Fibroma cemento-ossificante central: relato de caso
Central cemento-ossifying fibroma: a case report
Alvimar Lima de CASTRO* Ana Maria Pires SOUBHIA* Glauco Issamu MIYAHARA* Idelmo Rangel GARCIA JÚNIOR** Leandro Toyoji KAWATA***
* Professor Adjunto do Departamento de Patologia e Propedêutica Clínica da Faculdade de Odontologia de Araçatuba-UNESP. ** Professor Adjunto do Departamento de Cirurgia e Clínica Integrada da Faculdade de Odontologia de Araçatuba-UNESP. *** Doutorando em Odontologia, área de concentração Estomatologia, Faculdade de Odontologia de Araçatuba-UNESP.
RESUMO
O fibroma cemento ossificante central é uma neoplasia benigna relativa ao osso que acomete principalmente o sexo feminino, durante a terceira ou quarta décadas de vida. No presente trabalho, é apresentado um caso em uma paciente melanoderma com 17 anos de idade com aumento de volume no rebordo alveolar superior direito, expansão de corticais ósseas vestibular e lingual, duro à palpação, coloração rósea e recoberto por mucosa íntegra. Com o diagnóstico diferencial de fibroma cemento ossificante central, osteoblastoma e displasia fibrosa monostótica, foi realizada biópsia incisional que possibilitou a identificação microscópica de inúmeras formações cementóides e/ou osteóides, de formas e tamanhos variados, dispostas em um estroma fibroso ricamente celularizado e vascularizado, definindo o diagnóstico de fibroma cemento ossificante. A seguir, a paciente foi submetida à remoção cirúrgica da lesão.
Palavras-chave: fibroma ossificante; neoplasias bucais; diagnóstico bucal; cementoma ABSTRACT
The central cemento ossifying fibroma (CCOF) is a osteogenic benign neoplasm that incidence is more common in female, during the third or fourth decades of life. These paper report a case in female patient 17 years old that presented swelling of right maxilla, with cortical expansion, hard to the touch, covered with rosy mucous. With the differential diagnosis of CCOF, osteoblastoma and monostotic fibrous dysplasia, it was accomplished biopsy that made possible the microscopic identification of formation of osteoid tissue and calcifications that resemble cementum-like, forms and varied sizes, disposed in a richly vascularized and cellularized fibrous stroma, defining the diagnosis of CCOF. The patient was submitted the surgical removal of the lesion.
INTRODUÇÃO
O fibroma cemento ossificante central (FCOC) é uma neoplasia benigna de origem rela-tiva ao osso que acomete principalmente o sexo feminino, durante a terceira ou quarta década de vida.4,9,12,14 Clinicamente, apresenta-se geralmente
como aumento volumétrico assintomático, de evolução lenta, acometendo a região de pré-mo-lares e mopré-mo-lares da mandíbula.4,5,10,16,14,19
Radiograficamente se apresenta como lesão bem definida e com áreas radiotransparentes e/ou radiopacas que podem estar associadas a divergênicas ou reabsorções radiculares.14,18 O
tra-tamento é a remoção cirúrgica, e o prognóstico, na maioria dos casos, favorável.2,4,5,12,14
CASO CLÍNICO
Paciente melanoderma com 17 anos de idade, sexo feminino, com queixa de “inchaço na face”, relatou ter percebido a lesão há 14 meses, sem sintoma doloroso e evolução constante, aumen-tando gradativamente de tamanho.
Ao exame físico extrabucal se constatou dis-creta assimetria facial devido a tumefação em re-gião de maxila direita e pele com cor e textura normais (Figura 1). Intrabucalmente se observou aumento de volume no rebordo alveolar superior direito desde incisivo lateral até túber de maxila, com expansão de cortical vestibular e lingual, duro à palpação, recoberto com mucosa íntegra de coloração normal e ausência do 15 (Figura 2). Na radiografia panorâmica se observou lesão mista acometendo o rebordo alveolar superior direito e seio maxilar, 15 incluso e com reabsorção radicular nos dentes 16 e 17 (Figura 3). A tomografia computadorizada em cortes axiais com janela para tecido duro mostrou lesão hiperdensa bem delimitada (Figura 4).
Com diagnóstico diferencial de fibroma cemento ossificante central, displasia fibrosa e osteoblastoma e diagnóstico clínico de fibroma
FIGURA 1 – Aspecto clínico extrabucal
FIGURA 2 – Aumento volumétrico difuso em região maxilar direita
cemento ossificante central, foi realizada biopsia incisional sendo que os cortes histológicos mostra-ram inúmeras formações cementóides e/ou osteóides, de formas e tamanhos variados, dispos-tas em um estroma fibroso ricamente celularizado e vascularizado caracterizando, assim, fibroma cemento ossificante central (Figura 5). A seguir, foi realizada remoção cirúrgica total da lesão (Figura
FIGURA 6 – Peça cirúrgica evidenciando lesão bem delimitada.
FIGURA 3 – Radiografia panorâmica evidenciando imagem mista e reabsorção radicular no 16 e 17
FIGURA 4 – Tomografia computadorizada em cortes axiais com janela para tecido duro evidenciando imagem hiperdensa bem delimitada
FIGURA 5 – Corte histopatológico evidenciando formações esparsas de tecido mineralizado em estroma fibroso bem celularizado. H.E.50X
6), sendo que o exame histopatológico ratificou o diagnóstico inicial. A paciente se encontra em pós-operatório de três anos sem evidências de recidiva.
DISCUSSÃO
Apesar de alguns autores como MARTINS
NETO et al.10 (1995) preferirem utilizar o termo
fibroma ossificante devido ao aspecto histológico da lesão, optamos por fibroma cemento ossificante cen-tral, por estar de acordo com a padronização da
Or-ganização Mundial da Saúde.9 Diferentemente da
forma periférica, que é uma condição proliferativa
não neoplásica, o FCOC tem natureza neoplásica. 11
Em estudo de SOBRAL et al. 17 (2003), com
204 casos de lesões fibro-ósseas benignas, o FCOC teve incidência de 19,1%. Em casuística de
Ogunsalu et al. 13 (2001), a idade dos pacientes
com FCOC variou de 12 a 63 anos de idade.
CASTRO4 (2000) relata a maior ocorrência na
quarta década de vida. Quanto ao sexo, o FCOC apresenta marcante predileção pelo feminino, che-gando à proporção de 5:1 segundo alguns autores.
5,8,12,14 Porém, na casuística de Sobral et al. 17
(2003), apenas 51% eram do sexo feminino.
Segundo OGUNSALU et al. 13 (2001) e
SOBRAL et al. 17 (2003) não há diferença
porcentual significante entre a ocorrência da FCOC na mandíbula e maxila, o que contraria a
literatura, a qual relata que a lesão ocorre com
maior freqüência na mandíbula, 8,12,14 sendo a
re-gião posterior o sítio de predileção.12,13,14,17 Há
poucos relatos de casos em região anterior, bem como lesão bilateral. 13
As lesões iniciais podem aparecer como radiotransparência uni ou multiloculares que têm semelhança com um cisto odontogênico. O está-gio inicial progride gradualmente para uma lesão mista, à medida que o material calcificado é depo-sitado no tumor. As lesões maduras podem con-sistir em massa radiopaca densa, circundada por uma linha radiotransparente bem definida.5,12,14 No
caso apresentado, considerando-se as característi-cas radiográficaracterísti-cas, a lesão provavelmente era madu-ra. Em geral, deslocamentos das raízes dos den-tes podem estar presenden-tes, e menos comumente, a lesão pode reabsorver as raízes dentárias,3,5,6,12,14
como no caso apresentado. Estas características são sugestivas de lesão benigna.
No caso apresentado, o fato da lesão acome-ter uma adolescente de 17 anos de idade e com aumento volumétrico em maxila, nortearia para um diagnóstico clínico de displasia fibrosa, porém o aspecto radiográfico de lesão com limites bem definidos indicam presença de FCOC.
O diagnóstico diferencial do fibroma cemento ossificante central se baseia no aspecto radiográfico, o que reflete seu grau de maturação. Se a lesão for radiolúcida, geralmente se deve incluir cisto odontogênico, ameloblastoma, mixoma, e lesão de células gigantes central. Se a lesão tiver imagem mista ou radiopaca, o que é mais comum, o diagnóstico diferencial incluiria displasia fibrosa, osteoblastoma, cementoblastoma e osteomielite esclerosante focal.14,19
Cabe considerar que em alguns casos, o exa-me histopatológico não é suficiente para a defini-ção do diagnóstico, devendo-se avaliar o conjunto das características clínicas, radiográficas e histopatológicas. O FCOC geralmente se apresen-ta radiográfica e cirurgicamente bem delimiapresen-tado, o que não ocorre nos casos de displasia fibrosa.
3,6,7,12,14,15
O prognóstico é favorável,4 desde que
ade-quada terapêutica seja instituída. É de consenso que o tratamento de eleição seja a remoção cirúr-gica da lesão.2,12,14
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Recebimento:29/11/2005 Aceito: 15/9/2007 Alvimar Lima de CASTRO José Bonifácio 1193
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