipe ...49 Manuscrito 1

Figura 1 – Diagrama de fluxo da seleção

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LISTA DE TABELAS

Tabela 1 – Critérios de reconhecimento da modalidade de trabalho em equipe: integração ou agrupamento ...50

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LISTA DE QUADROS

Quadro 1 – Relação dos estudos selecionados: Autor(es), ano de publicação, título do estudo, revista científica onde foi publicado, tipo e local do estudo e principais evidências do estudo. Em cinza, categoria 1, em branco, categoria 2 ... ...69

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LISTA DE ABREVIATURAS E SIGLAS

AB – Atenção Básica

ASB – Auxiliar de Saúde Bucal ACS – Agente Comunitário de Saúde AD – Atenção Domiciliar

ANVISA - Agência Nacional de Vigilância Sanitária CD – Cirurgião-dentista

CONASS - Conselho Nacional de Secretários de Saúde COREQ - Critérios Consolidados para Relatos de Pesquisa Qualitativa

EMAD - Equipe Multiprofissional de Atenção Domiciliar EMAP - Equipe Multiprofissional de Apoio

EqSF – Equipe Saúde da Família ESB – Equipe de Saúde Bucal ESF – Estratégia Saúde da Família

ESFSB - Equipes de Saúde da Família com Saúde Bucal GT - Grupo de Trabalho

IDH - Índice de Desenvolvimento Humano MS - Ministério da Saúde

NASF - Núcleo de Apoio à Saúde da Família OPAS - Organização Pan-americana da Saúde PACS – Programa de Agentes Comunitários de Saúde

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PMAQ – Programa de Melhoria do Acesso e da Qualidade PMC - Programa Melhor em Casa

PMF - Prefeitura Municipal de Florianópolis PNAB - Política Nacional de Atenção Básica PNSB – Política Nacional de Saúde Bucal PSF – Programa Saúde da Família SAD - Serviços de Atenção Domiciliar

SAMDU - Serviço de Assistência Médica Domiciliar de Urgência SB – Saúde Bucal

SBC – Saúde Bucal Coletiva SUS – Sistema Único de Saúde

TCLE - Termo de Consentimento Livre e Esclarecido TSB – Técnico em Saúde Bucal

UBS – Unidade Básica de Saúde VD – Visita domiciliar

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SUMÁRIO

1 INTRODUÇÃO ...25 2 MARCO HISTÓRICO-LEGAL ...29 2.1 HISTÓRICO DA ATENÇÃO DOMICILIAR NO BRASIL:

CRIAÇÃO DA POLÍTICA NACIONAL DE ATENÇÃO

DOMICILIAR ... 29 3 MARCO CONCEITUAL ...37 3.1 ATENÇÃO DOMICILIAR, ASSISTÊNCIA/ATENDIMENTO

DOMICILIAR, INTERNAÇÃO DOMICILIAR E VISITA

DOMICILIAR ... 37 4 MARCO TEÓRICO ...39 4.1 A INSERÇÃO DA SAÚDE BUCAL NO SISTEMA ÚNICO DE SAÚDE E O DESAFIO DA ORGANIZAÇÃO DA ATENÇÃO DOMICILIAR ... 39

4.2 ATENÇÃO DOMICILIAR COMO DISPOSITIVO DE

INOVAÇÃO TECNOLÓGICA E DESINSTITUCIONALIZAÇÃO DO CUIDADO EM SAÚDE ... 42 4.3 PROCESSO DE TRABALHO EM SAÚDE: TRABALHO EM EQUIPE COMO ORGANIZADOR DA ATENÇÃO DOMICILIAR47 5 OBJETIVOS ...53 5.1 OBJETIVO GERAL... 53 5.2 OBJETIVOS ESPECÍFICOS ... 53 6 METODOLOGIA EXPANDIDA ...55 6.1 MANUSCRITO 1... 55 6.2 MANUSCRITO 2... 56 7 RESULTADOS ...63 7.1 MANUSCRITO 1 ... 63

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7.2 MANUSCRITO 2 ... 85 8 CONSIDERAÇÕES FINAIS ... 119 9 RECOMENDAÇÕES PARA TRABALHOS FUTUROS ... 123 REFERÊNCIAS ... 125 APÊNDICES ... 133 ANEXOS ... 143

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1 INTRODUÇÃO

A visita domiciliar (VD) está posta como prática indispensável no Brasil desde a década de 90. O modelo de atenção à saúde, com enfoque na promoção da saúde individual e coletiva, contribuiu para o surgimento da VD, primeiramente no âmbito do Programa de Agentes Comunitários de Saúde (PACS) e, mais recentemente, sendo aprimorada com a institucionalização da Estratégia Saúde da Família (ESF). Por meio dela, pode-se conhecer in loco a realidade social dos indivíduos e famílias, possibilitando concretizar a longitudinalidade, integralidade, acessibilidade e a interação entre o profissional e os usuários/famílias (CUNHA; GAMA, 2012).

O território e a população adscrita, o trabalho em equipe e a intersetorialidade constituem eixos fundamentais da concepção da ESF, e as VDs uma de suas principais ações (BRASIL, 2004). Nesta os membros da equipe vão até a residência dos moradores da área de abrangência das unidades, inovando em relação aos outros modelos de atenção que aguardavam a vinda dos usuários até as Unidades Básicas de Saúde (UBS) (ROMANHOLI, 2010).

A VD é uma modalidade da Atenção Domiciliar (AD) à saúde que engloba a atenção, o atendimento/assistência e a internação domiciliar, com finalidades, objetivos e práticas distintas (GIACOMOZZI; LACERDA, 2006). A VD na ESF busca superar o modelo hegemônico de atenção à saúde, onde a doença e a postura tecnocrática dos profissionais predominavam, e caracteriza-se como uma tecnologia de interação do cuidado à saúde (ALBUQUERQUE; BOSI, 2009).

Todos os profissionais da Equipe Saúde da Família (EqSF) tem como atribuição comum a realização de VDs, quando necessário (BRASIL, 2017). O Caderno de Atenção Básica n° 17 aponta a organização da AD como um desafio para as Equipes de Saúde Bucal (ESB), caracterizando que a assistência no contexto do domicílio é inerente ao processo de trabalho desse nível de atenção (BRASIL, 2006).

De-Carli et al. (2015) realizaram um estudo observacional com 17 mil equipes que atuam em todas as regiões do país, com a finalidade de apresentar os dados referentes à realização de VDs e aos cuidados no

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domicílio obtidos na Avaliação Externa do primeiro ciclo do Programa Nacional de Melhoria do Acesso e da Qualidade (PMAQ), enfatizando as práticas das ESB. Os resultados evidenciaram que aproximadamente 100% das EqSF e as equipes das UBS tradicionais avaliadas realizam VD. E que 90% dos profissionais da equipe mínima realizam cuidados no domicílio; no que diz respeito à ESB, o percentual cai para, aproximadamente 50%.

Este estudo apontou que ainda existem barreiras para que a atuação no contexto do domicílio seja uma prática estruturada da ESB, indicou a necessidade de políticas indutoras e mais diretivas na incorporação de ações no ambiente domiciliar e recomendou uma análise das distintas realidades regionais, favorecendo intervenções direcionadas (DE-CARLI, et al. 2015).

Considerando que a AD é uma prática que oportuniza a ampliação da dimensão do cuidar em saúde, que tem na VD uma ferramenta para sua operacionalização, mostra-se fundamental refletirmos sobre como os profissionais da ESF têm realizado a AD, de modo especial nas práticas de saúde bucal (RODRIGUES; ROCHA; PEDROSA, 2011).

Florianópolis é considerada referência em Atenção Básica (AB) no cenário nacional, por destacar-se na implantação da ESF (PMF, 2014). Possui 108 EqSF e 43 ESB implantadas, respectivamente 77,14%% e 36% de cobertura populacional (DAB, 2018). A capital, que utiliza o slogan ―Aqui o SUS dá certo‖, recebeu por três vezes o 2º lugar no Prêmio Brasil Sorridente nos últimos 5 anos e possui o menor índice de dentes cariados, perdidos e obturados aos 12 anos (CPO-D = 0,68). Também foi premiada nas áreas de educação, turismo, gastronomia e desenvolvimento econômico. Por essas características, o município é por excelência um potente campo de estudo no âmbito da APS (PMF, 2014).

Os dados do 1° ciclo do PMAQ, Módulo II – Equipe, divulgados pelo Departamento de Atenção Básica, descreveram a avaliação de 707 equipes de saúde da família com saúde bucal (ESFSB) no estado de Santa Catarina (DAB, 2018). Destas, 100% referiram realizar VD. Entre os profissionais que realizam cuidado domiciliar, 706 (99,9%) são enfermeiros, 686 (97%) médicos, 447 (63,2%) são cirurgiões-dentistas (CD), 687 (97%), técnicos de enfermagem e 339 (48%) são técnicos e auxiliares de saúde bucal. Em Florianópolis, 90 equipes de saúde foram avaliadas, 49 destas foram ESFSB. Todas as ESFSB (n=49) relataram que a agenda está organizada para realização de visitas domiciliares e que realizam VD. Quanto à realização do cuidado domiciliar pelo CD,

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91,8% (n=45) das equipes relataram que o profissional realiza cuidados domiciliares e 8,1% (n=4) das equipes relataram não realizar (BRASIL, 2012).

As reflexões acerca da AD desenvolvida pelas ESB iniciaram-se para mim no contexto da Residência Multiprofissional em Saúde da Família (REMULTISF) da Universidade Federal de Santa Catarina em parceria com a Prefeitura Municipal de Florianópolis. O desafio da atuação territorial sob os princípios da Universalidade, Integralidade e Equidade demonstrava a sua complexidade a cada saída do mocho do consultório odontológico para ir ao encontro da comunidade, principalmente na realização da VD. Nos domicílios, a partir do contato com a realidade, os usuários/famílias eram o centro da atuação e uma relação de empatia se estabelecia capaz de contribuir na criação de vínculo e de um cuidado mais adequado às necessidades. Para mim, ficou evidente na época que as necessidades em saúde bucal desses usuários/famílias eram pouco percebidas pelos demais profissionais da equipe, evidenciando a demanda por trabalho interdisciplinar; além das fronteiras estabelecidas entre a dificuldade de acesso e o direito à saúde; as potencialidades e inovações tecnológicas do trabalho no contexto desinstitucionalizado e muitas dúvidas sobre as especificidades desse processo de trabalho na prática da ESB.

Essa necessidade de compreensão permeia este estudo e envolveu um exercício dialético, ou seja, um diálogo com as contradições históricas que a AD percorreu até tornar-se uma Política Nacional, parte da Rede de Atenção à Saúde (RAS) do Sistema Único de Saúde (SUS).

Considerando que a AD faz parte do processo de trabalho das ESB e EqSF e tem impacto no acesso e qualidade das ações de Saúde Bucal (SB), este estudo visa compreender como se realiza a AD com ênfase nas práticas de SB, no âmbito da ESF, no município de Florianópolis -SC, por meio de um estudo de caso intrínseco desenvolvido com uma EqSF e ESB.

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2 MARCO HISTÓRICO-LEGAL

2.1 HISTÓRICO DA ATENÇÃO DOMICILIAR NO BRASIL:

CRIAÇÃO DA POLÍTICA NACIONAL DE ATENÇÃO

DOMICILIAR

O cuidado em domicílio é uma prática bastante antiga. Antes da institucionalização dos hospitais na Idade Média, no continente europeu, já era uma prática amplamente utilizada. A AD foi criada em 1964, nos Estados Unidos, como prática institucionalizada, para ser uma alternativa ao congestionamento dos hospitais e possibilitar um contexto mais favorável à recuperação do paciente. No Brasil, o Serviço de Assistência Médica Domiciliar de Urgência (SAMDU), vinculado ao Ministério do Trabalho foi fundado em 1949 e pode ser considerado a primeira experiência organizada de AD. Porém, somente a partir de 1963 foi organizada como uma atividade planejada no setor público, como o Serviço de Assistência Domiciliar do Hospital de Servidores do Estado de São Paulo (REHEM; TRAD, 2005).

A Constituição Federal, em 1988, criou-se o SUS e estabeleceu novos conceitos e responsabilidades para os serviços e ações de saúde:

Saúde é direito de todos e dever do Estado, garantido mediante políticas sociais e econômicas que visem à redução do risco de doença e de outros agravos e ao acesso universal e igualitário às ações e serviços para sua promoção, proteção e recuperação (BRASIL, 1988).

Ainda que seja relevante e estratégico que a Constituição Federal defina um conceito de saúde, é importante destacar que este conceito teve por base as discussões da 8ª Conferência Nacional de Saúde, em cujo relatório final se lê:

Direito à saúde significa a garantia, pelo Estado, de condições dignas de vida, e de acesso universal e igualitário às ações e serviços de promoção, proteção e recuperação da saúde, em todos os seus níveis, a todos os habitantes do território nacional, levando ao desenvolvimento pleno do do ser humano em sua individualidade (BRASIL, 1986, p.4).

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Fica evidente que o conceito de saúde da 8ª Conferência Nacional de Saúde não estava centrado na ―redução do risco de doença e de outros agravos‖ como o texto Constitucional.

Nesse sentido, a Organização Mundial da Saúde publicou o relatório Global Stategy on People Centred and Integrated Care Services, em 2015, que trouxe importantes elementos que contribuem para que o conhecido conceito de saúde como ―um completo estado de bem-estar físico, mental e social, e não apenas ausência de doença ou enfermidade‖ (OMS, 1946) subsidie sistemas de saúde centrado nas pessoas, e esta perspectiva permeia esse estudo:

Os Serviços de Saúde Centrados nas Pessoas é um enfoque que conscientemente adota as perspectivas de indivíduos, famílias e comunidades e que os vê, ao mesmo tempo, como participantes e beneficiários de sistemas de saúde que respondem às suas necessidades e preferências de maneira humana e holística (WHO, 2015, p.7).

Na década de noventa, fundamentados no conceito de saúde da 8ª Conferência Nacional de Saúde, iniciou-se o processo de municipalização da saúde, e em alguns municípios surgiram serviços de AD, não necessariamente voltados aos usuários em internação hospitalar. Ao longo dos anos, também houveram iniciativas de cuidado domiciliar pelo Ministério da Saúde (MS), de gestores estaduais, de equipes hospitalares ou até mesmo da AB. Nesse ínterim, os serviços privados de home care também tornaram-se cada vez mais comuns no país (BRASIL, 2014).

As mudanças no perfil demográfico e epidemiológico da população brasileira, aumentaram o número de idosos que manifestam doenças crônico-degenerativas, com perda da independência e necessidade de cuidados permanentes, denunciando a insuficiência de um modelo hospitalocêntrico. Além disso, 1,3% da população possui algum tipo de problema crônico de saúde, cerca de 6% dos brasileiros possuem até três doenças crônicas concomitantemente, além das crianças e adultos acometidos por doenças crônicas classificadas como raras; todas essas são demandas emergentes e elegíveis para o cuidado em domicílio de uma parcela significativa da população (BRAGA et al., 2016).

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Tal conjuntura evidencia a necessidade de novas modalidades de atenção à saúde, o que vem ocorrendo com a ampliação da AB no país, que se responsabiliza pelo cuidado em saúde das famílias, de um território delimitado, criando vínculo e atendendo também no domicílio. Ao longo do tempo, o crescimento das demandas de cuidado domiciliar pressionou o SUS a valorizar, redimensionar e assumir a AD de forma mais sistêmica (BRASIL, 2014).

Essa discussão teve início com a publicação da Portaria nº 2.416, do MS, em 1998, que definiu requisitos para o credenciamento de hospitais e estabeleceu critérios para a modalidade de internação domiciliar no SUS (BRASIL, 1998). Ela representou a retomada do cuidado no domicílio como forma de organização da assistência e, ao ser incorporado como tal, exige a formulação de mecanismos que garantam a regulação e o financiamento do setor. A Lei nº 10.424 de abril de 2002, sancionada pelo MS, acrescenta à Lei Orgânica da Saúde nº 8080 um dispositivo jurídico legal que institui no SUS o atendimento e internação domiciliar (BRASIL, 2002), representando uma tentativa de responder às demandas crescentes para o cuidado domiciliar no país e, ao mesmo tempo, garantir o cumprimento dos princípios constitucionais de universalidade, integralidade, equidade, participação comunitária, descentralização e hierarquização. Embora tenha ocorrido uma evolução em relação à legislação que regulamenta a AD como modalidade de assistência no país, foi considerada como complementar por sua proposição não ter feito parte do projeto original do SUS (BRASIL, 2014).

Em 2006, a Agência Nacional de Vigilância Sanitária (ANVISA) publicou a Resolução Colegiada nº 11, que dispõe sobre o regulamento técnico de funcionamento dos serviços que prestam AD, com os requisitos mínimos de segurança e os critérios normativos (BRASIL, 2006). No mesmo período, o Conselho Nacional de Secretários de Saúde (CONASS) publicou uma nota técnica propondo a implantação da Política Nacional de Internação Domiciliar. Esse movimento resultou na publicação da Portaria GM/MS n° 2.529, de 19 de outubro de 2006, que institui, no âmbito do SUS, a internação domiciliar. Ainda em 2006, o MS publica a Portaria n° 2.529 que avançou em relação à Portaria nº 2.416 de 1998, pois estabeleceu os Serviços de Internação Domiciliar de forma territorializada, através de equipes multiprofissionais com custeio federal mensal por equipe. No entanto, esta portaria não foi operacionalizada, gerando expectativa entre gestores e trabalhadores acerca dos rumos da AD no SUS, que permaneceu estagnada, sob o ponto de vista da política de saúde federal, até 2011 (BRASIL, 2013).

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No início de 2011, criou-se por intermédio do MS um grupo de trabalho (GT) formado por serviços municipais de AD e por áreas técnicas do MS. O GT partiu do acúmulo de experiências sobre a AD, para revisar a portaria vigente (Portaria n° 2.529, de 19 de outubro de 2006), para que efetivamente fosse operacionalizada à luz das necessidades em saúde. Como resultado, houve a revogação desta portaria e a criação da Política Nacional de Atenção Domiciliar ocorreu com a publicação da Portaria n° 2.029, de 2011, produzindo subsídios necessários para que o governo federal instituísse o Programa Melhor em Casa (PMC) no dia 08 de novembro de 2011 (BRASIL, 2013).

Em 27 de outubro de 2011, foi publicada a portaria GM/MS 2.527, redefinindo a AD no âmbito do SUS, para permitir que os municípios com porte populacional menor também tivessem a oportunidade de implantar em seu território serviços de AD com apoio do MS. O conceito de AD demarcado pela Portaria nº 2.527 traz elementos muito importantes por considerá-la uma modalidade de atenção à saúde ―substitutiva ou complementar‖, ou seja, pode tanto substituir o cuidado prestado em outro ponto da Rede de Atenção à Saúde (RAS), como o hospital, e ser complementar aos cuidados iniciados em qualquer um dos pontos, como as UBSs. Com o PMC, a AD no SUS foi instituída de forma sistêmica, tendo a AB como ordenadora e orientadora do cuidado e da ação territorial, e a incorporação da AD ao sistema de regulação das redes, de maneira a se articular com outros pontos de atenção (BRASIL, 2013).

Dentre as ações/estratégias no âmbito do PMC, podem-se citar: a própria existência de uma normativa federal instituindo a forma como a AD deve ser operacionalizada e o financiamento federal para isso; o apoio técnico do MS aos gestores locais para a implantação do programa; a criação de um sistema de informação específico para a AD; a publicação de materiais teóricos ou instrutivos para apoiar a implantação/qualificação dos Serviços de AD, destacando-se o Caderno de Atenção Domiciliar; e a criação do Programa Multicêntrico de Qualificação Profissional em Atenção Domiciliar à Distância (NETO; DIAS, 2014, p.61).

Essas definições foram alteradas pela Portaria nº 963, de 27 de maio de 2013, universalizando a possibilidade dos municípios de adesão

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ao PMC. Tal portaria trouxe avanços nos seguintes aspectos: reconhece os cuidados domiciliares realizados pelas equipes de AB instituindo a modalidade AD1, que é realizada pelas EqSF e Núcleo de Apoio à Saúde da Família (NASF) normatizando por uma portaria do MS; retira o foco principal da internação domiciliar, característica da Portaria 2.529; indica que a base territorial para a organização dos Serviços de Atenção Domiciliar (SAD) devem ter uma população adscrita de 100 mil pessoas, ou seja, qualquer usuário que se beneficiar da AD terá uma equipe de AD de referência, não precisando estar, essencialmente, internado em um hospital que possua o serviço de internação domiciliar; aumentando o número de municípios elegíveis na medida em que o recorte populacional passa a ser uma população acima de 40.000 habitantes e consolidando o conceito de que a AD faz parte da RAS, favorecendo a continuidade do cuidado e a integralidade da atenção (BRASIL, 2013).

A organização da AD se dá em três modalidades: AD1, AD2 e AD3, determinadas pelas características do usuário, tipo de atenção e dos procedimentos realizados no cuidado em saúde. A modalidade AD1 destina-se a usuários que possuam problemas de saúde controlados/compensados e com limitação ou impossibilidade física de locomoção até uma UBS; e/ou usuários que necessitem de cuidados de menor intensidade, abrangendo os de recuperação nutricional, menor frequência de VD e de recursos de saúde e dentro da capacidade de atendimento de todos os tipos de equipes que compõem a AB. A modalidade AD2 destina-se a usuários que, além de dificuldade de locomoção, necessitem de uma frequência maior de cuidado, recursos de saúde e acompanhamento longitudinal, oriundos de diferentes serviços da rede de atenção. Já a modalidade AD3, atende usuários semelhantes à AD2, porém que usem equipamentos específicos e, devido a sua maior complexidade, dificilmente terão alta desses cuidados domiciliares. Tanto a AD2 como a AD3 são de responsabilidade das equipes multiprofissionais de atenção domiciliar (EMAD) e da equipe multiprofissional de apoio (EMAP) (BRASIL, 2013).

Atualmente, a Portaria nº 825, de abril de 2016, redefiniu a AD no âmbito SUS como ―modalidade de atenção à saúde integrada à RAS, caracterizada por um conjunto de ações de prevenção e tratamento de doenças, reabilitação, paliação e promoção à saúde, prestadas em domicílio, garantindo continuidade de cuidados‖ (BRASIL; 2016).

Essa redefinição foi incorporada pelas mudanças na Política Nacional de Atenção Básica (PNAB) que define como atribuição comum a todos os profissionais da AB a realização da AD para ―pessoas

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com problemas de saúde controlados/compensados com algum grau de dependência para as atividades da vida diária‖ que apresentem dificuldade de acessar os serviços, de acordo com o planejamento da equipe, necessidades e prioridades estabelecidas. O cuidado domiciliar, quando indicado e necessário, é explicitado nas atribuições específicas dos profissionais da EqSF, ESB e NASF (BRASIL; 2017).

A AD é uma modalidade de atenção à saúde inerente ao processo de trabalho das equipes de AB, sendo fundamental que os profissionais estejam preparados para identificar e cuidar dos usuários que se beneficiarão desse cuidado, o que requer adequar a organização do seu processo de trabalho, bem como agregar certas tecnologias necessárias para realizar o cuidado em saúde no ambiente domiciliar. A AD se propõe a contribuir na reorganização do processo de trabalho pela equipe de saúde e nas discussões sobre diferentes concepções e abordagens familiares. Considera-se que os profissionais precisam atuar com criatividade e senso crítico, mediante uma prática humanizada, competente e resolutiva, que envolva ações de promoção, prevenção, recuperação e reabilitação. Um fator fundamental para a AD é a participação ativa do usuário, família e profissionais envolvidos para que essa modalidade de atenção seja efetivada. Portanto, se faz necessária articulação com os diferentes níveis de atenção e trabalho intersetorial na construção coletiva de uma proposta integrada de atenção à saúde, favorecendo mais qualidade aos serviços e consequentemente melhor qualidade de vida às pessoas (BRASIL, 2013).

A síntese do marco histórico-legal da AD está representada na Figura 1.

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Figura 1 – Marco histórico-legal da Atenção Domiciliar no Brasil. Fonte: A autora (2018). AD: atenção domiciliar. SAMDU: Serviço de Atenção Médica Domiciliar de Urgência. SUS: Sistema Único de Saúde. ANVISA: Agência Nacional de Vigilância Sanitária. CONASS: Conselho Nacional de Secretários de Saúde. RAS: Rede de Atenção à Saúde

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3 MARCO CONCEITUAL

3.1 ATENÇÃO DOMICILIAR, ASSISTÊNCIA/ATENDIMENTO DOMICILIAR, INTERNAÇÃO DOMICILIAR E VISITA DOMICILIAR

A AD à saúde engloba a VD, o atendimento e a internação domiciliar, sendo que cada uma delas possui objetivos e características específicas. A AD é considerada um componente de continuidade do cuidado em saúde, pois ao ofertar os serviços de saúde ao indivíduo e sua família em sua residência, pode promover, manter e restaurar a saúde e contribuir para a autonomia (GIACOMOZZI; LACERDA, 2006). Os autores ainda comparam o conceito de AD e a assistência domiciliar à saúde, afirmando que são atividades com diversos aspectos em comum, mas diferenciam-se na prática. A AD à saúde diferencia-se por constituir uma modalidade ampla que envolve as ações de promoção à saúde em sua totalidade, incluindo a prática de políticas econômicas, sociais e de saúde, que influenciam o processo saúde-doença dos indivíduos, além de envolver ações preventivas e assistenciais das outras categorias que engloba (atendimento, visita e internação domiciliar).

Já a assistência domiciliar à saúde é uma categoria da AD à saúde que pode ser também denominada atendimento ou cuidado domiciliar e fundamenta-se na interação do profissional com o indivíduo, sua família e com o cuidador, quando esse existe. Ela constitui um conjunto de atividades de caráter ambulatorial, programadas e continuadas desenvolvidas em domicílio, e pode ser instrumentalizada pela visita ou internação domiciliar (BRASIL, 2006). Giacomozzi e Lacerda (2006) acrescentam que as atividades na assistência domiciliar vão da educação e prevenção à recuperação e manutenção da saúde dos indivíduos e seus familiares no contexto de suas residências.

Para efetivar a totalidade da AD, que envolve as ações de promoção da saúde, é desejável que o modelo tecnoassistencial supere o foco na doença; para além da assistência, é fundamental que os profissionais e os serviços estejam organizados para dar suporte aos indivíduos em suas necessidades de saúde.

O conceito de internação domiciliar, por sua vez, trata-se de uma categoria mais específica, que envolve a utilização de aparato tecnológico em domicílio, de acordo com as necessidades de cada indivíduo, sendo caracterizada pela permanência da equipe de saúde na

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residência por no mínimo quatro horas diárias, com acompanhamento contínuo. Para que ocorra internação domiciliar, o indivíduo precisa apresentar quadro clínico estável, assim como a equipe profissional necessita de rede de suporte para as possíveis eventualidades. (GIACOMOZZI; LACERDA, 2006).

A VD, como categoria da AD, contribui para a compreensão ―in loco‖ do contexto de vida do usuário do sistema de saúde, demonstrando não só as condições de habitação, mas também as relações familiares e recursos disponíveis, o que pode direcionar a um planejamento da assistência mais resolutivo e facilitar o estreitamento de vínculo, por se tratar de um modelo de atenção diferenciado do SUS (TAKAHASHI; OLIVEIRA, 2001). A atenção às famílias e à comunidade é o objetivo central da VD, sendo entendidas, famílias e comunidade, como entidades influenciadoras no processo de adoecer dos indivíduos os quais são regidos pelas relações com o meio e com as pessoas. E nesse caso o ―sair para comunidade‖ precisa ter impacto na maneira de atuação dos profissionais, questionando seus conceitos acerca do modo de vivência e sobrevivência das famílias (VASCONCELOS, 1999).

Cunha e Gama (2012) além de reforçar essa ideia, retratando esse conceito na Figura 2 a seguir, salientando que a visita fornece subsídios para a execução das demais modalidades de AD.

Figura 2 Representação Esquemática da Atenção Domiciliar e suas respectivas modalidades. Fonte: Cunha e Gama (2012).

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4 MARCO TEÓRICO

4.1 A INSERÇÃO DA SAÚDE BUCAL NO SISTEMA ÚNICO DE SAÚDE E O DESAFIO DA ORGANIZAÇÃO DA ATENÇÃO DOMICILIAR

A Constituição Federal de 1988 estabeleceu os princípios e diretrizes para uma total reorganização do Sistema de Saúde que partisse da formalização de um princípio igualitário e do comprometimento público com a garantia dessa igualdade. A criação do SUS foi como uma ―carta fundadora‖ de uma nova ordem social no âmbito da saúde (MENICUCCI, 2009).

Tais transformações começam a ganhar concretude em 1991, com a implantação do PACS que teve como objetivo o enfrentamento dos preocupantes indicadores de mortalidade infantil e materna na região nordeste do Brasil. Por ser uma pessoa da própria comunidade, o Agente Comunitário de Saúde (ACS) também contribuiu no resgate e valorização do saber popular, provocando maior vinculação dos indivíduos e famílias com as UBS (SOUZA, 2000).

Dando continuidade a este processo, em 1994 o MS lança o Programa Saúde da Família (PSF), que tinha enfoque na promoção e prevenção e que deveria buscar a racionalização da utilização dos serviços, ampliação do acesso, melhoria da eficácia e a efetividade das ações, sendo ―porta de entrada‖ para os outros níveis do sistema de saúde – média e alta complexidade (MENICUCCI, 2009).

Principalmente no período entre 1998 e 2002, o PSF deixou de ser um programa que operacionalizava uma política com foco na AB de populações excluídas do consumo de serviços, para ser considerado como uma estratégia de mudança do modelo de atenção à saúde no SUS, sendo renomeado no país como ESF (LIMA et al., 2005).

A ESF constitui-se uma estratégia que prioriza as ações de prevenção, promoção e recuperação da saúde das pessoas, de forma integral e contínua, cujo atendimento é prestado na UBS ou no domicílio pelos profissionais que compõem as equipes, criando vínculos de corresponsabilidade entre estes e a população acompanhada, o que facilita a identificação e o atendimento aos problemas de saúde da comunidade (COSTA; CHAGAS; SILVESTRE, 2006).

As práticas em saúde na ESF trazem a intenção de substituição de um modelo tradicional na medida em que se propõem a romper com a atuação focada na UBS, trabalhando com o território e levando saúde para e junto à comunidade, sendo o atendimento domiciliar uma das

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ações em saúde facilitadoras dessa nova reorganização da atenção à saúde com ênfase na família (GIACOMOZZI; LACERDA, 2006).

A portaria ministerial 1.444 de 28 de dezembro de 2000 inseriu a ESB na ESF e fixou incentivo financeiro para reorientação das ações de SB. Em março de 2001, a Portaria nº 267 trouxe normas e diretrizes para esse novo cenário, considerando necessária a ampliação do acesso às ações e promoção e recuperação da SB da população brasileira, bem como de prevenção de doenças e agravos a ela relacionados, melhoria dos índices epidemiológicos de SB e inclusão das ações de SB na ESF. Este processo de regulamentação culminou em um aumento da rede de serviços em todo o país devido a um importante aporte financeiro no financiamento público para a área de saúde bucal (SILVESTRE et al., 2013)

Em 2003 o MS lançou a Política Nacional de Saúde Bucal (PNSB) – Programa Brasil Sorridente. O Brasil Sorridente constitui-se em uma série de medidas para garantir ações de promoção, prevenção e recuperação da SB dos brasileiros. A reorganização da prática e a qualificação das ações e serviços ofertados à população é objetivo principal dessa política, reunindo uma série de ações em SB voltada para os cidadãos de todas as faixas etárias, com acesso ampliado ao tratamento odontológico gratuito por meio do SUS (BRASIL, 2018).

Essa política é desenvolvida por meio do exercício de práticas democráticas e participativas, sob a forma de trabalho em equipe, dirigidas a populações pelas quais se assume a responsabilidade com o cuidado em SB, considerando a dinamicidade existente no território em que vivem essas pessoas (COSTA; CHAGAS; SILVESTRE, 2006).

Segundo diretrizes da PNSB, as ações e serviços devem ser resultado de um adequado conhecimento da realidade de saúde de cada localidade para, a partir disso, construir uma prática efetivamente resolutiva. Para isso, é imperativo que em cada território haja uma aproximação das pessoas na tentativa de tentar conhecê-las: suas condições de vida, as representações e as concepções que têm acerca de sua saúde, seus hábitos e as providências que tomam para resolver seus problemas quando adoecem bem como o que fazem para evitar enfermidades (BRASIL, 2004).

Resolutividade, entendida nesse estudo, não somente como uma resposta à demandas pontuais de doenças bucais, ou mesmo tratamentos completados, mas uma atuação profissional implicada em atender as necessidades das pessoas, que compreenda os determinantes do processo saúde-doença e a partir disso busque desenvolver estratégias inovadoras de cuidado em saúde bucal.

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A superação do modelo de atenção à SB clássico ou hegemônico e a mudança para o modelo da Saúde Bucal Coletiva (SBC) encontram na família excelente parceria para a participação popular, viabilizando a multidimensionalidade do cuidado, a melhoria das condições de vida e a promoção da saúde. (VASCONCELOS; FRATUCCI, s.d.).

Todavia, a mudança do modelo de atenção é um processo complexo, visto que depende da incorporação de transformações no processo de trabalho em saúde quanto aos seus propósitos, objetos, meios e, fundamentalmente, nas relações entre profissionais e a população usuária dos serviços. Para que a mudança no modelo tecnoassistencial seja efetiva, o usuário precisa assumir a centralidade na produção do cuidado, expressando suas necessidades e ocupando o lugar de sujeito na construção de projetos terapêuticos. (SILVA et al., 2010).

Para trabalhar na ESF, os profissionais de SB necessitam de mudança na forma de atuação, tomando consciência da realidade da situação da população a ser assistida. O contato entre a ESB e a comunidade em sua própria moradia, configura-se em uma atuação no nível básico que permite um trabalho de conscientização para a promoção da saúde (GROISMAN; MORAES; CHAGAS, 2005).

De acordo com MS a VD constitui uma atribuição de todos os profissionais da ESF, devendo ser realizada para o cadastramento das famílias, segundo a definição da área territorial pré-estabelecida para a adscrição e, também para monitorar a situação de saúde das famílias, quer seja de forma programada ou para atendimento de demandas espontâneas (BRASIL, 2013).

Na ESF, o parâmetro de VD para os ACS é de uma VD família/mês e não foi definida uma frequência de VD para os demais profissionais da equipe (BRASIL, 2006).

O caderno de Atenção Básica nº 17 do MS, ao orientar sobre a organização da atenção em SB na ESF, traz como um dos principais desafios à organização da AD, salientando que a Assistência Domiciliar é uma modalidade da AD, inerente ao processo de trabalho das equipes desse nível de atenção. ―Destina-se a responder às necessidades de saúde de um determinado segmento da população com perdas funcionais e dependência para a realização das atividades da vida diária.‖ (BRASIL, 2006, p. 24).

Essa concepção acerca da VD também foi destacada nas diretrizes da PNSB, que orienta que a ampliação e qualificação das ações de SB também se fazem por meio da organização de visitas da ESB às pessoas acamadas ou com dificuldades de locomoção, visando à

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identificação dos riscos e propiciando o acompanhamento e tratamento necessário (BRASIL, 2004).

A PNSB acrescenta que a Educação em Saúde pode ser desenvolvida pelo CD, técnico em saúde bucal (TSB), auxiliar de saúde bucal (ASB) e ACS especialmente durante as VDs. Ao abordar a ampliação do acesso, o programa de prevenção e controle do câncer bucal, orienta que a ESB deve oferecer oportunidades de identificação de lesões bucais (busca ativa) também por meio de VDs (BRASIL, 2004).

Como recurso para planejamento de VD, o Caderno de Atenção Básica nº17 indica o cadastro das famílias, realizado pelo ACS por meio do preenchimento da ―Ficha A‖ do Sistema de Informação da Atenção Básica (SIAB). Segundo o documento, a VD mensal realizada pelo ACS possibilita não só a constante atualização do cadastro familiar, mas também a identificação e o acompanhamento de indivíduos e/ou grupos prioritários. A VD realizada pelos profissionais, com prioridade pré-definida, colabora para uma abordagem com direcionamento familiar na organização das ações assistenciais (BRASIL, 2006).

O Caderno de Atenção Básica nº17 orienta também que a operacionalização da VD deve ser executada pela equipe de saúde por meio de um planejamento construído com o usuário-família, e considerando as atribuições dos membros da equipe, sendo necessário que a mesma sistematize um planejamento de ações integrado, dinâmico, flexível e adaptável à realidade do usuário. O planejamento deve contemplar a participação e a frequência de todos os profissionais na execução das ações, a partir das necessidades do usuário/família, buscando distribuir os profissionais de forma a otimizar o trabalho da equipe (BRASIL, 2006).

Silva (2012) destaca que embora ressaltem a importância de se acompanhar a família - inclusive por meio de VD realizada por todos os profissionais do programa - as publicações oficiais do MS não aprofundam os pressupostos para o planejamento da AD e, também, não orientam quanto a sua sistematização.

4.2 ATENÇÃO DOMICILIAR COMO DISPOSITIVO DE INOVAÇÃO TECNOLÓGICA E DESINSTITUCIONALIZAÇÃO DO CUIDADO EM SAÚDE

A AD é uma alternativa de organização da atenção à saúde capaz de contribuir ativamente para a produção da integralidade, da

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longitudinalidade do cuidado e da ampliação da autonomia dos usuários na produção de sua própria saúde (MERHY; FEUERWERKER, 2007). O trabalho em equipe no âmbito do domicílio pode ser um dispositivo efetivo de tensão entre o modelo hegemônico e uma prática inovadora, produzindo melhorias reais nas formas sociais de tratar e cuidar do sofrimento. O contexto domiciliar propicia novas formas de cuidar, a partir da substitutividade e da desinstitucionalização, onde o compromisso com a defesa da vida norteia o pacto de trabalho das equipes. Por isso, a AD pode ser um terreno do trabalho vivo em ato, possibilitando a invenção de práticas cuidadoras (FEUERWERKER; MERHY, 2008).

Entende-se por ―trabalho vivo em ato‖ o trabalho humano no momento em que é executado, determinando a produção do cuidado. Esse trabalho, interage constantemente com instrumentos, normas, máquinas, relacionando diferentes tecnologias, podendo ter processos mais criativos, centrados nas relações, ou processos mais restritos à lógica instrumental dura (como as máquinas) (MERHY, FEUERWERKER, 2009).

O potencial inovador da AD se dá pela permeabilidade maior das equipes aos diferentes aspectos da vida dos usuários e suas famílias e pela produção de um cuidado ampliado que não se restringe aos aspectos biológicos da doença e que também está atento à racionalidade econômico-financeira, aos sujeitos do cuidado e a articulação com os demais serviços de saúde. Assim, são desenvolvidas inovações tecnológicas de cuidado e ampliam-se as possibilidades de efetivação do trabalho em equipe, que articula e compartilha diferentes saberes e práticas profissionais nos projetos terapêuticos, com ampliação da autonomia dos usuários ou dos cuidadores (SILVA et al., 2010).

Ao potencializar a autonomia das equipes, o contexto do domicílio favorece o trabalho vivo em ato, pois nesse contexto os profissionais lidam constantemente com o inusitado, as singularidades e a própria humanidade (sofrimentos, alegrias, perdas e vitórias). Os processos de subjetivação que ocorrem a partir disso podem resgatar a solidariedade na prática profissional, rompendo com as barreiras da objetividade e da racionalidade científica, gerando relações mais produtivas entre profissionais de saúde e usuários (FEUERWERKER; MERHY, 2008). O domicílio é um lugar do encontro. Sendo esse encontro considerado uma categoria que dá significado às diferentes relações que se estabelecem no ambiente de trabalho, reconhecendo que essas relações produzem afetamentos e vão operar subjetivações entre os envolvidos (FRANCO; MERHY, 2008). É por meio desse contato entre

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trabalhadores e usuários que as equipes podem ampliar (ou não) a noção do que seria sua alçada, pela responsabilização com a realidade familiar vivenciada (FEUERWERKER; MERHY, 2008).

A atenção à saúde desenvolvida no domicílio coloca os profissionais em contato com o que mesmo indagado no contexto do consultório (condições de moradia, relações familiares, entre outros) não caracteriza-se como objeto direto do seu trabalho. Assim, na AD, a solidariedade e a invenção são elementos fundamentais na caixa de ferramentas das equipes, caracterizando um movimento de incorporação de inovações tecnológicas no fazer em saúde (SILVA et al., 2010).

A tecnologia nesse âmbito é compreendida de uma forma bem mais ampla e não pode ser confundida com equipamentos e máquinas. São saberes construídos para a produção de produtos singulares, seja para a organização das ações humanas nos processos produtivos, seja na dimensão relacional (MERHY, 2002).

Segundo Merhy (1998) ao menos três tipos de tecnologias são mobilizadas no processo de trabalho das equipes: as duras, as leve-duras e as leves. As tecnologias duras são representadas pelos equipamentos, ou seja, o material concreto propriamente dito; a tecnologia leve-dura é considerada dura no sentido de incluir os saberes estruturados, normatizados e bem protocolados representados pelas disciplinas que operam a saúde, como a clínica e a epidemiologia, e leve por abranger um saber adquirido pelas pessoas e que está inscrito no modo de pensar as situações de saúde e na sua maneira de organizar uma atuação sobre elas; já a tecnologia leve é produzida por meio do trabalho vivo, entendido como o processo de produção da comunicação, das relações, de vínculos que conduzem o encontro com o usuário, ou seja, tecnologias relacionais que favorecem a produção de relações intersubjetivas entre trabalhador de saúde e usuário. As tecnologias leves e leve-duras expressam-se nos processos relacionados às práticas de saúde, nos processos de trabalho e na capacidade que tem não só de gerar novas modalidades de produção do cuidado, mas também de governá-las.

Cabe ressaltar que a tecnologia leve se dá entre pessoas que atuam umas sobre e com as outras, sendo que nos espaços de intersubjetividade ocorrem os momentos das falas, escutas e interpretações, ocorrendo a produção de uma acolhida ou não das intenções que estas pessoas colocam neste encontro. São momentos que favorecem a responsabilização em torno do problema a ser enfrentado, ou mesmo de momentos de confiabilidade e esperança nos quais se produzem relações de vínculo e aceitação (MERHY; FEUERWERKER,

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2007). Entendendo vínculo na perspectiva de Franco e Merhy (2008), como diretriz do modelo assistencial e indicador de positividade nas relações de cuidado. O vínculo contribui para um processo de trabalho mais dialógico, interativo, com pactuação do projeto terapêutico e, além disso, facilita a relação que se estabelece no processo de cuidado entre todos os sujeitos envolvidos.

Do arranjo desses tipos de tecnologia é que se caracteriza um trabalho em saúde mais ou menos cuidador e mais ou menos efetivo. Os distintos modelos tecnoassistenciais em saúde se diferenciam pelas ênfases que oferecem aos arranjos tecnológicos no trabalho em saúde (FEUERWERKER, MERHY, 2008).

Franco e Merhy (2008) destacam que no contexto domiciliar, o trabalho vivo e em equipe inova na sua forma de operação, possibilitando aos profissionais o uso de tecnologias leves, requerendo que os profissionais usem sua capacidade inventiva para resolver os problemas de saúde e interagir melhor com o saber-cuidador da família. Salientam, ainda, que a normativa institucional não é capaz de captar essas situações, pois está no espaço de governo dos trabalhadores, e é nesse âmbito que a substitutividade das tecnologias de cuidado e das práticas profissionais se potencializam e ganham espaço.

O debate contemporâneo da substitutividade do cuidado hegemônico por modelos inovadores de produzir saúde é pautado pela discussão da transição tecnológica e reestruturação produtiva na saúde. É substitutiva a prática que renova o modo hegemônico ou que o desinstitucionaliza, pois visa outros tipos de objetos e formas de cuidar, bem como opera sob outras perspectivas de normatividades sociais históricas e imaginárias. (FEUERWERKER; MERHY, 2008).

―A AD coloca em cena a discussão da substitutividade como desinstitucionalização ou não, entendendo a desinstitucionalização como uma substitutividade no modo de se produzirem as práticas de saúde e não simplesmente uma reestruturação no modo de se fazer a produção do mesmo modelo hegemônico, centrado nas profissões e nos procedimentos, tendo como base nuclear o modelo médico, dos séculos XIX e XX, que predominou no ocidente, baseado na visão do seu objeto como a doença localizada em um corpo biológico, mecânico‖ (MERHY; FEUERWERKER, 2008, p. 4).

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A dimensão cuidadora do trabalho em saúde pode ser resgatada pelos profissionais de saúde quando operam como um trabalhador coletivo no âmbito da AD. O trabalho desinstitucionalizado pode oferecer aos profissionais de saúde mais liberdade de criação e condução de suas atividades, além de uma relação mais direta com as pessoas, vivenciando seus contextos de vida. Essas vivências podem mobilizar sua capacidade produtiva de alternativas coletivas, criativas e apropriadas para o cuidado e a produção de autonomia.(MERHY; FEUERWERKER, 2008).

Na AD pode haver uma tensão constitutiva básica, são lados que não se excluem, mas produzem-se mutuamente: a medicalização e a substituição. Esses lados caracterizam-se como uma dobra nuclear dos processos produtivos de saúde, em geral: reestruturação produtiva da saúde e/ou transição tecnológica. A disputa se dá entre a ―institucionalização‖ da casa como um ambiente de cuidado dominado pela racionalidade técnica (predomínio de tecnologias duras e leve-duras na produção do cuidada) e a ―desinstitucionalização‖ do cuidado em saúde, propiciando a construção compartilhada do projeto terapêutico, maior autonomia do cuidador/família/usuário e o predomínio de tecnologias leves e leve-duras, resgatando a dimensão cuidadora do trabalho em equipe (MERHY; FEUERWERKER, 2008).

―A AD pode ser trabalhada como um dispositivo para a produção de desinstitucionalização do cuidado e novos arranjos tecnológicos do trabalho em saúde. A tensão entre ambos os pólos é constitutiva da modalidade, mas, por isso, mesmo, ela é portadora de um potencial significativo de inovação.‖ (MERHY; FEUERWERKER, 2008, p.3).

Onde a AD se propõe a produzir alternativas inovadoras no cuidado em saúde, manifestam-se grandes conflitos e desafios. Conflitos em relação à autoria do plano de cuidados, ao papel de cada profissional e dos usuários/cuidadores na produção do cuidado num espaço que é privado, mas invadido pelo público; diante da convivência íntima dos profissionais com necessidades, sofrimentos, valores culturais e religiosos antes apenas vislumbrados. Desafios diante da necessidade de produzir novas tecnologias de cuidado; de construir um equilíbrio entre as diferentes tecnologias envolvidas no trabalho em saúde; de construir equipe com um trabalho efetivamente orientado e mobilizado pelas

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necessidades de saúde não somente do usuário, mas do coletivo familiar em questão; de superar a fragmentação do sistema de saúde e de produzir continuidade de atenção no interior de uma linha de cuidado que é produzida em ato para cada situação (MERHY; FEUERWERKER, 2007, p. 4).

A mudança do modelo de atenção é um processo complexo, que depende da incorporação de mudanças no processo de trabalho em saúde, quanto à sua finalidade, objetos, meios e, fundamentalmente, nas relações entre os profissionais e com a população usuária dos serviços. Essa mudança de modelo tecnoassistencial somente se efetiva quando o usuário é o foco na produção do cuidado, expressando suas necessidades e ocupando o lugar de sujeito na construção dos projetos terapêuticos. Embora as iniciativas ―macro‖ sistêmicas da formulação e implementação de políticas configurarem as condições objetivas para que hajam mudanças no nível ―micro‖, essas mudanças só ocorrem quando há a incorporação de tecnologias leves aos processos de trabalho, fundamentais para avançar na superação do paradigma biomédico (SILVA et al., 2010).

4.3 PROCESSO DE TRABALHO EM SAÚDE: TRABALHO EM EQUIPE COMO ORGANIZADOR DA ATENÇÃO DOMICILIAR

A AD na AB compõe o processo de trabalho das equipes e prima pela interdisciplinaridade (BRASIL, 2013), por isso buscou-se definir nesse tópico os conceitos de processo de trabalho e das diferentes modalidades de trabalho em equipe utilizados neste estudo.

O Processo de Trabalho em Saúde é relativo à dimensão microscópica do cotidiano do trabalho em saúde, ou seja, à prática dos profissionais de saúde inseridos no dia-a-dia da produção e consumo de serviços de saúde. Todavia, é necessário compreender que neste processo de trabalho cotidiano está produzida toda a dinâmica do trabalho humano (PEDUZZI; SCHRAIBER, 2008). A forma com que os serviços de saúde são organizados e os processos de trabalho, expressam as políticas de saúde e os modelos assistenciais, e ainda a articulação das práticas de saúde às demais práticas sociais, econômicas e políticas (PEDUZZI, 2007).

A lógica do cuidado e da integralidade da saúde caracterizam processos de trabalho em que os profissionais e as equipes não atuam somente na modalidade do agir instrumental e estratégico para obter êxito nas ações, em que o resultado foi determinado a priori,

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independentemente das intercorrências possíveis da intervenção e da interação profissional-usuário e entre os profissionais. Na lógica do cuidado e da integralidade, predomina o agir comunicativo, que requer a interação e a comunicação para a intervenção profissional, contribuindo com um contexto propício à articulação das ações e à construção de consensos, ou seja, de um projeto comum da equipe (PEDUZZI, 2005).

Quando a prática comunicativa acontece, caracteriza-se como um princípio organizador do trabalho em equipe, promovendo a integração entre os profissionais e a recomposição dos trabalhos especializados. Por sua vez, o trabalho em equipe pode ser entendido como um dos princípios organizadores do trabalho em saúde, junto às ideias reguladoras como a integralidade da saúde, o cuidado em saúde, a centralidade do usuário e da população de referência (PEDUZZI, 1998).

Porém, para que haja integração dos diferentes trabalhos especializados, não basta que os profissionais compartilhem a mesma situação de trabalho, nem estabeleçam relações pessoais cordiais. A articulação ocorre a partir da comunicação. No trabalho em equipe multiprofissional faz-se necessário a reciprocidade entre a articulação das ações executadas pelos profissionais, a coordenação e a integração dos saberes técnicos e a interação entre os membros da equipe (PEDUZZI, 2007).

O trabalho em equipe multiprofissional é definido como uma modalidade de trabalho coletivo que se configura na relação recíproca entre as múltiplas intervenções técnicas e a interação dos agentes de áreas profissionais distintas. A relação dialética entre trabalho e interação possibilita que os agentes estabeleçam um projeto assistencial comum e pertinente, visando a atenção integral às necessidades de saúde dos usuários do serviço (PEDUZZI, 1998); (PEDUZZI, 2001).

Cunhou-se uma tipologia (Figura 3) de duas modalidades distintas de trabalho em equipe: equipe como agrupamento de agentes e a equipe como integração de trabalho. A equipe agrupamento é caracterizada pela fragmentação, ocorre a justaposição das ações e agrupamento de profissionais. Já na equipe integração, os profissionais buscam uma articulação e interação comunicativa conforme a proposta de integralidade das ações de saúde. A articulação é entendida nas situações de trabalho em que os agentes correlacionam e evidenciam as conexões entre as diferentes intervenções executadas. Em ambas equipes existem as diferenças técnicas dos trabalhos especializados e da valoração desses distintos trabalhos, sendo necessário para a recomposição e a interação, um somatório não apenas de técnicas, sobretudo a interação dos agentes e a superação do isolamento de

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saberes e de suas disciplinas. Essa tipologia evidencia uma polaridade, por um lado uma tendência à integração dos trabalhos especializados e dos profissionais que as executam expressa em uma complementaridade objetiva) e, de outro, a tendência à fragmentação das ações e ao estranhamento e distanciamento dos trabalhadores nas relações estabelecidas entre eles e com o trabalho que executam, incluindo sua relação com os usuários.(PEDUZZI, 1998); (PEDUZZI, 2001).

Figura 3 Tipologia do trabalho em equipe. Fonte: Peduzzi (2001). O trabalho em equipe não extingue as especificidades dos trabalhos, pois são as diferenças técnicas que contribuem para a divisão do trabalho, para melhor qualidade dos serviços ofertados, ao passo que a especialidade favorece um aprimoramento do conhecimento e do desempenho técnico em uma área de atuação, além de maior produção. A convivência entre a flexibilidade da divisão do trabalho e as especificidades das áreas profissionais no trabalho em equipe ―borra‖ as fronteiras, levantando o questionamento das desigualdades entre os trabalhos e a importância da introdução de outras abordagens às necessidades de saúde, propondo outra ordenação do trabalho coletivo em detrimento do modelo biomédico dominante (PEDUZZI, 2001).

O mundo da vida e da cultura institucional estão impregnados das relações hierárquicas e do trabalho solo, tradição no trabalho em saúde, fazendo-se necessário problematizar o trabalho em equipe multiprofissional segundo a teoria do agir-comunicativo, reforçando seus aspectos positivos como a integração, democratização e

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